Gota e hiperuricemia

Propaganda
SEÇÃO 1
CAPÍTULO
Distúrbios articulares e ósseos
1
Editada por Terry L. Schwinghammer
Gota e hiperuricemia
•• A gota caracteriza-se por hiperuricemia, crises recorrentes de artrite aguda com cristais de urato
monossódico (UMS) em leucócitos presentes no líquido sinovial, depósitos de cristais de UMS em
tecidos e ao redor das articulações (tofos), doença renal intersticial e nefrolitíase por ácido úrico.
FISIOPATOLOGIA
•• O ácido úrico é o produto final da degradação das purinas. O aumento do reservatório de urato
em indivíduos com gota pode resultar de sua produção excessiva ou de sua excreção reduzida.
•• As purinas originam-se das purinas da dieta, da conversão do ácido nucleico tecidual em nucleotídeos de purina e da síntese de novo de bases purínicas.
•• A produção excessiva de ácido úrico pode resultar de anormalidades dos sistemas enzimáticos
que regulam o metabolismo das purinas (p. ex., aumento da atividade da fosforribosil pirofosfato
[PRPP, de phosphoribosyl pyrophosphate] sintetase ou deficiência de hipoxantina-guanina fosforribosil transferase [HGPRT, de hypoxanthine-guanine phosphoribosyl transferase]).
•• O ácido úrico também pode ser produzido em excesso em consequência da degradação aumentada
dos ácidos nucleicos teciduais, como a que ocorre nos distúrbios mieloproliferativos e linfoproliferativos. Os agentes citotóxicos podem resultar em produção excessiva de ácido úrico, devido à lise
e degradação da substância celular.
•• As purinas da dieta não são importantes no desenvolvimento da hiperuricemia na ausência de
algum transtorno no metabolismo ou na eliminação das purinas.
•• Dois terços do ácido úrico produzido diariamente são excretados na urina. O restante é eliminado
pelo trato gastrintestinal (GI) após a sua degradação por bactérias do cólon. O declínio da excreção
urinária para um nível abaixo da taxa de produção leva à hiperuricemia e ao aumento do reservatório de urato de sódio.
•• Os fármacos que diminuem o clearance renal de ácido úrico incluem diuréticos, ácido nicotínico,
salicilatos (< 2 g/dia), etanol, pirazinamida, levodopa, etambutol, ciclosporina e agentes citotóxicos.
•• A deposição de cristais de urato no líquido sinovial resulta em inflamação, vasodilatação, aumento
da permeabilidade vascular, ativação do complemento e atividade quimiotática dos leucócitos polimorfonucleares. A fagocitose de cristais de urato pelos leucócitos resulta em rápida lise das células
e descarga de enzimas proteolíticas no citoplasma. A consequente reação inflamatória provoca
intensa dor articular, eritema, calor e edema.
•• Ocorre nefrolitíase por ácido úrico em 10 a 25% dos pacientes com gota. Os fatores predisponentes
consistem na excreção urinária excessiva de ácido úrico, urina ácida e urina altamente concentrada.
•• Na nefropatia aguda por ácido úrico, ocorre insuficiência renal aguda em consequência do bloqueio do fluxo urinário devido à precipitação maciça de cristais de ácido úrico nos ductos coletores
e nos ureteres. A nefropatia crônica por urato é causada pelo depósito em longo prazo de cristais
de urato no parênquima renal.
•• Os tofos (depósitos de urato) são raros e constituem uma complicação tardia da hiperuricemia. Os
locais mais comuns de ocorrência consistem na base dos dedos das mãos, na bolsa do olécrano, na
face ulnar do antebraço, no tendão do calcâneo, nos joelhos, nos punhos e nas mãos.
1
SEÇÃO 1 | Distúrbios articulares e ósseos
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
•• As crises de gota aguda caracterizam-se por dor excruciante de início rápido, edema e inflamação.
Em geral, a crise é monoarticular, acometendo, com mais frequência, a primeira articulação metatarsofalângica (podagra) e, em seguida, por ordem de incidência, o dorso do pé, os tornozelos, os
calcanhares, os joelhos, os punhos, os dedos das mãos e os cotovelos. As crises costumam começar
à noite, e o paciente acorda com dor. As articulações acometidas estão eritematosas, quentes e
edemaciadas. Febre e leucocitose são comuns. As crises não tratadas podem durar 3 a 14 dias antes
da recuperação espontânea.
•• As crises agudas podem ocorrer sem provocação, ou podem ser precipitadas por estresse, traumatismo, consumo de álcool, infecção, cirurgia, rápida diminuição do nível sérico de ácido úrico por
agentes redutores de ácido úrico e ingestão de determinados fármacos que elevam as concentrações
séricas de ácido úrico.
DIAGNÓSTICO
•• O diagnóstico definitivo exige aspiração do líquido sinovial da articulação acometida e identificação de cristais intracelulares de UMS monoidratado nos leucócitos do líquido sinovial.
•• Quando a aspiração da articulação não é possível, presume-se o diagnóstico pela presença de sinais
e sintomas característicos, bem como pela resposta ao tratamento.
TRATAMENTO
•• Objetivos do tratamento: término da crise aguda, prevenção de crises recorrentes, e prevenção de
complicações associadas ao depósito crônico de cristais de urato nos tecidos.
ARTRITE GOTOSA AGUDA (FIGURA 1-1)
Terapia não farmacológica
•• A aplicação local de gelo constitui o tratamento adjuvante mais efetivo. Não se recomenda o uso de
suplementos dietéticos (p. ex., óleo de linhaça, raiz de aipo).
Terapia farmacológica
•• Os pacientes podem ser tratados, em sua maioria com sucesso, com agentes anti-inflamatórios não
esteroides (AINEs), corticosteroides ou colchicina.
AINEs
•• Os AINEs apresentam eficácia excelente e toxicidade mínima com uso em curto prazo. A indo-
metacina, o naproxeno e o sulindaco tiveram aprovação da Food and Drug Administration (FDA)
para o tratamento da gota, porém outros AINEs também parecem ser efetivos (Quadro 1-1).
•• Iniciar a terapia dentro de 24 horas após o início da crise e continuar até obter uma resolução completa (geralmente 5 a 8 dias). Pode-se considerar uma redução gradual da dose após a resolução,
em particular quando a presença de comorbidades, como insuficiência hepática ou renal, torna o
tratamento prolongado indesejável.
•• Os efeitos adversos mais comuns envolvem o trato GI (gastrite, sangramento, perfuração), os
rins (necrose papilar renal, redução do clearance de creatinina [CLα]), o sistema cardiovascular
(elevação da pressão arterial, retenção de sódio e de líquido) e o sistema nervoso central (SNC)
(comprometimento da função cognitiva, cefaleia, tontura).
•• Os inibidores seletivos da ciclo-oxigenase-2 (COX-2) (p. ex., celecoxibe) podem constituir uma
opção para pacientes para os quais o uso de AINEs não seletivos é menos indicado; todavia, a razão
risco-benefício na gota aguda não está bem esclarecida, e é preciso considerar o risco cardiovascular.
CORTICOSTEROIDES
•• A
eficácia dos corticosteroides é equivalente àquela dos AINEs; podem ser usados sistemicamente ou por injeção intra-articular (IA). Há necessidade de terapia sistêmica se uma crise for
poliarticular.
2
Resultado do tratamento
Intensa
FIGURA 1-1 Algoritmo para o manejo de uma crise de gota aguda.
Bem-sucedido
Resultado do tratamento
Resposta
inadequadad
Terapias sem indicações na bula e em fase de desenvolvimento
• Terapia com inibidor de interleucina-1
Mudar para a monoterapia alternativac
Resposta inadequadad
Iniciar a terapia de combinação:c
• Colchicina + AINE
• Colchicina + corticosteroide oral
• AINE + corticosteroide intra-articular
• Colchicina + corticosteroide intra-articular
• Corticosteroide oral + corticosteroide intra-articular
Intensidade da dor
aNível de evidências grau A: corroboradas por múltiplos ensaios clínicos randomizados ou metanálises.
bNível de evidências grau B: derivadas de um único ensaio clínico randomizado ou de estudos não randomizados.
cNível de evidências grau C: opinião de consenso de especialistas, estudos de casos ou de padrão de cuidados.
dA “resposta inadequada” é definida como uma melhora de < 20% no escore de dor dentro de 24 horas ou < 50% em ≥ 24 horas.
eA colchicina só é recomendada quando iniciada dentro de 36 horas após o aparecimento dos sintomas.
Prevenção de crises recorrentes
• Recomendar modificações na dieta para
prevenir a hiperuricemiab
• Instruir o paciente sobre o papel do ácido
úrico em excesso nas crises gotosasb
• Desenvolver um plano para o paciente para
autotratamento imediato de qualquer crise futurab
• Iniciar a terapia de redução de urato, quando
indicadoc
Bem-sucedido
Iniciar a monoterapia:a
• AINEa
• Colchicinaa,e
• Corticosteroide sistêmicoa
Leve/moderada
Gota e hiperuricemia | CAPÍTULO 1
3
SEÇÃO 1 | Distúrbios articulares e ósseos
QUADRO 1-1
Esquemas posológicos dos anti-inflamatórios não esteroides orais para o tratamento
da gota aguda
Fármaco
Dose inicial
Faixa habitual
Etodolaco
300 mg 2 vezes ao dia
300 a 500 mg 2 vezes ao dia
Fenoprofeno
400 mg 3 vezes ao dia
400 a 600 mg 3 a 4 vezes ao dia
Ibuprofeno
400 mg 3 vezes ao dia
400 a 800 mg 3 a 4 vezes ao dia
Indometacina
50 mg 3 vezes ao dia
50 mg 3 vezes ao dia no início, até que a
dor seja tolerável; em seguida, reduzir
rapidamente para interrupção completa
Cetoprofeno
75 mg 3 vezes ao dia ou 50 mg
quatro vezes ao dia
50 a 75 mg 3 a 4 vezes ao dia
Naproxeno
750 mg, seguidos de 250 mg a
cada 8 h, até a regressão da crise
–
Piroxicam
20 mg uma vez ao dia ou 10 mg
2 vezes ao dia
–
Sulindaco
150 mg 2 vezes ao dia
150 a 200 mg 2 vezes ao dia, durante
7 a 10 dias
Celecoxibe
800 mg seguidos de 400 mg no primeiro –
dia; em seguida, 400 mg 2 vezes ao
dia, durante uma semana
•• Estratégias de posologia oral da prednisona ou prednisolona: (1) 0,5 mg/kg ao dia durante 5 a
10 dias, seguidos de interrupção abrupta; ou (2) 0,5 mg/kg ao dia durante 2 a 5 dias, seguidos de
redução gradual por 7 a 10 dias. A redução gradual da dose costuma ser utilizada para diminuir o
risco hipotético de uma crise de rebote com a suspensão do esteroide.
•• A metilprednisolona é usada em esquema de seis dias, começando com uma dose de 24 mg no
primeiro dia, diminuindo em 4 mg a cada dia.
•• A triancinolona acetonida, 20 a 40 mg administrados por injeção IA, pode ser usada se a gota
for limitada a uma ou duas articulações. Em geral, os corticosteroides IA são administrados com
terapia oral com AINE, colchicina ou corticosteroides.
•• A metilprednisolona (um corticosteroide de ação prolongada), administrada na forma de injeção
intramuscular (IM) única, seguida de terapia com corticosteroides orais, constitui outra abordagem razoável. De modo alternativo, pode-se considerar a monoterapia com corticosteroide IM em
pacientes com múltiplas articulações acometidas que não podem receber terapia oral.
•• Em geral, o uso de corticosteroides em curto prazo é bem tolerado. Devem ser usados com cautela
em pacientes com diabetes melito, problemas GI, distúrbios hemorrágicos, doença cardiovascular
e transtornos psiquiátricos. Deve-se evitar o seu uso em longo prazo, devido ao risco de osteoporose, supressão do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal, catarata e descondicionamento muscular.
•• O hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) em gel, 40 a 80 unidades USP, pode ser administrado
por via IM a cada 6 a 8 horas, durante dois ou três dias, e, em seguida, interrompido. Seu uso deve
ser limitado em pacientes que apresentam contraindicações para terapias de primeira linha (p. ex.,
insuficiência cardíaca, insuficiência renal crônica, história de sangramento GI) ou em pacientes
que não podem tomar medicamentos orais.
COLCHICINA
•• A colchicina é altamente efetiva no alívio das crises agudas de gota; quando administrada dentro
das primeiras 24 horas após o início, cerca de dois terços dos pacientes respondem em poucas
horas. A colchicina só deve ser usada dentro de 36 horas após o início da crise, visto que a probabilidade de sucesso diminui substancialmente se o tratamento for tardio.
4
Gota e hiperuricemia | CAPÍTULO 1
•• A colchicina provoca efeitos adversos GI dependentes da dose (náusea, vômitos e diarreia). Os efei-
tos não GI incluem neutropenia e neuromiopatia axonal, que pode ser agravada em pacientes em
uso de outros agentes miopáticos (p. ex., estatinas) ou na presença de insuficiência renal. Não deve
ser usada concomitantemente com inibidores da glicoproteína P ou inibidores potentes do CYP450
3A4 (p. ex., claritromicina), uma vez que a excreção biliar reduzida pode levar a níveis plasmáticos
elevados de colchicina e toxicidade. Usar com cautela na insuficiência renal ou hepática.
•• O colcrys é um produto com colchicina aprovado pela FDA, disponível em comprimidos orais de
0,6 mg. Inicialmente, a dose recomendada é 1,2 mg (dois comprimidos), seguida de uma dose de
0,6 mg (um comprimido) dentro de 1 hora. Embora não seja um esquema aprovado pela FDA, as
diretrizes de tratamento da gota do American College of Rheumatology (ACR) sugerem que a colchicina, 0,6 mg uma ou duas vezes ao dia, pode ser iniciada dentro de 12 horas após a dose inicial
de 1,2 mg e continuada até a resolução da crise.
HIPERURICEMIA NA GOTA
•• As crises de gota recorrentes podem ser evitadas pela manutenção de baixos níveis de ácido úrico;
todavia, a adesão do paciente às terapias não farmacológicas e farmacológicas é precária.
Terapia não farmacológica
•• As instruções ao paciente devem considerar a natureza recorrente da gota e o objetivo dos medicamentos e de cada modificação no estilo de vida/dieta.
•• Promover a perda de peso por meio de restrição calórica e atividade física em todos os pacientes,
a fim de aumentar a excreção renal de urato.
•• A restrição do consumo de álcool é importante, pois o consumo correlaciona-se com as crises de
gota. As diretrizes do ACR recomendam limitar o consumo de álcool em todos os pacientes com
gota e evitar qualquer bebida alcoólica durante períodos de crises frequentes de gota, bem como
em pacientes com gota avançada inadequadamente controlada.
•• As recomendações dietéticas incluem limitar o consumo de xarope de milho com alto teor de
frutose e alimentos ricos em purinas (miúdos de animais e alguns frutos do mar) e incentivar o
consumo de vegetais e produtos lácteos com baixo teor de gordura.
•• Avaliar a lista de medicamentos à procura de fármacos potencialmente desnecessários que podem
elevar os níveis de ácido úrico. A gota não é necessariamente uma contraindicação para o uso de
diuréticos tiazídicos em pacientes hipertensos. O ácido acetilsalicílico em baixa dose para prevenção cardiovascular deve ser mantido em pacientes com gota, visto que o ácido acetilsalicílico tem
um efeito insignificante sobre a elevação dos níveis séricos de ácido úrico.
Terapia farmacológica (Figura 1-2)
•• Depois da primeira crise de gota aguda, recomenda-se a farmacoterapia profilática se o paciente
sofrer duas ou mais crises por ano, mesmo se o nível sérico de ácido úrico estiver normal ou apenas
minimamente elevado. Outras indicações incluem a presença de tofos, doença renal crônica ou
história de urolitíase.
•• A terapia para redução do urato pode ser iniciada durante uma crise aguda quando não foi administrada profilaxia anti-inflamatória.
•• A meta da terapia para redução do urato consiste em alcançar e manter um nível sérico de ácido
úrico abaixo de 6 mg/dL (357 μmol/L) e, de preferência, inferior a 5 mg/dL (297 μmol/L) se os
sinais e sintomas de gota persistirem.
•• Deve-se prescrever um fármaco para redução do urato para uso em longo prazo. O nível sérico de
urato pode ser reduzido pela diminuição da síntese de ácido úrico (inibidores da xantina oxidase)
ou pelo aumento de sua excreção renal (uricosúricos).
•• Utilizar uma abordagem sequencial para a hiperuricemia (ver Figura 1-2). Os inibidores da xan­tina
oxidase constituem a terapia de primeira linha recomendada; a probenecida, um agente uricosúrico, é recomendada como terapia alternativa para pacientes com contraindicação ou intolerância
aos inibidores da xantina oxidase. Nos casos refratários, sugere-se a terapia de combinação com
um inibidor da xantina oxidase mais um fármaco com propriedades uricosúricas (probenecida,
losartana ou fenofibrato). A pegloticase pode ser usada nos casos graves em que o paciente não
pode tolerar ou não responde a outras terapias.
5
6
Sim
FIGURA 1-2 Algoritmo para o manejo da hiperuricemia na gota.
cNível
bNível
aIndicações
Sim
Evidência de atividade
da gota durante a TRU?
Não
Sim
Suspender
a terapia
profilática
depois de seis
meses após
alcançar o
alvo do uratod
Presença de tofos?
Suspender a terapia profilática
após alcançar o maior de:
1) Seis mesesb
OU
2) Três meses após
alcançar o alvo
de uratoc
Não
Continuar a terapia profilática
Sim
Profilaxia anti-inflamatória da gota durante a iniciação da TRU
De primeira linha
• Colchicina em baixa doseb
• AINE em baixa dosed
Segunda linha
• Prednisona ou prednisolona em baixa dosed
para incluir a TRU: (1) presença de tofos; (2) ≥ 2 crises de gota por ano; (3) DRC de estágio 2 ou mais grave; ou (4) história pregressa de urolitíase.
de evidências grau A: corroboradas por múltiplos ensaios clínicos randomizados ou metanálises.
de evidências grau B: derivadas de um único ensaio clínico randomizado ou de estudos não randomizados.
dNível de evidências grau C: opinião de consenso de especialistas, estudos de casos ou de padrão de cuidados.
Passar para
a pegloticase
Não
Alcançou
o alvo do urato?
Se estiver utilizando IXO,
acrescentar terapia
uricosúrica
• Probenecida
• Fenofibrato
• Losartana
Sim
Alcançou
o alvo do urato?
Continuar todas as medidas necessárias para manter
indefinidamente o nível sérico de urato em < 6 mg/dLd
Sim
Alcançou
o alvo do urato?
Não
Não
Ajustar a TRU para
a dose máxima
• Alopurinol
• Febuxostate
Alternativa
• Probenecidac
Início da TRU
De primeira linha
• Inibidor da xantina oxidase (IXO)b
O paciente tem alguma indicação para a terapia de redução do urato (TRU)?a
Estratégias não farmacológicas para redução do uratod
Modificações dietéticas
• Reduzir/evitar o consumo de álcool e miúdos de animais
• Aumentar o consumo de vegetais e laticínios
Eliminar os medicamentos que elevam o nível de
urato se forem desnecessários
• Diuréticos
• Niacina
• Inibidores da calcineurina
Não
SEÇÃO 1 | Distúrbios articulares e ósseos
Gota e hiperuricemia | CAPÍTULO 1
INIBIDORES DA XANTINA OXIDASE
•• Os inibidores da xantina oxidase reduzem o ácido úrico ao comprometer a conversão da hipo-
xantina em xantina e desta em ácido úrico. Como esses agentes são efetivos tanto em indivíduos
que produzem ácido úrico em excesso quanto naqueles que apresentam uma excreção reduzida
de ácido úrico, eles constituem os fármacos mais prescritos para a prevenção em longo prazo de
crises recorrentes de gota.
•• O alopurinol reduz os níveis de ácido úrico por meio de um mecanismo dependente da dose. As
diretrizes do ACR recomendam uma dose inicial que não ultrapasse 100 mg ao dia, com ajuste
gradual a cada 2 a 5 semanas até chegar a dose máxima de 800 mg/dia e alcançar o nível-alvo de
urato sérico. Os pacientes com doença renal crônica (de estágio 4 ou mais grave) devem começar
com uma dose que não ultrapasse 50 mg ao dia. A posologia conservadora tem por objetivo evitar
a síndrome de hipersensibilidade ao alopurinol e as crises agudas de gota que são comuns durante
o início da terapia de redução de urato.
•• Os efeitos adversos leves do alopurinol consistem em exantema, leucopenia, problemas GI, cefaleia
e urticária. As reações adversas mais graves incluem exantema grave (necrólise epidérmica tóxica,
eritema multiforme ou dermatite esfoliativa) e síndrome de hipersensibilidade ao alouprinol,
caracterizada por febre, eosinofilia, dermatite, vasculite e disfunção renal e hepática, que ocorre
raramente, mas está associada a uma taxa de mortalidade de 20%.
•• O febuxostate também reduz os níveis séricos de ácido úrico por um mecanismo dependente da
dose. A dose inicial recomendada é de 40 mg, uma vez ao dia. Deve-se aumentar a dose para 80 mg
uma vez ao dia para pacientes que não alcançam as concentrações séricas alvo de ácido úrico
depois de duas semanas de terapia. O febuxostate é bem tolerado, e os efeitos adversos consistem
em náusea, artralgias e elevações mínimas das transaminases hepáticas. Esse fármaco não exige
ajuste da dose na presença de disfunção hepática ou renal leve a moderada. Devido à rápida
mobilização dos depósitos de urato durante o início do tratamento, deve-se administrar terapia
concomitante com colchicina ou com um AINE durante pelo menos as primeiras oito semanas de
terapia, a fim de evitar exacerbações agudas da gota.
FÁRMACOS URICOSÚRICOS
•• A probenecida aumenta o clearance renal do ácido úrico, inibindo a reabsorção tubular renal pro-
ximal pós-secretória de ácido úrico. Pacientes com história de urolitíase não devem receber agentes
uricosúricos. Deve-se iniciar a terapia com uricosúricos em dose baixa, a fim de evitar a ocorrência
de uricosúria pronunciada e possível formação de cálculos. A manutenção do fluxo urinário adequado e a alcalinização da urina durante os vários dias iniciais da terapia também podem diminuir
a possibilidade de formação de cálculos de ácido úrico.
•• A dose inicial de probenecida é de 250 mg duas vezes ao dia, durante 1 a 2 semanas e, em seguida,
500 mg duas vezes ao dia, durante duas semanas. Em seguida, a dose diária é aumentada em
500 mg a cada 1 a 2 semanas, até a obtenção de um controle satisfatório ou até atingir a dose
máxima de 2 g/dia.
•• Os principais efeitos colaterais da probenecida consistem em irritação GI, exantema e hipersensibilidade, precipitação de artrite gotosa aguda e formação de cálculos. As contraindicações incluem
comprometimento da função renal (CLCR < 50 mL/min ou < 0,84 mL/s) e produção excessiva de
ácido úrico.
PEGLOTICASE
•• A pegloticase é uma uricase recombinante pegilada, a qual reduz o nível sérico de ácido úrico
ao convertê-lo em alantoína, que é hidrossolúvel. A pegloticase está indicada como terapia anti-hiperuricêmica para adultos refratários à terapia convencional.
•• A dose é de 8 mg por infusão intravenosa durante pelo menos 2 horas, a cada duas semanas.
Devido às reações alérgicas potenciais relacionadas com a infusão, os pacientes devem ser previamente tratados com anti-histamínicos e corticosteroides. A pegloticase é de custo substancialmente
mais alto do que as terapias de primeira linha para redução do urato.
•• A duração ideal da terapia com pegloticase não é conhecida. O desenvolvimento de anticorpos
dirigidos contra a pegloticase, resultando em perda de sua eficácia, pode limitar a duração da
terapia efetiva.
7
SEÇÃO 1 | Distúrbios articulares e ósseos
•• Em virtude de suas limitações, a pegloticase deve ser reservada para pacientes com gota refratária,
com contraindicação ao uso de redutores do ácido úrico ou que não responderam a essas terapias
anteriormente mencionadas.
PROFILAXIA ANTI-INFLAMATÓRIA DURANTE O INÍCIO
DA TERAPIA PARA REDUÇÃO DO URATO
•• O início da terapia para redução do urato pode precipitar uma crise de gota aguda, devido ao
remodelamento dos depósitos de cristais de urato nas articulações após a rápida redução das
concentrações de urato. Deve-se usar a terapia profilática com anti-inflamatórios para prevenir
essas crises de gota.
•• As diretrizes ACR recomendam a colchicina oral em dose baixa (0,6 mg duas vezes ao dia) e AINEs
em doses baixas (p. ex., 250 mg de naproxeno duas vezes ao dia) como terapia profilática de primeira linha, sendo o uso da colchicina sustentado por evidências mais consistentes. Para pacientes
que recebem profilaxia em longo prazo com AINE, indica-se o uso de um inibidor da bomba de
prótons ou de outra terapia supressora de ácido para proteger o paciente dos problemas gástricos
induzidos pelos AINEs.
•• A terapia com corticosteroides em doses baixas (p. ex., prednisona ≥ 10 mg/dia) constitui uma
alternativa para pacientes com intolerância, contraindicação ou ausência de resposta à terapia de
primeira linha. Os efeitos adversos graves potenciais da terapia prolongada com corticosteroides
impedem o seu uso como terapia de primeira linha.
•• Continuar a profilaxia durante pelo menos seis meses, ou três meses após alcançar o nível sérico
alvo de ácido úrico, consoante o que for mais longo. Para pacientes que apresentam um ou mais
tofos, continuar a terapia profilática durante seis meses após a alcançar o nível sérico alvo de urato
(ver Figura 1-2).
AVALIAÇÃO DOS desfechos TERAPÊUTICOS
•• Verificar os níveis séricos de ácido úrico de pacientes com suspeita de crise gotosa aguda, em parti-
cular se não for a primeira crise, e tomar uma decisão quanto ao início da profilaxia. Todavia, pode
ocorrer gota aguda na presença de concentrações séricas normais de ácido úrico.
•• Monitorar os pacientes quanto ao alívio sintomático da dor articular e quanto aos efeitos adversos
potenciais e interações medicamentosas relacionadas com o tratamento farmacológico. A dor
aguda de uma crise inicial de gota deve começar a diminuir dentro de cerca de 8 horas após o
início do tratamento. A resolução completa da dor, do eritema e da inflamação costuma ocorrer
em 48 a 72 horas.
•• Para pacientes que recebem terapia para redução do urato, obter uma avaliação basal da função
renal, das enzimas hepáticas, dos eletrólitos e um hemograma completo. Repetir os exames a cada
6 a 12 meses em pacientes submetidos a tratamento de longo prazo.
•• Durante o ajuste da terapia para redução do urato, monitorar os níveis séricos de ácido úrico a
cada 2 a 5 semanas; após alcançar o nível-alvo de urato, monitorar o ácido úrico a cada seis meses.
•• Tendo em vista as altas taxas de comorbidades associadas à gota (diabetes melito, doença renal crônica, hipertensão, obesidade, infarto do miocárdio, insuficiência renal, acidente vascular cerebral),
os níveis séricos elevados de ácido úrico ou a presença de gota devem levar a uma avaliação para
doença cardiovascular e à necessidade de medidas apropriadas de redução de risco. Os médicos
também devem investigar possíveis causas de hiperuricemia passíveis de correção (p. ex., medicamentos, obesidade, neoplasia maligna, abuso de álcool).
Capítulo elaborado a partir de conteúdo original de autoria de Michelle A. Fravel, Michael E. Ernst e
Elizabeth C. Clark.
8
Download