i UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS DESENVOLVIMENTO INTESTINAL: TRANSIÇÃO DO EMBRIÃO AO ABATE Revisão da literatura Januária Silva Santos Orientador: José Henrique Stringhini GOIÂNIA 2011 ii JANUÁRIA SILVA SANTOS DESENVOLVIMENTO INTESTINAL: TRANSIÇÃO DO EMBRIÃO AO ABATE Revisão da literatura Seminário apresentado junto à Disciplina Seminários Aplicados do Programa de PósGraduação em Ciência Animal da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás. Nível: Doutorado Área de concentração: Produção Animal Linha de Pesquisa: Nutrição e alimentação de monogástricos Orientador: Prof. Dr. José Henrique Stringhini - UFG Comitê de Orientação: Profª. Dra. Maria Auxiliadora Andrade – UFG Profo. Dr. Marcos Barcellos Café – UFG GOIÂNIA 2011 i SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO...............................................................................................01 2. REVISÃO DA LITERATURA ........................................................................ 03 2.1. Trato digestório, desenvolvimento intestinal e reparo da mucosa do intestino....................................................................................................... 03 2.2. Microbiota do trato digestório..................................................................... 08 2.3. Desenvolvimento no estágio embrionário...................................................12 2.4. Desenvolvimento pós-incubação................................................................ 14 2.5. Desenvolvimento na fase de crescimento e abate..................................... 16 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 19 4. REFERÊNCIAS............................................................................................. 20 ii LISTA DE FIGURAS Figura 1. Trato digestório das aves............................................................... 04 Figura 2. Esquema geral das células epiteliais dos vilos intestinais............. 05 Figura 3. Enterócito evidenciando o microvilo.............................................. 06 Figura 4. Célula caliciforme........................................................................... 06 Figura 5. Célula enteroendócrina.................................................................. 07 Figura 6. Bactérias que habitam o trato digestório das aves........................ 10 Figura 7. Desenvolvimento do trato gastrointestinal..................................... 12 1 1. INTRODUÇÃO Com os altos índices produtivos alcançados pela cadeia de produção avícola, são necessários constantes estudos a respeito da digestão e absorção dos nutrientes. Tais, conhecimentos são necessários para ajustar a nutrição às constantes melhorias genéticas que geram indivíduos com organismo cada vez mais exigente. Conseguindo-se assim, suprir as necessidades fisiológicas exigidas no desenvolvimento do organismo das aves. As espécies aviárias apresentam particularidades inerentes em seu desenvolvimento. O estágio embrionário é realizado fora do organismo materno, em um sistema físico-químico complexo caracterizado pelo ovo. Além de ser fertilizado, este deve conter todos os nutrientes essenciais para o desenvolvimento do embrião (CAMPOS, 2003). A potencialidade do desempenho de frangos de corte depende em parte da qualidade dos ovos. A qualidade do ovo é um importante parâmetro para a embriogênese e, por consequência, interfere nos índices de eclodibilidade. Afetando assim, a qualidade do pintinho na fase pré-inicial e inicial, assim como na fase de crescimento e final (TONA et al., 2003). Dentre os alimentos existentes na natureza, o ovo é o mais completo, possuindo em sua estrutura elementos nutricionais que possibilitam a origem de um novo ser. Quando o ovo é colocado em condições de incubação, oferecendo temperatura de 37,5ºC e umidade relativa em torno de 60% com oxigenação e viragem adequadas, durante um período em torno de 504 horas, o embrião tem condições de se desenvolver por completo (CESARIO & GONZALES, 2003). Um ovo de Gallus gallus domesticus é constituído de casca, albúmen e gema, gerando após o período de incubação um pinto de corte de aproximadamente 44g. O trato alimentar do frango de corte tem seu desenvolvimento iniciado com 18 horas de incubação. Ao décimo oitavo dia da incubação começa o mecanismo fisiológico da absorção do saco da gema (DECUYPERE, 2003). Esse fenômeno dá origem ao desenvolvimento da mucosa intestinal, assim como dos seus componentes celulares. Na eclosão o sistema digestório da aves está 2 anatomicamente completo, mas sua capacidade de digestão e absorção ainda está imatura (MAIORKA et al., 2002). Os processos absortivos são dependentes das estruturas constituintes da mucosa intestinal e para que haja um bom aproveitamento da dieta oferecida, a mucosa deve apresentar características morfológicas e fisiológicas adequadas. Os processos de absorção são dependentes de mecanismos de transporte que ocorrem na membrana das células epiteliais da mucosa, sendo dessa forma, a integridade destas de vital importância, já que é a via de entrada dos nutrientes para o desenvolvimento da ave (MAIORKA, 2004). Com base no exposto acima, objetivou-se discorrer a respeito do desenvolvimento intestinal nos frango de corte desde o período da incubação até a fase final do ciclo de produção. 3 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1. Trato digestório, desenvolvimento intestinal e reparo da mucosa do intestino Para alcançar o máximo do potencial genético das aves é necessário que estas obtenham adequadas quantidades de nutrientes (lipídios, carboidratos, vitaminas, aminoácidos e minerais). Tal processo ocorre pela digestão e absorção dos alimentos, e para que todo esse processo seja realizado de forma satisfatória, o sistema digestório deve apresentar características estruturais que possibilitem a ingestão do alimento, a passagem do alimento pelo trato digestório, alterações físicas e químicas do alimento e a absorção dos produtos digeridos (BOLELI et al., 2002). Ainda de acordo com os autores o trato digestório das aves (Figura 01) difere dos mamíferos em alguns aspectos importantes. Embora as aves possuam glândulas salivares, faltam-lhes os dentes e assim não são capazes de esmagar e quebrar o alimento na cavidade oral. O alimento passa diretamente para o esôfago, sendo estocado no inglúvio. A partir do inglúvio, o alimento adentra na parte anterior do estômago, o proventrículo, estando sujeito a ação de enzimas digestivas é ácidos. Ele então, se move para a moela, parte altamente muscular do estômago, local em que o alimento será triturado. A digestão final do alimento e absorção dos nutrientes ocorre no intestino (BOLELI et al., 2002). O intestino das aves é composto de três partes o intestino delgado, intestino grosso e os cecos. O intestino delgado é a porção mais longa do sistema digestório (medindo cerca 1,5m em aves adultas), é composto por três regiões denominadas de duodeno, jejuno e íleo que apresentam diferenças funcionais e morfológicas. O intestino grosso é relativamente pequeno nas aves e compreende o cólon ou reto e os cecos (ITO, 2004) . 4 Figura 1. Trato digestório das aves. Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br Durante o período de incubação, o intestino delgado tem uma taxa de crescimento maior que a taxa de crescimento do restante do organismo da ave. Aos 18 dias a proporção do peso do intestino delgado do embrião é maior que a proporção do peso corporal (UNI et al., 2003). No período pós-eclosão, o intestino delgado continua aumentando seu desenvolvimento mais rapidamente que o restante da massa corporal. O aumento do peso e do comprimento intestinal não são idênticos dentre os segmentos intestinais (duodeno, jejuno e íleo). A atividade enzimática no período pós-eclosão acompanha o desenvolvimento do intestino delgado (SKLAN, 2001). O intestino delgado dos pintos de um dia é imaturo e sofre alterações morfológicas, bioquímicas e moleculares, que perduram por duas semanas após a eclosão, sendo que as primeiras 24 horas é o período em que ocorrem as alterações mais drásticas (GEYRA et al., 2001). 5 Durante as primeiras 48 horas após a eclosão, a gema contribui primordialmente no desenvolvimento e na manutenção do intestino delgado. Neste período o organismo do pinto recém eclodido altera sua fisiologia digestiva. A obtenção de energia deixa de ter uma base lipídica, fornecida pela gema e passa a ter uma base rica em carboidratos (NOY & SKLAN, 1999). O desenvolvimento da mucosa intestinal consiste no aumento da produção de enterócitos, células caliciformes e enteroendócrinas (Figura 02), assim como em sua maturação. Figura 02. Esquema geral das células epiteliais de um vilo intestinal Fonte: Boleli et al., 2002 Os enterócitos, ou células de absorção, são células tipicamente colunares, que respondem pela digestão final do alimento e pelo transporte transepitelial dos nutrientes a partir do lúmen e/ou para o lúmen. A superfície apical apresentam vários microvilos (Figura 03), que lhe proporcionam maior superfície de contanto com a digesta e, portanto, maior superfície de digestão, absorção e secreção. 6 Microvilo (microvilosidades) Figura 03. Enterócito evidenciando os microvilos Fonte: Boleli et al., 2002 As células caliciformes são secretoras de glicoproteínas (muco) que possuem o papel primário de proteger o epitélio intestinal da ação de enzimas digestivas e efeitos abrasivos da digesta durante o desenvolvimento embrionário e após a eclosão, outra função e a de barreira contra patógenos (Figura 04). Figura 04. Célula caliciforme Fonte: http://dc197.4shared.com Por fim, a células enteroendócrinas (Figura 05) são produtoras de hormônios (gastrina, colecistoquinina, secretina, polipeptídeo inibidor gástrico) e monoaminas biogênicas, produtos estes que participam na regulação da digestão, absorção e utilização de nutrientes (BOLELI et al., 2002). 7 Figura 05. Célula enteroendócrina, seta: grânulos de hormônios Fonte: http://cienciahoje.uol.com.br O desenvolvimento intestinal consiste primariamente de dois eventos citológicos associados, a renovação celular e a perda de células. O equilíbrio entre esses dois processos denomina-se turnover (renovação) celular. A mucosa do trato gastrointestinal apresenta uma característica única entre os tecidos do frango de corte, tem a mais alta taxa de renovação de todos tecidos do corpo (PIRES, 2008). Tal processo se dá em decorrência de proliferação e diferenciação celular resultante de divisões mitóticas sofridas por células totepotentes localizadas na cripta e ao longo dos vilos. Também ocorre o processo de extrusão de células no ápice dos vilos em decorrência do atrito com o bolo alimentar, presença de toxinas e microorganismos com potencial patogênico (MAIORKA et al., 2002). Quando o intestino responde a algum agente com desequilíbrio do turnover, ocorre modificação na altura dos vilos. Assim, se ocorrer aumento na taxa de mitose com ausência, diminuição ou manutenção da taxa de extrusão, deverá haver aumento no número de células e, conseqüentemente, aumento no tamanho dos vilos. Se o estímulo levar ao aumento na taxa de extrusão, havendo manutenção ou diminuição da taxa de proliferação, o intestino deverá responder com redução no tamanho dos vilos e, conseqüentemente, com diminuição em sua área de digestão e absorção. O maior ou menor desenvolvimento da mucosa intestinal é avaliado por meio de dados morfométricos do tamanho e número de 8 vilos, da profundidade das criptas, da altura do epitélio, da altura e número de microvilos enterocíticos e da integridade da mucosa ou perda de epitélio (STERZO, 2007). De acordo com MAIORKA et al. (2002) , essa manutenção do epitélio do intestino em condições fisiológicas, ou não, gera um custo energético elevado para o organismo das aves. Estima-se que em condições normais aproximadamente 20% da energia bruta seja consumida e utilizada para a renovação celular da mucosa intestinal. O intestino delgado é o principal órgão responsável pela digestão e absorção de nutrientes, assim quanto antes as aves alcançarem sua capacidade funcional, mais cedo elas poderão utilizar os nutrientes da dieta, crescer eficientemente e demonstrar seu potencial genético, resistir a infecções e doenças metabólicas (UNI & FERKET, 2004). 2.2. Microbiota do Trato digestório Vários são os microorganismos que se alocam no trato digestório das aves. A microflora é uma mistura de bactérias, fungos e protozoários, entretanto, as bactérias são os microorganismos predominantes (GABRIEL et al., 2006). A microbiota intestinal forma um sistema complexo e dinâmico, responsável por influenciar decisivamente em fatores microbiológicos, imunológicos, fisiológicos e bioquímicos no hospedeiro, podendo ser modulada pela composição da dieta (TANNOCK, 1998). As bactérias no trato gastrointestinal podem encontrar-se, tanto associadas intimamente com o epitélio ou livres na luz intestinal. Os microorganismos de vida livre devem multiplicar-se rapidamente para compensar a eliminação pelo peristaltismo intestinal ou ainda agregar-se às demais bactérias que encontram-se aderidas na mucosa intestinal (MAIORKA, 2004). No inglúvio, proventrículo e moela o pH é extremamente ácido o que determina a colonização por culturas bacterianas específicas do gênero Lactobacillus sp. Este gênero embora esteja presente em quase todo o trato 9 gastrintestinal, possuem uma predileção maior por ambientes de baixo pH (AMIT-ROMACH et al., 2004). O intestino delgado é colonizado por bactérias que toleram de forma mais eficiente um pH próximo ao neutro, tais como: Salmonella sp., Escherichia coli, Bifidumbacteria sp; porém como dito anteriormente cepas do gênero Lactobacillus sp. também crescem neste segmento intestinal. Já o ceco é considerado a fração intestinal com maior quantidade de microrganismos e das mais diversas espécies (MAIORKA et al., 2006). De acordo com ITO (2004), antes de receber alimento os microorganismos presentes no ceco são basicamente coliformes, Streptococcus sp do grupo D e baixo número de Clostrídios. Com 24 horas de vida da ave, é possível observar pequeno número de Lactobacillus sp e após três dias estes se tornam bactérias predominantes na flora cecal, juntamente com as demais bactérias. A partir do quarto dia pós eclosão e nas seis semanas seguintes, ocorre o aumento da quantidade de bactérias anaeróbicas (Eubactéria, Propionibacteria, Fusobacterium, Bacterióides e Rominococcus). Em cada segmento do trato gastrointestinal existe uma predominância de um determinado microorganismo (Figura 06). O número e composição dos microorganismos da microflora intestinal das aves varia consideravelmente ao longo do trato gastrointestinal. O ceco é reconhecido como o segmento de maior colonização de microorganismos, sendo que nele estão presente um grande número de bactérias gram positivas e negativas (MAIORKA, 2004). A variação da composição da microbiota presente no trato gastrointestinal se deve a vários fatores, tais como: os tipos de substratos adquiridos via dieta, a disponibilidade de oxigênio, as alterações no pH luminal, as concentrações de sais biliares e a presença de bacteriocinas. Estes fatores irão favorecer o desenvolvimento de determinada comunidade microbiana (APAJALAHTI et al., 2004). De acordo com RICHARDS et al. (2005), a densidade de microorganismos no trato gastrointestinal das aves tende a aumentar a partir da parte proximal para a parte distal. 10 Streptococcus (+) Staphylococcus (-) Lactobacilus (+) Escherichia coli (-) Eubacterium (+) Clostridium (+) Fusobacterium (-) Bacterióides (+) Figura 6. Bactérias que habitam o trato digestórios das aves. Fonte: Adaptado de ALBUQUERQUE, 2005 Para PEDROSO (2011), o aparelho reprodutivo da matriz contém microorganismos benéficos que durante o processo de formação do ovo passaria a fazer parte da sua estrutura e futuramente da microbiota do embrião. Estes se estabelecem no intestino em desenvolvimento quando o trato gastrointestinal se diferencia e fecha, ficando alocados nos intestinos e se desenvolvendo após a 11 eclosão. Outra teoria para justificar o isolamento de microorganismo em embriões seria a presença destes no aparelho reprodutivo da matriz que durante o estágio final do desenvolvimento embrionário, seriam transferidos para o líquido amniótico-albumina e posteriormente este líquido será ingerido pelo embrião. PEDROSO (2008) demonstrou que existe pequena quantidade de bactérias presentes no intestino e ceco de embriões e estes são viáveis. Após a eclosão os pintos de um dia entram em contato com o ambiente externo. Possivelmente o processo de manuseio, embalagem, contato com caixa de transporte, poeira e vacinação contribui para a evolução da comunidade microbiana. Na granja as aves começam a receber alimentação sólida, água e entra em contato com a cama presente no aviário, estes fatores fazem com que o número de espécies microbianas presentes no trato intestinal aumente (PEDROSO, 2011). De acordo com ITO (2004) a composição e a quantidade microbiana varia conforme a idade da ave (Figura 7). A microbiota de um animal adulto adquire pelo menos 17 famílias e entre 400 e 500 diferentes espécies microbianas que variam ao longo do trato gastrointestinal (PEDROSO, 2011). O estabelecimento da comunidade microbiana do intestino durante o período pós-eclosão e na fase inicial é fundamental, pois a conversão alimentar e a eficiência de aquisição e utilização dos nutrientes presentes no alimento pelas aves são grandemente afetadas por sua microbiota (PEDROSO, 2011). De acordo com LU et al. (2003), o perfil microbiano próprio das aves se torna mais complexo de acordo com o aumento da idade. A microbiota intestinal quando o organismo da ave está em equilíbrio traz grandes benefícios (produção de vitaminas, estimulação do sistema imune e inibição do crescimento de microorganismos patogênicos), ajudando no desenvolvimento das aves. Entretanto, quando em desequilíbrio pode ser indicativo de grandes prejuízos, tais como infecções localizadas ou sistêmicas, necrose intestinal e formação de toxinas (JEURISSEN et al., 2002). A microbiota é composta principalmente por lactobacilos, estreptococos e estafilococos, no ceco e cólon predominam cepas de Eubacterium sp e de Clostridium sp (ALBUQUERQUE, 2005). 12 2.3. Desenvolvimento no estágio embrionário As transformações que acontecem no período de incubação são constantes. Durante 21 dias, ocorrerá um sequenciamento de eventos que darão origem ao novo ser. O desenvolvimento do embrião após a postura do ovo embrionado é muito rápido, ocorrendo alterações a cada hora (CESARIO & GONZALES, 2003). Nas aves o desenvolvimento do trato alimentar se inicia nas primeiras 24 horas de vida do embrião (Figura 8). Ao quinto dia de vida embrionária ocorre a diferenciação da boca, assim como a formação do proventrículo e da moela. No sexto dia de vida tem-se início a formação do bico. Ao décimo quarto dia de vida embrionária ocorre a introdução do intestino na cavidade abdominal e no décimo sétimo dia ocorre a abertura do Divertículo de Meckel e tem-se o inicio da digestão intestinal (MAIORKA& ROCHA, 2009). 17 dias Figura 7. Desenvolvimento do trato gastrointestinal Fonte: MAIORKA, 2009 13 As divisões do futuro intestino ocorrem no sexto dia de vida embrionária. Nesse período é possível diferenciar o intestino delgado do intestino grosso. Entretanto, essa diferenciação só ocorre em decorrência da posição do ceco. O ceco está presente como uma pequena protuberância e encontra-se na junção dos intestinos delgado e grosso. Apesar da existência do órgão responsável pela absorção dos nutrientes, este ainda é afuncional. Durante a incubação os nutrientes para o embrião advêm dos lipídios presente no saco vitelínico e proteínas presentes no albúmen. Estes são diretamente transportados para o sangue através do processo de endocitose (SANTOS et al., 2010). De acordo com SUGIMOTO et al. (1999), no terço final de incubação parte do albúmen se mistura com o conteúdo do saco amniótico, formando uma mistura de carboidratos, proteínas e lipídios. Devido ao crescimento contínuo do embrião, ocorre o aumento da pressão intraovo e o diferencial de pressão criado em decorrência do crescimento embrionário contínuo, faz com que haja o consumo oral desta mistura que passará pelo sistema gastrointestinal. Parte do albúmen absorvido pelo intestino delgado serve para expandir as reservas de glicogênio corporal do embrião, além de preparar o organismo do embrião para a eclosão, período em que a alimentação deixa de ter uma base lipídica e passa a ser baseada em carboidratos (MORAN JR., 2007). A absorção parcial de proteínas a partir dessa mistura ocorre pelos enterócitos, que são capazes de absorver essa mistura durante o trânsito deste pelo duodeno e jejuno. Grande parte do gasto energético embrionário no tecido intestinal está concentrado durante as últimas 48 horas do período da eclosão. Isso se deve a preparação do organismo da ave para a digestão dos nutrientes após o nascimento (OLIVEIRA et al., 2009). A partir desse início do processo de digestão e de absorção ocorrem alterações nas características morfológicas e fisiologicas da mucosa do intestino delgado. Os enterócitos deixam de ser células arredondadas e apolares e passam a assumir sua conformação típica (alongada). Durante o período de incubação as criptas são estruturas rudimentares e afuncionais. 14 Dentre as mudanças morfológicas, estão o aumento do comprimento do intestino, na altura e densidade dos vilos e no número de enterócitos, células caliciformes e células enteroendócrinas. As alterações fisiológicas estão relacionadas com o aumento na capacidade de digestão e de absorção do intestino, que ocorrem em decorrência do aumento na produção de enzimas digestivas pancreáticas e de membrana (MAIORKA et al., 2002). As vilosidades dos embriões possuem enterócitos únicos que são capazes de absorver os fluidos embrionários contendo macromoléculas. Contudo, durante a fase embrionária os enterócitos tem como uma das funções primordiais a absorção de imunoglobulinas. O consumo do líquido amniótico-albumina e a sua absorção é contínuo até que o líquido desapareça e inicie o processo de bicagem interna (MORAN JR, 1985). Fatores anti-tripsina inibem fortemente a digestão durante o período de incubação, apesar da existência de um conjunto completo de enzimas pancreáticas (HOLDSWORTH & WILSON, 1967; MARCHAIM & KULKA, 1967; YOSHIZAKI et al., 2002). A albumina, juntamente com o composto de enzimas pancreáticas, penetra no saco vitelino por meio de sua base com o auxílio da atividade antiperistálticos do cólon (SUGIMOTO et al., 1989; BRYK & GHERI, 1990). 2.4. Desenvolvimento pós incubação O período pós-eclosão é um dos pontos críticos na produção de frango de corte. A transição alimentar que ocorre neste período, pode determinar o alcance de bons índices de produção na fase final de criação. O pinto recém eclodido sofre alterações bruscas em seu metabolismo. O fornecimento de nutrientes para o embrião In ovo é basicamente proveniente da fonte lipídica que provém do saco da gema. Neste período, os nutrientes são depositados diretamente na corrente sanguínea. De acordo com ROMANOFF (1960), as aves eclodem com a reserva nutricional contida no saco da gema. Essas reservas nutricionais são porções 15 remanescentes da utilização da gema e do albúmen, que flui para esse compartimento ao final da segunda semana de incubação. Resíduos desse conteúdo são frequentemente encontrados na luz intestinal e consequentemente submetidos aos processos normais de digestão (SULAIMAN et al., 1996). Desta forma ocorre a preparação do organismo do embrião para a fase de nutrição após a eclosão. Uma vez ocorrido o rompimento completo da casca e o contato com o ambiente, possibilitando a completa disponibilização de oxigênio para a ave, ela passa a ser capaz de utilizar plenamente a gordura corporal armazenada durante a incubação e de mobilizar os estoques contidos no saco vitelino (ROSEBOROUGH et al., 1978). A rápida introdução de uma dieta exógena estimula o desenvolvimento das funções digestivas e absortivas dos pintos, acelerando a adaptação das aves ao ambiente externo (VIEIRA, 2004). Pintos de um dia quando alimentados após a eclosão utilizam as reservas do saco vitelino muito mais rápido do que os pintos recém eclodidos que não receberam alimento (NOY & SKLAN 1996a). Aves com o saco da gema cirurgicamente removido têm desempenho inferior, demonstrando a importância dessa reserva para aves no período pós-eclosão (EDWARDS et al., 1962). O consumo de ração aumenta significativamente durante o período de desenvolvimento das aves, isso resulta em mudanças que ocorrem em todo o organismo, mas que se intensifica no trato gastrointestinal das aves. A adaptação à ingestão de alimentos depende do rápido desenvolvimento dos mecanismos de digestão e absorção, que por sua vez dependem diretamente do estímulo dado pela passagem de alimento no trato digestivo (VIEIRA, 2004). Nos primeiros dias após nascimento o peso dos segmentos intestinais aumenta mais rapidamente do que o restante dos órgãos do organismo do frango de corte. Após o período de quatro dias esse aumento de peso mais acelerado cessa, permanecendo constante ao peso do corpo do animal até o abate (SELL et al., 1991). A velocidade com que o alimento passa pelo lúmen intestinal, influi de forma direta no desenvolvimento do trato gastrointestinal. De acordo com 16 WASHBURN (1991), menores velocidades na passagem do alimento no lúmen intestinal melhoram a absorção de nutrientes. Isso se dá em decorrência do aumento do tempo em que o bolo alimentar fica em contato com as células de absorção e permite mais tempo para a fermentação microbiana. Contudo, a velocidade com que o alimento passa no lúmen intestinal (taxa de passagem) aumenta de acordo com o desenvolvimento das aves (VERGARA et al., 1989) Ocorrem alterações marcantes na morfologia da mucosa do intestino delgado durante o terço final da incubação e durante as duas semanas seguintes após a eclosão da ave. A maturação dos enterócitos e a diferenciação celular ocorrida nesta fase, marca de forma acentuada o desenvolvimento do intestino delgado (GEYRA et al., 2001). Ainda de acordo com o autor, os enterócitos são incompletos ao nascimento, pois nesse período o processo de extrusão ainda não ocorreu, pela ausência do trânsito do alimento exógeno. O desenvolvimento dos enterócitos no período pós-eclosão pode ser dividido em dois períodos. No primeiro período (24 horas após a eclosão) os enterócitos vão adquirindo polaridade, com o intuito de realizar a absorção dos nutrientes. O segundo período envolve a mudança na estrutura celular que deixa de ser arredondada e vai adquirindo uma forma mais cúbica, alterando assim o comprimento celular. Os segmentos intestinais sofrem as alterações nas suas características morfológicas celulares em diferentes períodos. No jejuno esse processo ocorre até 144 horas após o nascimento, diferente do duodeno em que o processo ocorre até 216 horas após a eclosão. No íleo não ocorre essa alteração na morfologia celular, o que prediz que os enterócitos do íleo no momento da eclosão estão maduros (GEYRA et al., 2001). 2.5. Desenvolvimento na fase de crescimento e abate As mudanças mais bruscas em relação ao desenvolvimento intestinal ocorrem na fase pré-inicial e inicial do ciclo de produção. Nestas fases o organismo das aves prioriza o desenvolvimento do trato gastrointestinal, 17 buscando melhor absorção de nutrientes, que terá influência direta na formação dos demais tecidos. Nas fases seguintes (crescimento e final) ocorrerá a manutenção da mucosa intestinal e o maior desenvolvimento de outros tecidos, tal como o tecido ósseo e muscular. Nas aves mais velhas, o epitélio do intestino delgado é continuamente renovado em decorrência da proliferação de células da cripta que migram até o ápice das vilosidades devido ao constante processo de extrusão celular que acontece no topo dos vilos. Concomitante ao desenvolvimento do processo de migração celular ocorre também a diferenciação celular (GEYRA et al., 2001). Parte da energia ingerida pelas aves fica destinada para a manutenção da mucosa, e quanto maior a necessidade de reparo da mesma, menor será a energia líquida destinada a produção (MAIORKA, 2004). A mucosa do intestino tem renovação contínua e é afetada não apenas pelos hormônios metabólicos (insulina, hormônio do crescimento, tiroxina e glicocorticóides), mas também por outros fatores relacionados com o alimento (características físicas e químicas dos nutrientes) e com a microflora presente no intestino. Dessa forma, o desenvolvimento da mucosa intestinal depende tanto de fatores endógenos como exógenos (MAIORKA et al., 2000). De acordo com ITO (2004), no período de 20 dias após eclosão, o intestino está completamente formado anatômica e funcionalmente. Seu peso aumenta em 27 vezes desde sua formação embrionária até sua total maturação. Ainda de acordo com o autor, o comprimento e o diâmetro do intestino variam de acordo com diversos fatores, tais como, o tipo de dieta, a presença de aditivo alimentar ou promotor de crescimento adicionado a ração, presença de microbiota bacteriana, incidência de doenças entéricas e intensidade de desenvolvimento corporal na fase inicial até 14 dias de idade. A fase de crescimento é de grande importância para o desempenho das aves. E nesse período que ocorrerá a formação de todos os órgãos e por consequência o desenvolvimento de todos os sistemas constituintes do organismo das aves. Com isso o frango de corte consegue chegar na fase final de criação obtendo boa eficiência alimentar (ZOCCHE, 2004). A capacidade digestiva e absortiva dos enterócitos aumenta de acordo com o avançar da idade das aves. A digestão de nitrogênio é 78 a 92% maior aos 18 21 dias quando comparada com os sete dias de idade (NOY et al., 1997). A absorção de glicose, na região do jejuno, também aumenta com a idade das aves, em decorrência de uma maior quantidade de transportadores de glicose (KOJIMA et al., 1999). Durante as duas fases finais do processo produtivo de frango de corte a manutenção da capacidade digestiva e de absorção intestinal é mantida pela continuação da formação de novos enterócitos, células caliciformes e células enteroendócrinas, assim como da sua maturação e extrusão (BOLELI et al, 2002). Contudo, esses dois períodos são de fundamental importância para saúde intestinal das aves de produção. O termo saúde intestinal refere-se à existência de um equilíbrio dinâmico no sistema digestório, o suficiente para atingir as metas esperadas de desempenho zootécnico que dependem da integridade do trato gastrointestinal (ITO, 2004). A integridade morfofuncional do sistema digestório é de fundamental importância para o bom desempenho dos índices zootécnico da produção de frango de corte, pois dela depende a execução adequada dos processos de digestão e absorção de nutrientes. Ao mesmo tempo, a plasticidade desse sistema em responder de forma adaptativa a agentes externos presentes na dieta mostra ser possível uma manipulação de suas características morfofuncionais a favor de uma maximização das áreas de digestão e absorção e no seu sistema de defesa (BOLELI et al, 2002) 19 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS As fases iniciais do ciclo de produção são de fundamental importância para alcançar bons índices de produção dentro da cadeia avícola. O trato gastrointestinal é o maior sistema do organismo das aves. Possui a mais extensa superfície exposta a vários fatores que podem afetar de maneira negativa o equilíbrio entre os componentes do intestino dos frangos de corte. Distúrbios neste equilíbrio podem afetar o estado de saúde e desempenho da produção de aves. A perturbação na microbiota normal das aves pode levar a um quadro de desequilíbrio microbiano que contribui para a multiplicação desordenada de patógenos. De forma geral, a capacidade de absorção de nutrientes relaciona-se ao desenvolvimento intestinal e do sistema de transporte através de membranas. As alterações morfológicas mais contundentes são o aumento no comprimento do intestino, da altura e densidade dos vilos, assim como do número de enterócitos, células caliciformes e células enteroendócrinas. Alterações estas que ocorrem mais intensamente no terço final do processo de incubação e fase pré-inicial. 20 4. REFERÊNCIAS 01. ALBUQUERQUE, R. Antimicrobianos como promotores do crescimento. In: Farmacologia aplicada a avicultura. São Paulo: Rocca, 2005. cap. 9, p. 149159. 02. AMIT-ROMACH, E.; SKLAN, D.; UNI, Z. Microflora ecology of the chicken intestine using 16S ribosomal DNA primers. 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