Tratamento cirúrgico das metástases ósseas * 1 2 2 2 VALTER PENNA , MARCOS HAJIME TANAKA , WU TU CHUNG , EMILIO CURCELLI , ÉLCIO LANDIN RESUMO Entre 1987 e 1992, 114 pacientes com fraturas patológicas foram tratados no Hospital A.C. Camargo, de São Paulo. Dos 114 pacientes, 89,4% apresentavam carcinoma metastático e 10,5% apresentavam mieloma multiplo. Dos tumores metastáticos, o sítio primário mais comum foi a mama. As metástases ocorrem mais comumente no esqueleto axial que no apendicular, mas podem surgir em qualquer osso. No total, foram realizadas 124 cirurgias. Em aproximadamente 70% dos casos, foi utilizado metilmetacrilato. Os melhores resultados foram obtidos nos pacientes submetidos a substituição com endoprótese (10,6 meses de sobrevida em média). O objetivo principal do tratamento cirurgico das fraturas patológicas é aliviar a dor e restabelecer, o mais rápido possível, a função do membro afetado, melhorando assim a qualidade de vida e a sobrevida do paciente. SUMMARY Surgical treatment of skeletal metastases The authors studied 114 patients with pathological fractures treated in Hospital A.C. Camargo-São Paulo, between 1987 to 1992. 89.4% of them had metastatic tumor and 10.5% had multiple mieloma. The mammary carcinoma was the most common origin site of metastatic tumor. Metastasis occur more commonly in the axial skeleton than the appendicular skeleton, but can occur in any bone. 124 surgery were performed. In about 70% of them the methylmethacrylate was used. The best results were seen in patients where the replacement with endopros- 3 thesis were performed (10.6 months of survival rate). The purpose of surgical treatment in pathological fractures is relieve pain, and restore the function to the affected limb, as soon as possible, improving the quality of life and patient’s surviving. INTRODUÇÃO As metástases ósseas são a forma mais comum de tumores ósseos malignos e, virtualmente, todo tumor (2,3) maligno pode produzir metástases ósseas . Metástases ósseas podem estar associadas com dor severa e outras complicações, mas raramente são fatais. A incidência de complicaçõees das metástases ósseas parece estar aumentando. Isso pode ser devido ao fato dos pacientes com câncer estarem vivendo mais, devido à melhora no tratamento da lesão primária e do câncer disseminado, ou pelo avanço no manejo dessas complica(2,3,6,7) . ções Nos últimos anos, houve melhora acentuada nas técnicas de tratamento cirúrgico para se obter fixação estável das fraturas patológicas, a despeito do grau de destruição óssea. A importância da fixação estável e o uso de metilmetacrilato para proporcionar estabilidade imediata e alívio da dor, mesmo com grande destruição óssea, está bem estabelecida, assim como a utilização das endopróteses não convencionais, que seriam, sempre que possível, a melhor indicação para o tratamento das fraturas (1,4-6,8-10) . em osso patológico MATERIAL E MÉTODO 3. Doutor em Ortopedia e Traumatologia. Entre 1987 e 1992, 114 pacientes com fraturas patológicas foram tratados no Hospital A.C. Camargo, de São Paulo. Dos 114 pacientes, 102 (89,47%) apresentavam tumor metastático e 12 (10,5%) portavam mieloma múltiplo. Dos tumores metastáticos, o sítio primário mais comum foi a mama (44 casos, 38,6%), seguida do pulmão (11 casos, 9,6%), colo do útero (dez casos, 8,8%) e de origem indeterminada (sete casos, 6,1 %) entre os Rev Bras Ortop — Vol. 28, Nºs 11/12 — Nov/Dez, 1993 799 * Trab. realiz. no serv. de Ortop. e Traumatol. ao Hosp. A.C. Camargo, da Fundação Antônio Prudente, São Paulo, SP. 1. Titular. 2. Médico Assistente. V. PENNA, M.H. TANAKA, W.T. CHUNG, E. CURCELLI & E. LANDIN mais comuns. Os casos de mieloma múltiplo foram 12, 10,5% (tabela 1). que (sete casos, 5,6%), laminectomia de descompressão (três casos, 2,4%) e somente um caso (0,8%) em que houve a necessidade de amputação (tabela 3). TABELA 1 Sítio primário Mama Mieloma Pulmão Colo do útero Indeterminado Rim Melanoma Linfoma Próstata Tiróide Cabeça/pescoço Vulva Pele Reto TABELA 3 Tipos de cirurgia 44 12 11 10 7 6 5 5 4 3 3 2 1 1 Cirurgia Nº Osteossíntese Endoprótese Ressecção Luque Laminectomia Amputação 49 35 29 7 3 1 RESULTADOS Em aproximadamente 70% dos casos, utilizou-se metilmetacrilato com dispositivos de fixação interna ou O sexo feminino foi o mais acometido, sendo 79 mulheres para 35 homens com fraturas patológicas. A média de idade foi de 60,7 anos. A média de seguimento pós-tratamento foi de 8,7 meses. As fraturas mais comuns foram no fêmur (90 casos, 78,9%), úmero (18 casos, 15,7%), vértebra torácica (sete casos, 6,1%), tíbia (quatro casos, 3,5%), vértebra lombar (três casos, 2,6%) e acetábulo (dois casos, 1,7%) em nossa estatística (tabela 2). Nos 114 pacientes citados, foram realizadas 124 cirurgias. TABELA 2 Localização da fratura Fêmur Úmero Vértebra torácica Tíbia Vértebra Iombar Acetábulo 90 18 7 4 3 2 TIPOS DE CIRURGIA A osteossíntese com cimento ósseo foi o método mais utilizado (49 casos, 39,5%) (fig. 1), seguida pela endoprótese não convencional (35 casos, 28,2%) (fig. 2) e da ressecção simples do tumor (29 casos, 23,3%) (fig. 3). Outros procedimentos cirúrgicos realizados foram a estabilização da lesão metastática com hastes de Lu800 Fig.1 — Exemplo de osteossíntese com cimento e resultado funcional Rev Bras Ortop — Vol 28, N°s 11/12 — Nov/Dez, 1993 TRATAMENTO CIRÚRGICO DAS METÁSTASES ÓSSEAS Fig. 2 — Exemplo de ressecção e substituição com endoprótese não convencional e resultado funcional Fig. 3 — Exemplo de ressecção simples e resultado funcional substituição por endoprótese. A maior sobrevida foi verificada nos pacientes que foram submetidos a substituição por endoprótese (10,6 meses), seguidos dos pacientes que foram submetidos a ressecção simples do tumor (10,4 meses) e dos pacientes submetidos a fixação das fraturas com dispositivos de fixação interna mais metilmetacrilato (6,4 meses). O uso do metilmetacrilato como método adicional e, principalmente, a utilização das endopróteses não convencionais melhorou a capacidade do cirurgião de proporcionar estabilização rápida, alívio da dor e retorno a um nível de função independente o mais rápido pos(5,7-10) sível Rev Bras Ortop — Vol. 28, Nºs 11/12 — Nov/Dez, 1993 COMPLICAÇÕES Dos 124 casos submetidos a tratamento cirúrgico, 114 (92%) não apresentaram nenhum tipo de complicação . 801 V. PENNA, M.H. TANAKA, W.T. CHUNG, E. CURCELLI & E. LANDIN Houve infecção em quatro casos (3,2%), refratura em dois casos (1,6%), soltura da placa em um caso (0,8%), luxação da prótese em um caso (0,8%), piora da dor em um caso (0,8%) e um caso de óbito transoperatório (0,8%). DISCUSSÃO lares, diminuindo o período de internação e ocupação de leito hospitalar. REFERÊNCIAS 1. Bouma, W.H., Mulder, J.H. & Hop, W.C.J.: The influence of intramedullary nailing upon the development of metastases in the treatment of an impending pathological fracture: an experimental study. Clin Exp Metastasis 1: 205-212, 1983. O desenvolvimento de uma fratura patológica não é obrigatoriamente um evento terminal, como se supu(2,3) . nha há alguns anos 2. Fidler, M.: Incidence of fracture through metastases in long bones. Acta Orthop Scand 52: 623-627, 1981. O objetivo maior do tratamento cirúrgico das fraturas patológicas é aliviar a dor e restabelecer a mobilida(1,4-6,10) . de e a utilização do membro afetado 4. Galasko, C.S.B.: The management of skeletal metastases. J R Coll Surg Edinb 25: 143-161, 1980. Nos tumores radiossensíveis, a radioterapia pós-ope(2-4) . ratória é uma parte importante do tratamento O tipo de estabilização vai depender da localização da lesão e do seu tamanho e, sempre que a estabilização não for adequada, a utilização do metilmetacrilato é re(5-10) . comendada Na nossa experiência, a substituição por endoprótese não convencional, sempre que possível, é o melhor método para o tratamento das lesões ósseas metastáticas. É importante salientar ainda o aspecto psicológico do paciente, que é devolvido mais rapidamente ao seu convívio normal, e também o aspecto dos custos hospita- 802 3. Galasko, C.S.B.: Skeletal metastases, London, 1986. Butterworths, 5. Galasko, C.S.B. & Banks, A.J.: The stabilization of skeletal metastases, in Hellman, K. & Eccles, S.A.: Treatment of metastasis: problems and prospects, London, Taylor & Francis, 1985. p. 85-88. 6. Harrington, K.D.: Current concepts review. Metastatic disease of the spine. J Bone Joint Surg [Am] 68: 1110-1115, 1986. 7. Harrington, K.D.: The management of acetabular insufficiency secondary to metastatic malignant disease. J Bone Joint Surg [Am] 63: 653-684, 1981. 8. Harrington, K.D., Johnston, J.O., Turner, R. & col.: The use of methylmethacrylate as an adjunct in the internal fixation of malignant neoplastic fractures. J Bone Joint Surg [Am] 54: 1665-1676, 1972. 9. Schatzker, H. & Ha’eri, G.B.: Methylmethacrylate as an adjunct in the internal fixation of pathologic fractures. Can J Surg 22: 179-182, 1979. 10. Sim, F.H. & Pritchard, D.J.: Metastatic disease in the upper extremity. Clin Orthop 169:83, 1982. Rev Bras Ortop — Vol. 28, Nºs 11/12 — Nov/Dez, 1993