EFEITOS DO TREINAMENTO FÍSICO E MUSCULAR

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Rev. bras. fisioter. Vol. 7, No. 1 (2003), 69-76
©Associação Brasileira de Fisioterapia
EFEITOS DO TREINAMENTO FÍSICO E MUSCULAR RESPIRATÓRIO EM
PACIENTES COM DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA (DPOC)
GRAVE SUBMETIDOS A BiPAP
Pires Di Lorenzo, V. A., 1 Silva, A. B., 2 Sampaio, L. M. M., 3 Jamarni, M.,4 Oishi, J. 5 e Costa, D. 6
1
Doutora em Fisiologia pela Universidade Federal de São Carlos, UFSCar
2
Mestre em Fisioterapia pela UFSCar
3
Mestre em Fisiologia pela Universidade Federal de São Carlos, UFSCar
4
Professor do Departamento de Fisioterapia, doutorando em Fisiologia pela Universidade Federal de São Carlos, UFSCar
5
Professor doutor do Departamento de Estatística, UFSCar
6Professor
doutor do Departamento de Fisioterapia, UFSCar
Correspondência para: Valéria Amorim Pires Di Lorenzo, Rua Paulino Botelho de Abreu Sampaio, 385, Apto 21,
Parque Santa Mônica, CEP 13561-060, São Carlos, SP, e-mail: [email protected]
Recebido: 711112001- Aceito: 30/10/2002
RESUMO
O objetivo deste estudo foi verificar a influência do treinamento físico (TF) e do muscular respiratório (TMR), associados à ventilação
não invasiva (VNI) pela "bilevel positive airway pressure" (BiPAP), sobre a pressão inspiratória e expiratória máxima (Pimax e PEmáx),
distância percorrida (DP) e escala de Borg (EB) no teste de caminhada de 6 minutos (TC6min) e no de esforço (TE) da avaliação
para reavaliação. Participaram 24 pacientes com DPOC grave (VEF 1 < 40%), estáveis clinicamente, com dispnéia ao esforço físico,
randomizados em 4 grupos de 6 pacientes: G1, realizando TF e TMR associados ao BiPAP; G2, realizando TF associado ao BiPAP;
G3, realizando TMR e BiPAP; e G4, realizando somente BiPAP por 30 minutos, com nível pressórico fixado na inspiração em 12
cmH2 0 e expiração em 4 cmHp. Foram realizadas sessões de 1 hora, 3 vezes por semana, com duração total de 6 semanas. O TF
na esteira teve duração de 30 minutos com intensidade de 80% da FC máxima obtida no TE. Utilizou-se para o TMR carga de 40%
da Plmáx. Constatou-se aumento significativo (teste t p :5: 0,05) da Plmáx e PEmáx para os grupos G 1 e G3 e da DP no TC6min para
os grupos G 1 e G2, com diminuição significativa da EB para os pacientes do G4. Em relação ao TE, observou-se aumento significativo
da DP para os grupos G1, G2 e G3. Embora não tenham sido constatadas alterações significativas da EB e da DP em todos os grupos,
observou-se maior tolerância ao exercício físico e força muscular respiratória quando as técnicas foram utilizadas em conjunto. Com
base nesses resultados, conclui-se que o TF e o TMR associados ao BiPAP tiveram importante influência nas variáveis estudadas.
Palavras-chave: treinamento físico, treinamento muscular respiratório, BiPAP, ventilação não invasiva, força muscular respiratória,
escala de dispnéia.
ABSTRACT
The aim of this study was to verify the influence of physical and respiratory muscular training (PT/RMT), associated to the use of
noninvasive mechanical ventilation (NMV) through the bilevel positive airway pressure (BiPAP), on maximal inspiratory and expiratory pressure (MIP and MEP), walk distance (WD) and borg scale (BS) during the 6-minute walk distance (6 MWD) and test of
effort (TE) to evaluate all the treatrnent. 24 patients with severe COPD (FEV 1 < 40%) were included, clinically stable and with dyspnea
to physical effort. They were randomized in 4 groups of 6 patients, named: G1, accomplishing PT and RMT associated to BiPAP;
G2 accomplishing PT associated to BiPAP; G3, accomplishing RMT and BiPAP and G4, accomplishing BiPAP only for 30 minutes,
in a medium pressure levei set in 12 cmH 2 0 to inspiration and 4 cmH 2 0 to expiration. The treatment occurred in one-hour duration
sessions, three times a week, with duration of 6 consecutive weeks. The TF took place on treadmill for 30 minutes with intensity
of 80% of the maximal heart rate (HR) obtained during the TE. The RMT was accomplished with load of 40% of the MIP. A significant increase (test t p :5: 0.05) of the MIP and MEP was verified for the groups G1 and G3, and for G1 and G2 there was a WD
increase in the 6MWD, with a BS decrease for the group 4. In relation to TE, a significant WD increase for the groups G 1, G2, G3
70
Pires Di Lorenzo, V. A. et al.
Rev. bras. fisioter.
was noticed. Although significant BS and WD alterations in all the groups have not been observed, a biggest tolerance to physical
exercise and respiratory muscular force were noticed when techniques were used all together.
Key words: physical training, respiratory muscular, BiPAP, noninvasive ventilation, respiratory muscular force, respiratory muscles,
borg scale, 6-minute walk distance.
INTRODUÇÃO
O treinamento físico (TF) e o treinamento muscular
respiratório (TMR) têm interferência positiva e reabilitadora
nas limitações dos pneumopatas, com ação significativa no
controle das condições de estabilidade do paciente, podendo
modificar suas atividades de vida diária, diminuindo suas
restrições físicas. 1• 2
Os mecanismos fisiológicos de intolerância ao exercício
físico na DPOC podem ser resumidos em resistência
aumentada das vias aéreas, ventilação ineficiente, hiperinsuflação, anormalidades das trocas gasosas e desvantagens
mecânicas dos músculos respiratórios, o que contribui para
limitação ventilatória durante o esforço no exercício. 1 A
descompensação das doenças pulmonares obstrutivas expressase clinicamente de diferentes formas e em diversos graus
de gravidade.
Muitos portadores de DPOC grave apresentam intolerância aos exercícios com piora do quadro respiratório,
atingindo completa incapacidade para tarefas que exigem
esforços mínimos. 2 Alguns estudos mencionam que a maior
dificuldade na utilização do recondicionamento aeróbico
em pacientes portadores de DPOC grave é a impossibilidade
de alcançar um nível adequado de intensidade de exercício
em razão da limitação ventilatória manifestada pelo sintoma
de dispnéia. 2 • 3• 4
Há estreita relação entre a faixa de trabalho que a DPOC
consegue executar e o índice de dispnéia, que corresponde
à ventilação-minuto e à ventilação voluntária máxima. Desta
forma, para uma mesma carga de trabalho os portadores de
DPOC, durante a atividade física, atingem níveis de ventilação
tão altos que se aproximam ou até excedem a capacidade
ventilatória máxima, e com isso acabam por desenvolver fadiga
dos músculos respiratórios e grande sensação de dispnéia.
A sensação de dispnéia em pacientes DPOC grave é
freqüentemente observada pelo aumento do trabalho respiratório, conseqüência do aumento da hiperinsuflação
pulmonar e dos efeitos deletérios da pressão expiratória final
positiva intrínseca (PEEPi). 5 • 6 • 7 Os pacientes com DPOC
apresentam tipicamente gasto metabólico maior ao exercício
físico e redução da carga máxima de trabalho e do consumo
de oxigênio, comparados a indivíduos sadios da mesma faixa
etária. 1
Segundo Pardy et al., 8 vários pesquisadores afirmaram
que o desempenho no exercício em pacientes com obstrução
crônica das vias aéreas não está limitado somente pelo
trabalho anormal dos músculos respiratórios, mas também
pela troca gasosa deficiente, pelo mecanismo pulmonar
anormal, pela hipertensão pulmonar e pela fraqueza dos
membros superiores e inferiores.
Vários estudos verificaram que a desvantagem mecânica
do diafragma, pela hiperinsuflação, leva ao encurtamento
dos sarcômeros e à diminuição da força muscular respiratória
(FMR). A hiperinsuflação reduz a zona de aposição, diminuindo a ação do diafragma sobre as costelas na última fase
da inspiração. Nessa condição, o recrutamento de músculos
acessórios, juntamente com a ação do diafragma para vencer
a pressão positiva expiratória final intrínseca (PEEPi),
aumenta o consumo de oxigênio, evoluindo com maior gasto
de energia. 9 • 10
O treinamento físico é considerado componente
fundamental do programa de reabilitação pulmonar para
pacientes com DPOC, pois a doença pulmonar crônica
freqüentemente resulta em declínio da capacidade de
exercício em razão do ciclo da inatividade física e
descondicionamento. 2 Vários trabalhos têm mostrado que
o treinamento físico por 6 semanas aumenta a capacidade
funcional de exercício e melhora a qualidade de vida. 2
O treinamento físico, em geral, tem por objetivo
melhorar a eficiência e a capacidade do sistema de captação,
transporte e metabolização dos gases respiratórios, ocorrendo
aumento significativo do consumo máximo de oxigênio. 8
Vários autores constataram que o suporte ventilatório
não invasivo, associado ao treinamento físico submáximo
na esteira, pode reduzir a dispnéia e aumentar a tolerância
ao exercício em pacientes com DPOC grave. 11 • 12• 6• 10 A
ventilação não invasiva (VNI) por bilevel positive airway
pressure (BiPAP) consiste na manutenção de dois níveis de
pressão por meio de máscara nasal: uma pressão inspiratória
positiva constante (IPAP - inspiratory pressure airway
positive), que auxiliaria a ventilação do paciente, e uma
pressão expiratória positiva constante (EPAP- expiratory
pressure airway positive).
O suporte ventilatório não invasivo, na doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC), pode ser utilizado durante a fase
de agudização da doença, na qual ocorre hipoxemia grave,
de difícil correção pela administração de oxigênio, e nos
casos de hipoventilação alveolar com acidemia. 13 • 14• 10• 7 Essa
forma de ventilação artificial pode reduzir a dispnéia,
melhorar a mecânica ventilatória e reduzir complicações
e internações. Schonhofer et al. 10 constataram que o
tratamento por 3 meses, utilizando a VNI por pressão
positiva, aumentou o desempenho muscular respiratório e
periférico em pacientes com falência respiratória crônica.
Vol. 7 No. 1, 2003
Treinamento Físico e Muscular Respiratório Associado a BiPAP
Em relação ao TMR, Nield 15 constatou em 4 pacientes
com DPOC grave que o treinamento muscular inspiratório
específico com "threshold", em sessões diárias com cargas
pressóricas maiores que 30% da pressão inspiratória máxima
(Pimáx), durante um periodo de 6 semanas, possibilitou tolerar
a carga de treinamento, aumentar sua força muscular inspiratória
e reduzir a dispnéia. Flynn et al. 16 demonstraram que o TMR
aumenta o desempenho muscular inspiratório, mas não altera
o desempenho no exercício ou o padrão respiratório durante
exercício máximo. A aplicação do TMR tem sido eficaz em
pacientes portadores de DPOC, pois estes apresentam capacidade
de sustentação respiratória reduzida, sendo que o TMR tem
o papel de contribuir na correção de tal deficiência. 17 • 4 • 3
O TMR em pacientes com obstrução crônica das vias
aéreas melhora a dispnéia, aumenta a capacidade de
caminhada durante o teste de caminhada de 6 minutos
(TC6min) e reduz o custo metabólico do exercício. 3• 4
A maioria dos pacientes portadores de DPOC acaba
evoluindo para internação hospitalar por descompensação
do quadro clínico, com piora da oxigenação. Assim, em
poucos trabalhos foi verificada a associação da reabilitação
pulmonar ambulatorial e do TMR à aplicação de BiPAP
em DPOC grave. Com base nisso, os objetivos deste estudo
foram verificar a influência do TF e do TMR, associados
à aplicação de VNI com BiPAP, sobre o desempenho da
FMR e sobre a distânCia percorrida e a escala de Borg no
TC6min e no TE.
MATERIAL E MÉTODOS
Casuística
Este estudo foi realizado no período de 12 meses, de
março de 2000 a abril de 2001, na Unidade Especial de
Fisioterapia Respiratória (UEFR) da UFSCar, onde foram
avaliados 30 pacientes, de ambos os sexos, com diagnóstico
de DPOC. Desses 30 pacientes, 24 foram selecionados
aleatoriamente para participar deste estudo. Como critério
de inclusão no estudo, consideraram-se aptos a participar
os pacientes que apresentaram diagnóstico de doença
pulmonar obstrutiva crônica grave estável, constatado por
meio de uma espirometria, que não apresentaram períodos
de agudização do quadro clínico, VEF 1 < 40% do previsto
e que apresentaram dispnéia ao esforço físico constatada
pela escala de Borg. Os pacientes que apresentavam
complicações resultantes de doenças cardiovasculares, história
de fraturas torácicas e de pneumotórax, cirurgias recentes,
limitações ortopédicas e claustrofobia foram excluídos. Este
estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade Federal de São Carlos. Somente receberam
o tratamento os pacientes que deram seu consentimento,
mediante as explicações dos objetivos do trabalho, em
atendimento à Resolução 196/96 do CNS.
71
Procedimento Experimental
Os pacientes portadores de DPOC, encaminhados à
UEFR da UFSCar, foram submetidos a avaliação física geral
e específica do sistema respiratório e receberam orientação
quanto aos procedimentos do tratamento convencional, bem
como do protocolo experimental proposto neste estudo. Todos
os pacientes foram submetidos a uma avaliação inicial e a
uma reavaliação após o período de tratamento, sendo
submetidos aos seguintes testes: espirometria simples e
eletrocardiograma de repouso e durante o teste de esforço
(TE). Para realização do TE foi utilizada uma esteira
Imbramed, com protocolo ilncremental elaborado para este
estudo, de inclinação constante em 3% e velocidade crescente,
com velocidade inicial de 2,0 kmlh, durante 2 minutos,
aumentando a velocidade de 0,5 kmlh a cada 2 minutos. Os
critérios de interrupção do teste foram sensação subjetiva
de cansaço, dispnéia e dores nos membros inferiores, relatadas
pelo paciente por intermédio da escala de percepção de
esforço de Borg, ou arritmias graves, aumentos significativos
da pressão arterial (PA) ou aumento acima da freqüência
cardíaca máxima (FCmax) prevista. Durante o TE, a PA foi
medida por meio de um esfigmomanômetro portátil e de um
estetoscópio, o monitoramento do traçado eletrocardiográfico,
com monitor e a freqüência cardíaca, por um freqüencímetro
(Polar). A saturação de oxigi!nio (Sat0 2) foi verificada durante
todo o teste por meio de um oxímetro portátil. O TC6min
foi realizado em um corredor plano, de 28 metros de
comprimento, onde os pacientes foram monitorizados com
o oxímetro portátil. As medidas de FMR (Pimáx e PEmáx)
foram realizadas por meio de um manovacuômetro Ger-Ar
escalonado em cmH 2 0.
Após esses testes e exames, os pacientes foram divididos de forma randomizada 1em 4 grupos: grupo 1 (G1): TF +
TMR + BiPAP; grupo 2 (G2): TF associado a BiPAP; grupo
3 (G3): TMR + BiPAP; e grupo 4 (G4): somente BiPAP.
Os exercícios de TMR foram realizados com o uso
do threshold IMT, com carga de 40% da Plmáx do dia para
os pacientes do G1 e do G3. O protocolo para o TMR foi
realizado em 5 séries de 15 repetições. O TF nos pacientes
dos grupos G 1 e G2 foi realizado na esteira rolante, durante
30 minutos, na velocidade determinada em 80% da FC
máxima atingida no TE, ou menos, caso o paciente referisse
cansaço, dispnéia, alterações da FC ou quedas da Sat0 2 •
A aplicação do BiPAP® nos pacientes dos grupos G 1
e G2 consistiu na aplicação de níveis decrescentes de pressão
durante o treinamento aeróbio. Para os grupos G3 e G4, esse
procedimento foi utilizado durante 30 minutos. Os níveis de
BiPAP foram ajustados de aeordo com a tolerância do paciente
(com IPAP fixado entre 15 e 10 cmHp; EPAP em 4 c~ O),
de forma que o paciente mantivesse níveis de Sat02 maiores
que 90%. O tempo total de cada sessão foi de 1 hora, 3 vezes
por semana, durante 6 semanas consecutivas.
72
Pires Di Lorenzo, V. A. et al.
Análise dos Dados
Os resultados foram organizados em tabelas e gráficos
de acordo com médias e desvios-padrão, conforme o grupo
de variáveis estudado. Para análise dos dados, foram utilizados o teste t pareado de Student para comparar os valores
observados nos grupos 1, 2, 3 e 4, antes e após o tratamento,
e análise de variância ANOVA para comparação entre os
grupos. O nível de aceitação foi de p::; 0,05 ou 5%.
RESULTADOS
As características sobre sexo, idade, peso, altura e índice
de massa corporal (IMC) de cada grupo constam na Tabela
1. Não foram encontradas diferenças significativas entre
os quatro grupos estudados quanto à idade, peso, altura, IMC
e volume expiratório forçado no 12 segundo (VEF1) (ANOVA
p::; 0,05).
Os resultados obtidos pelos pacientes dos grupos G 1,
G2, G3 e G4 estão dispostos em conjunto nos quatro grupos,
de acordo com cada uma das variáveis: FMR (Plmáx e
PEmáx), distância caminhada e escala de Borg no TC6min
e no TE. A Figura 1 mostra os resultados da FMR antes e
após a realização do tratamento de todos os pacientes.
Conforme pode ser observado pelos resultados apresentados,
houve aumento significativo da Plmáx [de 55± 18,7 antes
vs 71,6 ± 24 cmHp após (p = 0,00) para G1 e de 60 ± 12,6
vs 78,3 ± 11,6 (p = 0,01) para G3] e da PEmáx [de 71,6 ±
14,7 antes vs 88,3 ± 24,8 cmH 2 0 (p = 0,00) após para G1
e de 65 ± 5,4 vs 81,6 ± 13,2 (p = 0,01) para G3]. No entanto,
Rev. bras. fisioter.
para os grupos G2 e G4, as alterações não foram
significativas.
Além dos resultados já expostos, calculou-se o percentual da diferença entre a média dos valores iniciais e finais
para Plmáx e PEmáx dos quatro grupos estudados, de forma
que, ao comparar os valores pré e pós-tratamento dos grupos
1 e 3, observamos aumento na Plmáx (30% no G 1 e 30%
no G3) e aumento na PEmáx (23% no G 1 e 25% no G3).
Esses aumentos foram significativos para ambos os grupos.
O G2 não apresentou, tal como o G4, alterações significativas
na Plmáx e na PEmáx.
Como pode ser observado pelos resultados da Tabela
2 e da Figura 2, os pacientes dos grupos G 1 e G2 que realizaram o TF na esteira, associado ao BiPAP, aumentaram
significativamente a distância percorrida no tempo de 6
minutos, após a realização do TF, associado à aplicação do
BiPAP após o período de 6 semanas de treinamento.
Em relação à escala de Borg, como pode ser observado
nos resultados da Tabela 3, os pacientes que compuseram o
G4 e realizaram somente o BiPAP durante 30 minutos apresentaram redução significativa da sensação de dispnéia do pré para
o pós-tratamento, sendo que nos demais grupos não foram
constatadas alterações significativas da sensação de dispnéia.
Podemos observar na Tabela 4 que, em relação à
distância caminhada em metros durante o TE, os pacientes
do G1, G2 e G3 apresentaram aumento significativo da
distância caminhada do pré para o pós-tratamento. Em relação
à EB no TE, não foram constatadas alterações significativas
em nenhum dos grupos estudados.
Tabela 1. Médias e desvios-padrão da idade, sexo, altura, peso, índice de massa corpórea e VEF1 dos pacientes com DPOC que participaram
do estudo.
Grupo
Idade
Sexo m/f
Altura
Peso
IMC
VEF 1 (% prev)
Gl
64,6 ± 7,5
4/2
158,8 ± 7,3
58± 10,8
23 ± 4,1
0,64 ± 0,18 (28,6%)
G2
69,8 ± 2,1
3/3
158,3 ± 10,4
64,8 ± 15,2
25,6± 5,2
0,78 ± 0,27(36%)
G3
63,3 ±9,6
3/3
159,5 ± 7,8
62,6± 10,6
24,7 ± 3,1
O, 73 ± 0,28 (32%)
G4
57,1 ± 13
2/4
152,6 ±6,5
66,1 ± 11,4
28,2± 3,2
0,70±0,21 (31,8%)
Tabela 2. Média e desvios-padrão da distância caminhada no TC6min obtidos no pré e pós-tratamento nos pacientes do Gl, G2, G3 e G4
e respectivos resultados estatísticos.
Pré
Pós
Teste t
G1
411,5 ± 76,1
482,6 ± 71,5
0,01*
G2
417 ± 104,2
467,6± 86,8
0,05*
G3
450,6 ± 104,2
435 ± 119,7
0,31 (NS)
G4
447 ±93,9
462,6± 95
0,12 (NS)
Grupos
NS =não significativo; *=significativo p:::; 0,05.
73
Treinamento Físico e Muscular Respiratório Associado a BiPAP
Vol. 7 No. 1, 2003
Força muscular respiratória
120
11 o
100
90
o 80
r.N
70
E
u
60
50
40
30
20
D Plmáx pré
**
ffill Plmáx pós
11 PEmáx pré
• PEmáx pós
G4
G3
G2
G1
Grupos
Figura 1. Médias e desvios-padrão dos valores de Plmáx e da PEmáx obtidos no pré e pós-tratamento dos pacientes do Gl, G2, G3 e G4.
*Significativo p ~ 0,01.
Distância caminhada no TC6min
650
550
!E~
L~
450
VI
e 350
QJ
:2
250
150
50
G1
G3
G2
G4
Grupos
Figura 2. Médias e desvios-padrão da distância percorrida no TC6min (em metros) no pré e pós-tratamento para os pacientes do Gl, G2,
G3 e G4. *Significativo p ~ 0,05; **significativo p = 0,01.
Tabela 3. Médias e desvios-padrão da escala de Borg no final do TC6min obtidos no pré e pós-tratamento nos pacientes do Gl, G2, G3 e
G4 e respectivos resultados estatísticos.
Pré
Pós
Teste t
G1
3,66 ± 2,16
1,83 ± 1,94
0,11 (NS)
G2
3 ± 1,78
2,83 ± 2,48
0,82 (NS)
G3
4,33 ± 2,9
3,66 ± 1,03
0,48 (NS)
G4
4,33 ± 1,63
1,91 ± 1,02
0,00**
Grupos
NS
= não significativo; * = significativo p ~ 0,05; ** significativo p ~ 0,01.
74
Pires Di Lorenzo, V. A. et al.
Rev. bras. fisioter.
Tabela 4. Médias e desvio-padrão da distância caminhada no teste de esforço nos pacientes do Gl, G2, G3 e G4 e respectivos resultados
estatísticos.
Distância caminhada (metros)
Grupos
Pré
Pós
Teste t
G1
530±229
880 ± 251
0,01 **
G2
430 ±245
768 ± 366
0,01 **
G3
610 ±409
730 ±445
0,03*
G4
685 ± 317
688 ± 338
0,94 (NS)
Situação
NS =não significativo; *significativo p ~ 0,05; **significativo p = 0,01.
DISCUSSÃO
O efeito da VNI sobre a função ventilatória, na FMR,
e a sensação de bem-estar de pacientes com DPOC moderada
à grave têm sido discutidos em vários estudos. 18 • 19 A fraqueza
dos músculos respiratórios pode contribuir para a limitação
ao exercício nos pacientes com DPOC; isso sugere que o
treinamento de força pode diminuir a dispnéia e melhorar
a tolerância ao exercício físico. 10
Embora alguns autores 19 tenham afirmado que o
tratamento com BiPAP nasal reduz a atividade eletromiográfica do diafragma, mantendo os níveis de ventilação e
promovendo repouso dos músculos da inspiração, eles não
constataram aumento da força muscular respiratória.
Nossos resultados estão de acordo com os dados de
Renston et al., 19 em relação à FMR, avaliada pela Plmáx
e PEmáx. Conforme pode ser observado nos resultados
das Figuras 1 e 2, somente os pacientes dos grupos G 1
e G3, que realizaram TMR específico, apresentaram
aumento significativo tanto da Plmáx quanto da PEmáx.
Os pacientes do G2, tal como os do G4, não apresentaram
alterações significativas da Plmáx e da PEmáx. Sugerese que o aumento da PEmáx encontrado ocorreu em razão
da melhor eficiência mecânica dos músculos expiratórios,
já que o incremento de força inspiratória certamente
proporcionou melhor desempenho dos músculos expiratórios. Esses dados não estão de acordo com os obtidos
por Schonhofer et al., 10 que constataram aumento de
Plmáx após três meses de aplicação de VNI em pacientes
com falência respiratória crônica. O TMR proporciona
efeitos benéficos em pacientes com DPOC, diminuindo
a dispnéia e aumentando a Plmáx e o ganho de tolerância
ao exercício físico. 4 De forma semelhante, Sanchez et al. 3
constataram que o TMR, em pacientes com DPOC,
melhorou a capacidade de caminhar e a dispnéia no
TC6min. Também, Renston et al. 19 constataram aumento
na tolerância à caminhada por meio do TC6min em
pacientes DPOC graves submetidos a BiPAP nasal por
um período de 5 dias de tratamento.
Os testes de esforço físico têm-se tornado um procedimento comum para avaliar objetivamente as respostas
cardíacas e pulmonares dos indivíduos durante o esforço.
Por meio dessas respostas podem ser estudadas as limitações
do esforço em razão de fatores cardíacos, respiratórios,
metabólicos, endócrinos, neuromusculares, entre outros. 2
Os pacientes dos grupos 1, 2 e 3 apresentaram maior
tolerância ao exercício e atingiram maiores estágios no teste
incrementai na esteira rolante, observados pelo aumento da
distância percorrida no TE, após a realização do tratamento
associado ao BiPAP, o que está de acordo com os resultados
de Schonhofer et al., 10 que, em um grupo de 20 pacientes
submetidos a 3 meses de tratamento noturno com VNI, por
pressão positiva, constataram melhora da endurance tanto
dos músculos respiratórios como dos músculos dos membros
inferiores. Embora não tenha sido constatado aumento
significativo na DP e no TE para G4, observa-se que os
valores se mantiveram do pré para o pós tratamento.
De acordo com os achados de Dolmage & Goldstein, 11
a assistência ventilatória durante o exercício em cicloergômetro,
em pacientes DPOC grave, proporciona aumento da
tolerância ao exercício e diminui a dispnéia. Segundo os
autores Bianchi et al., 12 o suporte pressórico inspiratório
pode reduzir a dispnéia e aumentar a tolerância ao exercício
em esteira em pacientes com DPOC grave.
Vol. 7 No. 1, 2003
Treinamento Físico e Muscular Respiratório Associado a BiPAP
A escala de Borg (EB) modificada, utilizada tanto no
TC6min como no TE, consiste em um critério de avaliação
do grau da dispnéia eficaz para quantificarmos, de forma menos
subjetiva, a resposta de tolerância ao exercício físico e também
a sintomatologia do paciente. 20 A sensação de dispnéia em
pacientes com DPOC grave é freqüentemente observada com
aumento do trabalho respiratório, uma conseqüência do
aumento da resistência das vias aéreas e da hiperinsuflação
pulmonar. 5• 6 • 7 Em relação à EB, no final do teste de esforço,
não foram encontradas alterações significativas do pré para
o pós-tratamento em todos os grupos, em razão dos resultados
terem sido avaliados na intensidade pico atingida no final do
teste e não na mesma intensidade do teste pré-treinamento
físico. O fato de os pacientes terem percorrido maior distância
e tolerarem maiores estágios no teste incrementai mostra
influência eficaz do BiPAP associado ao TF e ao TMR.
Constatamos alterações significativas da distância
caminhada no teste de esforço, comparadas aos resultados
do TC6min, principalmente para os pacientes do grupo G3,
sugerindo que no teste de esforço, além da velocidade ser
imposta, permitindo maior controle sobre a distância
caminhada, as condições para a realização do TE são mais
controladas, o que não foi possível realizar totalmente no
TC6min. Cabe ressaltar que, para os pacientes de G 1 e G2,
a distância percorrida foi maior tanto no teste de esforço
quanto no TC6min, sugerindo que o TF e o TMR associados
à utilização da BiPAP constituem um método eficaz para
aumentar a tolerância ao exercício físico.
O TF e o TMR, associados ao BiPAP, têm interferência
positiva e reabilitadora nas limitações dos pneumopatas, com
ação significativa no controle das condições de estabilidade
do paciente, podendo modificar a qualidade de vida dos
mesmos. Não foi possível controlar neste estudo o desempenho dos pacientes em suas atividades de vida diária. Todavia,
a maioria deles relatou bem-estar e maior disposição para
realização das tarefas do dia-a-dia.
Embora não tenham sido constatadas alterações significativas da EB e do DP em todos os grupos, observaram-se
maior tolerância ao exercício físico e maior força muscular
respiratória quando as técnicas foram utilizadas em conjunto.
Muitos pacientes portadores de DPOC grave apresentam
intolerância aos exercícios e piora da dispnéia, atingindo
completa incapacidade para realizarem tarefas que exigem
esforços mínimos, justificando a importância da aplicação
de um suporte ventilatório em pacientes com tal grau de
limitação. Nossos resultados permitem concluir que a
utilização da BiPAP isoladamente não proporciona aumento
de FMR quando utilizada de forma intercalada, com duração
de 30 minutos e com os níveis pressóricos empregados neste
estudo. Cabe ainda destacar que a utilização da BiPAP,
aplicada em conjunto ao treinamento físico e muscular
respiratório de pacientes portadores de DPOC grave,
promoveu maior tolerância ao exercício físico, destacando
a importante influência nas variáveis estudadas.
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