eletroestimulação na paralisia facial periférica crônica de

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ELETROESTIMULAÇÃO NA PARALISIA FACIAL PERIFÉRICA CRÔNICA DE BELL
por Sherazade Alvarez M. de M. Gomes - Fisioterapeuta, graduada pela UEMG campus de Lavras - MG
I. Introdução
A Paralisia Facial Periférica (PFP) é uma das mononeuropatias mais freqüentes e pode originar-se
por diversos tipos de afetação de seu núcleo motor. A freqüência das paralisias idiopáticas varia entre 62 e
93% dos casos. Desde que em 1830 Sir Charles Bell descreveu pela primeira vez uma debilidade unilateral
da face por desfunção do nervo facial, este subgrupo de paralisias idiopáticas passou a denominar-se
paralisias de Bell. Lasaosa et al (2000)
O VII par craniano (nervo facial) é fundamentalmente um nervo motor com um pequeno
componente sensitivo (nervo intermédio de Wrisberg), que conduz a informação sensitiva do gosto dos 2/3
anteriores da língua.
As conseqüências da lesão na fibra nervosa dependem da sua natureza, intensidade e do local
lesado.
1.Semiologia Clínica
Segundo Lasaosa et al (2000) a PFP, ou de neurônio motor inferior, origina a perda do movimento
voluntário e emocional em todos os músculos faciais do lado afetado, tanto superiores quanto inferiores. A
face é assimétrica tanto em repouso como em tentativa de movimento voluntário; ao tentar fechar as
pálpebras, a contração sinérgica fisiológica do reto superior faz girar para cima o globo ocular e se
descobre a esclerótica (fenômeno de Bell); a posição descendida da pálpebra inferior separa o ponto
lacrimal do saco conjutival e as lagrimas deslizam para o exterior (epífora). A resposta motora do reflexo
corneal e reflexo de oclusão das pálpebras estão diminuídos ou abolidos.
O músculo elevador da pálpebra superior tem a função, como o próprio nome diz, de elevar a
pálpebra superior, mantendo assim, o olho aberto. Este músculo receber inervação do III par craniano
(óculomotor), que não está lesado.
A sensibilidade da córnea, o tato da face, bem como a musculatura da mastigação, são inervados
pelo V par craniano (trigêmeo) e permanecem presentes.
Paciente com paralisia facial periférica de Bell (face E) há 1 mês, numa tentativa de movimentação
voluntária (sorriso).
2. Etiologia
Recentemente postularam-se outras hipóteses que vinculam a doença a agentes virais, incluindo o
Herpes Vírus Simplex-1, e a uma disfunção auto-imune.
Outras possíveis etiologias para a paralisia facial incluem Diabete Melito, Hipertensão Arterial
Sistêmica, tumor, trauma, Herpes Zoster, idiopática, paralisia neonatal, gestação e puerpério e Síndrome de
Guillain-Barré, na qual também ocorre acometimento de membros superiores e inferiores. (Ferreira-1999)
3. Classificação das Lesões nervosas periféricas
Segundo Seddon (1984), existem predominantemente três tipos de lesões das fibras nervosas:
neuropraxia, axonotmese e neurotmese.
3.1 Neuropraxia
Ocorre quando não existe perda da continuidade axonal entre o neurônio e o músculo. Ocorre
apenas uma interrupção da condução nervosa (bloqueio de condução) por uma lesão exclusivamente na
bainha de mielina do nervo. O aspecto mais importante é sua reversibilidade. Essas paralisias decorrentes
de um bloqueio de condução duram de 1-6 meses, embora geralmente resolvam em até 3 meses.
3.2 Axonotmese
Neste caso, a lesão acomete os axônios do nervo e ocorre uma reação em duas fases. A primeira
fase envolve a desintegração do axônio e a quebra da bainha de mielina, o que é chamado de degeneração
Walleriana (axonal).
A segunda fase da reação ‘a lesão é o processo de regeneração (reinervação) da continuidade
entre axônio e seu órgão terminal.
3.3 Neurotmese
Neste tipo de lesão ocorre perda de continuidade de todo o tronco nervoso. Todas as alterações
decorrentes de uma lesão axonal tipo axonotmese também ocorrem na neurotmese. A recuperação é muito
difícil em função de que as alterações neuronais retrógradas são muito graves e um grande número de
neurônios não sobrevive.
4. Prognóstico
Segundo Lasaosa (2000) esta é uma discussão de extraordinária importância. A neuropraxia se
recupera integramente em poucas semanas, a axonotmese implica uma recupreração mais lenta e
provavelmente imcompleta. Nove dias depois do começo da Paralisia Facial (é obrigado deixar uma
margem de segurança, pois os axônios não se lesionam todos em um momento preciso na paralisia facial
espontanea), pode-se calcular o tipo e grau da lesão produzida.
Existem diversas técnicas com o fim de demonstrar e quantificar o grau da afetação no nervo facial:
-
Teste de Excitabilidade Nervosa
-
EMG convencional
-
Reflexo trigeminofacial ( blink-reflex)
-
Eletroneuromiografia (ENG)
-
Estimulação Magnética Transcraneal
-
Tempo de condução distal
-
Potencial antidrômico de nervo facial
5. Diagnostico Topográfico
Se a lesão é proximal ao nervo petroso superficial maior, se afeta a secreção lacrimal. Se a lesão é
proximal ao nervo estapedio, se produzirá hiperacusia ou intensificação modesta da percepção dos ruídos;
se perde o reflexo audiométrico do estapedio. Se a lesão é proximal a corda do tímpano (fraturas de
penhasco, infecções do ouvido médio), se perde o gosto nos 2/3 anteriores da hemilingua. Estes sintomas
não existem nas lesões do agurejo estilomastoideo ou da glândula parótida. Mas deve-se salientar que a
validez do diagnóstico topográfico baseado nestes critérios tem suas limitações.
6. Regeneração nervosa
A origem da regeneração neural é aquela porção do axônio próximo ao local da lesão e que se
encontra situada em um tubo endoneural não lesado. Existem dois processos de reinervação em lesão
axonal motora parcial. Uma delas é quando o axônio que está crescendo é confinado ao tubo que
originalmente o continha durante sua regeneração. Os axônios atingem o órgão terminal originalmente por
ele inervado de maneira que o padrão de reinervação seja exatamente o mesmo do padrão original e, a
função é completamente recuperada. O outro é o processo de brotamento colateral que ocorre dentro do
músculo, em que os axônios intactos reinervam fibras musculares adjacentes que foram desnervadas.
A regeneração ocorre a uma velocidade, em média, de 1 mm/dia.
Quando ocorre a secção de todo o tronco nervoso, os axônios que estão regenerando percorrem o
tecido cicatricial que esta separando os terminais do tubo endoneural seccionado. Este tecido pode prevenir
os axônios de atingirem ou entrarem no segmento distal do tudo e estes podem ter seu curso alterado,
entrando em um tubo endoneural adjacente que o conduz para um órgão terminal diferente, gerando
Sincinesias.
Se os tubos endoneurais não são reinervados em 1-1,5 ano após a desnervação, tornam-se menos
susceptíveis a receber um axônio em função de as células de Schwann serem substituídas por tecido
conjuntivo.
7. Seqüelas
A determinação do grau de recuperação clínica do nervo facial foi graduada e descrita por HouseBrakmann.
House-Brakmann facial nerve grading system:
Grau
I
Descrição
Características
Normal
Função facial normal em todas as áreas
II
Leve disfunção
III
IV
V
Moderada
disfunção
Gross: Pequena fraqueza detectável na inspeção do
fechamento, podem haver sincinesias muito leves;
em repouso: simetria e tônus normais; mov. da
testa: moderada a boa função; mov.do olho:
completo fechamento com mínimo esforço; mov. da
boca: leve assimetria.
Gross: Óbvia, mas sem diferença desfigurante entre
os dois lados, detectável, mas não severa sincinesias,
contraturtas, e/ou espasmo hemifacial; em repouso:
Simetria e tônus normais; mov. da testa: pequeno a
moderado movimento; mov. do olho: completo
fechamento com esforço; mov. da boca: levemente
fraco com máximo esforço.
Moderadamente Gross: Óbvia fraqueza e/ou assimetria desfigurante;
em repouso: simetria e tônus normais; mov. da
testa: nenhum, mov. do olho: fechamento
Severa
incompleto; mov. da boca: assimétrico com máxima
disfunção
força.
Severa
disfunção
Gross: Somente e não mais que movimento
perceptível; em repouso: assimétrico; mov. da testa:
nenhum; mov. do olho: fechamento incompleto;
mov. da boca: leve movimento.
VI
Total Paralisia
Nenhum movimento
* fonte: (Targan et al-2000)
Existe uma definição dos termos usados para as sequelas que podem ocorrer em
pacientes com Paralisia Facial Periférica. Tais termos foram relacionados por
Targan et al (2000) e estão listados abaixo:
Sincinesias
Um movimento involuntário ocorrendo em
associação com um movimento voluntário.
Lacrimejamento
Efusão de lágrimas do olho parético
porcausa da inabilidade de controlar o
escoamento
Fenômeno de Bell
Movimento para cima e leteral do globo
ocular parético após uma tentativa de
fechar o olho.
Hiperacusia
A condilção pela qual os sons são
percebidos como indevidamente alto
Sialorreia
Escoamento de fluidos do canto da boca
afetada por causa da inabilidade de
controlar os músculos depressor e
orbicular da boca.
Lágrimas de crocodilo
Lacrimejação acompanhando a
mastigação-uma seqüela da paralisia facial
quando a regeneração das fibras da corda
do tímpano são direcionadas e inervam a
glândula lacrimal no lado afetado.
Zigomatico pendente
Aparência assimétrica da face quando da
tentativa de produzir um largo sorriso
mostrando os dentes.
Piscar anormal
Reflexo anormal do Orbicular do olho no
lado afetado.
Perda do paladar
Habilidade prejudicada para identificar
comida pelo gosto.
Paralisia do Bucinador
Inabilidade para mastigar e prender a
comida na cavidade bucal.
Nasalis congelado
Inabilidade para puxar ou mover o
músculo nasal parético.
Blepharoclonus
Clônus intermitente
fechando a pálpebra
abrindo
e
8. A Eletroestimulação
Nos primórdios da estimulação elétrica, eram utilizadas correntes galvânicas com
interrupção manual ou de duração muito longa que “queimavam” as placas motoras
neoformadas e propiciavam a fibrose e contratura dos músculos estimulados, impedindo a
reinervação e a recuperação funcional. Como e estimulação elétrica era muito utilizada nas
lesões do nervo facial e as paralisias/sincinesias deste são estigmatizantes, os
ortorrinolaringologistas e neurologistas da época passaram a contra-indicar este método
terapêutico indiscriminadamente até hoje, apesar dos avanços técnicos.(Ferreira, 1999)
A estimulação elétrica já tem sido usada com alguns sucessos em Paralisia de Bell,
embora 84% dos pacientes com esta paralisia recuperam espontaneamente sem tratamento.
Em 1999, Gittins et al, realizou um estudo onde propôs um protocolo de tratamento
de 3 meses de duração. Somente o músculo orbicularis oculi foi estimulado com dois
eletrodos, um em cada canto do olho parético. Foi usado um estimulador elétrico transcutaneo
com uma saída constante de voltagem e com uma forma de pulso monofásico compensado.
Os pacientes foram instruídos a usar o estimulador por aproximadamente 1 h diária. A
freqüência de pulso e largura foram ajustadas para 10 Hz e 200s., respectivamente. O duty
cicle de 2s ON e 1s OFF.
Já em 2000, Targan et al, utilizou, em seu estudo, um estimulador a bateria (NT2;BMR NeuroTech Inc, Bunbeg, Ireland) que produziu uma corrente monofásica em forma de
onda, tendo duração de pulso de 86s. , e liberou um pulso a cada 700ms. Os pulsos foram
interrompidos para permitir um tempo de ON de 6s e um tempo OFF de 6s. A rampa de subida
foi de 1s e rampa de descida 0,5s.A intensidade da estimulação foi mantida a um nível
submotor tal que o paciente estava apto a perceber os pulsos sem concomitante contração
muscular. Os músculos faciais - orbicularis oculi, frontalis, zygomatic e nasalis -foram
estimulados por 30 minutos diariamente no 1o mês, 1h diária no segundo mês, e 2h diárias
durante o 3o mês. Começando o 4o mês, o paciente estimulou cada músculo por 6h enquanto
dormia a noite. Durante o 5o e 6o mês, quatro músculos adicionais no lado afetado buccinator, mentalis, orbicularis oris e mandibularis- foram estimulados por 30 minutos
(5omês) e 60 min. (6omês) diariamente enquanto a estimulação de 6h noturnas para os
músculos originais permaneceu. O tempo total de tratamento durou 6 meses.
8.1 Resultados
Em seu livro Ferreira (1999) faz um comentário: “o estímulo elétrico é muito
importante nestes casos, principalmente em se tratando de lesão do nervo facial, pois os
músculos faciais têm poucas fibras por unidade motora, são delicados e fibrosam com maior
rapidez que outros músculos maiores. A determinação da reobase, cronaxia e curva I/D, além
do acompanhamento, objetivo do paciente, permite-nos escolher de forma segura e científica
o tipo de pulso elétrico mais adequado, evitando utilizar correntes de durações muito longas
que podem “ queimar” as novas terminações da placa motora.”
Gittins et al (1999) relatou melhora significativa com redução no Lagophthalmus e
melhora no mecanismo de fechamento da palpebra em seus pacientes. No estudo de Targan
et al (2000), onde foram estimulados vários músculos faciais, dos 17 pacientes, 8 mostraram
mais que 40% de melhora, 4 mais que 30%, e 5 menos que 10% de melhora. Isto mostra
clinicamente uma resolução muito significativa na severidade das seqüelas. O Reflexo de
piscada espontânea não foi melhorado em nenhum dos dois protocolos de tratamento.
9. Conclusão
O programa de estimulação elétrica pode reverter parcialmente as deficiências
crônicas nas latências de condução motora e seqüelas, e podem prover benefícios a pacientes
com paresias crônicas do nervo facial.
Os resultados deste estudo alimentam a hipótese que curas futuras de duráveis
paresias do nervo facial é clinicamente viável e significativa.
Este programa de tratamento pode ser combinado com um programa de exercícios
específicos, podendo aumentar o grau de sucesso de tal intervenção.
Tal melhoria pode ser de grande ajuda para a auto-estima e função social do paciente
e podem reduzir os custos de contínuos cuidados médicos para as complicações.
Referências Bibliográficas
1.
Seddon HJ: Three types of nerve injury. Brain 1984; 66:237 IN: FERREIRA, A. S; Lesões
Nervosas Periféricas. 1d. São Paulo: Santos, 1999.
2.
TARGAN, ROBERT; ALON, GAD. Effct of long-term eletrical stimulation on motor recovery
and improvement of clinical residuals in patientes with unresolved facial nerve palsy. The
National Center for Facial Paralisys, february, 2000.
3.
LASAOSA, S. SANTOS; MILLAN PASCUAL. Parálisis facial periférica: etiología, diagnóstico y
tratamiento. Revista de Neurologia; España; 30 (11):1048-1053, 2000.
4.
GITTINS, JOHN; MARTIN, KEVIN. Eletrical Stimulation as a Therapeutic Option to improve
Eyelid Function in Chronic Facial Nerve Disorders. IOVS, vol. 40, n 3, march 1999.
5.
FERREIRA, A. S; Lesões Nervosas Periféricas. 1d. São Paulo: ed Santos, 1999.
6. Laurie L. Neurociência fundamentos para reabilitação,1o.ed, Rio de Janeiro: Guanabara
koogan, 2000.
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