Marketing, mercado, mídia e espetáculo da fé na Bola de Neve Church Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Filho, Universidade de São Paulo (USP), [email protected] Resumo: colocar aqui o mesmo encaminhado Texto completo: A igreja neopentecostal Bola de Neve, mais conhecida como Bola de Neve Church, foi fundada em 1999 por Rinaldo Seixas, (auto) denominado apóstolo Rina, na cidade de São Paulo. A Bola de Neve Church, daqui em diante chamada por sua sigla, BDN, se insere num neopentecostalismo de supergeração, que se refere às igrejas neopentecostais que tem como característica majoritária o uso potente do ciberespaço como maneira de veicularem a imagem da igreja e de seus líderes, suas doutrinas e produtos comerciais.1 Tem como forte característica o uso de um marketing de Jesus; planejamento estratégico de marketing que visa atender e criar demandas religiosas de seu público-alvo; no caso da Bola de Neve Church, formado por uma juventude de 12 a 35 anos, conectada à internet, fã de gêneros como rock n’ roll e reggae, adepta de surfe e skate, e vindos de uma classe alta e média, e urbana – em muitos casos litorânea. A BDN, como possível protótipo de igreja neopentecostal de supergeração, tem a característica majoritária de se adequar a um público linkado no ciberespaço, ultrapassando a opção pela mídia impressa e radio/teledifusoras, mais potentes em outras igrejas neopentecostais. Como é perceptível, há nesta corrente do neopentecostalismo características que a diferenciam daquele professado por igrejas como a IURD, a IMPD, a Internacional da Graça, e também outras mais contemporanizadas, como a Renascer em Cristo e a Sara Nossa Terra. Estas últimas, por exemplo, são enfáticas na forma como se utilizam de um discurso coloquializado, modernizado e adaptado ao seu público, e também em promover uma aparente flexibilização do discurso religioso 1 Aprofundo este conceito no artigo Neopentecostalismo de supergeração: o ciberespaço como chave para o sucesso neopentecostal. História Agora, Revista de História do Tempo Presente. Volume 10, dossiê Religiões e Religiosidades no Tempo Presente. 25 dez. 2010. acerca de dados usos e costumes. Entendo que Sara Nossa Terra e Renascer em Cristo sejam espécies de genomas de igrejas mais recentes, como a Crash Church, a Sexxx Church, o Projeto 242, a Caverna de Adulão e a Bola de Neve Church, conhecidas por agregarem público supostamente alternativo ou underground, ou em outras palavras, seu nicho mercadológico. Para Philip Kotler,2 mercado é o grupo de pessoas com os mesmos desejos e necessidades de um produto e com o poder de compra para adquiri-lo, o que induz a entender a preocupação em se fazer o produto ser conhecido pelo maior número de pessoas, ou seja, espetacularizado e divulgado. É aqui que se evidencia a importância do marketing, que para Kotler seria “administrar mercados para chegar às trocas, com o propósito de satisfazer as necessidades e desejos do homem”3, para Raimar Richers, gerir “as atividades sistemáticas de uma organização humana voltadas à busca e realização de trocas para com o seu meio ambiente, visando benefícios específicos”4, e para Fernando Dolabela, “o processo de planejamento de uma organização que busca realizar trocas com o cliente, cada um com interesses específicos: o cliente quer satisfazer suas necessidades; uma empresa quer gerar receita.”5 Para Richers, ainda, a idéia de troca pode envolver objetos tangíveis como dinheiro e bens de consumo e intangíveis, como serviço ou idéias. Como pondero no caso do marketing de Jesus, bens religiosos tangíveis são representados por produtos como roupas, DVDs, CDs, Bíblias, livros, adesivos, dinheiro e qualquer coisa de caráter material que possa ser comprada; enquanto o bem religioso intangível se refere a tudo aquilo de caráter não-material, como doutrinas, idéias, serviços e sensações, como por exemplo “estar feliz”, “estar em comunhão (inserido prosperidade, no coletivo)”, o companheirismo, a fraternidade e a esta última que, como procuro ilustrar, pode se dar através da negociação que o fiel faz com Deus através da igreja, o que identifica o caráter de mercantilização da religiosidade. Para entendermos como funciona o marketing de Jesus da BDN, decompomos seu planejamento estratégico nos 4 As e nos 5 Pês do marketing, o marketing mix. 2 KOTLER, 1997, passim. A obra referida é Princípios do Marketing. 3 Ibidem, 1997, p. 7. 4 5 RICHERS, 1994, p. 18. A obra referenciada é O que é marketing. DOLABELA, 1999, p. 146. A obra referida é O segredo de Luísa. Uma idéia, uma paixão e um plano de negócios: como nasce o empreendedor e se cria uma empresa. As estratégias de marketing são compostas, como Richers sugere, pelos quatro As do marketing: análise, adaptação, ativação e avaliação; e pelo marketing mix, ou composto mercadológico, formado pelos 5 Pês. Para Dolabela, além do marketing mix, são estratégias de marketing os serviços prestados ao cliente, o relacionamento com o cliente e o controle sobre o cliente.6 Como Richers mostra, os quatro As do marketing são formados pela análise, que consiste em se “compreender as forças vigentes no mercado em que opera a empresa”; a adaptação, “intuito de ajustar a oferta da empresa (linhas de produtos e/ou serviços) às forças externas detectadas através da análise”; a ativação, “conjunto de medidas destinadas a fazer com que o produto atinja os mercados prédefinidos e seja adquirido pelos compradores com a frequência desejada”; e a avaliação, que se propõe a “exercer controles sobre os processos de comercialização e interpretar os seus resultados.”7 O marketing mix (ou a mistura de marketing), seria a combinação de elementos variáveis que compõe as atividades de marketing, e que em geral são referidos como os 4 Pês: produto, preço, promoção e ponto de venda (ou praça de distribuição), sendo ampliado por alguns autores para 5 Pês (agregando o conceito de pessoas) ou 7 Pês (processo e evidência física – ou physical evidence).8 A identificação do marketing mix pode ser importante para a análise de como as instituições religiosas praticam formas distintas de planejamento estratégico religioso. Por dar maior sentido à minha análise e interpretação sobre o marketing de Jesus proposto pela BDN, me utilizo da noção de 5 Pês, convencionando pessoas como público. Assim, o produto é entendido como o objeto fabricado e tudo que se refere a ele, como formulação física, características, marca, design, embalagem (e também serviços); o preço, visto com seus possíveis descontos, formas e prazos de pagamento; o ponto de venda como o local ou canal de distribuição, com as tarefas necessárias para apresentar o produto ou o serviço ao consumidor; a promoção como as tarefas 6 DOLABELA, 1999, p. 150. 7 RICHERS, 1994, p. 20. 8 Ibidem, 1994, p. 21. O marketing mix também recebe referências de Jack Sissiors e Lincoln Bumba. SISSORS, BUMBA, 2006, p. 78. A obra é Planejamento de mídia: aferições, estratégias e avaliações. O conveito de 5 Pês é descrito por Bernard James Mullin, Stephen Hardy e William Anthony Sutton. MULLIN, HARDY, SUTTON; 2007, p. 412. A obra dos autores é Sport Marketing, volume 13. Sobre os 7 Pês, encontrei informações em LANCASTER; REYNOLDS, 2005, p. 41. A obra é Management of marketing. de comunicação que promovem o consumo (como as estratégias de midiatização e publicidade); e as pessoas, entendidas como o público consumidor destes produtos e serviços.9 No caso da BDN, o público é identificado por seus frequentadores, jovens de classe média e alta, do meio urbano e/ou litorâneo, atletas e fãs de reggae e rock n’roll, linkados à rede mundial de computadores; bem como por um público virtual indefinido, mas supostamente formado por indivíduos com características semelhantes às do público que frequenta a igreja, muitas vezes sendo o mesmo. Como produto comercializado pela igreja, temos alguns produzidos pela mesma, e outros adquiridos de empresas especializadas. Há adesivos para veículos, roupas masculinas, femininas e infantis, especialmente de skate wear e surf wear, adereços diversos, Bíblias, algumas adequadas aos surfistas, uma especialmente feita para a igreja, livros de teologia evangélica, DVDs e CDS gospel de gêneros lírico-musicais distintos, e também de pregações, dentre outros. O preço é identificado por suas formas diferentes de pagamento: dinheiro, cheque, crédito, débito, depósito bancário, e atrela-se à promoção, muitas vezes variando de unidade para unidade da igreja, e ao ponto de venda, dividido na Lojinha da Bola, espaço físico específico, e no Shopping da Bola, espaço virtual. O marketing de Jesus, no caso da BDN, vai se identificar nestas estratégias de levar o consumidor (em boa parte pertencente às classes econômica alta e média) a conhecer e adquirir mercadorias diversas através da Lojinha da Bola, do Shopping da Bola, de sua publicação impressa, a Crista, de seus sítios, da Bola TV, sua teledifusora, das rádios Bola Radio Extreme e Bola Radio Worship, e de sua canção gospel de reggae e rock n’roll. Avento, encerrando, a possibilidade de que uma das linhas de força em se identificar o marketing de Jesus ou outras formas de marketing religioso, esteja em conhecer um fenômeno que aponta para a identificação de nós mesmos como indivíduos que também midiatizam idéias, valores, marcas e instituições, e que, de 9 O termo marketing mix foi formulado por Jerome Mc Carthy na primeira edição de seu Basic Marketing, de 1960, desenvolvido por Neil H. Borden em seu artigo O Conceito do Marketing Mix (The Concept of the Marketing Mix) em 1965, e posteriormente popularizado por Philip Kotler em toda sua obra. McCARTHY; PERREAULT, 1996, p.73. A obra é Basic Marketing: a global-managerial approach. BORDEN, Neil H. The concept of the marketing mix. Journal of Advertising Research 4, June 1964: 2-7. modos diversos, também se midiatizam, espetacularizam e se colocam como produtos de consumo. Referências bibliográficas DOLABELA, Fernando. O segredo de Luísa. Uma idéia, uma paixão e um plano de negócios: como nasce o empreendedor e se cria uma empresa. São Paulo: Cultura, 1999. KOTLER, Philip. Princípios do Marketing. 7. ed. Rio de Janeiro: Prentice-Hall do Brasil, 1997. LANCASTER, Goffrey; REYNOLDS, Paul. Management of marketing. 2005. MARANHÃO FILHO, Eduardo Meinberg de Albuquerque. A grande onda vai te pegar: mídia, mercado e espetáculo da fé na Bola de Neve Church. Dissertação de Mestrado em História apresentada ao PPGH da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Florianópolis, SC: 2010. Orientação de Márcia Ramos de Oliveira e Artur Cesar Isaia. ______________________________________________. Neopentecostalismo de supergeração: o ciberespaço como chave para o sucesso neopentecostal. História Agora, Revista de História do Tempo Presente. Volume 10, dossiê Religiões e Religiosidades no Tempo Presente. 25 dez. 2010. RICHERS, Raimar. O que é marketing. Coleção primeiros passos, v.27, São Paulo, Brasiliense, 1994. Disponível na internet Bola de Neve Church. Disponível em: <www.boladenevechurch.com.br>. Acesso em: 10 dez. 2010.