arquitetura moderna da praça da independência de

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Revista Ceciliana. Maio de 2012.
Número Especial: Patrimônio Cultural – Memória e Preservação.
ISSN 2175-7224 - © 2010/2012 - Universidade Santa Cecília
Disponível online em http://www.unisanta.br/revistaceciliana
ARQUITETURA MODERNA DA PRAÇA DA INDEPENDÊNCIA DE SANTOS
COMO REPRESENTAÇÃO DA MEMÓRIA E DO PATRIMÔNIO LOCAL
CLÁUDIA DE ASSIS BUSTO1
Universidade Santa Cecília de Santos – Pós-graduação em Patrimônio Cultural: Memória e
Preservação
_________________________________________________________
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo destacar a importância da Praça da
Independência, da cidade de Santos, localizada no Bairro do Gonzaga, como
patrimônio cultural santista. Pretende-se considerar a destruição da primeira
formação arquitetônica do local, inaugurada em 1922, com a instalação do
Monumento dos Andradas; o seu conjunto arquitetônico atual, com
características da arquitetura moderna brasileira; e, por fim, a identificação da
população santista com o cenário atual como palco de comemorações,
manifestações e encontros.
PALAVRAS-CHAVE: Praça da Independência de Santos; Arquitetura Moderna;
Patrimônio Cultural Santista.
_________________________________________________________
INTRODUÇÃO
O trabalho apresentado nas
próximas
páginas
tem
como
finalidade evidenciar o cenário da
Praça da Independência de Santos,
desde
sua
fundação,
com
a
inauguração do Monumento dos
Andradas, em 7 de setembro de
1922,
em
comemoração
ao
centenário da Independência do
Brasil, até a atualidade, como
importante
patrimônio
cultural
santista.
Em virtude da destruição do
primeiro
conjunto
arquitetônico,
formado pelos casarões da geração
cafeeira, com características da
arquitetura eclética, entende-se que
o conjunto arquitetônico atual,
formado com características da
arquitetura moderna, ainda não é
considerado
pelos
órgãos
de
preservação, municipal e estadual, e
também
pelos
especialistas
e
estudiosos do tema, um patrimônio
santista a ser preservado.
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A pesquisa identifica que, em
linhas gerais, a arquitetura moderna
brasileira em si precisa de muitos
estudos e valorização de seu
patrimônio. Entende-se, assim, que
o conjunto arquitetônico da Praça da
Independência é um importante
centro
de
referência
dessa
arquitetura e para cidade de Santos.
Porém,
identifica-se,
principalmente, a importância da
arquitetura da Praça, pela memória
que esta representa nas atuais
gerações da cidade. O Monumento
dos Andradas, acompanhado do
conjunto
arquitetônico
atual
moderno, também representa para
o santista das últimas gerações um
cenário
de
comemorações,
manifestações e encontros.
Logo, o estudo encontrou na
bibliografia atual e em artigos
publicados por pesquisadores sobre
o tema alguns conceitos que serão
apresentados neste trabalho, com a
finalidade
de
identificar
a
importância do local como cenário a
ser preservado, e principalmente, a
ser
objeto
de
estudos
mais
aprimorados sobre a arquitetura
moderna brasileira e o patrimônio
cultural da cidade de Santos.
REFERENCIAL TEÓRICO
Para se desenvolver a pesquisa
exposta
neste
trabalho
foram
utilizadas as obras de alguns
autores que se relacionaram com o
desenvolvimento urbano da cidade
de Santos como: Ana Lúcia Duarte
Lanna (1996), que em Uma cidade
na Transição, estabelece no modo
de vida urbano da cidade no fim do
século XIX e início do XX toda a
contextualização da transformação
de uma cidade estagnada para um
polo de desenvolvimento social, por
meio das relações humanas, do
crescimento comercial do maior
porto da América Latina e o que
esse desenvolvimento significou na
estrutura urbana de Santos. O
estudo de Lanna (1996) serviu como
base de entendimento da fase
anterior, existente na Praça da
Independência de Santos, para que
assim fosse possível desenvolver as
novas transformações ocorridas e
pesquisadas neste artigo.
Dentro
desse
contexto,
buscaram-se também referências na
pesquisa
da
autora
Jaqueline
Fernández Alves (2000), pois em
Arquitetura
à
Beira-Mar
encontram-se todas as relações de
transformação da arquitetura da
cidade, em função de duas fases
diferentes
de
desenvolvimento
econômico e imobiliário. Nessa obra
podem-se entender as relações
vividas na sociedade na fase da
economia cafeeira e também na
transformação do perfil turístico da
cidade entre as décadas de 50 e 60
do
século
XX.
Tais
relações
aqueceram o setor imobiliário da
cidade e abriram espaço para um
novo modelo de arquitetura já
conhecido na Europa e trazido para
o Brasil na década de 30.
Obras
como:
Uma
certa
arquitetura moderna brasileira,
de Carlos Eduardo Dias Comas
(1987), e Moderno e Brasileiro,
de
Lauro
Cavalcanti
(2006),
enriqueceram
a
pesquisa
na
contextualização
da
arquitetura
moderna brasileira, pois retratam
não somente o estilo arquitetônico
das edificações, como manifestação
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artística, mas também identificam
as relações humanas e técnicas de
um empreendimento utilitário com
estilo e desenvolvimento brasileiros
e
que
mudaram
o
cenário
arquitetônico do País.
Para identificar o patrimônio
cultural do objeto de estudo deste
artigo e a falta de política de
preservação que o mesmo se
encontra, os textos de Leonardo
Castriota (2009), por meio da
relação do conceito mais abrangente
de patrimônio, e de Nelson Santos
Dias (2005), no levantamento das
informações
de
políticas
de
preservação atual do Bairro do
Gonzaga, onde se localiza a praça,
são abordados e pesquisados para
fortalecer a identificação e a
memória da população de Santos
com a Praça da Independência e
estabelecer
a
importância
de
preservação
do
conjunto
arquitetônico atual, pois acredita-se
que as novas gerações já se
apropriaram do cenário atual como
memória e patrimônio local.
Além do referencial escrito
apontado, o trabalho pretende
utilizar
outros
autores
que
trouxeram os mesmos conceitos
citados, porém com viés diferente e
significativo para a argumentação
da pesquisa.
DESENVOLVIMENTO
Arquitetura Moderna da Praça
da Independência de Santos
como representação da memória
e do patrimônio local
A cidade de Santos pertence à
região da Baixada Santista — região
metropolitana formada por nove
cidades (Bertioga, Guarujá, Santos,
São Vicente, Cubatão, Praia Grande,
Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe),
localizadas no litoral de São Paulo —
e conhecida internacionalmente por
ter o maior porto da América Latina.
Desde a sua fundação até 1839,
quando passa a ser considerada
cidade, Santos ficou completamente
estagnada. Como afirma Gisele
Homem de Mello (2008, p. 14):
A Santos de fins do século
XVIII pouco se desenvolveu de
sua fundação como Vila, não
ultrapassando os limites da atual
área
central,
vivendo
apagadamente
os
séculos
coloniais.
O início de seu desenvolvimento
deu-se por conta do crescimento das
atividades portuárias, como relata
Jaqueline Fernandez Alves (2000):
O
desenvolvimento
de
Santos sempre esteve ligado à
prosperidade do seu porto. Foi a
partir de meados do século XIX
que a cidade conheceu um
rápido e intenso crescimento. A
produção agrícola no interior do
estado e, principalmente, as
exportações de açúcar e café,
deram o impulso necessário para
a concretização do porto como
principal pólo de escoamento de
produtos do país.
Com o desenvolvimento em
virtude do crescimento do porto,
durante décadas a cidade apenas
cresceu nas mediações do cais,
como discorre Gisele Homem de
Mello (2008, pág 28):
A inauguração da área
ferroviária
representou
o
primeiro
passo
para
transformar Santos numa das
mais importantes cidades do
país. Esse foi o primeiro passo
para remodelação urbana que
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se estabelecia no Centro Velho:
ao
redor
da
estação
apareceram novos lugares de
convivência: os quiosques ali
instalados eram ponto de
encontro da população; criouse novas oportunidades de
emprego
para
a
própria
população, atraindo mão-deobra de fora da cidade.
Em virtude do aumento da
população
e
do
crescimento
econômico, Santos necessita urgente
de melhoria das condições sanitárias
no início do XX. O planejamento
sanitário chega à cidade, que passou
a se desenvolver e a crescer para
outra área, ainda não explorada, e
que leva ao caminho do mar, como
retrata Jaqueline Fernandez Alves
(2000):
O
desenvolvimento
econômico somado à falta de
infraestrutura da cidade colonial,
fez com que o estado de
insalubridade
agravasse
a
proliferação
de
endemias,
dizimando grande parte da
população. A necessidade de
ampliação do porto e o iminente
saneamento da cidade fizeram
com que os produtores de café
associados à autoridades locais
pressionassem
os
meios
governamentais para que se
encontrava a cidade.
(...)
A
Campanha
Sanitária
daria resultados esperados. A
população que vivia encortiçada
começaria a ser retirada no
perímetro urbano.
Com
esse
crescimento
e
desenvolvimento
urbanístico,
Santos, nas primeiras décadas do
século passado, teve como uma de
suas
principais
características
arquitetônicas os casarões de estilo
eclético e art noveau, construídos
nas avenidas que levavam à orla da
praia e na própria orla. Constata
Carlos Eduardo Finochio (2011):
As casas, construídas sobre
porões
altos,
permitem
escadarias,
geralmente
em
mármore, ladeadas por corrimão
trabalhado em cimento num
desenho de curvas tipicamente
barroco, ou em ferro batido
sugerindo o floral nas delicadas
linhas do contemporâneo francês
“art noveau”. É nessa mistura de
diversos elementos de estilos
que encontramos o comentado
estilo “eclético” dos primeiros
anos do século XX.
(...)
Esse contexto se repete
não só nos edifícios oficiais, mas
nos novos palacetes que vão ser
construídos nos bairros mais
próximos à orla da praia e ao
longo das avenidas que cortam a
cidade.
Carlos Eduardo Finochio (2011)
identifica
ainda
que
essas
construções são as moradias das
famílias dos grandes comerciantes
de café, que gerenciavam as
negociações no porto:
As mudanças e os novos
hábitos de viver foram facilitados
pelas ferrovias e a liberação da
mão-de-obra escrava substituída
pela
imigrante
européia,
permitindo novas relações e
definindo
a
chamada
elite
cafeeira como “empresários do
café” o que a identifica com o
complexo de atividades ligadas
ao café.
Essa nova elite urbana
trouxe heranças culturais do
mundo rural de estilos de vida
nas casas grandes das fazendas
de café. A elite cafeeira foi um
setor que dominava, além dos
negócios do café, bancos, meios
de
transportes
e
parte
significativa da economia do país
e orgulhosos da descendência
dos bandeirantes.
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Os casarões se espalharam pela
nova cidade do século XX, mas
poucos deles restaram na memória e
como patrimônio atual da Santos do
início século XXI. Localizada em uma
ilha, com pouca área para ser
construída, a cidade portuária acaba
por ter suas construções sempre
renovadas,
impedindo
que
construções antigas convivam com a
expansão urbanística, como mostra
Jaqueline Fernandez Alves (2000):
A modernidade trazia uma
nova forma de morar e o
ímpeto
da
construção
acelerada, não deixou espaço
para que pudessem conviver o
moderno e o antigo.
Muitas histórias rondam esses
casarões e os locais onde foram
construídos. Nas discussões da falta
de preservação do patrimônio da
cidade, sempre são citados exemplos
como os casarões da orla da praia
que, atualmente, são representados
pelo único que restou em todos os
sete quilômetros da orla, localizado
na Av. Bartolomeu de Gusmão, n.º
15, conhecido como Casarão Branco
da Praia. O modelo atualmente
abriga a Pinacoteca Benedito Calixto,
equipamento de cultura e de
patrimônio arquitetônico, histórico e
cultural da cidade. Porém, sem
tombamento por qualquer órgão de
preservação,
seja
de
instância
municipal ou estadual, muito menos
nacional.
Outro exemplo de falta de
preservação, sempre lembrado, mas
atualmente
sem
qualquer
representante,
é
o
conjunto
arquitetônico
da
Praça
da
Independência, que se torna objeto
de estudo deste artigo.
Seu último exemplar de casarão
foi demolido aos olhos de toda
população, registrado pela imprensa,
por historiadores e fotógrafos, que
assistiram à queda da memória do
início do século XX do Bairro do
Gonzaga, sem ter uma legislação
que pudessem acionar para impedir
tamanha destruição do patrimônio
santista.
O Jornal Eletrônico Novo Milênio
retrata a demolição.
O início da demolição do último
casarão da praça, o palacete Áurea
Conde (entre a Av. Ana Costa e a
Rua Galeão Carvalhal), foi registrado
nestas três fotos do antigo jornal
Cidade de Santos:
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Busto, Revista Ceciliana. Maio de 2012
Foto cedida a Novo Milênio pelo historiador Waldir Rueda
Foto cedida a Novo Milênio pelo historiador Waldir Rueda
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Foto cedida a Novo Milênio pelo historiador Waldir Rueda
No entanto, após inúmeras
histórias de destruição física da
cidade,
muitos
desses
locais
continuam como referências de
identidade para população.
Em alguns casos, como o da
própria Praça da Independência, o
cenário mudou por completo, mas a
referência localizada em torno do
Monumento dos Andradas continua
forte na memória e identidade da
população. O monumento é uma
homenagem
aos
irmãos
José
Bonifácio de Andrada e Silva, o
Patriarca da Independência, Martim
Francisco Ribeiro de Andrada e
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e
Silva, cuja atuação foi decisiva para
o Brasil conquistar a autonomia
política e administrativa. A obra é do
arquiteto Gaston Castel e do escultor
Antoine Sartorio, artistas franceses
que deram à então Companhia
Constructora Santista o primeiro
lugar
no
concurso
público
internacional para a construção do
monumento em homenagem aos
irmãos Andradas.
A inauguração da praça ocorreu
em 7 de setembro de 1922, em
comemoração ao centenário da
Independência do Brasil, marcando
assim
a
primeira
de
muitas
comemorações, que ainda iriam
ocorrer ao longo das próximas
décadas. Desde então, a praça se
transformou
no
cenário
de
comemorações,
manifestações
e
encontros da população da cidade de
Santos.
O Jornal Eletrônico Novo Milênio
apresenta essa característica na
inauguração e em outro evento da
década de 20, do século passado:
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Foto: Acervo José Carlos Silvares/Santos Ontem
(...) vista neste outro cartão postal comemorativo do
centenário da independência, vendo-se o palanque e a cerca para
conter o público, (...):
Nesta outra imagem, possivelmente feita durante uma
solenidade em 1922/1925, observa-se à esquerda o hotel Deodoro,
por trás do monumento o hotel Atlântico, (...):
Foto: acervo do professor e pesquisador santista Francisco Carballa
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A partir da década de 50, a
Praça da Independência foi se
transformando e ganhando uma
nova
forma
urbanística
e
arquitetônica, enquanto os antigos
casarões foram sendo expulsos da
cidade e da memória do povo.
O fotógrafo santista Kauffmann
registrou essa transição, em 1956,
onde se pode notar o Edifício
Independência,
de
autoria
do
engenheiro e arquiteto Eduardo
Corrêa da Costa Júnior, ao lado de
casas comerciais e residenciais,
como também registra o Jornal
Eletrônico Novo Milênio:
Nesta rara imagem de
1956, do fotógrafo santista
Kauffmann, vê-se ainda um
conjunto de casas residenciais e
comerciais que existia entre as
ruas Dr. Galeão Carvalhal (à
esquerda)
e
a
Goitacazes
(centro), defronte à Praça da
Independência
e
seu
monumento. O trecho final da
Av. Ana Costa, em direção a
praia, está à direita:
Foto enviada a Novo Milênio por Jair Siqueira, em 26/8/2011
Essa
transformação
arquitetônica ocorreu em toda
cidade de Santos, em virtude de
uma tendência iniciada no Brasil, em
meados da década de 30. A
arquitetura moderna chega ao País,
por influência direta do movimento
moderno
europeu
e
mais
especificamente de Le Corbusier1,
1
Charles-Edouard
Jeanneret-Gris,
mais
conhecido como Le Corbusier, (La Chaux-de-
como retrata Carlos Eduardo Dias
Comas (1987):
O ano de 1936 é data
particularmente significativa na
história da arquitetura erudita
brasileira. É então que se
Fonds, 6 de Outubro de 1887 — RoquebruneCap-Martin, 27 de Agosto de 1965) foi um
arquiteto, urbanista e pintor francês de origem
suíça. É considerado juntamente com Frank Lloyd
Wright, Alvar Aalto, Mies van der Rohe e Oscar
Niemeyer, um dos mais importantes arquitetos
do século XX. (Fonte Wikipédia).
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projetam
o
Ministério
da
Educação e a Universidade do
Brasil, tendo Le Corbusier como
consultor. Sob a liderança de
Lúcio Costa e Oscar Niemeyer,
implanta-se
no
país
uma
arquitetura explicitamente filiada
à arquitetura moderna europeia
em sua vertente corbusiana, que
vem a florescer até 1957.
Devemos considerar que a
chegada da arquitetura moderna a
Santos ocorre também devido à
transformação da população que
circula na cidade nas décadas de 50
e 60. Até esse momento, Santos
recebia turistas interessados nos
cassinos espalhados pela orla. Em
1946, o Governo Federal fechou
todos os cassinos, logo, o perfil do
turista que vinha a Santos mudou
por completo. Essa mudança é
retratada por Jaqueline Fernandez
Alves (2000):
A cidade passou a vivenciar
outra
experiência
que
definitivamente
mudaria
a
configuração até o momento
existente: a construção dos
edifícios multifamiliares à beiramar, fato que ocorreria também
na
maioria
das
cidades
balneárias. (...)
A década de 50 é um dos
maiores períodos de crescimento
e verticalização já notados na
cidade. (...)
Nos primeiros anos até
meados dos anos de 1940 os
edifícios multifamiliares são a
novidade no cenário urbano
convivendo
com
hotéis
e
pensões.
A
população
que
iniciava a consumir nova forma
de
lazer
à
beira-mar
era
composta de famílias abastadas
paulistanas.
Os
imóveis
eram
compostos
de
pequenos
apartamentos, com no máximo
dois dormitórios, alguns com
garagem,
algumas
vezes
mobiliados.
Diante desse novo cenário, a
Praça da Independência foi se
transformando. O primeiro projeto
de arquitetura moderna, que chegou
para se unir ao Monumento dos
Andradas,
foi
o
Edifício
Independência (FIGURA 1)2, como já
citado anteriormente, do engenheiro
e arquiteto Eduardo Corrêa da Costa
Júnior, pela Cia Construtora Correa
da Costa. Identifica-se ainda nesse
cenário
atual
de
arquitetura
moderna, também localizados na
praça, os projetos do Edifício Queiroz
Ferreira (FIGURA 2)3,
do Edifício
Campos Elíseos (FIGURA 3)4 e, por
fim, o projeto do Edifício José Maria
de. Almeida (FIGURA 4)5.
2
O Edifício Independência é uma construção
mista, de imóveis comerciais e residenciais, com
17 andares. Seu logradouro residencial está
localizado na Praça da Independência, n.º 15; e
os comerciais, inclusive o logradouro do primeiro
teatro moderno de Santos, estão na Avenida Ana
Costa e na Rua Goitacazes.
3
O Edifício Queiroz Ferreira é uma construção
mista, de imóveis comerciais e residenciais, com
XX andares. Seu logradouro residencial está
localizado na Rua Galeão Carvalhal, n.º 47; e o
comercial na Praça da Independência, n.º 17.
4
O Edifício Campos Elíseos é uma construção
mista, de imóveis comerciais e residenciais, com
XX andares. Seu logradouro residencial está
localizado na Praça da Independência, n.º 14; e
os comerciais também são localizados pelo
logradouro da Praça.
5
O Edifício José Maria de Almeida é uma
construção mista, de imóveis comerciais e
residenciais, com XX andares. Seu logradouro
residencial está na Av. Floriano Peixoto, n.º 4; e
o comercial na Praça da Independência, n.º 5.
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Figura 1 – Edifício Independência – Foto de J. Carlos de Carvalho
Figura 2 – Edifício Queiroz Ferreira – Foto de J. Carlos de Carvalho
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Figura 3 – Edifício Campos Elíseos – Foto de J. Carlos de Carvalho
Figura 4 – Edifício José Maria de Almeida – Foto de J. Carlos de Carvalho
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Desde a década de 50 até os
dias atuais, esses projetos formam o
atual conjunto arquitetônico da
Praça da Independência, cenário
único na memória das últimas
gerações. Os casarões ecléticos e art
nouveau não preenchem mais as
lembranças do santista, que entende
a Praça como um local de identidade
de comemorações, manifestações e
encontros.
Assim
como
a
arquitetura
moderna brasileira ainda encontra
dificuldades de ser entendida como
patrimônio a ser preservado, o
conjunto arquitetônico moderno da
Praça ainda não foi visto como um
patrimônio local. Podemos justificar
esse
não
reconhecimento
considerando a descaracterização de
seu cenário original.
No
entanto,
abrimos
um
precedente para a discussão sobre o
que
estamos
atualmente
preservando. Partindo do princípio
de que as gerações que vivenciaram
os acontecimentos da Praça, antes
da década de 50, não poderão mais
preservar
fisicamente
suas
memórias, será que não deveríamos
pensar no patrimônio histórico,
arquitetônico e cultural dessa nova
geração, que tem como identidade
os edifícios modernos?
E
por
que
não
estudar,
pesquisar e preservar a Arquitetura
Moderna?
Carlos
Eduardo
Dias
Comas (1987) cita Lúcio Costa ao
identificar esse estilo da arquitetura
como “o verdadeiro estilo de nosso
tempo”:
(...) a concretização material
dessa arquitetura brasileira é
precedida
e
orientada
por
raciocínios muito específicos sobre
a
identidade
da
arquitetura
moderna. Em dois textos que se
podem considerar fundamentais —
“Razões da nova arquitetura”, de
1934, e a memória do projeto da
Universidade do Brasil, de 1937—
Lúcio Costa sustentava que a
arquitetura
moderna
era
essencialmente
manifestação
artística, o verdadeiro estilo de
nosso tempo. Como todo e
qualquer verdadeiro estilo do
passado,
arrancava
de
um
empreendimento utilitário e se
ancorava
em
uma
técnica
construtivista;
porém
seu
objetivo, para além da utilidade e
da
técnica,
era
a
beleza.
Certamente
as
formas
da
arquitetura moderna deviam ser
distintas
das
formas
da
arquitetura do passado, porque
serviam
a
outros
usos
e
empregavam outras técnicas. Não
obstante, debaixo dessas formas
distintas atuavam um mesmo
espírito e as mesmas leis, que
tudo deviam à racionalidade dos
gregos e romanos. A arquitetura
moderna não devia ser vista como
ruptura histórica, senão como
recuperação de uma tradição
legítima
apagada
por
uma
maquiagem eclética e historicista.
Além
dessa
discussão
do
patrimônio arquitetônico da atual
Praça
da
Independência,
não
podemos deixar de identificar, como
já citado neste artigo, a importância
cultural e tradicional desse local.
Desde sua inauguração, o
Monumento dos Andradas é o palco
de inúmeras comemorações da
população,
principalmente,
nas
conquistas dos títulos de futebol
(fig. 5), além de conquistas políticas
e também como ponto de encontro
de
manifestações
e
lazer.
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Figura 5 – Torcedores do Santos Futebol Clube em comemoração do título da Taça
Libertadores da América, conquistado em 2011
Considerando a recente a
identificação
dos
patrimônios
imateriais
pelo
Instituto
do
Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan), no início do século
XXI, e lembrando que a “Unesco
define como Patrimônio Cultural
Imaterial
as
práticas,
representações, expressões, (...) e
lugares culturais que lhes são
associados - que as comunidades,
os grupos e, em alguns casos, os
indivíduos reconhecem como parte
integrante
de
seu
patrimônio
cultural’"6; fica evidente o quanto
devemos discutir e considerar o
ambiente identificado nesse artigo
como patrimônio santista.
Diante das evidências, fica
clara a importância da Praça para a
população da cidade. No entanto,
existe alguma ferramenta que
previne outra destruição dessa
memória?
Leonardo
Castriota
(2008) relata a importância ao se
pensar nos dias de hoje sobre a
concepção de patrimônio cultural:
6
Fonte site do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan)www.iphan.gov.br
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Revista Ceciliana. Maio de 2012.
Número Especial: Patrimônio Cultural – Memória e Preservação.
ISSN 2175-7224 - © 2010/2012 - Universidade Santa Cecília
Disponível online em http://www.unisanta.br/revistaceciliana
(...)
a
amplitude
do
patrimônio cultural, que deve ser
contemplado em todas as suas
variantes: devem-se trabalhar
todos os diversos suportes da
memória — as edificações e os
espaços,
mas
também
os
documentos, as imagens e as
palavras.
Nesse
sentido,
a
questão do patrimônio deve
deixar der ser exclusividade de
alguns
profissionais
que
tradicionalmente se ocupam com
ela,
passando
a
exigir
a
composição
de
equipes
interdisciplinares amplas e a
ativa participação da sociedade.
(...) com a incorporação das
perspectivas dos mais diversos
profissionais e os da própria
população, enquanto usuária e
produtora do patrimônio.
A Praça da Independência, por
todo
seu
conteúdo
histórico,
inclusive por ser um dos locais que
um dia obteve os antigos casarões e
foi um marco de destruição, deve
ser palco e objeto de novos estudos
e pesquisas para que toda a sua
relevância cultural — seja das fotos
e memória oral das primeiras
décadas do século XX, seja pelo
conjunto atual arquitetônico e por
todas
as
comemorações,
manifestações e encontros que
ocorreram desde o dia 7 de
setembro de 1922 — se eternize
como patrimônio cultural santista e
novas
memórias
possam
ser
construídas.
Essas
novas
pesquisas
e
estudos sobre toda a importância
cultural da Praça poderão fomentar
alternativas de como a população
santista, incluindo o poder público e
os órgãos de preservação municipal
e estadual, encontrará a melhor
forma
de
preservação
desse
ambiente, seja por ferramenta de
nível de preservação, seja por
tombamento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa realizada para a
elaboração deste artigo evidenciou
inúmeros fatores que elevam a
importância do objeto de estudo, a
Praça da Independência de Santos,
como patrimônio cultural santista.
Ao longo do trabalho, foi
possível verificar que, independente
de
uma
descaracterização
do
primeiro conjunto arquitetônico de
casarões da geração cafeeira, o
atual conjunto de edifícios, com
características modernas representa
um
período
extremamente
importante da expansão imobiliária
da cidade de Santos.
Considerou-se
também
a
importância de se estudar a
arquitetura moderna santista, para
identificar o quanto esta representa
na memória do País, com seus
novos conceitos e soluções de
habitação.
No entanto, ficou evidente que
a importância do objeto de estudo
como patrimônio cultural é a sua
marca na memória e na identidade
da população, como cenário e palco
de comemorações, manifestações e
encontros.
Acredita-se
que
o
estudo
atingiu seu objetivo, desde que,
além
de
identificar
tais
importâncias, abriu precedente para
novas
pesquisas,
estudos
e
discussões sobre como poderá se
preservar o atual cenário da Praça
da Independência de Santos.
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Universidade Santa Cecília – Todos os direitos reservados.
Busto, Revista Ceciliana. Maio de 2012
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Dissertação
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Disponível
em:
http://www.novomilenio.inf.br/santo
s/fotos009b.htm. Acesso em: set.
2011.
1
Cláudia de Assis Busto. Jornalista e
gestora
cultural.
Pós-graduanda
em
Patrimônio Cultural, Memória e Preservação
pela Universidade Santa Cecília, em Santos
(SP). Graduada em Comunicação Social,
com habilitação em Jornalismo, pela
Universidade Santa Cecília, em Santos (SP).
Assessora de Imprensa da Universidade
Santa Cecília e coordenadora do Centro de
Estudos Pagu Unisanta.
Contato: [email protected]
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