Utilização de medicamentos por pacientes ambulatoriais do setor

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Revista Expressão Católica 2012 jan-jun; 01(1)
UTILIZAÇÃO
DE
MEDICAMENTOS
POR
PACIENTES
AMBULATORIAIS DO SETOR DE TRAUMATOLOGIA NO
HOSPITAL MUNICIPAL DE QUIXADÁ (CE), DESPROVIDOS DE
ATENÇÃO FARMACÊUTICA
Fabrício Saldanha de Aquino
Luciana Macatrão Nogueira
Tiago Moreira de Olinda
RESUMO
A atenção farmacêutica surgiu da necessidade de orientação da população após o
advento da indústria farmacêutica no último século. O presente estudo objetiva
avaliar o uso de medicamentos prescritos em um setor de traumatologia a pacientes
ambulatoriais desprovidos de atenção farmacêutica no setor de traumatologia do
Hospital Dr. Eudásio Barroso, do município de Quixadá - Ceará. Para isto, foi aplicado
um questionário baseado em duas abordagens a tais pacientes, uma logo após a
consulta médica e outra no final do tratamento medicamentoso, para que
pudéssemos estabelecer o perfil dos mesmos e os aspectos relacionados à terapia
medicamentosa. Assim, verificamos que grande parte dos usuários do serviço de
traumatologia ligado ao SUS é composta de adultos jovens (26,5%), fato associado às
atividades desenvolvidas por este grupo. Verificamos ainda que muitos carecem de
orientação profissional com relação ao uso de medicamentos (85%), uma vez que
grande parte de nossa amostra demonstrou estar propensa a interações
medicamentosas (70%), reações adversas e outros problemas relacionados a
medicamentos (PRM’s), já que grande parte é constituída de adeptos da polifarmácia
e da automedicação. Neste trabalho, ainda foram analisados outras informações tais
como número de medicamentos na prescrição, via de aquisição, adesão ao
tratamento e fatores socioeconômicos. Concluímos que a atenção farmacêutica é
essencial para o desenvolvimento de uma terapia medicamentosa efetiva e segura,
contudo, políticas de saúde mais eficazes devem ser implementadas.
Palavras-chave: Medicamentos; PRM; Atenção farmacêutica.
ABSTRACT
The pharmaceutical care came out from the necessity of guidance of the population
after the rising of the pharmaceutical industry in the last century. The object of this
study was to evaluate the prescriptions of drugs to patients that for whom were not
offered pharmaceutical care in the field of traumatology at the hospital Dr. Barroso
Eudásio at the city of Quixadá- Ceará. To reach so, a questionnaire was used as a tool
in two different stages of clinical treatment: first the questionnaire was applied just
after the medical examination, and the second just after the end of the medical
treatment. These proceeds intended to establish the profile of the patients and
evaluate other aspects of the therapy. It could be verified that the major part of the
patients assisted at the traumatology service attached to the SUS was composed of
young adults (26,5%), fact associated to their daily activities. It was also noted that
many patients feel a lack of professional guidance in what concern the use of drugs
(85%). A great part of the sample analyzed showed a tendency to pharmacological
interactions (70%), side effects and other problems associated to the use of drugs
once the majority of the patients normally use many medicines at the same time and
also related the practice of self-medication. In this study were analyzed information
such as quantity of prescribed drugs, acquisition pathways and socioeconomics
features. As a conclusion we stressed the importance of pharmaceutical attention at
the development of a safe drug therapy. To accomplish that effective healthy politics
need to be carried out.
Keywords: Drugs; PRD; Pharmaceutical Care.
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1 INTRODUÇÃO
Desde os tempos mais remotos, o ser humano tem
se deparado com os mais variados tipos de problemas
ligados a fatores sociais, psicológicos ou naturais. Dentre
esses males, podemos destacar a reação do organismo
frente a agressões e outras situações capazes de
provocar debilidades, com a manifestação de sinais e
sintomas, tal como a dor. Assim, a utilização de
medicamentos é um processo social controlado por
inúmeras forças, sendo o desejo de um melhor cuidado
com a saúde apenas uma delas (VANCE; MILLINGTON,
1986). Neste sentido, ao longo dos tempos, o homem
vem buscando meios e instrumentos das mais variadas
origens (animal, vegetal, mineral ou místico-religiosa),
para por fim a tais males, como nos indicam muitos dos
antigos registros históricos da China, antigo Egito,
Suméria e Grécia (SCHOSTACK, 2004).
Na atualidade, os medicamentos representam
grande importância nos sistemas de saúde de todo o
mundo, seja prevenindo, protegendo, preservando ou
recuperando a saúde. No entanto, inúmeros fatores, tais
como os altos custos e a elevada incidência de
morbimortalidade associada ao uso de substâncias
representam um dos grandes desafios à saúde pública.
Neste sentido, a Organização Mundial de Saúde
recomenda a adoção de uma política nacional de
medicamentos composta de diretrizes, entre as quais se
destaca o papel da informação como meio essencial à
prescrição e ao uso racional de medicamentos. Desde a
década de 1940, com o advento da indústria
farmacêutica e a introdução em larga escala e, de modo
contínuo, de novos medicamentos, houve uma “explosão
de informações” acompanhando o surgimento dos
mesmos. Porém, nem sempre essas informações eram
imparciais e de boa qualidade para orientar o consumo
dos mesmos (VIDOTTI et al., 2003).
Eraker (1984) afirma que a não adesão ao
tratamento medicamentoso pode ser uma das razões
pelas quais medicamentos reconhecidamente eficazes
sob condições controladas resultam ineficazes quando
utilizados na prática clínica habitual. Estudos realizados
em diversos países indicam que 50% a 60% dos pacientes
que recebem uma prescrição não cumprem o tratamento
estabelecido pelo médico e muitos o interrompem
quando se sentem melhores. É neste sentido que se
percebe o importante papel da orientação no que diz
respeito a obedecer à terapia prescrita, orientação esta
muitas vezes ligada apenas a uma melhor
conscientização da importância de se seguir
corretamente a prescrição.
Apesar da informação acerca dos medicamentos
constituir condição básica para a adesão ao tratamento,
não se tem prestado atenção suficiente ao seu
fornecimento nas diversas situações de atendimento ao
paciente, incluindo a consulta médica e a dispensação do
medicamento em farmácias (SILVA et al., 2000).
Assim, percebe-se que a falta de informação a
respeito da doença e do tratamento, ou a não
compreensão
das
informações
recebidas
dos
profissionais de saúde, podem ser determinantes para a
não adesão involuntária do paciente ao tratamento,
conforme afirma Roizblatt et al. (1984).
É neste contexto que se insere a atuação do
profissional farmacêutico como orientador do uso de
medicamentos, através do mais novo caminho para tal
finalidade: a atenção farmacêutica.
Em tal processo, o farmacêutico analisa as reais
necessidades apresentadas pelo paciente relacionadas à
terapia medicamentosa, detectando os problemas
relacionados a medicamentos (PRM’s). Para tanto, de
acordo com Furtado (2001), o farmacêutico atende
diretamente, avalia e orienta em relação à
farmacoterapia prescrita pelo médico. Assim, observa-se
que a atenção farmacêutica está baseada no tripé
médico, farmacêutico e paciente (OLIVEIRA et al., 2002).
Tais atitudes têm por objetivos básicos promover,
sobremaneira, saúde, segurança e eficácia (PERETTA;
CICCIA, 2000). Porém, há ainda muitos obstáculos a
serem superados para o estabelecimento deste
programa, tais como o despreparo do profissional
farmacêutico na área clínica, o sistema de
comissionamento nas farmácias comunitárias e a
delegação de atividades burocráticas e gerenciais ao
farmacêutico, acabando por distanciá-lo do paciente
carente de orientação (OLIVEIRA et al., 2005).
Logo, percebe-se que a atenção farmacêutica é
essencial ao tratamento medicamentoso, mas, na
realidade, ainda está longe de ser implementada de
forma a demonstrar sua importância para a sociedade,
tal como afirma Oliveira (2005) em uma pesquisa
realizada no município de Curitiba, onde 92,1% dos
farmacêuticos entrevistados assumiram não possuir
nenhuma atividade relacionada ao tema.
Baseados nos dados apontados e na realidade
visualizada dentro das farmácias comunitárias, a situação
não representa um caso isolado podendo-se esperar
dados mais alarmantes em regiões desprovidas de
qualidade nos serviços de saúde como o interior
cearense, alvo de desenvolvimento do presente estudo.
É neste contexto que o presente trabalho busca
investigar os efeitos do uso de medicamentos entre
pacientes ambulatoriais do setor de traumatologia de um
hospital, uma vez que se admite ter o trauma atingido o
primeiro lugar como etiologia de morbimortalidade na
população de 0 a 39 anos de idade, sendo os custos
decorrentes do mesmo superior a 400 bilhões de
dólares. Vale ressaltar também alguns fatores como
salários não recebidos, gastos com assistência médica,
custos administrativos, destruição de propriedades,
perdas por incêndio, encargos trabalhistas e perdas
indiretas por acidentas de trabalho, compreendendo um
grave problema de saúde pública, que necessita de
medidas intervencionistas de caráter imediato (BRAGA-
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JÚNIOR et al., 2005). Pode se considerar a orientação e o
acompanhamento quanto ao uso de medicamentos,
através da atenção farmacêutica, um dos instrumentos
utilizados para diminuir custos relacionados à assistência
médica, no que concerne às diversas modalidades de
problemas relacionados a medicamentos (PRM’s). Além
disso, os estudos que correlacionam o uso de
medicamentos entre pacientes vítimas de trauma
músculo-esquelético são ainda bastante escassos.
Sendo assim, este trabalho tem como objetivo
avaliar os efeitos decorrentes do uso de medicamentos
prescritos por médicos em um município do Ceará
desprovido dos serviços de atenção farmacêutica a
pacientes ambulatoriais atendidos no setor de
traumatologia do Hospital Dr. Eudásio Barroso de
Quixadá (CE).
2 MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho baseou-se na coleta de dados,
a partir do acesso à prescrição de medicamentos de
pacientes ambulatoriais do setor de traumatologia do
hospital municipal de Quixadá, município localizado no
Sertão Central do Ceará, com prévio encaminhamento
médico de outras unidades de saúde, e após os mesmos
terem preenchido o termo de consentimento. Para
tanto, foi solicitada a autorização por parte da direção do
hospital e do médico plantonista. Os pacientes foram
convidados a participar voluntariamente da pesquisa,
mediante assinatura de termo de consentimento livre e
esclarecido, elaborado segundo as diretrizes e normas
regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres
humanos do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 1996).
Os dados foram coletados em um questionário
elaborado com base nos objetivos do presente trabalho e
dividido em duas partes, constituído de perguntas diretas
e subjetivas, relativas ao perfil dos pacientes e à
farmacoterapia prescrita, fornecendo aos pacientes
orientações relativas às questões abordadas. No total,
foram 110 questionários.
A primeira parte do questionário (abordagem
hospitalar) era preenchida logo após a saída do paciente
do consultório médico, apenas para os pacientes que
traziam consigo uma ou mais prescrições, quando então
eram colhidos os nomes e a posologia dos medicamentos
prescritos e alguns dados pessoais relevantes frente ao
projeto e que facilitariam o contato com o mesmo para o
preenchimento da segunda parte do questionário
(abordagem domiciliar), no final ou após o término do
tratamento, com o objetivo de detectar relatos de
reações adversas, interações medicamentosas, via de
aquisição do medicamento e outros PRM’s, bem como
verificar se o usuário recebeu ou sentiu carência de
alguma orientação profissional (tal como médico,
farmacêutico ou outro profissional de saúde) relativo ao
tratamento.
Durante a abordagem domiciliar, foram fornecidas
informações na tentativa de resolver possíveis dúvidas
quanto ao tratamento apresentadas pelos participantes
do presente trabalho.
Vale ressaltar que, em virtude do hospital onde se
realizou a primeira parte do trabalho atender toda a
população municipal e distrital, inclusive a população de
alguns dos municípios vizinhos, foi feita uma prévia
seleção no intuito de que todos os participantes do
estudo fossem residentes na própria cidade, a fim de
facilitar o contato com os mesmos de modo pessoal em
suas residências.
Assim, todo o estudo foi desenvolvido no período
de 03/02/2007 a 05/05/2007, sendo a primeira parte do
questionário (abordagem hospitalar) realizada às
quartas-feiras e aos sábados das 08 às 12 horas da
manhã. A abordagem domiciliar, como já exposto, foi
realizada no final ou término do tratamento.
Todos os pacientes que participaram do estudo
preencheram um termo de consentimento livre e
esclarecido e todos os protocolos da pesquisa seguiram
as diretrizes preconizadas na Resolução nº 196/96, do
Conselho Nacional de Saúde, que aborda o tema de
pesquisa com seres humanos. O projeto foi aprovado
previamente pelo Comitê de Ética e Pesquisa da
Faculdade Católica Rainha do Sertão.
3 RESULTADOS
Com relação aos dados que definem o perfil dos
pacientes, verificamos que 10% dos participantes tinham
entre 0-10 e 11-20 anos cada, 6,5% tinham de 21-30
anos, 26,5% entre 31-40 anos, 20% estavam na faixa dos
41-50 e 51-60 anos cada. Entre 61-70 anos eram 3,5%,
valor este igual para os que tinham acima de 70 anos.
Foi avaliado o grau de escolaridade dos pacientes e
podemos constatar que 33,5% possuíam o ensino médio
completo. Outros 33,5% não terminaram o fundamental;
26,5% possuíam o fundamental completo e 6,5% eram
analfabetos. Verificamos que, de todos os participantes,
50% eram casados, 40% solteiros e 10% viúvas. De
acordo com a Tabela 1, foi visto que 53,5% estavam
empregados, sendo metade deste total constituída de
trabalhadores informais. Os desempregados totalizaram
10%. Os aposentados eram 16,5%, enquanto 20% eram
estudantes.
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Tabela 1 - Distribuição dos pacientes (%) quanto à
ocupação (n = 110)
A grande maioria da amostra analisada foi
representada por indivíduos do sexo feminino, 63,5%,
enquanto 36,5% eram do sexo masculino.
Em relação à prescrição, verificamos que a 63,5%
dos pacientes foi prescrito um único medicamento e aos
demais, no total de 36,5%, foi prescrito dois
medicamentos (Figura 1). Do total de 110 prescrições
analisadas, verificamos a prescrição de apenas 17 tipos
diferentes de medicamentos, de acordo com o princípio
ativo de cada formulação.
Figura 1 - Prescrição
A Figura 2 mostra que 70,5% dos medicamentos
foram prescritos utilizando o nome comercial e 29,5%
pelo nome genérico.
Figura 2 - Gráfico da frequência (%) em que as
prescrições foram representadas (n = 110)
Na abordagem domiciliar, obtivemos os seguintes
resultados: 10% não haviam ainda começado o
tratamento, sendo que, deste total, 66,5% achavam o
tratamento desnecessário e 33,5 % não iniciaram o
tratamento por motivos econômicos (Tabela 2).
Tabela 2. Distribuição da frequência (%) das condutas
adotadas pelos pacientes no início do tratamento
medicamentoso prescrito (n = 110).
Não
10
Achou
66,5
iniciou o
%
desnecessário
%
tratamento
Motivos
33,5
econômicos
%
Iniciou o
90
tratamento
%
Com relação à via de aquisição, observamos que
7,5% adquiriram a medicação via SUS; 81,5% na farmácia
comunitária e 11% por outros meios, tais como
familiares e vizinhos que tinham o mesmo medicamento
prescrito em sua casa, como pode ser observado na
Figura 3.
Figura 3 - Distribuição (%) da forma de aquisição aos
medicamentos (n = 110).
A Tabela 3 demonstra que 23,5% assumiram não
ter seguido o tratamento conforme a prescrição, sendo
os principais motivos o esquecimento do horário de
administração, representando 71,5% do total, seguidos
de por perca do medicamento (10%) e por achar
desnecessário (19,5%).
Tabela 3. Distribuição quanto ao cumprimento da
terapia conforme prescrição ou orientação médica
pelos pacientes (n = 110).
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Quanto ao surgimento de reações adversas,
verificamos que 41% dos pacientes relataram o
surgimento de uma ou mais reações, tais como sialorréia,
náuseas, azia, tonturas, disritmias e diarréia (Figura 4).
Outros 30% faziam uso concomitante com outros
medicamentos em especial antiinflamatórios e antihipertensivos (Figura 5). Uma parcela de 18,5% dos
participantes do presente trabalho relatou ter
compartilhado o medicamento prescrito com outras
pessoas (Figura 6).
Figura 6 - Gráfico da frequência (%) quanto ao
compartilhamento ou não do(s) medicamento(s)
prescrito(s). (n = 110)
Figura 4 - Gráfico da frequência (%) quanto ao relato de
reação adversa (n= 110)
Figura 5 - Gráfico da representação (%) do uso
concomitante com outros medicamentos (n = 110)
Com relação ao fornecimento de orientações
relativa ao tratamento, 77% dos pacientes relataram ter
recebido alguma informação, todas por parte de
balconistas, sendo desconsiderados, visto que estes não
podem ser considerados profissionais legalmente
habilitados para tal finalidade de modo isolado. Todos os
participantes afirmaram não ter recebido nenhuma
orientação profissional além da fornecida pelo médico
prescritor no ato da consulta.
A grande maioria dos participantes, quando
conscientizados de como seria a verdadeira orientação
profissional, relataram ter sentido necessidade da
mesma, totalizando 85% (Figura 7).
Figura 7 - Gráfico da frequência (%) quanto ao
sentimento de necessidade pelos pacientes, do
atendimento profissional (n = 110)
Tabela 4 - Lista de medicamentos prescritos
Classe terapêutica
Medicamento
Antiinflamatórios/
Ibuprofeno, diclofenaco de
analgésicos/
sódio, diclofenaco de
imunossupressor
potássio, nimesulida,
paracetamol, dipirona,
dexametasona, aceclofenaco,
ácido acetilsalicílico,
piroxicam
Antibióticos
Cefalexina, amoxicilina,
ciprofloxacino
Gastroprotetor/
Omeprazol
antiulceroso
4 DISCUSSÃO
Conforme se pôde observar, a maioria dos
pacientes atendidos e que receberam pelo menos uma
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prescrição contendo de um a dois medicamentos, eram
adultos jovens, principalmente na faixa dos 31 aos 40
anos de idade, fato este também visualizado por Bertoldi
(2005), ao analisar a prevalência e os determinantes
individuais ligados a utilização de medicamentos em
adultos. Porém, esse achado está em desacordo com o
obtido por Braga-Júnior (2005), ao realizar estudo em
uma emergência traumatológica de um dos principais
hospitais de Fortaleza, onde a maioria dos pacientes
atendidos, vítimas de trauma músculo-esquelético, eram
adolescentes e jovens na faixa de 12 a 22 anos. No
entanto, tal desacordo pode ser justificado pelo fato do
presente estudo ter sido desenvolvido no setor de
traumatologia de um hospital que realiza atenção à
saúde em nível secundário, destinando os casos mais
graves a um hospital de nível terciário. Dessa forma, o
hospital restringiu-se a atender casos mais básicos de
trauma músculo-esquelético, que são mais comuns em
adultos jovens, visto as atividades desenvolvidas por essa
parcela da população a predispõe a riscos mais elevados
de trauma.
Analisando o grau de escolaridade, verificamos que
uma parcela expressiva de nossa amostra não concluiu o
ensino fundamental, situação semelhante à encontrada
por Bertoldi (2005), em que 66,6% dos indivíduos
participantes de seu estudo possuíam apenas de um a
quatro anos de estudo. Silva et al (2000), ao avaliarem o
nível de informação a respeito de medicamentos
prescritos, também evidenciaram um predomínio de
pacientes com o primeiro grau incompleto. O seguinte
fato, no entanto, já era de se esperar em nossa pesquisa,
uma vez que o trabalho foi desenvolvido em um hospital
público de uma das cidades do interior cearense
composta por uma população vítima há décadas da
exclusão e das desigualdades sociais.
O exposto é bastante relevante em nosso estudo,
uma vez que baixos níveis de escolaridade podem
comprometer o sucesso do tratamento farmacoterápico.
Assim, propomos a identificação destes pacientes e
posterior desenvolvimento de ações educativas voltadas
a tais grupos de pacientes, relacionadas à sua
farmacoterapia.
Metade dos participantes era casada, fato este
também observado de modo semelhante por Bertoldi
(2005), podendo ser correlacionado ao primeiro dado, no
qual se observa a prevalência de adultos jovens.
Observamos ainda que a maior parte dos pacientes
do estudo eram trabalhadores, sendo metade
constituída por trabalhadores que viviam na
informalidade. Podemos correlacionar tal achado com os
possíveis motivos para a consulta traumatológica. Muitas
empresas na atualidade financiam consultas e outras
ações de saúde para seus funcionários como forma de
estímulo à produção e obtenção de bons resultados.
Neste mesmo contexto, insere-se o grupo de
desempregados desprovidos de recursos financeiros para
uma consulta particular, sendo dessa forma o setor
público a única forma de acesso a consultas.
Com relação ao sexo, a grande maioria dos
participantes eram mulheres, totalizando 63,5%. Tal
achado é semelhante ao de Sans (2002), em que as
mulheres apresentaram uma prevalência de 76,2%.
Levando-se em consideração que as mulheres
demonstram maiores cuidados com a saúde em relação
aos homens, tal dado apenas justifica o exposto. No
entanto, Braga-Júnior et al. (2005) identificaram um
predomínio de 60,7% de homens entre os que foram
atendidos na unidade de traumatologia do hospital onde
se deu sua pesquisa, sendo justificado pelo fato de estes
apresentarem comportamento de risco potencialmente
causador de acidentes. Porém, o mesmo autor observa
que há uma inversão com o aumento da idade, visto que
após a menopausa começam a surgir casos como a
osteoporose que acabam por levar as mulheres a compor
a lista de pacientes no setor em questão.
Verificamos ainda que em 63,5% dos casos foi
prescrito apenas um único medicamento, tendo sido
prescritos no máximo dois medicamentos em todos os
casos. Estes dados estão de acordo com os estudos de
Silva (2000), em que foi detectada a prescrição de uma
média de 2,4 de medicamentos por pacientes com um
desvio padrão de 1,4. Apesar de terem sido prescritos no
máximo apenas dois medicamentos, pode-se afirmar que
este número é suficiente para o surgimento de
interações medicamentosas prejudiciais ao paciente,
especialmente considerando-se a ocorrência da
automedicação, conforme abordaremos mais adiante
(SILVA; SCHENKEL; MENGUE, 2000).
Conforme determina a Lei nº 9.787, de 10 de
fevereiro de 1999, no âmbito do Sistema Único de Saúde
(SUS) a prescrição médica e odontológica se fará pela
Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta,
pela Denominação Comum Internacional (DCI). Tal fato
parece ainda não ser observado pelos profissionais
prescritores, visto que de um total de 17 tipos de
especialidades medicamentosas prescritas, 70,5% foram
prescritas pelo nome comercial, o que demonstra a
necessidade de conscientização dos profissionais que
atuam no setor público no sentido de que os mesmos
possam prover ou facilitar os meios para uma terapia de
qualidade, eficiência, segurança e baixos custos.
Notamos que parte dos pacientes não tinha iniciado
o tratamento, tendo como principal motivo a própria
ideia de que este seria desnecessário. A situação exposta
nos desperta duas possibilidades: em primeiro lugar,
podemos indagar se de fato haveria em todos estes
casos a real necessidade de uma terapia medicamentosa
ou se na realidade estaríamos lidando com vítimas de
prescrições irracionais. E, em segundo lugar, podemos
concluir a necessidade de esclarecimento por parte do
prescritor a seus pacientes durante a consulta, quanto a
real necessidade do tratamento, para que os mesmos
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possam estar cientes dos malefícios advindos de não se
seguir corretamente a prescrição.
Analisando ainda entre os motivos do não início do
tratamento, observamos que 33,5% afirmaram não ter
recursos econômicos para a aquisição dos referidos
medicamentos, situação esta também em desacordo
com o direito a saúde conforme afirma o artigo 196,
título VIII, da Constituição Federal Brasileira (BRASIL,
1988), ao afirmar que “A saúde é um direito de todos e
dever do estado”. Assim, só nos resta propor uma maior
intervenção do Estado na garantia do acesso da
população a medicamentos, bem como uma maior
conscientização da população quanto ao seu direito à
saúde, situação esta visualizada pelo fato de apenas 7,5%
dos pacientes ter adquirido seu medicamento pelo SUS.
Observamos que entre os que adquiriram o
medicamento prescrito, uma parcela de 23,5% assumiu
não ter seguido o tratamento medicamentoso conforme
o estabelecido, principalmente por terem se esquecido
do horário de administração seguido por perca e por
achar desnecessário. Tal situação apenas reforça a ideia
do papel da informação prestada no ato da dispensação,
tornando o paciente receoso e consciente da
importância de se seguir corretamente seu tratamento. É
neste sentido que Pepe e Castro (2000) afirmam que a
informação prestada no ato da dispensação é tão ou
mais importante que o medicamento por ele recebido,
esperando-se assim bons resultados especialmente
quando esta informação for repassada por um
farmacêutico, visto que, de acordo com Marin (2003), os
pacientes mostram-se amplamente receptivos ao
aconselhamento farmacêutico.
Quase metade dos participantes relatou alguma
reação adversa, tais como sialorréia, azia, náuseas e
diarréia. De acordo com Oberg (1999), as reações
adversas afetam negativamente a qualidade de vida do
paciente, influenciam na perca de confiança do paciente
para com o médico, aumentam os custos e podem
atrasar os tratamentos. Assim, fica evidente a
necessidade de ações de farmacovigilância e
farmacoepidemiologia, em especial entre os usuários de
antimicrobianos e antiinflamatórios, visto que estes, de
acordo com Bertoldi (2004), são frequentemente
utilizados, especialmente de forma irregular por
automedicação, situação esta também visualizada no
presente estudo.
Observamos ainda que 30% dos nossos
entrevistados faziam uso do medicamento prescrito com
outros
medicamentos,
especialmente
outros
antiinflamatórios e anti-hipertensivos, o que nos permite
detectar a presença da polimedicação entre nossos
participantes, situação esta que pode levar a até 45% de
eventos adversos entre os seus adeptos, tal como afirma
Medeiros (2005), ao analisar a frequência de problemas
relacionados com medicamentos no serviço de urgência
de um hospital regional.
O uso de anti-hipertensivos nos desperta a
existência de uma subpopulação de pacientes
hipertensos entre os nossos participantes, fato que
ressalta a necessidade do desenvolvimento do processo
de atenção farmacêutica voltada a grupos especiais de
pacientes, especialmente portadores de doenças
crônicas. A hipertensão é a enfermidade que aparece
como principal causa de óbitos no Brasil e tem na
atenção farmacêutica um grande instrumento para seu
controle (MALTA; ARAUJO, 2004).
Verificamos também que 18,5% compartilharam
pelo menos um dos medicamentos prescritos com outras
pessoas, como vizinhos e familiares. Tal prática é
observada de forma comum, principalmente entre
desprovidos de um nível mínimo de informação, como
ocorre em regiões vítimas do atraso social.
No que tange ao fornecimento de orientação
profissional pelo farmacêutico ou outro profissional
gabaritado para o mesmo, todos os pacientes afirmaram
não ter recebida nenhuma orientação que não a do
médico, sendo que 85% disseram ter sentido falta de
pelo menos uma orientação durante o tratamento. Tal
situação é bastante relevante, visto que o próprio Código
de Ética Farmacêutica (CONSELHO FEDERAL DE
FARMÁCIA, 2004), garante o direito à informação ao
paciente. No entanto, como se pode observar, em
nenhum dos casos houve o fornecimento de informações
relativas ao tratamento medicamentoso por parte do
farmacêutico
responsável
pelo
estabelecimento
dispensador dos medicamentos. Tal situação pode ser
justificada pela própria ausência deste profissional nas
farmácias no município de Quixadá, visto que no interior
do Estado do Ceará ainda vigora a prática de apenas
“assinar a farmácia” pela qual ele (farmacêutico) deveria
dedicar-se em horário de seu funcionamento.
Outra justificativa para a mesma situação, e que
pode ser aplicada à situação vivenciada no referido
município, é dada por Oliveira (2005), ao afirmar que,
quando presente na farmácia, o farmacêutico é
recoberto de responsabilidades burocráticas e gerenciais
que acabam por anular qualquer possibilidade de
desenvolver alguma atividade relacionada à atenção
farmacêutica, mesmo quando apenas em grupos
especiais, trazendo à tona a necessidade de se prover
meios e incentivos para a realização da mesma.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maior parte dos que utilizam o serviço público de
traumatologia são adultos jovens, muitos dos quais têm
baixo nível de escolaridade e, na sua maioria, são
casados e do sexo feminino.
A média de medicamentos prescritos neste setor é
de um a dois medicamentos. Situação esta suficiente
para o surgimento de interações medicamentosas e
outros
PRM’s,
especialmente
levando-se
em
consideração que muito destes pacientes fazem uso de
outros medicamentos por conta própria.
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A prescrição pela DCB ou DCI, ainda não é
totalmente observada no âmbito do SUS, conforme
determina a Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999. Tal
situação demonstra de certa forma desrespeito para com
os usuários do referido sistema, visto que a prescrição
pela DCB ou DCI é de suma importância no
favorecimento à política de medicamentos genéricos no
Brasil.
De fato, se observa com base na análise dos dados
obtidos que há péssimas condições de conscientização
por parte dos pacientes com relação ao uso de
medicamentos, situação esta bastante relevante como
justificativa para incentivo à implantação do processo de
atenção farmacêutica em todos os âmbitos da
dispensação de medicamentos.
Outras justificativas para a mesma finalidade são
expressas nos dados que indicam que muitos dos
pacientes avaliados faziam uso concomitante com outros
medicamentos e, principalmente, pelo fato de 85%
destes afirmarem terem sentido necessidade, durante
alguma fase de seu tratamento medicamentoso, de uma
orientação profissional.
Podemos concluir, então, que o farmacêutico é de
extrema importância no desenvolvimento de uma
terapia medicamentosa racional, segura, rápida e efetiva
por ser o profissional gabaritado para identificar e
orientar os pacientes sobre todos os aspectos
relacionados aos medicamentos. Dessa forma,
concluímos que, tanto os cursos de graduação, como as
políticas de saúde pública, devem valorizar a atenção
farmacêutica como forma de beneficiar boa parte da
população evitando, consequentemente, PRM’s e
possíveis gastos desnecessários com a resolução destes.
REFERÊNCIAS
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VIDOTTII, C. C. F.; SILVA, E. V.; HOEFLER, R. Centro de
informações sobre medicamentos e sua importância
Fabrício Saldanha de Aquino
Graduado em Farmácia pela Faculdade Católica rainha do
Sertão – FCRS.
Luciana Macatrão Nogueira
Mestrado em Ciências Farmacêuticas - Área de
Concentração - Farmácia Clínica.
Docente da Universidade Federal do Vale do São
Francisco (UNIVASF).
Tiago Moreira de Olinda
Doutorando em Farmacologia pelo Programa de PósGraduação em Farmacologia pela Faculdade de Medicina
na Universidade Federal do Ceará - UFC.
Revista Expressão Católica 2012 jan-jun; 01(1)
ANEXO I - QUESTIONÁRIO
Utilização de medicamentos por pacientes ambulatoriais do setor de traumatologia no hospital municipal de
Quixadá (CE), desprovidos de atenção farmacêutica.
Abordagem hospitalar
Data:___/___/___
Nome: ______________________________________________________________
Idade: ______ Grau de escolaridade: __________ Estado civil: ________________
Profissão: _______________________ Telefone: ____________________________
Medicamento(s) prescrito(s): ____________________________________________
Posologia: _________________ Período de tratamento:_______________________
Abordagem domiciliar
Data: ___/___/___
Iniciou o tratamento: ( ) sim ( ) não
Se não, por qual motivo:
___________________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________
____________________________
Via de aquisição: ( ) SUS ( ) Farmácia comercial ( ) outros
Se outros, quais:_______________________________________________________
Seguio o tratamento conforme a prescrição e orientação médica: ( ) sim ( ) não
Se não, por qual motivo:
___________________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________
____________________________
Quais os efeitos colaterais/ reações adversas percebidas durante o tratamento:
___________________________________________________________________________________________
_________________________________________________
Usou outra medicação além da prescrita: ( ) sim ( ) não
Em caso afirmativo, quais:
______________________________________________________________________
Alguém mais fez uso da medicação: ( ) sim ( ) não
Quem: ________________________________________________________________
Durante a aquisição do(s) medicamento(s) foi fornecida alguma orientação profissional:
( ) sim ( ) não
Durante o período de tratamento, sentiu falta de uma orientação profissional:
( ) sim ( )não
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