0 CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO JOSÉ DE ITAPERUNA CURSO DE PSICOLOGIA MÔNICA ALVIM MARQUES RESILIÊNCIA NA SITUAÇÃO DE DOENÇAS CRÔNICAS Itaperuna/RJ Dezembro/2012 1 MÔNICA ALVIM MARQUES RESILIÊNCIA NA SITUAÇÃO DE DOENÇAS CRÔNICAS Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para obtenção do título de Psicólogo. Orientador: Boechat. Itaperuna – RJ Dezembro/2012 Profa Esp. Ieda Tinoco 2 MÔNICA ALVIM MARQUES RESILIÊNCIA NA SITUAÇÃO DE DOENÇAS CRÔNICAS Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para obtenção do título de Psicólogo. Orientador: Boechat. Itaperuna, 05 de dezembro de 2012. Banca Examinadora: ___________________________________ Profa. Esp. Ieda Tinoco Boechat (Orientador) UNIFSJ – Itaperuna ___________________________________ Profa. Esp.Fátima Aguiar Faria Ximenes (Examinador 1) UNIFSJ – Itaperuna ___________________________________ Prof. Ignael Muniz Rosa (Examinador 2) UNIFSJ – Itaperuna Profa Esp. Ieda Tinoco 3 RESILIÊNCIA NA SITUAÇÃO DE DOENÇAS CRÔNICAS Mônica Alvim Marques*1 Ieda Tinoco Boechat Resumo: Resiliência é a capacidade de superação e adaptação diante das adversidades. No mundo atual, as pessoas constantemente são confrontadas com muitas adversidades, as quais podem alterar sua trajetória de vida. O presente trabalho visa, portanto, a abordar a resiliência, e pretende enfocá-la em situação de doenças crônicas, descrevendo-a sob o prisma teórico através da revisão de literatura. Há fatores que podem favorecer a superação de dificuldades ao se conviver com uma doença crônica, ou seja, a resiliência frente às adversidades com as quais os seres humanos se deparam ao longo de sua existência, propicia condições de ressignificar tais experiências de vida. A ampliação do entendimento sobre a resiliência diante da doença crônica assim se apresenta como um dos possíveis e promissores caminhos para a atuação dos profissionais de saúde, dando ênfase às potencialidades do indivíduo. Palavras-chave: Adaptação. Superação. Enfermidades crônicas. Introdução No mundo atual, as pessoas constantemente são confrontadas com muitas adversidades, as quais, muitas vezes abatem, fragilizam, trazem medo, desânimo, tristeza, adoecimento, que podem atrapalhar sua trajetória de vida, quando se permitem serem abaladas a tal ponto por estas situações, que se entregam, não conseguindo superar ou se adaptar de forma que possam continuar sua caminhada de maneira saudável, mesmo que algo de ruim lhes tenha acontecido. O presente trabalho visa, portanto, abordar a resiliência, que é a capacidade de superação e adaptação diante das adversidades, e pretende enfocar a resiliência diante de uma situação de doença crônica. O interesse pelo tema deu-se a partir do Estágio Básico Supervisionado em Psicologia Clínica, nos Setores de Hemodiálise e Oncologia do Hospital São José do Avaí, em Itaperuna/RJ, ao se observar como alguns pacientes, em tratamento exigido por suas enfermidades, posicionam-se diante de procedimentos médicos tão desgastantes a que estão submetidos, que lhes trazem outras tantas situações 1 *Graduanda do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna Psicóloga, Terapeuta de Família, Psicopedagoga, Professora do Curso de Psicologia do UNIFSJ e Professor-orientador do CEJA-Itaperuna 4 igualmente desgastantes. Descobrem ali que têm uma doença que os acompanhará a vida inteira e precisarão aprender a conviver com ela e com todas as modificações que essa nova situação abarca. Este trabalho tem como objetivo descrever a resiliência sob o prisma teórico, trazendo a seguinte questão-problema: que fatores podem favorecer a superação das dificuldades enfrentadas por pessoas que convivem com uma doença crônica? Pretende, ainda, estudar o que significa a presença ativa ou não da resiliência na vida das pessoas; como a resiliência pode contribuir para que, frente às adversidades com as quais os seres humanos se deparam ao longo de sua existência, encontrem-se em condições de ressignificar experiências de vida; e avaliar os fatores que influenciam o bom desenvolvimento da resiliência. O método usado neste trabalho é o de pesquisa bibliográfica, baseada na obra de autores como Silva, Elsen e Lacharité (2003), e Frankl (2008). A ampliação do entendimento sobre a resiliência diante de situação de doença crônica, assim se apresenta como um dos possíveis e promissores caminhos para a atuação dos profissionais de saúde, dando ênfase às potencialidades do indivíduo. 1 Sobre a resiliência: origem do termo e contribuição de alguns autores O termo resiliência provém da Física e refere-se à capacidade de os materiais resistirem aos choques e pressões sem alterar suas qualidades. O Dicionário de Língua Portuguesa Novo Aurélio, diz que “na Física, resiliência é a propriedade pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora duma deformação elástica”. (YUNES, 2003, p. 76). Segundo Pinheiro (2004, p. 68), o vocábulo que provém “do latim resiliens, significa saltar para trás, voltar, ser impelido, recuar, encolher-se, romper. Pela origem inglesa, resilient remete à ideia de elasticidade e capacidade rápida de recuperação”. O conceito de resiliência foi incorporado recentemente pelas ciências humanas e expressa a capacidade de um ser humano superar traumas e adversidades, assim como de adaptar-se a tais fatores. Nos domínios das Ciências Humanas e da Saúde, o conceito de resiliência faz referência à capacidade do ser humano em responder 5 de forma positiva às situações adversas que enfrenta, mesmo quando essas comportam risco potencial para sua saúde e/ou seu desenvolvimento. Esta capacidade é considerada por alguns autores como uma competência individual que se constrói a partir das interações entre o sujeito, a família e o ambiente e, para outros, como uma competência não apenas do sujeito, mas, também, de algumas famílias e de certas coletividades. (SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 147, 148). Para se entender melhor a conceituação de resiliência, importa considerar o que propõem alguns estudiosos do assunto. Por ser a resiliência um conceito que se traduz num fenômeno complexo, onde muitos contextos interdependentes compõem a realidade com a qual a pessoa convive, fenômeno esse que tem despertado olhares diversos, Silva; Elsen; Lacharité (2003) apresentam importantes contribuições a respeito do tema em estudo, ao descreverem-no a partir do que concebem Rutter; Masten e Coatsworth; Luthar, Cicchetti e Becker; Zimmerman e Arunkumar; Garmezy; Cyrulnik. Michel Rutter traz duas interessantes concepções de resiliência: 1)“relativa ‘resistência’ manifestada por algumas pessoas diante de situações consideradas potencialmente de risco psicossocial para seu funcionamento e desenvolvimento” (RUTTER, 1999 apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149); 2)“resultante da interação entre fatores genéticos e ambientais, os quais, também, oscilam em sua função, podendo atuar como proteção em certos momentos e, em outros, como fator de risco” (RUTTER, 1987 apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149). A relatividade expressa na primeira consideração é exatamente, segundo o autor, o que não permite que a resiliência seja uma constante em todas as circunstâncias, devendo-se observar a etapa do ciclo vital das pessoas no momento em que experienciam a situação de adversidade e a abrangência da pesquisa, não podendo ser considerada um constructo universal. A segunda concepção lança luzes sobre as interações, seu contexto e momento histórico. (SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149) Rutter (1987 apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149) afirma que a resiliência implica habilidade para lidar com mudanças, confiança na auto-eficácia e estratégias no enfrentamento de problemas. Masten; Coatsworth (1995); Luthar; Cicchetti; Becker (2000) (apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149) consideram que a resiliência se refere à 6 obtenção de resultados desenvolvimentais esperados, apesar da presença de desafios significativos para o desenvolvimento e a adaptação do sujeito. Estes autores destacam duas condições críticas associadas ao conceito: A primeira refere-se à exposição da pessoa a uma ameaça significativa ou a uma severa adversidade; na segunda há concretização de uma adaptação efetiva, apesar da ‘agressão’ em potencial que repercute no desenvolvimento do sujeito. Para Zimmerman; Arunkumar (1994) (apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149), a resiliência diz respeito “aos fatores e ao processo que interrompem uma trajetória de risco para transtornos de comportamento ou psicopatologias, resultando em respostas positivas mesmo na presença de adversidade”. Aplicando tal ideia à Psicologia, referem-se à capacidade de a pessoa conseguir não reeditar, quando adulta, os conflitos familiares experimentados na infância. E acrescentam: uma criança filha de genitor(es) alcoolista(s) não necessariamente se tornará alcoolista, mesmo sendo essa uma doença suscetível à predisposição hereditária, como registram diversos autores. Garmezy (1993) (apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149) atribui ao conceito de resiliência uma dimensão que se aplica mais ao estudo de populações que construíram um padrão de comportamento ao longo da vida. Concebe, então a resiliência como a capacidade de recuperar o padrão de funcionamento após experienciar uma situação adversa, sem que, no entanto, deixe de ser atingido por ela. Esta concepção está associada à ideia de que a pessoa resiliente, vivendo sob uma situação de ameaça ao seu bemestar, pode se curvar, perder suas forças e ainda se recuperar. A ênfase nesta capacidade do sujeito para retomar os padrões de comportamento habituais que possuía antes de vivenciar a adversidade pressupõe que ela funcionava relativamente bem ao se deparar com a situação negativa e somente a partir deste momento passa a ter dificuldades, mas que algo se produz, levando-a a recuperar sua forma. (GARMEZY apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149). Resiliência também pode ser entendida como “um conjunto de fenômenos articulados entre si, que se desenrolam, ao longo da vida, em contexto afetivo, social e cultural, podendo ser metaforicamente comparado à arte de navegar em meio à tempestade” (CYRULNIK apud SILVA; ELSEN; LACHARITÉ, 2003, p. 149, 150). Tal concepção considera a resiliência uma história construída pela pessoa desde que 7 ela nasce, num processo que acontece em um determinado contexto e se reconstrói coletivamente. Então, mesmo vivendo situações que possam oferecer risco e sofrimento, a pessoa consegue ir em frente. Dessa forma, resiliente é o caminho que se faz enquanto se caminha. Em todos os conceitos abordados, vê-se a tônica recair sobre a capacidade que o humano tem de reagir satisfatoriamente a situações adversas, capacidade essa exigida a pessoas que experimentam a situação de doença crônica. 2 Doenças Crônicas A pessoa que tem uma doença crônica geralmente vivencia uma mudança em diversos aspectos de sua vida, experimentando novos sentimentos e emoções, complicações na saúde física, mudanças comportamentais, restrições sociais. Por vezes, tem ainda de lidar com dificuldades econômicas e relacionais no âmbito familiar, incapacidade para o trabalho, dependência de outras pessoas, sofrendo, assim, uma modificação na sua forma de viver. Para a Organização Mundial de Saúde, a definição de doença crônica deve atender a uma ou mais das características: (i) é permanente e deixa incapacidade, mesmo que residual; (ii) é causada por alterações patológicas irreversíveis; (iii) requer um treino específico do doente para a reabilitação ou pode vir a necessitar de um longo período de supervisão, observação e cuidados. (ALMEIDA, 2007, p. 24). Segundo Ribeiro (apud ALMEIDA, 2007, p. 24), as enfermidades que se prolongam pela vida do paciente incapacitam porque têm causas irreversíveis e requerem “formas particulares de reeducação, que obrigam o doente a seguir determinadas prescrições terapêuticas e/ou a aprendizagem de um novo estilo de vida, necessitam de controle periódico, observação e tratamento regulares”. A Doença Renal Crônica (DRC), também conhecida por Insuficiência Renal Crônica (IRC), mostra-se como uma patologia que compromete a função renal e consiste em lesão renal e perda progressiva e irreversível da função dos rins (glomerular, tubular e endócrina).Em sua fase mais avançada (chamada de fase terminal de insuficiência renal crônica- 8 IRC), os rins não conseguem mais manter a normalidade do meio interno do paciente. (JUNIOR, 2004, p. 1). Segundo Castro et al. (apud NEPOMUCENO, 2011, p. 15), o portador de IRC convive com uma doença permanente, sofre alterações patológicas irreversíveis, que geram muitas incapacidades e requerem períodos longos de acompanhamento, e passa por alterações nos níveis orgânico, psíquico, social e econômico. Outra doença crônica experimentada por muitas pessoas é o câncer. Pimentel; Lima; Fonseca (2009, p. 17), declaram que, segundo o Instituto Nacional do Câncer “o câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado (maligno) de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo” O câncer é uma doença que, quando ocorre na vida de alguém, tem como característica, ser irreversível em muitos casos, o que possibilita que esta seja classificada como doença crônica. Porém, há casos em que ocorre um bom prognóstico e a pessoa fica completamente curada. No entanto, ainda que isso ocorra, é preciso que se faça um acompanhamento posterior, incluindo supervisão, observação e cuidados, o que também é característica pertinente à doença crônica. O câncer apresenta-se, por diversos fatores, como uma doença assustadora não só para o doente, mas também para sua família. O câncer é uma das doenças mais temidas pelo ser humano, pois existe sempre a incerteza da cura, a ideia de muitas hospitalizações, da sintomatologia pós-quimioterapia, da dor física e emocional e até mesmo da morte. Vivenciar a doença do câncer certamente é uma fonte de estresse intenso para a família e para o paciente. (IAMIN, 2011, p. 44). Uma outra situação de doença crônica a ser mencionada, seria a AIDS. De acordo com Silva; Goveia (2004, p. 1), “a síndrome da imunodeficiência humana (AIDS) é uma manifestação clínica avançada da doença causada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV-1 e HIV-2) que são membros da família Retroviridae, na subfamília dos lentivírus”. Quem possui esta doença passa por alterações em diversos aspectos de sua vida, precisando se adaptar não só à doença, como também, conviver com o preconceito e as demais situações a que são submetidos. 9 [...] Ser portador do HIV envolve o impacto da doença e do diagnóstico na qualidade de vida; aumento do estresse pelo preconceito e medo da discriminação e pelo potencial efeito da doença que pode culminar em depressão, transtorno de ajustamento e outras patologias decorrentes dos fatores de estresse. (PONTRELLI apud SILVA; GOVEIA, 2004, p. 6). “Viver com AIDS requer extraordinária adaptação e reajustamento, muitas vezes num contexto de múltiplas perdas sociais e pessoais. Sobreviver com AIDS representa conviver com situações às quais foram expostos.” (SILVA; GOVEIA, 2004, p. 6). Com os avanços no diagnóstico e tratamento desta doença, diminuiu-se o medo da morte iminente, mas aumentou a necessidade de reestruturar a vida e aprender a lidar com o fato de ter o vírus presente no organismo e a seguir o tratamento com o rigor que requer. As pessoas que ficam sabendo estar com HIV/AIDS deparam-se ainda com o diagnóstico de uma doença sem cura, mas com boas perspectivas de tratamento devido à oferta de medicamentos que favorecem uma maior sobrevida e uma melhor qualidade de vida. (NASCIMENTO, 2002, p. 4). São consideradas também doenças crônicas: diabetes, asma, artrite reumatoide, epilepsia, cancro, doenças cerebrovasculares, entre outros. A doença crônica traz alterações não só para a vida do paciente, como também para a vida de seus familiares, tendo estes que se adaptarem também à nova situação. A família exerce papel de grande importância no tratamento destes pacientes, visto que pode e deve contribuir e participar ativamente ou ao menos de forma indireta. É comum sempre ter alguém que acompanhe de forma mais próxima, estando sujeito a ser também afetado emocionalmente ao acompanhar essa situação desgastante. Familiares e profissionais da saúde têm importante papel a desempenharem. Eles têm o poder de auxiliar os enfermos, especialmente, os acometidos por doença crônica, a usarem toda sua potencialidade a seu favor, pois acreditarem em “suas capacidades, aceitá-las e confirmá-las positiva e incondicionalmente é, em boa medida, a maneira de as tornar mais confiantes e resilientes para enfrentar a vida do dia-a-dia por mais adversa e difícil que se apresente” (TAVARES apud PINHEIRO, 2004, p. 69). 10 A doença crônica, por si só, coloca a pessoa em uma situação desconfortável, e a forma como a pessoa se adequa a esta situação, vai proporcionar a ela uma condição de vida melhor ou não. Se ela conseguir se adaptar de forma a conviver da melhor forma possível com a condição que lhe confere a doença crônica, aderindo ao tratamento necessário, há de conseguir viver melhor, mesmo em meio a uma situação tão difícil. Porém, se ela não consegue se adaptar, a possibilidade é de que ela tenha experiências muito mais complicadas, visto que terá de enfrentar procedimentos invasivos, dolorosos e alheios à sua vontade. Por isso, a importância de ser resiliente ou de tentar desenvolver a resiliência quando ela ainda não se faz presente. 3 Fatores que influenciam o bom desenvolvimento da resiliência É possível encontrar sentido na vida mesmo diante de uma situação sem esperança, quando se tem de enfrentar uma fatalidade implacável, diz Frankl (2008, p. 136), já que o que realmente importa, então, é dar testemunho do potencial especificamente humano no que ele tem de mais elevado e que consiste em transformar uma tragédia pessoal em um triunfo, em converter nosso sofrimento numa conquista humana. Quando já não somos capazes de mudar uma situação – podemos pensar numa doença incurável, como o câncer que não se pode mais operar -, somos desafiados a mudar a nós próprios. (FRANKL, 2008, p. 136, 137). O que pode modificar uma situação adversa é a busca de sentido na vida. Com este posicionamento, a pessoa quando não tem condições de transformar uma situação, se permite ser transformada por ela, de forma que possa dela tirar algo que lhe seja útil para um viver mais pleno. Diz Erthal (2010, p. 61) que “é a liberdade frente ao mundo, considerda a característica da pessoa psicologicamete ‘sã’ “. As adversidades podem trazer uma certa desorganização à vida das pessoas que se deparam com tais situações, de modo que, a resiliência se apresenta como fator de grande importância para o alcance de uma boa saúde psíquica. A cada situação vivida, a pessoa resiliente tem condições de se recuperar e se adaptar, sendo que quanto maior for sua capacidade em ser resiliente, terá mais 11 facilidade de controlar as situações, alcançando um maior desenvolvimento pessoal, o que lhe terá benefícios ao seu viver diário. Quando se é uma pessoa resiliente, há que se ter uma capacidade maior em enfrentar os percalços da vida, em meio aos quais se encontra todo aquele que vive, seja diariamente, seja ocasionalmente, situações adversas que dificultam a caminhada. Aos que não possuem essa capacidade e não mostram interesse em desenvolvê-la, pouco se pode sugerir, mas aquelas que buscam ser resilientes, podem se valer das orientações fornecidas por Karen Reivich e Andrew Chatté (apud BARBOSA, 2006, p. 21, 22, grifo dos autores), ao sugerirem “que a resiliência é composta por sete fatores centrais: Administração das Emoções, Controle dos Impulsos, Empatia, Otimismo, Análise Causal, Auto-eficácia e Alcance de Pessoas”. Tal proposta tem suas bases na abordagem Cognitiva e pode ser entendida pelos autores supracitados pela forma como se segue. Administrar as emoções implica manter-se sereno diante de uma situação de estresse. As pessoas resilientes são capazes promover a autorregulação; quando essa habilidade é rudimentar, as pessoas encontram dificuldades em cultivar vínculos e, com frequência, desgastam no âmbito emocional aqueles com quem convivem em família ou no trabalho. O controle de impulsos implica regular a intensidade da ação impulsiva numa experiência de forte emoção. Regulação da intensidade das emoções e a administração destas se conectam, pois ambas se estruturam a partir de sistemas de crenças semelhantes. O otimismo refere-se à crença de que as coisas podem mudar para melhor. Há um investimento contínuo de esperança e, por isso mesmo, a convicção da capacidade de administrar intempéries, mesmo quando o poder de decisão pareça estar fora de alcance. A análise causal trata da capacidade de identificar precisamente as causas dos problemas e das adversidades presentes no ambiente. A empatia significa a capacidade que o ser humano tem de compreender os estados psicológicos dos outros e agir em função disso. Auto-eficácia se refere à certeza de ser diligente nas ações propostas. Alcançar pessoas é a capacidade que a pessoa tem de se vincular a outras para juntas encontrarem saídas para os percalços da vida, sem receios e medo do fracasso. 12 Os fatores acima mencionados e assim entendidos por Karen Reivich e Andrew Chatté (apud BARBOSA, 2006, p. 21, 22) podem influenciar positivamente e favorecer o desenvolvimento da resiliência. Todos estes fatores estão de uma certa forma interligados: uma vez um fator alcançado, favorece o desenvolvimento do outro que acabam por se complementarem mutuamente. A pessoa que consegue controlar suas emoções, possui um fator facilitador do desenvolvimento da resiliência, porque quem possui essa característica, consegue promover um ajustamento à situação que se impõe, utilizando-se de uma flexibilidade que lhe possibilita uma adaptação à nova experiência. Se a pessoa consegue agir de forma a não se permitir atos irrefletidos, controlando seus impulsos, mais chances terá de experimentar atitudes favoráveis. A atitude positiva baseada na crença de que se é capaz de enfrentar adversidades possibilita, por sua vez, um maior controle das emoções e dos impulsos. A coragem e a determinação que daí surgirão capacitam a pessoa a identificar as causas dos problemas e agir adequadamente diante do que se apresenta. Isso inclui ter a capacidade de alcançar as pessoas, ter habilidade e humildade para acessar o outro e ter com quem somar e dividir fraquezas e vitórias. Nessas relações interpessoais, a empatia vai propiciar aproximação e uma compreensão tal que favorecerão a ressignificação da situação adversa. Um dos conceitos desenvolvidos por Frankl (2008), em sua logoterapia, é o conceito de "otimismo trágico", pelo qual afirma que é possível manter o otimismo apesar da “tríade trágica” (dor, culpa e morte), assim definido como um otimismo diante da tragédia e tendo em vista o potencial humano que, nos seus melhores aspectos, sempre permite: 1.transformar o sofrimento numa conquista e numa realização humana; 2.extrair da culpa a oportunidade de mudar a si mesmo para melhor; 3.fazer da transitoriedade da vida um incentivo para realizar ações responsáveis. (FRANKL, 2008, p. 161). Um posicionamento otimista mediante os percalços da vida, diante de qualquer situação que seja, é um fator que contribui para que se perceba através das questões que se apresentam na vida, condições para, então, ressignificar suas experiências de vida. Quando a pessoa consegue desfrutar de uma atitude resiliente diante da vida, constrói a possibilidade de obter um melhor estado de saúde física e psíquica, e de 13 bem estar social e famliar. Todos estes aspectos estão inter-relacionados, influenciando uns aos outros direta ou indiretamente, proporcionando uma melhor qualidade de vida, se alcançada a resiliência. Segundo Troster (2011, p. 36), muitas são as evidências da relação existente entre a saúde emocional e a baixa morbidade e mortalidade causadas por doenças clínicas, o que é enfatizado pelo comportamento saudável e o aumento da resistência ao estresse. Estudos recentes salientam a importância da resiliência na sobrevida e na qualidade de vida em pacientes com AIDS, acima de 50 anos, com testagem genética para câncer colorretal hereditário, doenças relacionadas à idade, dor crônica, diabetes, doenças cardiovasculares, diálise em doença renal crônica, entre outras condições. (TROSTER, 2011, p. 36). Um outro fator que se insere como uma possibilidade de desenvolvimento da capacidade de resiliência, é a fé, segundo a qual, aqueles que a possuem, acreditam que Deus lhes dá forças para superar quaisquer coisas que lhes sobrevenham e assim procuram se adaptar às situações, de forma que possam transcender ao que lhe acontecer de ruim, com esperança, mesmo em meio às adversidades. Em um estudo realizado por Calvetti e colaboradores, em 2008, com pacientes que apresentavam o vírus da AIDS, os pesquisadores descobriram que o bem estar espiritual pode ser destacado como uma das variáveis presentes na capacidade de resiliência e na promoção de saúde. (BRAGA, 2011, p. 50). A doença crônica, não definirá a postura de uma pessoa diante da vida. Se ela for resiliente, com certeza passará por essa experiência levando consigo algumas marcas, mas não deixará de viver outras possibilidades que a vida proporcionará porque sofreu algo que as desestruturou em algum momento da vida. Como ressalta Frankl (2008, p. 102, 103), quando um homem descobre que seu destino lhe reservou um sofrimento, tem que ver nesse sofrimento também uma tarefa sua, única e original. Mesmo diante do sofrimento, a pessoa precisa conquistar a consciência de que ela é única e exclusiva em todo o cosmo dentro deste destino sofrido. Ninguém pode assumir dela o destino, e ninguém pode substituir a pessoa no sofrimento. Mas na 14 maneira como ela própria suporta esse sofrimento está também a possibilidade de uma realização única e singular. Em meio a esse contexto, nota-se a necessidade de se fazer uso da liberdade que todos os seres humanos possuem, pois como diz Frankl (2008, p. 90), pela maneira com que uma pessoa assume seu destino inevitável, assumindo com esse destino todo o sofrimento que se lhe impõe, revela-se, mesmo nas mais difíceis situações, mesmo no último minuto de sua vida, uma abundância de possibildades de dar sentido à existência. O que vai ser referencial de uso da liberdade, no entanto, é a forma como a pessoa se utilizará de suas possibilidades diante de sua liberdade de escolha. 4 Conclusão A resiliência tem sido utilizada há pouco tempo pelas ciências sociais e humanas. Ainda são poucas pessoas do círculo acadêmico que a utilizam, pois não sabem o que significa e como se aplica. A resiliência mostra-se como um fator de grande importância na vida do ser humano no mundo atual, em que se é constantemente confrontado por tantas adversidades, tornando-se necessário esclarecer para os profissionais e a todos a quantos interessar o que isto significa, quais as implicações na vida da pessoa, e como se pode desenvolver esta habilidade buscando obter, desta forma, uma vida psíquica saudável e uma saúde física também melhor. As pessoas que são acometidas por doença crônica sofrem o primeiro impacto, mas não precisam permanecer estagnadas diante de tal realidade. Elas têm a capacidade em serem resilientes, e podem continuar uma vida de qualidade apropriando-se de si, administrando suas emoções, controlando seus impulsos, desenvolvendo empatia, sendo otimistas, analisando as causas, buscando a autoeficácia, mantendo e criando novos vínculos, e tendo sempre como base o sentido na vida. No que diz respeito ao paciente portador de doença crônica, como a DRC ou a AIDS e o câncer, a resiliência se apresenta como tema de significativa relevância, 15 visto que estas pessoas passam por muitas alterações no seu estado físico, emocional, social, econômico, familiar etc, e como seres humanos que são, têm como faculdade a capacidade de dar um novo significado às suas vivências. Nesse contexto, o profissional de saúde e os familiares podem e devem contribuir dando ênfase à resiliência, não ressaltando apenas os aspectos físicos da doença e procurando fazer com que se considerem as potencialidades e possibilidades que o paciente dispõe, buscando contribuir para que ele se perceba como também responsável por sua existência e capaz de escolher com liberdade como serão seus dias futuros. A contribuição do profissional de saúde para com os acometidos por algum tipo de doença crônica é de suma importância, visto que estes profissionais possuem um contato direto com os pacientes e são eles que podem levar a efeito, no ambiente hospitalar, uma relação interpessoal que estimule a resiliência, através da sua abordagem no cuidado com seus pacientes. Referências ALMEIDA, Assunção das Dores Laranjeira de. Impacto da Intervenção Psicoeducativa: O Acidente Vascular Cerebral e Cancro. Universidade de Aveiro. Secção Autónoma de Ciências da Saúde. 2007. 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