DOENÇAS RARAS: a vida é uma jornada

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Edição N°002/2016
DOENÇAS RARAS: a vida é uma jornada
Geralmente são caracterizadas como doenças crônicas, graves e incapacitantes, nas quais a qualidade de vida é
comprometida. O enfrentamento de uma doença rara é rotineiro, mas com acesso à rede de atenção à saúde,
informação, esperança, esse desafio pode ser minimizado
29 de fevereiro é o dia mais
raro do ano. A data foi instituída
pela Eurordis (Organização Europeia para Doenças Raras) em
2008. O Rare Disease Day, em português, Dia Mundial das Doenças
Raras, é marcado por uma série
de atividades realizadas por associações de pacientes, em mais
de 70 países. Todas as atividades
têm como objetivo sensibilizar a
sociedade, governo, educadores,
profissionais da área da saúde,
pesquisadores e indústrias para
os desafios que os pacientes com
doenças raras enfrentam.
O tema definido neste ano pela
Eurordis foi “Voz do Paciente”,
cuja proposta é de empoderar as
pessoas que convivem com doenças raras. Nessa perspectiva,
existem diversas iniciativas de
dar voz ao paciente e provocar
as mudanças necessárias: garantir o cumprimento das políticas
de atenção à saúde por meio de
informação de seus direitos e
conscientização do seu permanente atendimento; aumentar
e melhorar a investigação das
doenças raras tendo como objetivo o diagnóstico precoce e a inclusão na rede de atendimento o
mais precoce possível; ampliar os
investimentos em atendimento
multidisciplinar, a igualdade de
acesso ao tratamento e cuidados
de qualidade; promover atividades de capacitação aos profissionais, pacientes e familiares; e
ampliar o conhecimento de novas tecnologias que possibilitem
maior inclusão social desde a
acessibilidade à própria comuni-
cação com uso de recursos mais modernos que ofereçam mais qualidade de vida aos pacientes.
Em Brasília, entre os dias 16 e 18 de fevereiro foi realizada a
I Jornada das Doenças Raras, organizada pelo Instituto Alta Complexidade Política & Saúde e o Observatório de Doenças Raras da Universidade de Brasília. As atividades abordaram assuntos da alta complexidade em saúde direcionados às pessoas com doenças raras, desde o
diagnóstico ao tratamento multiprofissional.
Durante as próximas edições do Política & Saúde – Alta Complexidade em Pauta abordaremos assuntos que afetam as pessoas
com diagnóstico de doenças raras, trazendo uma série de entrevistas
com especialistas e pacientes, haja vista que faz-se necessário conhecer e difundir as informações sobre o que é realizado em diversas
cidades do Brasil, e também de compartilhar as vivências de quem
tem uma doença rara, o enfrentamento, a superação e a expectativa
de melhorar a qualidade de vida. A conscientização sobre as doenças
raras deve ser permanente considerando grande número de pacientes
no Brasil, estimado em 16 milhões e o nível de complexidade que
envolve o atendimento dos pacientes e familiares.
Foto: Francisco Aragão
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
Políticas Públicas
C
erca de 16 milhões de pessoas são diagnosticadas
com alguma doença rara
no Brasil, segundo dados da Organização Mundial da Saúde
(OMS), estima-se que existam entre 6 a 8 mil doenças raras, sendo
que 80% têm origem genética e
para apenas 7% há medicamento
disponível. O conceito de doença
rara utilizado pelo Ministério da
Saúde é o mesmo recomendado
pela OMS, ou seja, é a doença que
afeta até 65 pessoas em cada 100
mil indivíduos ou 1,3 mil para
cada 2 mil pessoas.
O Ministério da Saúde criou
a Política de Atenção Integral
às Pessoas com Doenças Raras
no Sistema Único de Saúde que
institui os incentivos financeiros,
a Portaria N°199/2014, uma
política construída a partir de
mobilizações realizadas por associações de pacientes, diálogos
com autoridades, especialistas
da área de saúde e universidades. Essa Portaria tem como
objetivos: reduzir a mortalidade, a melhorar a qualidade de
vida das pessoas, por meio de
ações de: promoção, prevenção,
detecção precoce, tratamento
multiprofissional e cuidados paliativos, acesso aos direitos previdenciários e sociais.
A política foi estruturada em
dois eixos macro: Eixo I (composto pelas doenças raras de
origem genética e organizado
nos seguintes grupos: anomalias
congênitas ou de manifestação
tardia; deficiência intelectual; e
erros inatos de metabolismo), e
o Eixo II (composto por doenças
raras de origem não genética e
organizado nos seguintes grupos:
infecciosas; inflamatórias; e autoimunes). Para cada eixo foram
definidas as funções, os critérios
Custeio a equipes
Serviços de Atenção Especializada em Doenças Raras
Incentivo financeiro - R$ 11.650,00/ por equipe
Equipe mínima (Médico, Enfermeiro e Técnico de Enfermagem)
Habilitação de mais - R$ 5.750,00
Máximo de cinco serviços por estabelecimento
Inclusão de mais um profissional médico por serviço
Serviços de Referência em Doenças Raras
Incentivo financeiro - R$ 41.480,00 por equipe.
Equipe mínima (Médico, Enfermeiro e Técnico de Enfermagem,
Geneticista, Neurologista, Psicólogo, Assistente Social e outros
conforme o perfil do serviço).
de encaminhamento e interfaces tais como: avaliação clínica para
recomendadas em cada nível de diagnóstico de doenças raras
atenção, que incluem a Atenção (anomalias congênitas, deficiênBásica, a Atenção Domiciliar e a cia intelectual, erros inatos do
Atenção Especializada (ambu- metabolismo), aconselhamento
latorial e hospital, Centros Es- genético, análise de DNA, idenpecializados em Reabilitação e tificação de alteração cromossHabilitação (CER) e Serviços de ômica, dosagem quantitativa de
Aconselhamento Genético).
aminoácidos, ensaios enzimátiDois anos após a implanta- cos e outros.
ção da Política de Doenças RaOutro andamento da Política
ras, algumas ações já estão em de Doenças Raras são Protocolos
andamento na pasta da Saúde. Clínicos e Diretrizes TerapêutiUm desses avanços é a habili- cas (PCDTs). Atualmente a pasta
tação dos serviços especializa- possui 36 protocolos já estabeledos e serviços de referência em cidos e até o final de 2018 serão
doenças raras, cuja efetividade mais 47. Os PCDTs são documendepende inicialmente da partici- tos elaborados com o objetivo
pação dos gestores das unidades de nortear as ações dos profisde atenção especializada.
sionais de saúde na triagem,
Na prática, essa habilitação diagnóstico, tratamento e acomsignifica que o centro estará cre- panhamento de pacientes.
denciado junto ao MinistéConsulta pública
rio da Saúde
e
receberá
A Comissão de Nacional de Incorporação de
recursos esTecnologias no SUS (Conitec) prorrogou o prazo até
pecíficos para
o dia 11 de março para que a sociedade participe da
realizar esse
enquete de atualização dos Protocolos Clínicos e
atendimento,
Diretrizes Terapêuticas (PCDTs) publicados em
no custeio das
2012 e 2013. Os PCDTs são documentos elaboraequipes mínidos com o objetivo de nortear as ações dos profismas e tamsionais de saúde na triagem, diagnóstico, tratamento
bém os proe acompanhamento de pacientes.
cedimentos de
A enquete está disponível em: http://conitec.gov.br/
index.php/enquetes
diagnóstico,
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
O
IFF é o primeiro Centro de Referência
habilitado em Doenças Raras
Instituto Fernandes Figueira
(IFF/Fiocruz) tornou-se em
2015 o primeiro Centro de
Referência de Atenção às Pessoas
com Doenças Raras no Estado do
Rio de Janeiro. A expertise foi apresentada durante a I Jornada das
Doenças Raras, em Brasília, pelo
médico geneticista e coordenador
do Centro de Genética Médica &
Centro de Referência para Doenças
Raras do IFF, Dr. Juan Llerena.
O especialista apresentou uma
estimativa do número de pessoas
atendidas no serviço anualmente
que são de 1.500 pacientes, por exemplo, no grupo de anomalias congênitas. Esse total terá um impacto
orçamentário anual de R$ 4,8 milhões. O valor é semelhante para o
grupo de pacientes com deficiência
intelectual. Para o grupo de Erros
Inatos do Metabolismo e aconselhamento genético o montante é
de R$ 250 mil, e o custeio a equipe
chegará a um valor de R$ 497 mil.
Em um ano, o investimento do governo federal será mais de R$ 10
milhões de reais.
Com a Portaria N°199/2014, o
IFF torna-se habilitado e é facultado
a ele a solicitação de exames para
diagnóstico previamente listados
na Tabela de Serviços e Procedimentos do SUS. “Os tipos de exames
são bastante sofisticados, incluindo
análise do DNA, avaliações bioquímicas e estudos utilizando a última geração das varreduras genômicas (CGH-array)”, explicou Dr. Juan
Llerena.
De acordo com o Dr. Juan, a habilitação do IFF vem num momento
oportuno, isso porque a Portaria
permite ter um financiamento
extra-orçamentário, sem o qual o
Instituto não conseguiria oferecer
uma série de procedimentos aos
pacientes. “A habilitação em si não
passa tanto pelo campo da saúde,
passa mais pelo campo do planejamento, porque para a habilitação
em si, as equipes mínimas, pode se
formar por três profissionais. Essa é
prerrogativa da Portaria. Entretanto, a barreira maior é institucional
porque você precisa estar em dia
com muitos alvarás, vigilância sanitária, bombeiros, estrutural, de cadastro de todos os profissionais que
fazem parte da equipe mínima, cadastrado nas sociedade”, avalia.
Além da habilitação, o geneticista
comentou sobre um novo projeto
do IFF que trata sobre o sequenciamento do Exoma. “É uma nova forma
de sequenciar genes, mas tem uma
grande vantagem que ele sequencia
todos os genes simultaneamente, e
você faz a análise daqueles genes
que lhe interessa, diferentemente
do método anterior que era gene
por gene”, explicou.
O Exoma é aplicado de forma
objetiva, onde você tem uma genética de múltiplos genes, relacionados a um único fenótipo, e o inverso
também, muitos fenótipos associados a um gene alterado. O Exoma faz
a análise do DNA como um todo, que
é a região essencial para produção
de proteínas. Dr. Juan explica que
esse projeto tem a finalidade de
“selecionar a capacidade dos pacientes dentro dessa via celular que
é composta, de múltiplos genes e
fenótipos. Já no segundo momento
você vê todas as questões técnicas
envolvendo o que pode encontrar
num indivíduo, através do Exoma.
De um modo geral, vamos conseguir
responder algumas questões técnicas, clínicas e qual o custeio para
o SUS dentro de um centro de referência”.
Sequenciamento do Exoma
Define-se como Exoma a parte do genoma humano que
contem sequências funcionais do DNA que instruem
a fabricar proteínas essenciais ao seu funcionamento
normal; essas regiões são denominadas exons. Apesar
do Exoma representar 3% do total do genoma de um
indivíduo, sabe-se que a maioria dos erros genéticos
que ocorrem nas sequências de DNA, levando a doenças genéticas, são localizados no Exoma. Assim sendo,
o SE é considerado um método eficiente de analise do
DNA de uma pessoa visando detectar a causa genética de doenças e deficiências.
Adicionalmente, o SE inclui uma investigação do DNA mitocondrial, também relacionado a problemas clínicos. Fonte: Llerena, 2016
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
Atendimento em doenças raras no DF
A capital federal foi a primeira unidade no Brasil a ter uma
Coordenação Técnica de Doenças Raras no âmbito da Secretaria de Estado de Saúde do DF.
A unidade, criada por meio da
Portaria Nº 39, publicada no
Diário Oficial do DF em 5 de
março de 2013, atende a uma
demanda social antiga de pessoas com diagnóstico de doenças
raras.
A coordenação sistematiza
o atendimento multidisciplinar
dos pacientes que buscam os
serviços especializados da rede
pública. O modelo adotado no
DF possibilita aos pacientes a
condição de atendimento especializado e integrado favorecendo seu acesso aos meios de diagnóstico e tratamento.
Os pacientes com doenças
FIQUE POR DENTRO
Café com
cromossomo
O Núcleo de Genética da SESDF promoverá uma série de encontros mensais em 2016 com
profissionais de saúde para
discutir aspectos clínicos e acompanhamento de pacientes atendidos
com doenças genéticas pela rede.
Local: Auditório do Hospital de
Apoio de Brasília
Datas: 07/03; 04/04; 02/05; 06/06;
04/07; 01/08; 05/09; 10/10; 07/11
e 05/12
Horário: 14h às 18h
Inscrições: [email protected]
*Programação disponível no site do
Alta Complexidade:
www.altacomplexidade.org
raras buscam a rede hospitalar,
principalmente por meio dos
ambulatórios de genética clínica,
mas também da neurologia, cardiologia, hematologia e nefrologia de maneira isolada.
Além da coordenação de
Doenças Raras, a rede de saúde
do DF tem outras iniciativas pioneiras no país, desde 2012, a
rede disponibiliza o teste de triagem neonatal ampliado, único no
sistema público do país a oferecer a triagem de 30 doenças raras,
o que permite o diagnóstico precoce de patologias, como: Aminoacidopatias, Hipotireoidismo
Congênito, Anemia Falciforme
e outras hemoglobinopatias e
Hiperplasia Adrenal Congênita.
Conheça os locais que oferecem atendimento para os pacientes
em Brasília:
Rede Sarah
Serviço: Atendimento ambulatorial especializado nas áreas de Genética, Neurologia, Ortopedia, avaliação clínica, realização de exames e
aconselhamento genético.
Informações: (61) 3319 1111 ou http://www.sarah.br/especialidades/rede-genetica-medica/
Hospital Universitário de Brasília (HUB)
Serviço: Atendimento ambulatorial especializado nas áreas de Genética, Pneumologia, Dermatologia, Nefrologia, Reumatologia e outros.
Informações: (61) 2028-5210 ou http://www.ebserh.gov.br/web/
hub-unb/consultas-e-exames
Hospital da Criança de Brasília
Serviço: Atende pacientes com doenças raras de caráter hereditário
ou esporádico, o que inclui pacientes com malformações genéticas,
baixa estatura, deficiência intelectual, erros inatos do metabolismo,
entre outras.
Informações: (61) 3025-8350 ou www.hcb.org.br
Núcleo de Genética – SES-DF (NUGEN)
Serviço: Atende pacientes com doenças raras de caráter hereditário
ou esporádico, o que inclui pacientes com malformações genéticas,
baixa estatura, deficiência intelectual, erros inatos do metabolismo,
entre outras. O atendimento acontece em diversos hospitais da SESDF, principalmente no HAB (Oncogenética, Fenda Neuromuscular e
Genética Infantil Ambulatorial), HBDF (Genética) e HMIB (Erros Inatos do Metabolismo, Genética Infantil e Reprodução Humana).
Informações: (61) 3905-4681 (HAB) ou (61) 3445-7544/7640
(HMIB) ou [email protected]
Centro de Referência em Doenças Neuromusculares –HRAN
Serviço: Atende cerca de 18 doenças neuromusculares, e inclui profissionais de Neurologia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Pneumologia,
Terapia Ocupacional. O agendamento de consultas é feito por telefone.
Serviço: (61) 3325-4219
Fonte: Observatório de Doenças Raras da UnB
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
Dê voz ao paciente!
O Alta Complexidade Política & Saúde entrevistou algumas pessoas que convivem com as doenças
raras. Depoimentos que falam de esperança, dos enfrentamentos diários, dos cuidados necessários
para garantir a manutenção da vida, mas que nesse itinerário também enfrentam o descaso na falta
de assistência à saúde, mesmo quando esse direito é garantido judicialmente.
J
osefa Josiene é mãe de João
Paulo diagnosticado com a síndrome de Moebius, a doença é
rara e causa a paralisia craniofacial.
Durante mais de sete anos a família
conviveu com o ambiente de UTI Unidade de Terapia Intensiva, pelo
fato de a criança depender de ventilação mecânica, terapia nutricional
enteral, além de cuidados e monitoramento permanente pela equipe
de saúde. Mas devido a uma melhora no quadro clínico, a criança tinha
possibilidades de ir para a residência, que é possível por meio de um
programa do Ministério da Saúde,
Melhor em Casa.
A mãe relatou durante o Evento
a saga para conseguir o direito a internação domiciliar ela teve todos
os direitos negados. “Na época em
que busquei o acesso à justiça, o juiz
disse-me que melhor lugar era para
o meu filho seria ficar no hospital.
Tive de recorrer novamente à De-
fensoria Pública e hoje o João Paulo
está em casa. É uma outra realidade,
pois no hospital ele é o paciente com
Moebius, e no lar é o meu filho”.
Danilo tem o mesmo diagnóstico da síndrome de Moebius que
afeta João Paulo, mas ele é considerado ainda mais raro pela ótica da
medicina, isso porque a doença não
apresenta tantas manifestações clínicas.
“Moebius é conhecida como a doença
da máscara, pois você
não tem expressão facial, ou é a síndrome
sem sorriso, porque
você também não consegue sorrir. Pra mim
é pouco impercebível,
porque é só de um
lado da face. Hoje eu
tenho uma vida normal, trabalho como
professor de inglês e
faço o curso de Terapia Ocupacional na UnB da Ceilândia. Entrei para
esse curso justamente pelo que passei a vida inteira e o aprendizado
que tive na Rede Sarah. Falar que
é fácil não é, porque você se sente
diferente tendo uma doença rara,
mas você consegue superar as dificuldades e vencer. Pra mim, entrar
na UnB foi uma superação”.
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
O
utro obstáculo para quem
tem diagnóstico de uma
doença rara é a restrição
alimentícia, sobretudo para quem
tem Erros Inatos do Metabolismo
(relacionados ao metabolismo das
proteínas). Esse grupo de pacientes
necessita de alimentos para fins especiais, mas o enfrentamento é na
dispensação dessa dieta pelo SUS e
a redução de impostos federal, pois
muitos desses alimentos não são co-
mercializados no Brasil, entretanto,
são alimentos de custo mais elevado e de difícil acesso à maioria das
famílias. É que relata Aldair Pereira
é mãe de paciente com diagnóstico
de Fenilcetonúria (doença genética
causada pela ausência ou pela diminuição da atividade de uma enzima do fígado, que transforma a
fenilalanina - aminoácido presente
nas proteínas em outro aminoácido
chamado tirosina).
Para Aila Dantas, diagnosticada
com Xantomatose Cerebrotendínea
(um doença do grupo dos Erros
Inatos do Metabolismo, caracterizada pela deficiência de 27-hidroxilase hepática, levando ao acúmulo
de colestanol e colesterol), a angústia de viver com uma doença rara é
o cumprimento das decisões judiciais no fornecimento de um fármaco
que permite o controle e os avanços
da doença.
A advogada descobriu a doença tardiamente. Os sintomas
começaram ainda na adolescência,
aos 14 anos, aos 23 teve um agravo
e foi submetida a uma cirurgia para
a retirada de tumor no tendão de
Aquiles. Somente aos 26 anos concluiu o diagnóstico, mas diante do
desconhecimento dos médicos, a
sensação segundo ela foi de estar
numa sala escura.
“Não sabia a quem procurar,
ninguém conhecia e nem tinha nem
ouvido falar. Até que fui a um posto
de saúde e me encaminharam para
o Hospital de Base. Hoje eu
uso um ácido que consegui
há quatro meses e o meu
processo durou três anos e
meio, a decisão foi favorável a
mim. No entanto, a cada seis
meses eu passo uma angústia muito grande porque não
tenho a certeza de que meu
remédio vai chegar a tempo.
Eu consigo ver uma melhora na minha dosagem de
Colestanol, meu equilíbrio já
melhorou bastante, mas fico
na incerteza da continuidade
do tratamento”, relatou.
Diante do descaso enfrentado pelo governo, o futuro
para Aila é angustiante. “A falta de assistência do governo tanto
federal quanto distrital é enorme,
porque eles falam que vão dar o
remédio, mas não tem uma preocupação com a continuidade e com o
tratamento do paciente, de dar uma
boa qualidade de vida. A justiça de
não fazer de forma mais efetiva o
Onde está o direito humano?
“A nossa grande dificuldade é
com o acesso a essa alimentação
para os pacientes, pois não tem a
comercialidade no País, e a gente
que é mãe sofre por ver que o nosso
filho não pode comer de tudo. Aqui
a gente faz o contrabando do bem,
ou seja, quando alguém viaja pra
fora, a gente encomenda os produtos para os nossos filhos, como biscoito, macarrão e farinha. A nossa
luta é grande. Queremos incluir
esse alimentos no SUS e fazer que
o governo entenda que é uma necessidade”.
Atualmente existe um grupo de
Mães Metabólicas na rede de relacionamento do Facebook que coordenam uma campanha Alimentos
Hipoproteícos Já, cujo objetivo é de
dialogar com o Ministério da Saúde
para a inclusão desses alimentos
para fins especiais nos protocolos
clínicos, e numa perspectiva de incorporação de novas tecnologias,
fazer com que esses itens estejam
padronizados e disponíveis no SUS
para os brasileiros.
cumprimento das decisões, a gente
fica refém do governo. Ser raro é
viver com medo todos os dias, de
não saber o que vai acontecer com
você pela falta de assistência. Falta
vontade do governo auxiliar a gente
a ter uma vida digna e melhor”.
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
Vida e esperança
A
história de Cinthia Coutinho
é um conjunto de luta e superação. Aos 16 anos, os planos foram interrompidos abruptamente. O começo foi bem difícil, os
planos já estavam em andamento.
Tocava violão e guitarra e já estava
tudo acertado para entrar numa
banda de meninas, mas o projeto
foi frustrado quando recebeu o diagnóstico de Ataxia de Friedreich,
(uma doença neuromuscular multissistêmica, ou seja, afeta vários
Quem também viveu um momento de quebra de paradigmas
e mudança no curso da vida foi
Shara Cunha. Durante toda a
gestação, havia sinais de que o
bebê precisaria de cuidados especiais por toda a vida – como o
descolamento de placenta no segundo mês e polidramnia no sétimo mês, mas o diagnóstico veio
quando Pedro Henrique nasceu.
sistemas do corpo humano, definida
pela incapacidade de realizar movimentos finos, precisos e coordenados). Mesmo com essa quebra de
sonhos, ela continuou a vida, fez o
curso de Pedagogia e almeja seguir
a carreira de orientadora profissional.
“Ter uma doença rara é difícil,
porque infelizmente a maioria delas
não tem cura. Ter um diagnóstico
aos 16 anos de idade e saber que
você só vai piorar é impactante para
a vida de qualquer pessoa. A
O pequeno tinha Treacher Collins,
um distúrbio de caráter genético
autossômico, que se caracteriza por
deformidades craniofaciais. A mãe
conta que teve o primeiro impacto
ao receber o diagnóstico e de ver
pela primeira vez uma criança com
malformação, traqueostomizada e
gastrostomizada. Após, o choque
aceitou a condição do filho de ter
a doença rara e o amor de mãe, incondicional, falou mais alto.
Até o dia de vir para a casa, a
criança passou pela internação
na Unidade de Terapia Intensiva
de 45 dias, sendo 15 com ventilação
mecânica, e mesmo precisando de cuidados especiais, a criança passou pela
desospitalização e teve direito a uma
internação domiciliar. Shara conta que
a chegada do bebê em casa foi diferente do que a primeira gravidez ou de
qualquer outro recém-nascido. “Pedro
foi para a casa num bebê conforto, mas
dentro de uma ambulância e a recep-
mudança de vida que a gente tem é
total. A gente muda a rotina da casa,
muda a vida das pessoas que estão
a nosso lado. É difícil, mas dá para
conviver, por mais depressiva que
eu fiquei, nunca quis parar a minha
vida por causa da doença. Se é com
a doença, então vamos caminhar”,
conta.
Para o futuro, as expectativas
de Cinthia são muitas, e uma delas
é voltar ao mercado de trabalho.
“Fui aposentada aos 23 anos de
idade pela doença, aí cheguei a ir ao
INSS e ela me disse que seria bom
que eu passasse num concurso para
depois desaposentar. É complicado
trabalhar e ter uma doença crônica,
pois tem dia que estou bem, mas
tem dias que sinto dores e não durmo bem. Trabalhar de carteira
fichada é complicado, nem sempre
o empregador vai entender a nossa
necessidade, vamos ser taxados de
irresponsáveis, como preguiçoso,
na verdade é que o nosso desagaste
é diferente de outra pessoa. Quanto ao futuro, não penso que minha
vida vai ser breve. Espero construir
uma família, eu sou uma pessoa feliz, tenho meus dias tristes, mas eu
ganho em outras áreas”.
ção em casa, também foi diferente, o
quarto era de uma criança, mas tinha
balão de oxigênio, equipamentos e a
presença de profissionais de saúde”.
Uma adaptação difícil, porém, de fácil
superação, quando o amor impera.
“Eu o aceitei do jeito que ele é, e o
Pedro veio para nos ensinar o que é
viver. A doença afeta a parte craniofacial, mas não afeta o cognitivo. Ele
é muito esperto, muito inteligente, e
desde o nascimento, o diagnóstico só
foi de melhoras. E agora no próximo
mês de março temos a expectativa de
que vai tirar a traqueostomia e fará
algumas cirurgias ao longo da vida,
mas vai ter uma vida normal. E nossa
mensagem é que as forças de outros
pais que tem bebês com síndromes é
que possam acreditar que essas crianças são especiais e tem tudo para
ser feliz. Vai depender de cada pai
e de cada mãe, porque o principal
ponto para elas sobreviverem é ter o
amor. Ele supera todas as coisas”.
[ ESPECIAL: I JORNADA DAS DOENÇAS RARAS ]
Universidade de Brasília lança aplicativo para doenças raras
Com o propósito de oferecer apoio a profissionais
de saúde no cuidado e tratamento de pacientes com
doenças raras em um único
local, o Observatório de
Doenças Raras da Universidade de Brasília apresentou
a comunidade o mais novo
projeto, o RarasNet, um
aplicativo mobile para divulgação de informações sobre
doenças raras.
O app é inédito no Brasil
e busca fornecer aos profissionais de saúde, pacientes,
associações civis e público
em geral, uma plataforma
nacional de informações sobre doenças raras, com orientações de saúde, informações
sobre centro de referências e
especialistas, dados de pesquisa
e base de dados bibliográfica nacional, servida por aplicativos
web e mobile (Android). O pro-
EXPEDIENTE
jeto é patrocinado pelo Ministério da Saúde/SGTEs, Rede Nacional de Ensino e Pesquisa,
NESP e CAPES e teve como modelo a iniciativa europeia, a Orpha.Net (www.orpha.net).
“O Raras.Net traz informações a pacientes
e a profissionais de
saúde que, até então,
ficavam espalhadas e,
algumas vezes, inacessíveis. A plataforma
mapeou diagnósticos,
centros de atendimentos, nome e especialidade de médicos de
todo o país, além de
protocolos sobre tratamento de mais de 5 mil
doenças graves. A motivação encontrada para a criação do aplicativo surgiu em 2013, quando
o projeto teve início, motivado
pelo desencontro e a fragmentação de conhecimento do assunto,
inclusive entre profissionais”, comenta o coordenador do Rede
Raras Prof. Dr. Natan Monsores.
Nesta fase inicial,o programa
pode ser baixado pela internet
– https://goo.gl/Zplt1K – e funciona de forma demonstrativa,
wa partir de um cadastro, com
acesso mais amplo a profissionais de saúde. Em breve, o app
estará disponível para download
em celulares e possibilitará que
o paciente pesquise sobre doenças e sintomas.
Política & Saúde é um periódico elaborado pelo Instituto Alta Complexidade Política & Saúde. Conteúdo informativo e
educativo sobre Alta Complexidade em saúde, políticas públicas e universo da pessoa com deficiência.
Presidente: Sandra Mota
Jornalista Responsável: Hulda Rode (DRT DF N°8610/2010)
E-mail: [email protected]
Site: www.altacomplexidade.org
Permitida a reprodução do conteúdo, desde que citada a fonte.
Créditos fotográficos: © Alta Complexidade Política & Saúde 2016
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