Eletricidade no mar

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CIÊNCIA & TECNOLOGIA ENERGIA
Eletricidade no mar
Projetos internacionais apostam nos ventos oceânicos para gerar energia.
Estudos preliminares mostram que o Brasil também poderia se beneficiar
Marcela Buscato
O
Reino Unido planeja entrar na era do
vento para enfrentar o aquecimento
global. Para isso, está investindo em
um tipo especial de catavento. Ele aproveita o
potencial das correntes de ar fortes e constantes que sopram no mar. Em vez de cataventos
tradicionais fincados na beira da praia ou na
crista de montanhas, como já existem hoje no
interior dos Estados Unidos, na Europa e até
no litoral do Ceará, as novas turbinas eólicas
britânicas estão instaladas a pelo menos cinco
quilômetros da costa. O projeto tem grandes
dimensões. Começando pelos cataventos. Os
maiores têm 175 metros, altura equivalente à
de um prédio de 50 andares.
Hoje, o Reino Unido já é o maior gerador
mundial de energia eólica no mar. As nove
usinas em funcionamento produzem eletricidade suficiente para abastecer 300 mil
casas. Ainda é pouco. Segundo o governo, os
ventos do litoral da ilha da Grã-Bretanha têm
potencial para abastecer todas as residências
da Inglaterra, Escócia, do País de Gales e da
Irlanda do Norte. Até 2020, mais 21 usinas
deverão povoar o horizonte das praias britânicas com outros 7 mil cataventos.
O investimento britânico em energia eólica marítima é o mais agressivo, mas não é o
único. Pelo menos outras 13 usinas já estão
operando na Dinamarca, Suécia, Holanda
e Irlanda. Os projetos dos Estados Unidos e
da Espanha estão na fase de planejamento.
As vantagens das usinas eólicas marítimas
explicam por que elas são consideradas
uma das principais saídas para diminuir as
emissões de gás carbônico. Primeiro, porque
toda a tecnologia já foi desenvolvida. Basta
transferi-la para o mar. Em segundo lugar,
a maior parte da população concentra-se
próxima à faixa litorânea, o que diminui os
62 > ÉPOCA , 2 de março de 2009
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custos e o desperdício de energia no transporte. O terceiro motivo é que os cataventos
do oceano escapam da especulação imobiliária em torno dos terrenos do litoral, que
sempre encarece a implantação das turbinas
em terra firme. Além disso, diminuem consideravelmente as reclamações de vizinhos,
que não querem um catavento fazendo barulho e estragando a paisagem.
O principal motivo do entusiasmo em torno das usinas eólicas marítimas é o potencial
dos ventos oceânicos. As regiões com ventos
mais propícios seriam o extremo norte dos
Estados Unidos, Canadá, Europa e o sul da
África, Austrália e América do Sul. O Mar
do Norte, onde o Reino Unido está concentrando seus esforços, abrigaria os ventos mais
propícios. Turbinas instaladas em uma área
Onde estão os ventos
Um levantamento feito pela agência espacial americana,
a Nasa, mostra o potencial de geração nos mares
INVERNO DO
SUL: entre junho
e setembro, o
Brasil tem seu
maior potencial
no litoral de Santa
Catarina ao do Rio
Grande do Sul
INVERNO DO
NORTE: entre
dezembro e
março, o Mar do
Norte é o ponto
mais privilegiado
do mundo
A ESCALA DE COR indica quantos watts podem ser gerados por metro
quadrado da superfície do oceano. Os ventos são mais fortes no inverno
30
70
110
190
270
350 450 550 650 750 850 1.000 1.200 1.400 watts/metro2
Infográfico: Gerson Mora e Nilson Cardoso
26/2/2009 21:54:49
de 17.900 quilômetros quadrados do Mar do
Norte, menos de 3% de sua superfície, bastariam para abastecer um quarto da eletricidade da União Europeia, de acordo com um
estudo da Associação Europeia de Energia
Eólica. Uma pesquisa da organização ambiental Greenpeace sugere que uma rede de
usinas interligadas entre países banhados pelo
mar, como Reino Unido, Bélgica, Dinamarca,
França e Holanda, seria uma maneira de garantir um suprimento de energia constante.
Quando o vento estivesse mais fraco em uma
região, as usinas de outra área se encarregariam de assegurar o abastecimento.
Até o Brasil poderia se beneficiar da energia
dos ventos marinhos. Um levantamento do
oceanógrafo Felipe Pimenta, da Universidade
de Delaware, nos Estados Unidos, estima que
usinas marítimas instaladas no Sul poderiam
ter a mesma potência que o conjunto das usinas elétricas hoje em operação no país todo.
A região mais favorável seria a do litoral de
Santa Catarina até o do Rio Grande do Sul.
Uma das principais dificuldades para
construir usinas eólicas no oceano é saber
onde elas podem ser instaladas. Primeiro, falta avaliar com exatidão os possíveis
impactos ambientais. Alguns especialistas
afirmam que a biodiversidade marinha
poderia ser afetada pela movimentação
durante a construção e manutenção das
turbinas e, por isso, áreas de conservação
deveriam ser excluídas dos projetos.
Outros pesquisadores dizem que a
base das turbinas funcionaria como um recife artificial e serviria como um novo habitat para as espécies marinhas. Logo, mesmo
áreas importantes para a pesca poderiam
ser incluídas. Os riscos que os cataventos
oferecem à navegação também precisam ser
avaliados. Pequenas embarcações podem
ENERGIA QUE VEM DO MAR
Como cataventos
instalados 5
quilômetros mar
adentro geram
eletricidade
atravessar entre os cataventos, mas grandes
cargueiros seriam impedidos de passar.
O preço da energia gerada pelas turbinas
oceânicas é outro fator que inibe investimentos no setor. As tarifas chegam a ser
40% mais caras que as da energia produzida em parques eólicos em terra firme,
porque o custo de instalação é maior. Esses custos deverão cair quando os projetos
ganharem escala. Espera-se que inovações
também ajudem a derrubar os preços. A
empresa escocesa Green Ocean Energy
está desenvolvendo um mecanismo que,
acoplado à haste do catavento, aproveita
as ondas para gerar ainda mais energia. A
eletricidade gerada pelo movimento dos
braços hidráulicos na água aumentaria
em 50% o rendimento de cada catavento.
“Não tenho dúvida de que, na próxima
década, esse tipo de catavento será quase
tão comum quanto as usinas hidrelétricas”,
diz Pimenta. “Pelo menos nos EUA e na
Europa.”
U
1 BASE É escavada no fundo do oceano, a
30 metros de profundidade.
2
2 HÉLICES Sensores detectam a direção dos
ventos para que as pás girem no sentido
que aproveita melhor a ventania
3 TURBINA Um gerador transforma em
eletricidade a energia gerada com a
movimentação das hélices
3
PRODUTIVIDADE
Uma empresa escocesa desenvolveu
um acessório para gerar energia das
ondas na base dos cataventos. Com
o equipamento, batizado de Wave
Treader, cada catavento produziria até
50% a mais de eletricidade
TAMANHO
175 metros de
altura = um prédio
de 50 andares
NAVEGAÇÃO As turbinas eólicas no mar podem ser uma
ameaça para as embarcações. É provável que rotas marítimas
tenham de ser redesenhadas para desviar das usinas
5
4 CABOS Instalados no fundo do mar,
conduzem a eletricidade até um
transformador
5 TRANSFORMADOR Converte a
eletricidade na voltagem adequada para
cada região
6 REDE Recebe a energia gerada pelos
cataventos e distribui para empresas e
residências
6
1
4
Fonte: Nasa, British Wind Energy
Asssociation e Green Ocean Energy
2 de março de 2009, ÉPOCA > 63
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