As Relações Políticas entre os Mouros da Espanha e Norte da

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As Relações Políticas entre os Mouros da Espanha e Norte da África no período
de dominação Islâmica na Península Ibérica Medieval1
Acauã Alves Galvão da Silva2
RESUMO:
O objetivo do artigo pretende demonstrar resumidamente a história política muçulmana na Península
Ibérica (al-Andalus) e as ligações que possuíam com o Norte da África em uma pesquisa exploratória sobre
os mouros, baseada em um levantamento bibliográfico, destacando os acontecimentos da conquista árabe e
movimentos originários da África do Norte, até a expulsão dos mouros. Também demonstrar a influência da
África sobre a Europa medieval, a fim de quebrar paradigmas que possuímos sobre essa cultura islâmica, de
modo que, traga a consciência que existiram outros povos, como os mouros, que ajudaram a construir nossa
nação brasileira, direta ou indiretamente.
Palavras-chave: Mouros, Muçulmanos, Espanha, África, Reconquista.
ABSTRACT:
The purpose of the present study investigates summarized Muslim political history in the Iberian Peninsula
(al-Andalus) and the links it had with North Africa in an exploratory research on the moors, based on a
literature review, highlighting the events of the Arab conquest and movements originating in North Africa
until the expulsion of the Moors. Also demonstrate the influence of Africa on medieval Europe, in order to
break paradigms we have about this Islamic culture, so, bring awareness that there were other people, as the
Moors, who helped build our Brazilian nation, directly or indirectly .
Keywords: Moors, Muslim, Spain, Africa, Reconquest.
INTRODUÇÃO
Quando falamos da história do Brasil, o ensino se desdobra do ano do descobrimento (1500)
em diante. Destacando como protagonistas da história: Portugueses, Indígenas, Escravos e
posteriormente os Imigrantes. Os fluxos migratórios do final do Império trouxeram diversos povos
para Brasil, com ele vieram os sírios e libaneses que ao se fixarem no nosso país. Eles “não somente
reconheceram traços de sua própria cultura em nossa sociedade, como também não foram tratados
como completos estranhos” (EL-MOOR, 2011). Esses traços árabes, reconhecidos pelos imigrantes,
além da posterior influência deles, são influência da colonização portuguesa nas terras do Brasil,
fruto de um povo antes deles, os mouros. Os mouros são muçulmanos, árabes e berberes, que
viveram na Península Ibérica antes da criação de Portugal e Espanha, criando uma civilização
esplendorosa, na qual, permanece viva até os dias de hoje.
Nossa cultura possui a presença moura, isso se deve ao fato de que eles eram mais
constantes na Península Ibérica, resultado de oito séculos de domínio, especialmente o Reino de
Granada, seu último reduto em solo europeu, que foi conquistada pelos cristãos em 1492, mesmo
ano em que Colombo chegava à América. O colonizador, no século XVI, ao desembarcar trouxe sua
herança moura: música, culinária, arquitetura e decoração, técnicas agrícolas e de irrigação,
farmacologia e medicina. Deste modo a “cultura árabe tem presença garantida na história e nas
sociedades brasileiras” (TRUZZI, 2009 apud EL-MOOR, 2011, p. 4).
Entretanto, o domínio mouro na Espanha teve na África o ponto de partida para essa
empreitada. Do Norte da África, mais precisamente do Magrebe, tropas invadiam repetidamente alAndalus (nome islamizado da Península Ibérica), marcando com profundidade a política e as
relações de poder entre cristãos e muçulmanos. O Magrebe compreende os países localizados no
1
2
Trabalho de Conclusão do Curso (TCC) do curso de História da Faculdade Estácio de Goiás
Autor, Graduando em História pela Faculdade Estácio de Sá de Goiás, FESGO
Norte da África, está limitado pelo Mar Mediterrâneo a norte, pelo Oceano Atlântico a oeste, pelo
Golfo de Gabes a leste, e pelo deserto do Saara a sul. Atualmente compreende Marrocos, Tunísia,
Argélia, Líbia e Mauritânia (este na costa Atlântica).
Do Magrebe se origina o termo mouro, os romanos denominavam “mauri” os não-romanos
que viviam na região. E após a imigração dos magrebinos para Ibéria, o termo mouro passou a
designar os muçulmanos que viviam em al-Andalus. O maior grupo que compõem os mouros são os
berberes, povo nômade que designa o grupo linguístico norte-africano (camita semítico), na qual
apresentam a língua como denominador comum, uma vez que nas palavras de Hilário Franco, “os
mouros não devem ser considerados uma etnia, e sim uma minoria religiosa, porque, em termos
raciais, não havia diferença entre portugueses cristãos e portugueses muçulmanos”. No entanto, os
berberes não conseguem criar um estado autônomo e durável com uma civilização própria.
Já os árabes, grupo linguístico semita do Oriente Médio, vieram para o Magrebe na
expansão islâmica. Nesse processo de expansão, os berberes também se islamizaram, adotando a
língua e religião árabe. Atualmente, o uso disseminado dos termos árabes ou islâmico significa a um
agrupamento cultural, do que uma etnia ou raça. Então, os povos árabes, são aqueles que se
arabizaram devido às conquistas arábicos-muçulmanos dos séculos VII e VII d.C. Assim, falar em
mouros é falar de magrebinos, sejam árabes ou berberes.
Definido o tema, o próximo passo do historiador é estabelecer as fontes que ele vai utilizar
em sua pesquisa exploratória cujo objetivo é a maior familiaridade com o problema ou tema. As
pesquisas históricas devem ser cuidadosas e a seleção feita com fontes confiáveis. Uma vez que
dados imprecisos ou mal feitos comprometem o rigor científico do trabalho. Existem três principais
fontes que constituem o saber histórico: os documentos escritos, a arqueologia e a tradição oral,
“apoiadas pela linguística e pela antropologia, que permitem matizar e aprofundar a interpretação
dos dados” (KI-ZERBO, 2010, p. XXXVI). As fontes primárias “antigas e medievais caracterizamse por escrita literária ou narrativas; são testemunhos conscientes em sua maioria, sejam anais,
crônicas, viagens ou geografias (…) a partir do século XII, o documento arquivístico começa a
aparecer no Magrebe (peças almóadas, documentos oficiais, fatwas)” (KI-ZERBO, 2010, p.79). A
história muçulmana, então, é bem documentada por cartas, registros comerciais, fatwas e
documentos cristãos.
Particularmente, esse artigo utilizará somente fontes escritas e documentadas secundárias, de
trabalhos consagrados, conforme a Bibliografia. Os documentos secundários, mais precisamente, os
livros de história que contam sobre esse período passaram por uma análise científica mais apurada e
muito útil para esse tipo de pesquisa exploratória de levantamento bibliográfico. O procedimento
técnico da pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, baseado em
artigos e livros. Apesar de existir diversas fontes documentais que trazem esse tema, não foi
utilizada o cruzamento de fontes documentais secundárias, deste modo, foi minimizado utilizar
fontes diversas para o mesmo assunto e também ter que lidar com inúmeras traduções para o mesmo
nome, apesar da curiosidade do historiador em seguir várias trajetórias ao mesmo tempo. Já a
arqueologia e a tradição oral, não foi utilizada nesse presente trabalho, apesar de ser um repositório
histórico precioso.
As bibliografias escolhidas eram inúmeras, utilizando o recurso online de pesquisa (Google
Schoolar). Com o termo “mouros”, “moros”, “Granada”, “berberes”, “magrebe”, encontrou-se
muitos trabalhos e dissertações, principalmente em língua espanhola. Não foi feita distinção entre
livros, artigos e trabalhos acadêmicos em geral. A primeira delimitação foi por obras que falavam
dos mouros de modo mais abrangente, excluindo trabalhos sobre os mouros e mouriscos no Reino
de Portugal, por exemplo. Assim, os livros de história foram utilizados como fonte bibliográfica
principal. A Coleção História Geral da África elaborado pela UNESCO foi a principal fonte
bibliográfica, uma vez que a história do Norte da África se mescla com a história da Península
Ibérica medieval, e abrange praticamente todo o tema do artigo. O Atlas da História Medieval foi
útil para demarcar uma ordem cronológica e mostrar as alterações ocorridas fora do território
estudado. Já o livro a História do Mundo Árabe Medieval foi adicionado posteriormente, mas de
grande valia para o presente artigo. Os demais trabalhos serviram para pontuar pequenas passagens
e apontamentos breves. Outra delimitação, foi o próprio instrumento utilizado, o Artigo tem como
característica ser um trabalho sucinto, desta forma, não poderia alongar o tema e escolher muitas
fontes.
Através da leitura e análise dessas fontes foi possível estabelecer um plano evolutivo da
história dos mouros da Espanha e Norte da África. Não foram utilizados os procedimentos técnicos
de pesquisa documental, por não haver tratamento em fontes primárias; de pesquisa experimental;
de levantamento de dados; de estudo de campo; e estudo de caso.
A utilização dos nomes dos países atuais, na qual corresponde o mesmo território do período
que vamos utilizar, é um recurso da historiografia para melhor compreensão didática. Assim,
Península Ibérica e Espanha, possuem o mesmo valor territorial. Bem como Marrocos, Magrebe ou
Norte da África. Entre parenteses estarão destacados o ano vulgar que ocorreu o fato histórico.
1. OS SENHORES VINDO DO LESTE
Para compreender os povos foram os mouros da Espanha e os berberes islamizados,
precisamos voltar no tempo e analisar os fatores que constituíram a construção desses povos.
Focaremos na história do islã na Península Ibérica e suas ligações com a África, bem como os
movimentos dos cristãos na Europa, desde a queda do Império Romano.
1.1 Do oriente para o ocidente
Na Europa Ocidental, no século V, diante das migrações dos germânicos, empurrados pelos
hunos, o Império Romano não conseguia fazer oposição a horda que avançava progressivamente
sobre o Império Romano do Ocidente, devido diversos fatores que fogem ao escopo deste trabalho.
Na Península Ibérica, no ano de 409, as migrações dos alanos, vândalos e suevos atravessaram os
Pireneus e se apoderam da Espanha. Os germanos visigodos, em 414-418, atacaram os estados
fundados pelos invasores. O final do Império do Ocidente tinha sido alcançado. Os visigodos se
espalharam-se da França (ano 470) até a Espanha (anos 469-478), excetuando pelos territórios
bascos e suevos, este anexado posteriormente. Esses acontecimentos levaram uma devastação, o
declínio das cidades e diminuição das atividades comerciais. De grandes cidades, a Europa torna-se
uma civilização agrária. Nessa altura, “os germanos estavam já bem instalados nos territórios
romanos e os membros do grupo de guerreiro tinham-se transformado em proprietários”
(MCEVEDY, 1979). Em 589, os visigodos abandonam suas religiosidades tradicional e adotam o
cristianismo como religião oficial da Hispânia Visigótica.
Longe das gélidas florestas europeias, na imensidão do deserto da Península Arábica, na
cidade árabe de Meca, o profeta Maomé, conseguiu vencer as adversidades e prevalecer a fé
islâmica, com fiéis sempre dedicados em empurrar as fronteiras da sua fé. Ainda que a unidade
imposta por Maomé (570-632) morresse com ele, segundo McEvedy (1979), o Islã continuou
remodelando a sua lei temporal e espalhando-a para além do horizonte do Profeta. Em 634, os tribos
árabes nômades, unificados, política e espiritualmente, em nome da fé que lhe proibia lutarem entre
si, envia os primeiros exércitos para o exterior. Conquistam a Síria (636-638), Mesopotâmia (639646), Egito (640-642), depois Tripolitânia ou Líbia (642), todo império persa Sassânida e territórios
do Império Bizantino. O sucesso árabe, segundo El Fasi (2010), se deu pois os autóctones não
opuseram resistência aos invasores árabes em razão de não terem nada ou quase nada a perder com
a mudança dos mestres. Essa foi a criação de um novo grande império na bacia mediterrânea e no
Oriente Médio. O império dos nômades árabes conseguiu, ao contrário dos impérios romanos e
mongóis, preservar sua língua e unidade, “os árabes (…) impuseram a sua língua e a sua autoridade
aos diversos povos que eles haviam dominado” (EL FASI, 2010, p. 3). Esse território vasto, além do
florescer de uma grandiosa cultura, seguiu o caminho oposto da Europa medieval, houve um grande
desenvolvimento comercial, nas palavras de El Fasi (2010, p. 5), “o Império Muçulmano funcionou
como uma zona de livre comércio”. E sua posição no mundo, serviu como uma ponte entre o Velho
Mundo e o resto dele.
Os árabes tinham como chefe os califas, na qual reuniam, tal como Maomé, os poderes de
imperador, papa e a princípio eram designados por eleição. El Fasi (2010) diz que após a morte de
Maomé, seus sucessores foram os califas inspirados (al-khulafa’ al rashidun), todos aparentados de
Maomé. Mas quando o terceiro califa Otmã (‘Uthman ibn Affan) morreu, e Ali (‘Ali ibn Abi Talib)
foi eleito para lhe suceder, ele não foi aceito pelo governador da Síria, Muawiya (‘Abd al-Rahmân
Mu‘āwiya). A guerra civil eclode entre os muçulmanos, com a vitória de Muawiya (661), primeiro
califa do clã dos omíadas (Banu Umayyade). Sua vitória estabeleceu as bases para a instauração do
califado hereditário, segundo McEvedy (1979), “graças a um nepotismo extensivo”.
1.2 Islamização do Magrebe
A conquista do Magrebe (al-Maghreb, ocidente em árabe), na qual, compreende todo
noroeste da África, do mar Mediterrâneo até o Atlântico. Segundo El Fasi (2010), a África do Norte
ocupava posição-chave no mundo muçulmano, política e economicamente, dali o islã se expandiu
para o sul da África e para Europa, na Espanha e Sicília. A campanha de Magrebe foi iniciada no
governo dos Omíadas (ano 670). Ao contrário das fáceis conquistas árabes no Egito e Síria, o
Magrebe ofereceu maior resistência. Os habitantes das cidades romanas do litoral eram cristãos e os
berberes do interior praticavam a religião tradicional africana. Nas palavras de El Fasi (2010), o
processo de islamização foi relativamente lento, com vários grupos cristãos em seu meio, se
estendendo séculos depois da conquista. Nas primeiras conversões das tribos berberes (ano 678),
eram mais de fachada política, como um reconhecimento de alguma derrota militar. No entanto,
quando a última rebelião berbere, em 703, o governador do Magrebe Oriental ou Ifriqiya (atual
Tunísia), Musa ibn Nusayr (640-716), libertou alguns jovens nobres berberes, mediante sua
conversão ao islã, para lhes confiar postos no exército. A maioria dos berberes se converteram ao
islã, e antes contrários, “eles tornaram-se ardentes partidários da nova fé, contribuindo para
propagá-la do outro lado do estreito de Gibraltar e além do Saara.” (EL FASI, 2010, p. 8). Deste
modo, Musa concluiu a conquista do Magrebe (710), com exceção da cidade de Ceuta (domínio
Bizantino).
2. CONQUISTA DA PENÍNSULA IBÉRICA
No século VIII, no Reino Visigodo, na Península Ibérica, passava por convulsões internas
por conta da sucessão real (710), duas facções brigavam pelo poder. Nos diz Palencia (2005, p. 9),
quando morre Vitiza, os nobres nomearam Rodrigo como rei em desfavor ao filho de Vitiza, Águila.
O reino foi dividido em dois, a porção sudoeste controlada por Rodrigo, e a porção nordeste
controlada por Águila II. A luta entre os dois levou o tio de Águila, Opas, bispo espanhol, pedir
auxílio aos muçulmanos para combater Rodrigo, ajudados pelo governador de Ceuta, Conde Julian
que auxilia os muçulmanos, em vingança por Rodrigo não ter desposado sua filha. Musa envia Tariq
ibn Ziyad (ano de 670-720), com tropas berberes e árabes, que desembarcam em Gibraltar (ano
711). Ele vence Rodrigo na Batalha de Guadalete e conquista a capital Toledo, sob o pretexto de
ajudar Opas. Tariq conquistou Córdova, Archidona e Elvira. Diz El Fasi (2010) que, Musa não
tardou a se juntar a Tariq e conquistando Medina, Sidonia, Sevilha e Mérida. Conta El Fasi (2010,
p. 289), com a conquista da Ibéria, milhares eram os berberes que atravessaram o estreito, tamanha
pressa que alguns foram sobre tronco de árvores. Conquistada militarmente, inúmeros imigrantes
berberes:
"[…] estabeleceram-se na Espanha (al-Andalus, a Espanha muçulmana), casaram-se com
árabes ou romano-ibericos, tornando-se andaluzes muçulmanos. A península estava
semeada de colônias berberes. A sua progênie pertencia a classe dos muwalladun (Muladi:
andaluz por parte de pai árabe ou berbere e de mãe ibérica), componentes de 70% da
população da Espanha muçulmana. Oriundos de todas as categorias sociais, estes andaluzes
de origem berbere deixaram-nos uma lista interminável de celebres personagens: generais,
ministros, teólogos, inventores, poetas e artistas" (EL FASI,2010, p.289).
A derrota dos visigodos entregou toda a Península aos árabes (ano de 711-718), com
exceção do extremo norte, os bascos e o Reino das Astúrias, herdeiros dos visigodos. Esses poucos
constituíram o germe do que seria o movimento chamado de Reconquista. A Reconquista é utilizado
na historiografia ibérica e europeia para designar o processo da resistência cristã à dominação
muçulmana e as guerras que tiveram por objetivo sua expulsão da península, aliado ao sentimento
que intrusos, ocupantes de uma área que, por direito, pertenciam a seus ancestrais, e restaurar a
herança visigoda. A Reconquista cobre o período de 722 a 1492, isto é, da Batalha de Covadonga
até a queda de Granada.
Os árabes continuaram sua conquista para o norte, atravessando os Pireneus (ano 719),
tomaram a região visigótica da França. Todavia, os francos tinham sido reunificados por uma série
de prefeitos do palácio, segundo McEvedy (1979), responsáveis pela administração do território em
nome dos descendentes do rei Clóvis. Os francos conseguiram bloquear a progressão das tropas
muçulmanas na Gália. Em 732, o prefeito Carlos Martelo derrotou os árabes na Batalha de Poitiers,
“que fez com deixassem de constituir uma ameaça para a França” (MCEVEDY, 1979). No final do
século VIII, a unificação política pelos carolíngios, Carlos Magno (768-814) conseguiu os
territórios do Norte da Espanha, fundando o Condado de Barcelona (801-802). Até a queda do
Califado Omíada, al-Andalus foi dirigida por governadores dependentes de Damasco, de 710 até o
ano de 755.
2.1 Fim do Califado Omíada de Damasco
Em 749, o descontentamento político e religioso perante o poder dos omíadas explodiu
bruscamente numa revolta declarada em todo califado. El Fasi (2010), nos diz que as contradições
criadas pelo fato de uma minoria árabe usurpar todo o poder político e os privilégios econômicos,
enquanto a maioria, embora já muçulmana, via-se recusar o acesso, como os berberes. E também, o
Califado Omíada que estabeleceu o califado hereditário, não consegui desfazer “o sentimento de
que Ali e os seus descendentes eram os herdeiros legítimos do profeta, e isso passou a fazer parte do
dogma religioso das facções descontentes” (MCEVEDY, 1979). Nisso reside o cisma religioso,
entre o Islã Ortodoxo (sunitas ou “aqueles que aderem à sunna ou tradição”) e o de Ali (xiitas ou
Shi’atu ‘Ali, ou seja, “o partido de ‘Ali”).
O resultado da revolta foi, nas palavras de McEverdy (1979), apenas uma mudança de
dinastia, reinando agora os abássidas. No ano de 750 sobe ao poder Abu'l Abbas al-Saffah, fundador
da dinastia abássida. Para consolidar o poder, al-Saffah massacra toda a família dos omíadas em um
banquete. Nas palavras de McEverdy (1979), "a única província que porém se recusou efetivamente
a reconhecer os primeiros Abássidas foi a Espanha. Um dos poucos omíadas que sobrevivera criou
um estado independente, em 756, depois de uma luta implacável que deu aos cristãos do Norte da
Espanha a possibilidade de ganhar novamente a Galiza e estabelecer o reino sobre bases mais
sólidas". Esse sobrevivente era o príncipe 'Abd al-Rahmân I, que se declara emir de Córdova
(Qurtuba), após a incrível façanha de fugir de Damasco até a Espanha.
O poder político e administrativo centralizado árabe começa a se desfazer. Assim, o fim do
Império Árabe dos primeiros conquistadores cedera lugar ao “mundo muçulmano da Idade Média”
(EL FASI, 2010, p. 3), os abássidas, além da Espanha, posteriormente perderam o controle de todas
as províncias africanas a Oeste do Egito. As províncias mais distantes tinham tendência a tornar-se
independentes e hereditários, como diz McEverdy (1979), tal como a Tunísia ou Ifriqiya (Aglábida,
800-909), e a Pérsia Oriental (Taíridas, 820), e Marrocos ou Magrebe (Idrísidas, 789-926).
3. A DINASTIA OMÍADA NA PENÍNSULA IBÉRICA
O recém-fundado emirado de 'Abd al-Rahmân I (731-788), foi marcado por guerras, tanto
externas como internas. Do exterior vieram tropas dos abássidas. No interior havia “luchas entre los
berberiscos y los árabes” pelo poder e independência, principalmente em Saragoça e Barcelona, que
muitas vezes se aliaram com Carlos Magno contra o emir (PALENCIA, 2005, p.12, tradução nossa).
Mesmo diante disso, os omíadas conseguiram prevalecer no poder.
No século X, o oitavo Emir de Córdova, ‘Abd al-Rahmân III (912–961), em 929 se declara
primeiro Califa de Córdova. Conta Palencia (2005, tradução nossa), que ao subir no trono, a
Espanha se encontrava dividia por guerras, ameaçadas pelos moçárabes (cristãos arabizados),
cristãos dos reinos do norte e pelo Califado Fatímida na África. Segundo Giordani (1958), após a
pacificação interna, ‘Abd al-Rahmân III, ao se declarar califa, busca quebrar a intenção Fatímida de
reunificar o Império Árabe. Consolidando seu poder, trouxe uma era de prosperidade para dinastia
omíada.
3.1 O legado de Almançor e o exército berbere
O governo de Hisham II, terceiro califa de Córdova, o primeiro-ministro (hájibe) conhecido como
Almançor das crônicas cristãs (938-1008), substitui o exército de escravos eslavos, por um exército
de mercenários berberes, do antigo Califado das Idrísidas, na qual devastavam periodicamente os
reinos cristãos do Norte (Reino de Leão e Navarra). Entretanto, lembra McEverdy (1979), embora a
supremacia muçulmana na Espanha nunca tivesse sido defendida com tanto empenho não
conseguiam grandes vitórias. Com a morte de Almançor, inicia-se "a inexorável decadência do
califado de Córdova. Lutas de partidos e deposições de califas caracterizam essa época"
(GIORDANI, 1985: 111).
4 REINO DE TAIFAS
No século XI, após a morte de Almançor, seu filho, Almodáfar (‘Abd al-Malik al Muzaffar),
continua primeiro-ministro (1002-1008) de Hisham II Após ser morto por seu meioirmão,
Sanchuelo (‘Abd al-Rahmân Sangul), este assume o cargo (1008–1009). Conta Palencia (2005: 60,
tradução nossa), Sanchuelo, odiado pelos seus faquires, não tinha as qualidades de seu pai e irmão,
quando estava em campanha contra Alfonso V de Leão, uma revolta popular liderada pelo príncipe
Maomé II, bisneto de 'Abd al-Rahmân III, invade o palácio em Córdova e aprisiona Hisham II e
depõem Sanchuelo. Maomé II é proclamado califa. Ao retornar, Sanchuelo é morto em Córdova.
Esse é o marco histórico para a guerra civil de al-Andalus ou Fitna al-Andalus que conduzirá ao
final do califado e à desagregação territorial que conduzirá às Taifas. As Taifas voltarão a reaparecer
toda vez que não houver um poder central sob os muçulmanos espanhóis.
Com o apoio dos berberes e do conde Sancho Garcia de Castela, Sulaiman II ibn al-Mustain
primo de Maomé II, derrota-o, em 1009. O que obriga Maomé II a se refugiar em Toledo. Sulaiman
toma Córdova e permite seu saque por suas tropas berberes.
Uma segunda vez, Maomé II se tornou califa em 10 de maio de 1010, quando tropas de
escravos e de mercenários, apoiadas por tropas catalãs do conde de Barcelona, Raimundo Borrel I,
derrotaram o exército de Sulaiman. Maomé foi alçado novamente ao trono de Córdova, onde
permaneceu até ser assassinado em 23 de julho de 1010. Após a sua morte, Hisham II ascendeu
novamente ao trono (1010-1013). Hisham II foi incapaz de reconquistar o controlar as tropas
bérberes – que ainda apoiavam Sulaiman – e a guerra continua. Em 1013, os berberes, liderados por
Zawi ibn Ziri, do clã Banu Ziri, tomam Córdova e saqueiam a cidade. O Hisham é morto. Sulaiman
al-Mustain torno-se o novamente o califa.
A política de Suleiman de concessões aos berberes, árabes e tropas de escravos efetivamente
reduziram a autoridade do califado à região de Córdova apenas. Todos os governadores das coras do
Califado (províncias) se tornam reinos independentes. McEverdy (1979) diz que a "guerra civil
entre os árabes e os berberes tornara-se endêmica e embora o califado se mantivesse até 1031, era
um espectador impotente. Os emires berberes proclamaram a independência no sul e no oeste da
Espanha e em Marrocos". Na Fitna nasceu inúmeros Estados independentes, El Fasi (2010) diz que
“vinte pequenos Estados se haviam assim formado em diversas províncias e cidades, nos quais
reinavam emires e reizetes aos quais coletivamente se designa pelo nome árabe muluk al-tawa’if”
(“reis de partidos ou facções”, em espanhol: reyes de taifas). Um exemplo disso foi do berbere Zawi
ibn Ziri que proclama a Cora de Elvira independente de Córdova, tornando-se Taifa de Granada
(1013-1090).
Nisso, o governador da Cora de Ceuta, Ali ibn Hammud al-Nasir, dos hamúdida (Banu
Hamud), após atravessar o estreito e domina a cidade de Málaga, em 1016, conquista Córdova em
seguida, tornando-se califa. Sulaiman é morto. Outros seis califas, quatro omíadas e dois hamúdida
suceder-se-iam até 1031, data em que um conselho de Córdova aboliu o sistema do califado,
tornando-se uma república de Córdova até ser conquistada pela Taifa de Sevilha, controlada pela
dinastia dos abádidas (Banu Abbad). Nesse ponto não existe poder central em al-Andalus.
Segundo McEverdy (1979), a Taifa de Sevilha aniquilou o domínio berbere no Sul, mas nem
Sevilha, nem qualquer outro emirado espanhol conseguiram fazer frente aos cristãos do Norte, na
qual partiram para ofensiva, embora Navarra tivesse sido dividida, a conquista de Leão por Castela
(1037) instaurou no norte um reino, capaz de conseguir pela força a submissão dos muçulmanos
divididos. O Rei Afonso VI de Leão e Castela em 1085 conquista Toledo. A ofensiva cristã foi
refreada pelos almorávidas de Marrocos, como diz McEverdy (1979), que atravessaram o estreito
de Gibraltar a pedido dos muçulmanos espanhóis (1086).
5 OS ALMORÁVIDAS
Os almorávidas (do árabe: al-Murabitun) foram inicialmente um movimento religioso,
iniciado por ‘Abdallah ibn Yasin. o clã dos Lamtuna, ramo da tribo berbere Sanhadja, Essa tribo
“foram muito amiúde considerados como a voz dos almorávidas por excelência” (EL FASI,2010),
cujo os chefes eram Yahya ibn‘Umar e seu irmão Abu Bakr ibn‘Umar, os mais fiéis partidários da
jihad almorávida. Essa guerra santa buscava a “restauração da fé, isto é, a ortodoxia muçulmana sob
sua forma tradicional, o maliquismo” (GIORDANO, 1958: 113). Os almorávidas conquistam todas
as províncias do Magrebe.
Em 1056, Yahya é morto em batalha "e Abu Bakr tornou-se o seu sucessor à frente da
comunidade almorávida. “[…] A comunidade religiosa transformou-se em reino dinástico" (EL
FASI, 2010, p. 410). Em 1062, ele funda a cidade de Marrakech, no Marrocos, que torna-se a
capital do império. De 1075 a 1083, o exército almorávida é comandado por Yusuf ibn Tashfin,
primo de Abu Bakr. Ele conquista progressivamente o Marrocos e Argélia até tomar o controle de
Gibraltar e Ceuta. Pouco tempo após, a porção ocidental do Magrebe cairia sob domínio dos
almorávidas berberes, que eliminaram da região os últimos vestígios do kharidjismo, do xiismo e da
heresia dos berberes barghawata, estabelecendo definitivamente o domínio da escola jurídicoreligiosa maliquita do madhhab do Islã sunita. Em 1083 todo o Magrebe é pacificado.
5.1 Almorávidas conquistam a Espanha
Conta El Fasi (2010), que os jurisconsultos muçulmanos espanhóis, principalmente pelas
investidas do Rei Afonso VI de Leão (1047-1109) começaram a alarmarem-se com esta situação
que ameaçava varrer o Islã e a sua civilização de al-Andalus. Mediante o convite do rei de Sevilha,
al-Mutamid (al-Mu’tamid, das abádidas de Sevilha), o exército almorávida conduzido por Yusuf ibn
Tashfin, atravessou o Estreito de Gibraltar, em 1086, para se opor ao avanço cristão do norte. Os
Almorávidas derrotam o rei Alfonso VI e El Cid em Zalacas, “em que ficaram célebres os
guerreiros negros das forças almorávidas” (NIANE, 2010, p.7). Os Almorávidas retornam para
África, por causa da morte do filho de Yusuf, e os cristãos voltam à guerra. De novo as Almorávidas
regressam e conquistam nova vitória em 1088, em Aledo. Yusuf deixaria al-Andalus uma segunda
vez, sob o temor dos muçulmanos espanhóis diante seu poder. Entretanto pela terceira vez Yusuf
volta para al-Andalus em 1090, El Fasi (2010) diz, "ele retornaria, porém desta feita como
conquistador e não mais como aliado. Fortalecido por fatwa (pareceres jurídicos) assinados por
numerosos fukaqa’ (doutores em direito) marroquinos e andaluzes, ele dirigiu uma campanha contra
os muluk al-tawa’if (rei de taifas), acusados de diversos crimes contra o Islã". Os mongescavaleiros almorávidas declaram jihad contra os muçulmanos depravados dos reinos ibéricos. Além
das inovações, como arqueiros e tambores de guerra, o estilo agressivo era marcado pela
fundamentação religiosa. McEverdy (1979) fala que os Almorávidas tinham incorporado no império
todos os emirados de Espanha, exceto Badajoz, Albarracim e Saragoça, que tombaram em 1094,
1103 e 1110, respectivamente, com exceção de Toledo que permanece no domínio da cristandade.
5.2 Luxo e ostentação em Marrocos
O Império Almorávida, cuja capital era Marrakech, inicialmente rigoroso, paulatinamente se
atenuou, em seus atos e comportamentos. E a ostentação e o luxo transbordavam de Marrocos
devido ao ouro que vinha do sul do Saara, indo até o norte da Espanha. Isso era o contraponto ao
rigor dos juristas maliquitas:
"[…] esta repressão conferiu verossimilitude às reprimendas endereçadas, particularmente
pelo nascente movimento almóada. […] A rigidez estampada na esfera jurídica e nos
procedimentos inquisitórios dificilmente esconde certa flutuação doutrinária e não são raras
as revoltas" (EL FASI, 2010: 429).
Em 1118, os cristãos capturam a cidade Saragoça. Aragão e Navarra separaram-se em 1134,
mas, enquanto Aragão ampliava suas fronteiras. Em 1125, revoltas surgem das montanhas do Atlas,
organizada pelos almóadas. Conta McEverdy (1979) que nessa época os almóadas criaram um
império xiita mais a oeste, ocuparam os territórios dos almorávidas, em vias de desagregação,
expulsaram os normandos do litoral e reforçaram a supremacia sobre os nômades berberes e árabes.
Em 1144, surge novamente os reinos de Taifas, entretanto, seu poder independente dura somente até
a chegada dos almóadas.
6 OS ALMÓADAS
Os almóadas (corruptela de al-Muwahhidun, que significa crentes da unicidade de Deus ou
monoteístas), como relata Niane (2010, p. 17) foi a um “reforma religiosa encabeçada pelo famoso
mahdi dos almóadas, Ibn Tumart” da tribo masmuda contra o severo poder maliquitas dos
almorávidas e o seu “antropomorfismo”, ou hashwiya, como explica Niane (2010, p. 21), de “aterse unicamente aos sinais exteriores, ligando-se servilmente às ciências das aplicações jurídicas,
colocando a salvação dos fiéis na prática exterior das prescrições da lei e desconsiderando
totalmente a vida religiosa interior”. Ibn Tumart só admitia o Corão e a sunna e condenava o direito
e a argumentação lógica. Apesar da vitória política, o almoadismo não abalou o maliquismo no
Magrebe, com traços de sufismo andaluz. Indo além das motivações religiosas e políticas, e também
de ordem econômica, foi uma “dinastia fundada por um dos mais antigos e notáveis companheiros
de Ibn Tumart, a dos mumínidas” (NIANE, 2010, p. 16).
Após a morte de Ibn Tumart, al-Mumin dos mumínidas passa a comandar os almóadas e
quem domina e unifica todo o Magrebe (1159). Em 1147, morre o último emir almorávida, na
Batalha de Marrakech. Niane (2010, p. 42) diz que "durante o cerco a Marrakech, o chefe almóada
tinha recebido uma deputação andaluza. […] Enviou então um corpo expedicionário" para fazer
frente ameaça cristã. No mesmo ano, os almóadas capturam Sevilha, que torna-se a capital de alAndalus. O filho de al-Mumin continua o trabalho do pai na Espanha. Em al-Andalus, o poder dos
almóadas só se consolida em 1165, após derrotar Ibn Mardanish, rei da Taifa de Múrcia e Valência.
A nova investida dos cristãos na Espanha foi reprimida e, por outro lado, a separação de
Portugal (1139) e Leão (1157) de Castela fragmentou a força do reino setentrional. A união de
Aragão e Barcelona (1140) equilibrou esta divisão, conta McEverdy (1979), embora o Califado
Almóada abrangesse uma área impressionante, a preponderância em Espanha pertencia agora aos
cristãos.
6.1 A Batalha de Las Navas de Tolosa
No século XII, com a conquista de Cuenca, Afonso VIII de Castela (1155-1214) havia
conseguido alguns avanços importantes no território muçulmano, tomando e ocupando fortalezas e
entregando-as às ordens militares; “os monges-cavaleiros, pelo menos desde 1150, estavam na linha
de frente da Reconquista, travando os combates mais decisivos” (COSTA, 2004). Na vila de
Alarcos (fundada por Afonso VIII) foi ponto de partida de inúmeros ataques. Entretanto, foi
rechaçado pelos almóadas (1195). Uma curiosidade do pensamento medieval, a derrota em Alarcos
foi atribuída por castigo de Deus a Afonso VIII, pelo pecado de ter enamorado uma judia na
adolescência, “para o homem medieval, o campo de batalha era local do ajuste de contas com Deus”
(COSTA, 2004).
Anos de preparação depois, sob o impulso do bispo de Toledo, Rodrigo Jiménez de Rada,
cuja “a atuação (…) foi coroada pela obtenção de uma declaração de cruzada pelo papa Inocêncio
III” (NIANE, 2010, p. 59). Começam a vir para Tolelo companhias de cruzados de toda a Europa.
Após a derrota na Batalha de Alarcos, a última grande vitória muçulmana, os cristãos se
reorganizaram e voltam para o ataque. Podemos depreender, que existe certa relação ao jihad
almóada e a cruzada como resposta. Nisso resulta a vitória cristã em 16 de julho de 1212 em Las
Navas de Tolosa (al-Uqab), muito mais como um símbolo, essa batalha marcou a primeira vitória
dos cristãos unidos (Castela, Navarra, Portugal e Aragão) e diversas ordens militares contra os
exércitos almóadas comandado pela quinta califa almóada Muhammad al-Nasir ou Miramolim
(1199-1214). Para os mouros "essa derrota assinalou o fim da Espanha muçulmana. Em
consequência, "Leão e Castela reunidos desde 1223, avançaram regularmente. Portugal (…) ocupou
em breve o quinhão que lhe cabia, e Aragão, além das conquistas em terra firme, utilizou a força
marítima de Barcelona para conquistas as Baleares (Maiorca) (1228-1232)" (MCEVEDY, 1979).
A Batalha de Las Navas de Tolosa foi quando a Reconquista atingiu seu ponto culminante
com a tomada dos territórios centrais da al-Andalus pelos cristãos. Os domínios muçulmanos que
sucessivamente caíram em poder dos diferentes reinos ibéricos. Conta Niane (2010, p. 63), que em
1230, “o poder almóada desaparecia da península, (…) as metrópoles muçulmanas da al-Andalus
começaram, então, a cair uma a uma sob o domínio dos reis de Castela (Córdova, 1236) ou de
Aragão (Valência, 1238)”.
Após a derrota em Las Navas, o califa volta para Marrakech, e mergulha num estado de
depressão que durou até sua morte. Foi sucedido por seu filho Yusuf al-Mustansir, até 1224.
Ademais, a aristocracia almóada era extremamente ciosa de seus privilégios e considerava infiéis
todos os muçulmanos não almóadas; esses, em grande número, viram-se privados do direito à terra
e progressivamente esmagados pelos impostos. Com isso, o “Império Almóada, exaurido pelas
guerras externas e corroído no plano interno, cedeu lugar a quatro reinos independentes: um na
Espanha e três no Magrebe” (NIANE, 2010, p. 72), o emirado násrida de Granada, o sultanato
merínida do Marrocos, o reino zaiânida de Tlemcen e o sultanato hafécida de Túnis.
7 O ÚLTIMO REINO MOURO NA ESPANHA
Com desaparecimento do poder central, as províncias Andaluzes dão origem ao reino de
taifas novamente (1228–1266). No entanto, poucos conseguem fazer frente ao avanço cristão.
Quando em 1236, o Rei da Múrcia entrega a cidade de Córdova para Castela, então, o emir da Taifa
de Arjona, Maomé I (Muhammad Ibn Nasr al-Ahmar, 1194-1273) aproveita a oportunidade e
conquista Alméria, Málaga e Granada em 1237. Maomé I se declara rei de Granada. Em 1244, após
inúmeras batalhas, Maomé I é forçado a assinar a paz, torna-se vassalo de Castela e pagar um
tributo anual. Sua paz só foi conseguida por prestar vassalagem à Castilha. O pacto é quebrado
quando a Taifa de Niebla é conquistada, e Granada passa a ser o último reino muçulmano na
Espanha.
No século XII, aproveitando-se da decadência dos almóadas, surge um novo poder no
Magrebe, os Banu Marin eram berberes do grupo zenata. Abu Yahya (1243-1258), chefes merínidas,
apodera-se de Fez, de Meknés, de Rabat e de Sidjilmasa. Seu sucessor, Abu Yusuf, em 1269,
conquistaram Marrakech e se desfaz o Califado Almóada; o califado “tinham já perdido a maior
parte da Espanha, e o pouco com que ficara transformou-se no emirado independente de Granada,
enquanto que, no continente africano, tinha sido substituído em grande parte pelos hafécidas de
Tunes (1231)” (MCEVEDY, 1979).
7.1 A Batalha de Rio Salado e o fim da influência militar magrebina na Espanha
Graças à rivalidade entre Castela e Aragão, e à ajuda que os merínidas lhe proporcionaram
no primeiro século de existência, Granada conseguiu sobreviver. Mesmo com o fim do Império
Almóada, o sultão Marínida de Fez não rompe os laços com al-Andalus.
"Abu Yusuf Ya‘kub atravessou o estreito de Gibraltar (1275) e conseguiu vitória decisiva
sobre os castelhanos nas proximidades de Ecija (Istidja). Até o ano de 1285 o sultão lançou
três novas campanhas contra os exércitos espanhóis, tendo a armada marínida derrotado a
esquadra castelhana em 1279; este fato teve por efeito conter momentaneamente a ameaça
que os cristãos representavam para o Marrocos e Granada. A quarta campanha resultou num
acordo segundo o rei de Castela se comprometia a não intervir nos negócios dos territórios
muçulmanos (1285)" (NIANE, 2010, p. 103).
No século XIV, o rei de Castela retomou as agressões contra Granada (1337), na qual levou
uma aliança das forças muçulmanas contra a aliança de Castela e Aragão. Em 1340, na Batalha do
Rio Salado “o exército muçulmano sofreu pesada derrota, a mais grave desde Las Navas de Tolosa”
(NIANE, 2010, p. 103). Nisso, o Magrebe deixou de intervir na Espanha. Como consequência, o
emirado de Granada ficou entregue a si mesmo e “a luta entre Castela e Granada assumiu mais o
caráter de conflito feudal entre suserano e vassalo do que o de guerra entre cristãos e muçulmanos”
(NIANE, 2010, p.112). Em 1492, termina a Reconquista, o Reino de Granada é capitulado, e o rei
Boabdil (1460 - 1533) entrega as chaves para os Reis Católicos. Em consequência, os mouros que
não migraram para outros reinos, ficaram sob o domínio da cristandade. Nos reinos cristãos, a
população não cristã ficou dividida em Mudéjar (muçulmanos que viviam nos reinos cristãos) e
posteriormente, foram obrigados a se converterem, passando a denomina-se de Mouriscos
(muçulmanos convertidos ao cristianismo). Na tentativa de manterem seus costumes, os mouriscos
se revoltaram inúmeras vezes, até que em 1609, foram expulsos da Espanha por decreto do rei
Felipe III.
8 CRONOLÓGIA
Século V
478 - Surge o Reino Visigodo.
Século VII
622 - Início do calendário islâmico, com profeta Maomé;
632 - Governo dos califas inspirados;
634 - Começo da expansão islâmica para além dos limites da Península Arábica;
661 - Início do Califado Omíada.
Século VIII
710 - Conquista do Magrebe;
711 - Vitória dos muçulmanos na Batalha de Guadalete e conquista Península Ibérica;
732 - Os muçulmanos são derrotados na Batalha de Poitiers e fim da expansão islâmica na Europa;
750 - Início do Califado Abássida;
756 - Surgimento do Emirado de Córdova na Península Ibérica.
Século X
926 - Início do Califado de Córdova.
Século XI
1009 - Eclode a Guerra Civil; surgem os primeiros reis de Taifas em al-Andalus;
1031 - Desfaz o Califado de Córdova;
1062 - Fundada a cidade de Marrakesh, no Marrocos, pelos almorávidas;
1083 - Conquista do Magrebe pelos almorávidas;
1085 - Conquista de Toledo pelos cristãos;
1086 - Batalha de Zalaca e primeira vitória almorávida sobre os cristãos;
1090 - Os almorávidas lançam-se contra as Taifas e dominam al-Andalus.
Século XII
1118 - Conquista de Saragoça pelos cristãos;
1125 - Surgem os Almóadas;
1144 - Segundo período de reis de Taifas;
1147 - Batalha de Marrakesh: derrota dos almorávida e conquista de al-Andalus pelos almóadas.
Século XIII
1212 - Os almóadas são derrotados na Batalha de Las Navas de Tolosa;
1212 - Terceiro período de Taifas;
1238 - Fundado o Reino de Granada;
1249 - Finalizado a Reconquista Portuguesa com a conquista do Algarve.
Século XIV
1340 - Derrota das forças muçulmanas na Batalha do Rio Salado.
Século XV
1492 - Termina a Reconquista Espanhola com a capitulação do Reino de Granada;
1492 - Cristóvão Colombo descobre a América;
1492 - Os judeus são expulsos da Espanha.
Século XVII
1609 - Os mouriscos são expulsos da Espanha.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo, mesmo que superficialmente, contou toda a saga de setecentos anos de história
dos mouros na Península Ibérica. Desde a invasão e conquista do Reino Visigodo, seu
estabelecimento com o califado dos Omíadas, período de paz e de esplendor da civilização islâmica
em al-Andalus; a inúmeras batalhas entre as taifas e os cristãos; a forte presença africana com os
Impérios Almorávidas, Almóadas e do Sultanato dos Merínidas; até o seu fim com o último reino de
Granada. Não foi tema deste artigo trazer a herança cultural dessa civilização, como a arquitetura,
gastronomia e outros. Mas creio que contar a história política desse povo é o modo de lembrar as
nossas raízes culturais árabe berbere. E mais, mostrar como a África foi fator importante para o
surgimento desse povo, quebrar preconceitos e recupera a memória islâmica que possuímos.
As batalhas listadas aqui são marcos que mostram o momento de ganho ou perda da
influência de um dos lados, a cristandade e o islamismo, no que pese o lado religioso, a questão era
também política. Segundo Magnoli, do livro História das Guerras, diz que a "guerra é uma história
de alteridades. Cada guerra é um fenômeno único, singular, irredutível". É um fluxo de relações
internacionais entre poderes. No entanto, os poderes que moviam os árabes, segundo El Fasi (2010,
p. 58), não foi a conversão religiosa, mas em garantir a supremacia da charia (shari’a) e a aumentar
a esfera de dominação do Islã (Dar al-islam). Ademais, a invasão da Península Ibérica também foi o
estabelecimento de um povo. Giordani relembra (1985), que os muçulmanos que chegaram não
vinham acompanhados com mulheres, nisso a conquista foi além da militar mais também
estabelecimento de novo começo para os mouros.
Al-Andalus tornou-se uma sociedade multi-étnica, racial e religiosa, coabitavam árabes,
judeus, berberes, hispano-romanos e hispano-godos, o próprio 'Abd al-Rahmân I, primeiro emir de
Córdoba, tinha pai árabe e mãe berbere. Muitos hispanos se mantiveram cristãos, mas arabizados,
sendo chamados de Moçárabes; outros foram convertidos ao Islã, tomando o nome de Muladis (do
árabe muwalladun). No entanto, mesmo entre dois continentes, separados pelo Mar Mediterrâneo,
as relações entre os mouros andaluzes e magrebinos nunca se quebraram. Nos conta Giordani
(1985), que Magrebe para os árabes, era uma região muito especial cuja extensão abrange não só a
África setentrional, mas também a Espanha.
Deste modo, era natural que senhores de al-Andalus se fizeram valer das forças magrebinas.
Lembramos que o terrível Almançor utilizou de mercenário berberes para constituir seu exército. Os
berberes, após a morte de Almançor, constituíram uma força que corou e destronou califas, como
fizeram a Guarda Pretoriana no Império Romano. Outrora os reis de Taifas pediram ajuda aos
magrebinos, mas em vez de mercenários, veio uma força religiosa nova e pujante, que trouxe nova
força e energia aos já combalidos andaluzes. Os almorávidas, segundo Giordani (1985), a grande
obras deles foi estabelecer e aprofundar o contato entre as civilizações andaluza e berbere, que não
deixa de ser paradoxal, uma vez que a origem dos andaluzes é o Magrebe. Na esteira da guerra
santa, no Magrebe surge os almóadas, que mesmo sem serem convidados, dominaram os dois lados
do estreito de Gibraltar. Segundo Giordani (1985, p. 117):
“[…] Apesar de seu fracasso final, os almóadas devem ser considerados como os maiores
representantes da história dos berberes, não somente sob o ponto de vista militar, mas
também sob o ponto de vista religioso. Ibn Tumert compôs inicialmente obras em dialeto
berbere. Mais tarde, como dissemos, os pregadores deveram pregar nessa língua
(contrariando os usos do Islã em geral). Enfim, grandes monumentos, de inspiração
andaluza, e verdade, atestam “a vontade de poder” de sua arte em Marrakech, Sevilha e
Rabat".
Por fim, o maior legado que prescrevo aqui, não foi as conquistas miliares, mas relações que
existiam entre a Europa e a África, na qual tornaram a Espanha em um caleidoscópio de povos e
culturas. No ocidente muçulmano medieval ignorava os preconceitos de pigmentação de pele, como
diz El Fasi:
"A sociedade hispano-magrebina, espantosamente tolerante em uma Idade Média reputada
como fanática, particularmente compósita e heterogênea (nas suas duas extremidades), foi
um tecido de entidades simultaneamente muito específicas e intimamente ligadas entre si,
graças a todo um sistema de relações múltiplas e complexas […]. Apesar da forte presença
moura (árabe-berbere), Al-Andalus, inicialmente, era sobretudo povoado por iberos e
goths" (EL FASI, 2010: 316).
A coexistência de judeus, muçulmanos e cristãos caracterizou que “a Idade Média na Ibéria
foi menos medieval no sentido pejorativo do termo: se trevas existiram, elas forma menos sombrias
lá” (DOMINGUES, 1997, p. 196). O intercâmbio que existia entre as culturas "começou a se
deteriorar seriamente (…) após a queda de Granada (1492). (…) O colapso demográfico, gerador de
estagnação, de atraso, de regressão econômica provocou a atrofia cultural" (NIANE, 2010, p. 78).
Deste modo, a própria cultura europeia cuja “a herança acumulada nos confins setentrionais
da África e na Espanha muçulmana foi recolhida por uma Europa que, em plena expansão
demográfica, descobriu, com entusiasmo, seu inestimável valor cultural e tático” (NIANE, 2010, p.
87), floresceu com seu esplendor naquilo é chamado de Renascença europeia. E mais, o
“Renascimento espanhol (…) é possível identificar uma forte continuidade em relação à Idade
Média sem entretanto negar a originalidade do século XVI” (DOMINGUES, 1997, p. 197). Tanto
que essa continuidade marcou a colonização das Américas. Na esteira da reconquista, os espanhóis
estabeleceram suas colônias exatamente para expandir a fé católica, como fizeram contra os
mouros.
Em conclusão, a maior herança dos mouros, não foi somente o legado cultural, mas saber
que existiu um povo em que sua crença pregava a convivência na diversidade, entre árabes,
berberes e europeus. “O conhecimento do passado de suas próprias sociedades representa uma
tomada de consciência indispensável ao estabelecimento de sua identidade em um mundo diverso e
em mutação” (KI-ZERBO, 2010, p. 37). Esse processo de autoconhecimento traz a consciência no
tocante aos laços que unem os seres humanos entre si e a compreensão mútua entre os povos da
Terra. E assim, transcender os conhecimentos históricos etnocentrista e uma concepção deturpada
da história do mundo.
REFERÊNCIAS
Livros:
KI-ZERBO, Joseph. História geral da África, I: Metodologia e pré-história da África / editado
por Joseph Ki-Zerbo. – 2.ed. rev. – Brasília: UNESCO, 2010.
EL FASI, Mohammed. História geral da África, III: África do século VII ao XI / editado por
Mohammed El Fasi. Brasília: UNESCO, 2010.
NIANE, Djibril Tamsir. História geral da África, IV: África do século XII ao XVI / editado por
Djibril Tamsir Niane. – 2.ed. rev. – Brasília: UNESCO, 2010.
McEVEDY, Colin. Atlas da História Medieval. São Paulo: verbo: Ed. Universidade de São Paulo,
1979.
GIORDANI, Mário Curtis. História do mundo árabe medieval. Petrópolis, Vozes, 1985.
Artigos Pesquisado na Internet:
EL-MOOR, Patrícia Dario. O Reconhecimento da Presença Árabe no Brasil: na busca de uma
identidade Nacional. In: Anais do XI Congresso Luso Afro Brasileiro de Ciências Sociais,
realizado em Salvador, de. 2011.
FRANCO Jr., Hilário. Ecos do passado. Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de
Janeiro, 2008.
PALENCIA, Ángel González. Historia de la España musulmana. Editorial MAXTOR, 2005.
Disponível em <http://books.google.com.br>. Acesso em: 15 de maio de 2014.
DOMINGUES, Beatriz Helena. O medieval e o moderno no mundo ibérico e ibero-americano.
Revista Estudos Históricos, v. 10, n. 20, p. 195-216, 1997.
COSTA, Ricardo da. Amor e Crime, Castigo e Redenção na Glória da Cruzada de
Reconquista: Afonso VIII de Castela nas Batalhas de Alarcos (1195) e Las Navas de Tolosa
(1212). Guerras e Imigrações. Campo Grande: Editora da UFMS, p. 73-94, 2004.
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