Instituto Oswaldo Cruz Curso de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO DO OVO DE Schistosoma mansoni SAMBON, 1907 ARNON DIAS JURBERG Dissertação apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências na área de Biologia Celular e Molecular Orientadores: Dr. Henrique Leonel Lenzi Dr. Paulo Marcos Zech Coelho Julho de 2008 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. Instituto Oswaldo Cruz Curso de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular ARNON DIAS JURBERG DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO DO OVO DE Schistosoma mansoni SAMBON, 1907 Orientadores: Dr. Henrique Leonel Lenzi Dr. Paulo Marcos Zech Coelho Banca examinadora: 1 Naftale Katz (presidente) 2 José Roberto Machado-Silva (membro) 3 Gerson Cotta-Pereira (membro) 4 Lycia de Brito Gitirana (revisora/suplente) 5 Arnaldo Maldonado Jr. (suplente) 18/07/2008 ii A minha mãe, Vania Maria Mello Dias, por todo amor, dedicação e incentivo na minha formação pessoal e profissional. Sem ela, esse trabalho não teria sido possível. e À Raquel Miscow Ferraz de Mendonça, com muito amor e carinho. iii “The egg cell is... a universe.” Ernest Just, 1939. “Muito louco isso.” Henrique Lenzi, 2007. “Afinal, mestrado é pra gente se divertir.” Luís Fernando Ferreira, 2007. iv AGRADECIMENTOS A realização desse trabalho somente foi possível com o envolvimento e a participação, direta ou indireta, de pessoas muito especiais. A elas, meu profundo reconhecimento: Aos meus queridos orientadores, Dr. Henrique Leonel Lenzi e Dr. Paulo Marcos Zech Coelho, pelos seus exemplos como seres humanos e profissionai; pelo convívio e estimulantes discussões científicas e culturais; pelos inúmeros incentivos e pela confiança. Por toda a dedicação e paciência, mas, sobretudo, pela afetuosa amizade. Aos senhores, o meu mais sincero agradecimento. À Tiana Gonçalves e Tatiane Andrade Costa, pela imensurável contribuição na realização desse trabalho. Ao Bernardo Miguel de Oliveira Pascarelli, pelas inumeráveis horas de análise ao microscópio confocal de varredura a laser. A vocês, pelos inesquecíveis momentos de convivência e aprendizado. Por todo o apoio e incentivo, mas principalmente pela amizade, que espero carregar para o resto da vida. Sem vocês, esse trabalho não teria sido possível. A todos os amigos do Laboratório de Patologia-IOC, que sempre contribuíram de alguma forma muito especial, além dos agradáveis momentos de convivência e descontração. Em especial, ao Dr. Marcelo Pelajo-Machado, por toda a dedicação em proporcionar as melhores condições possíveis de trabalho no laboratório; pelo incentivo e paciência. À equipe do setor de histotecnologia – Luzia Fátima G. Caputo, Luciana Silva Souza, Luzia Helena Pereira Barros, Marcelo Barbosa dos Santos e Alexandra Menezes dos Santos – pelas excelentes preparações histológicas, fundamentais para a realização desse trabalho. À Iolanda Deolinda Pedro, Filomena de Fátima Cruz, Andréa Natividade e Juciara Felisbino de Souza, pela manutenção do ciclo biológico do Schistosoma mansoni e do biotério do laboratório. Ao Pedro Paulo de Abreu Manso e à Priscila Tavares Guedes, pela ajuda na realização de reações de imuno-histoquímica; ao Pedro Paulo, também por auxiliar na aquisição de imagens ao microscópio confocal. À Rosinei Miranda Ferreira e à Alexandra Corrêa Pereira, pelo auxílio e apoio burocrático. v A todos os amigos do laboratório de Esquistossomose-IRR, que me acolheram tão bem durante as minhas estadias. Em especial, à Ana Carolina de Mattos, Ana Karine Sarvel, Neuza de Araújo e ao Áureo Almeida de Oliveira, pela inestimável contribuição e grande paciência na realização de alguns experimentos. À Vera de Paula Ribeiro e ao Dr. John R. Kusel (da Glasgow University), pelas valiosas revisões de inglês dos artigos submetidos/publicados. Ao Marcelo Ribeiro Alves, da Plataforma de Desenvolvimento em Tecnologia e Insumos em Saúde (PDTIS), Nanotecnologia e Microarranjos – Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS)/Fiocruz, pela inestimável modelagem estatística dos dados de crescimento dos ovos. Ao Bruno Eschenazi, do setor Produção e Tratamento de Imagens/IOC, pela belíssima representação esquemática do desenvolvimento embrionário dos ovos (artigo 2). À Dra. Jane Arnt Lenzi e à Dra. Lycia de Brito Gitirana, pela minuciosa revisão dessa dissertação. Ao Laboratório de Biologia Celular/IOC, na pessoa da Dra. Andréa Henrique Pons, por permitir a utilização do criostato na obtenção de secções histológicas para a realização de imunomarcações indiretas. À Flávia Rachel Moreira Lamarão, Kelly Grace Magalhães, Mariana Acquarone, bem como ao Thiago Parente e Gustavo Lázaro Rezende, pelo incentivo, sugestões e ajudas, além dos empréstimos de reagentes e, sobretudo, pelo agradável convívio. À Coordenação do Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular do Instituto Oswaldo Cruz, nas figuras de seu Coordenador, Dr. Milton Ozório Moraes, e de Daniele Lobato, secretária executiva, pelo apoio burocrático e suporte financeiro em eventos científicos. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pelo suporte financeiro durante a vi realização desse trabalho. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Superior (CAPES), pela criação e manutenção do portal de acesso de periódicos internacionais (http://www.periodicos.capes.gov.br), muito útil na redação dessa dissertação. Por fim, mas não menos importante, à minha família, por todo o apoio e incentivo. Em especial, à minha querida mãe, Dra. Vania Maria Mello Dias, por toda a sua dedicação e suporte na minha formação pessoal e profissional. Ao meu irmão Igor, pelo grande exemplo de garra e determinação, mesmo continuando a um oceano de distância. Ao meu pai, Dr. Pedro Jurberg, pelas proveitosas conversas e ensinamentos. À Raquel Miscow Ferraz de Mendonça, minha amada namorada (calma, agora só falta o doutorado para o casório), por todos os inúmeros e especiais momentos e o aconchegante carinho. vii Este trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Patologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), Rio de Janeiro, RJ, e no Laboratório de Esquistossomose do Instituto René Rachou, Belo Horizonte, MG, ambos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Este trabalho recebeu suporte financeiro da Fiocruz e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). viii Sumário Lista de figuras .................................................................................................. xi Lista de abreviaturas ......................................................................................... xii Resumo ............................................................................................................. xiii Abstract ............................................................................................................. xiv I – Considerações iniciais ............................................................................... 15 1. Introdução ............................................................................................. 16 2. Fundamentação teórica .......................................................................... 18 2.1. Classificação taxonômica ................................................................. 18 2.2. Características gerais dos esquistossomos ....................................... 18 2.3. Esquistossomose mansoni ............................................................... 19 2.4. O ciclo biológico do Schistosoma mansoni ........................................ 21 2.5. O desenvolvimento embrionário dos platielmintos ........................... 22 2.5.1. Conceitos básicos em biologia do desenvolvimento ................... 23 2.5.2. Filogenia dos platielmintos, com ênfase em Schistosomatidae e Schistosoma ...................................................................................... 38 2.5.3. Visão geral do desenvolvimento embrionário dos platielmintos . 53 2.6. O desenvolvimento embrionário do ovo do Schistosoma mansoni ...... 66 2.6.1. Fecundação ............................................................................. 66 2.6.2. Formação da casca do ovo ....................................................... 67 2.6.3. Desenvolvimento embrionário dos ovos .................................... 69 2.7. Reação granulomatosa (granuloma periovular) ................................. 71 2.7.1. Antígenos solúveis do ovo ........................................................ 72 2.8. Morfologia do miracídio de Schistosoma mansoni ............................. 79 II – Objetivos .................................................................................................. 82 1. Objetivo geral ..................................................................................... 83 2. Metas …………………………………………………………………………….... 83 III – Justificativa …………………………………………………………………………… 84 IV – Artigos …………………………………………………………………………………. 86 ix Artigo 1. Trematode embryology: a new method for whole-egg analysis by confocal microscopy …………………………………………………………... 87 Artigo 2. The embryonic development of the trematode Schistosoma mansoni …………………………………………………………………..……….…. 93 V – Considerações finais e Conclusões ………………………………………………. 148 1. Discussão ........................................................................................ 149 1.1. Sistemas de classificação ......................................................... 150 1.2. Desenvolvimento embrionário in vivo e in vitro .......................... 151 1.3. Desenvolvimento embrionário e filogenia .................................. 153 1.4. Desenvolvimento embrionário e granulomatogênese ................. 156 2. Conclusões ...................................................................................... 160 VI – Referências bibliográficas …………………………………………………………. 165 x Lista de figuras Figura 1.1. Casal de vermes adultos de Schistosoma mansoni ...................................... 19 Figura 1.2. Ciclo biológico de Schistosoma mansoni ...................................................... 22 Figura 1.3. Ciclo celular de blastômeros e células somáticas ........................................ 24 Figura 1.4. Planos da clivagem holoblástica total ......................................................... 26 Figura 1.5. Resumo dos principais padrões de clivagem ............................................... 27 Figura 1.6. Clivagem em espiral do molusco Trochus .................................................... 28 Figura 1.7. Clivagem em espiral ................................................................................... 32 Figura 1.8. Tipos de movimentos celulares durante a gastrulação ................................ 34 Figura 1.9. Modos de formação do mesoderma na gástrula tardia ................................ 35 Figura 1.10. Formação do celoma por esquizocelia ....................................................... 37 Figura 1.11. Formação do celoma por enterocelia ......................................................... 37 Figura 1.12. Dendogramas exemplificando três tipos de táxons .................................... 39 Figura 1.13. Geração de genes ortólogos e parálogos .................................................... 40 Figura 1.14. Resumo das relações filogenéticas dos platielmintos ................................. 47 Figura 1.15. Filograma dos trematódeos de tetrápodes ................................................. 50 Figura 1.16. Estratégias de desenvolvimento em diferentes táxons de platielmintos ..... 54 Figura 1.17. Clivagem em espiral de um policlado ........................................................ 59 Figura 1.18. Larva de Muller ........................................................................................ 59 Figura 1.19. Desenvolvimento inicial de embriões F1 de Gyrodactylus gasterostei ........ 64 Figura 1.20. Miracídio de Schistosoma mansoni por microscopia confocal de varredura a laser (CLSM) ............................................................................................................. xi 81 Lista de abreviaturas AB alcian blue (azul de Alciano) CLSM microscopia confocal de varredura a laser COPT do inglês, circumoval precipitin reactions DDC dietilditiocarbamato DNA ácido desoxirribonucléico E exsudativo EP exsudativo-produtivo ESP proteínas totais secretadas pelo ovo evo-devo biologia evolutiva do desenvolvimento FaRPs peptídeos FMRFamida-relacionados HSPs proteínas de choque térmico i.e. isto é IL interleucina INF-gama interferon-gama kDa kiloDalton LSU grandes subunidades de RNAr MHC complexo principal de histocompatibilidade RNAmi micro-ácido ribonucléico RNAm ácido ribonucléico mensageiro mtDNA ácido desoxirribonucléico mitocondrial NPFs neuropeptídeos Fs P produtivo p.ex. por exemplo p.i. após a infecção PAS reação do ácido periódico de Schiff pH pontencial hidrogeniônico pI ponto isoelétrico RI reação inicial RNAr ácido ribonucléico ribossomal SEA antígeno solúvel do ovo SSU pequenas subunidades de RNAr xii INSTITUTO OSWALDO CRUZ DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO DO OVO DE Schistosoma mansoni SAMBON, 1907 RESUMO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Arnon Dias Jurberg Na patogênese da esquistossomose e na continuidade do ciclo de vida do parasito, os ovos possuem um papel central. Tradicionalmente, o amadurecimento dos ovos é classificado a partir da simples relação entre os tamanhos do embrião e do ovo propriamente dito (classificação de Vogel e de Prata, “VP”). A proporção de cada estádio (oograma) tem sido considerada como um critério confiável para a avaliação de drogas esquistossomicidas. Contudo, pouco se sabe sobre a sua biologia do desenvolvimento propriamente dita. A presente dissertação objetivou descrever os eventos morfológicos durante a embriogênese dos ovos de Schistosoma mansoni através de histologia convencional e análise de preparados inteiros. Os eventos foram divididos em dez estádios, adaptando uma classificação prévia inicialmente introduzida para um rabdocelo de vida livre. O amadurecimento dos ovos no hospedeiro e em cultura (meio RPMI-1640) foi também avaliado por modelagem estatística da área média de cada estádio (considerando a classificação VP) e então, morfologicamente, pela análise de ovos inteiros sob microscopia confocal a laser (nosso sistema de estagiamento aqui proposto). Devido ao difícil reconhecimento dos eventos morfológicos observados em ovos vivos não-corados, uma correlação com a classificação VP é apresentada. De fato, o desenvolvimento embrionário dos ovos de esquistossomos é mais complexo do que considerado previamente (como na classificação de Vogel). A diferenciação das estruturas embrionárias e seus prováveis papéis na granulomatogênese são discutidos. O sistema de estadiamento, aqui proposto, pode contribuir para uma melhor compreensão da biologia do ovo e embasar futuros estudos sobre a produção e difusão dos antígenos do ovo na reação granulomatosa. xiii INSTITUTO OSWALDO CRUZ THE EMBRYONIC DEVELOPMENT OF Schistosoma mansoni SAMBON, 1907 EGGS ABSTRACT MASTER DISSERTATION Arnon Dias Jurberg In pathogenesis of schistosomiasis and in its life cycle, the eggs have a central role. Traditionally, the primary screening of antischistosomal drugs uses as main criteria the Vogel and Prata’s classification (VP’s), which is based on the relation of embryo/eggshell sizes and the qualitative oogram. However, little is known on egg developmental biology itself so far. The present work aimed to describe the morphological events during the Schistosoma mansoni egg embryogenesis by using conventional histology and whole-mount preparations. These events were divided in ten stages, adapting a previous classification initially introduced for a free-living rhabdocoel. Egg maturation in the host and in culture (RPMI-1640 medium) were also evaluated by statistical modeling of the mean area for each stage (considering VP’s classification) and then morphologicaly by whole-mount eggs under the confocal laser microscopy (our proposed staging system herein). Due to difficult recognition of the morphological events in live, unstained eggs, a further correlation to the VP’s classification is presented. Indeed, schistosome egg embryonic development is more complex than previous considered (as in VP´s classification). The differentiation of embryonic structures and their probable role in granulomatogenesis is discussed. The stage system here proposed may contribute to a better comprehension of the egg biology and underlies further studies on egg antigen production and its diffusion in the the granuloma reaction. xiv Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I – Considerações Iniciais 15 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I – Considerações Iniciais I. 1 – Introdução Como um organismo se forma? Como se produz um outro ser? A busca pelo entendimento dessas questões e de inúmeras outras mais específicas fez da Biologia do Desenvolvimento um dos campos mais fascinantes em biologia. Organismos tão diferentes quanto borboletas, ouriços-do-mar, peixes, primatas e vermes originam-se a partir de uma única célula, o zigoto. Para esses seres (e outros vários), a construção de uma estrutura adulta perpassa por estádios transitórios. O tempo é fundamental. Nos esquistossomos, causadores da esquistossomose humana, o zigoto é circundado por células vitelínicas individualizadas, ainda no sistema reprodutivo da fêmea adulta. Ao redor dessa massa celular é polimerizada uma casca de formato peculiar (diferente para cada espécie de esquistossomo). Os ovos possuem um papel ainda mais intrigante: eles são os agentes primários na patologia da esquistossomose. Após serem liberados pelas fêmeas adultas na corrente sanguínea do hospedeiro vertebrado, eles são passivamente carregados até ficarem retidos em vasos de calibre mais reduzido. Nesse momento, tais ovos são capazes de atuar como agentes granulomatogênicos, podendo causar fibrose periportal e hipertensão, além de varizes esofagianas, que, ao se reomperem, podem muitas vezes levar ao óbito. Apesar do seu papel central na biologia dos esquistossomos e na patogenia da esquistossomose, o desenvolvimento embrionário dos ovos tem sido alvo de estudos esporádicos, quase sempre superficiais. Por exemplo, sua classificação é atualmente baseada simplesmente na relação entre o tamanho do embrião em relação ao ovo (Vogel 1942; Prata 1957). Pouco se conhece sobre as moléculas do ovo relacionadas com a patogenia e menos ainda sobre os mecanismos moleculares que regem o seu desenvolvimento. Frequentemente, ovos isolados para avaliações moleculares (genômica, transcriptômica, glicômica, lipidômica e outros) são considerados como uma entidade única, sem os diferentes estádios de maturação. Assim, essa dissertação tem por finalidade a descrição da embriogênese dos ovos de Schistosoma mansoni Sambon, 1907 em seu hospedeiro experimental murino. Para fins de comparação, o desenvolvimento de ovos em cultura também foi avaliado. O cultivo de ovos é amplamente utilizado em estudos moleculares e imunológicos, bem como em avaliações quimioterapêuticas. É necessário, portanto, determinar se as condições de cultura empregadas nesse trabalho são, de fato, válidas para o estudo do amadurecimento dos ovos em circunstâncias livres de variações intrínsecas desconhecidas, como em hospedeiros animais. Em outras 16 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado palavras, é preciso definir se as condições de cultura utilizadas, por si só, não afetam o desenvolvimento dos ovos e seus processos biológicos. Outra intenção dessa dissertação é propor um sistema de estadiamento para o desenvolvimento ovular de S. mansoni a partir de critérios morfológicos e morfogenéticos, como previamente introduzido por Hartenstein e Ehlers (2000) para outros platielmintos. A identificação morfológica desses estádios permite comparar eventos do desenvolvimento, tais como movimentos morfogenéticos, expressão gênica e diferenciação celular. Isso é especialmente útil no caso dos esquistossomos, já que seus ovos são encontrados em diferentes momentos de amadurecimento nos tecidos do hospedeiro. Por fim, a presença de certos antígenos do ovo foi avaliada durante a sua embriogênese. 17 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I. 2 – Fundamentação Teórica I. 2. 1 – Classificação Taxonômica Reino: Metazoa Filo: Platyhelminthes Classe: Trematoda Subclasse: Digenea Ordem: Strigeidida Família: Schistosomatidae Gênero: Schistosoma Espécie: Schistosoma mansoni I. 2. 2 – Características gerais dos esquistossomos Os esquistossomos são trematódeos (do grego trematodes, furado) digenéticos (do grego dis, duplo; genos, raça), inteiramente adaptados ao parasitismo e com ciclo biológico complexo. O termo trematódeo refere-se a estruturas notáveis da superfície do corpo – as ventosas. Uma delas, situada ventralmente, é particularmente bem desenvolvida e delimitada do parênquima por uma cápsula distinta, sendo denominada acetábulo. Uma segunda ventosa dispõese em torno da boca nas espécies parasitas – é a ventosa oral. Os trematódeos possuem ainda um sistema reprodutivo com canal de Laurer e um cirro como órgão masculino copulatório (também encontrado em outros grupos, mas provavelmente não-homólogo). Poro(s) excretor(es) localiza(m)-se posteriormente. Eles têm também uma larva (miracídio) com células epidérmicas ciliadas, com núcleos intra-epiteliais (neoderme). O hospedeiro invertebrado é preponderantemente um molusco (raramente, um anelídeo), enquanto o hospedeiro vertebrado pode ser facultativo ou obrigatório. Por sua vez, o termo digenético refere-se aos dois tipos de geração no ciclo de vida: (1) os esporocistos, que parasitam o hospedeiro intermediário e reproduzem-se assexualmente; e (2) o adulto, que é primariamente endoparasito de vertebrados (exceto Cyclostomata) e reproduz-se sexualmente. Outras características desse grupo referem-se à organização em fileiras transversais regulares das células epidérmicas ciliadas dos miracídios, bem como a presença de outra forma larvar, chamada cercária. Usualmente, os vermes adultos nesse grupo são hermafroditas; porém, os esquistossomos 18 (Fig. 1.1) e poucos outros Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado trematódeos são dióicos (do grego di, dois; oykos, casa), ou seja, possuem sexos separados. Figura 1.1. Casal de vermes adultos de Schistosoma mansoni. A fêmea, destacada artificialmente na cor verde, fica alojada no canal ginecóforo do macho. Na região anterior do macho é possível visualizar as duas ventosas (setas). Fonte: Scientific American Brasil. 2004 (28) Set. I. 2. 3 – Esquistossomose mansoni As histórias sobre o descobrimento e os primeiros estudos da esquistossomose como moléstia humana são um pouco obscuras e fontes ainda de grandes debates entre as escolas médicas (ver Katz 2008). O primeiro relato escrito sobre esquistossomose humana data do antigo Egito (Olds e Dasarathy 2001, citando Girges 1934). Neste relato, a presença de um verme foi associada com sangramento urinário. Todavia, a primeira descrição formal desse verme foi somente realizada no século XIX, pelo patologista alemão Theodor Bilharz (18251862). Bilharz (1853a) relatou a presença de vermes adultos na veia porta hepáticointestinal de um homem jovem autopsiado (apud Olds e Dasarathy 2001). Em sua homenagem, portanto, a denominação bilharziose, que é utilizada ainda hoje em alguns países. Bilharz (1853b, 1856) também relatou alterações patológicas características, bem como sintomas clínicos da esquistossomose. Na época, os vermes apresentados por Bilharz foram denominados de Distomium haematobium (Bilharz 1853b). Poucos anos depois, Wienland e Cobbold sugeriram o nome Schistosoma, pois constataram que apenas uma das duas ventosas do então Distomum levava a uma cavidade oral (Cobbold 1859; Warren 19 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado 1973). A etimologia do termo Schistosoma refere-se à fenda (“schisto”) no corpo (“soma”) do macho, atualmente denominada canal ginecóforo. Assim, desde 1864, a nomenclatura científica oficial utilizada para essa doença tem sido “esquistossomose”. Alguns anos mais tarde, ao examinar as fezes de um paciente, o médico escocês Patrick Manson (1844-1922) sugeriu a existência de uma nova espécie, com ovos com espinho lateral (Manson 1902). Pouco tempo depois, a partir da análise de um único verme adulto macho, o médico italiano Louis Westenra Sambon (18651931) descreveu uma nova espécie (Sambon 1907a, b), a qual denominou Schistosoma mansoni em homenagem ao seu admirado amigo e mestre (Wilkinson 2002; Katz 2008). Embora Bilharz (1853b) tenha observado ovos com um espinho terminal na urina de seus pacientes, ele também encontrou ovos nas fezes e vermes adultos na veia porta hepático-intestinal. Tais achados não deixavam explícito qual das espécies de Schistosoma (S. haematobium ou S. mansoni) havia sido descrita. Em 1908, o médico brasileiro Manuel Augusto Pirajá da Silva (1873-1961) publicou o primeiro trabalho sobre esquistossomose no Brasil (Pirajá da Silva 1908a), relatando que havia observado quatro anos antes, mas que não sabia explicar, ovos com espinho lateral nas fezes de pacientes. Somente após a leitura dos trabalhos de Manson e Sambon que Pirajá da Silva pôde compreender o seu achado (Pirajá da Silva 1908a; Katz 2008). Ele avaliou os 20 primeiros casos humanos da doença na Bahia, forneceu seu diagnóstico e descreveu suas manifestações clínicas. Em três oportunidades, o médico brasileiro realizou a necrópsia dos pacientes e encontrou apenas um verme nos dois primeiros casos e 24 vermes (19 machos, uma fêmea e dois casais) no terceiro. Pirajá da Silva ainda fotografou um ovo com espinho lateral no útero de uma fêmea, além de outras características particulares do referido parasito. A eclosão do miracídio também foi observada por Pirajá da Silva. A descrição precisa do tamanho e características dos vermes fizeram Pirajá da Silva concluir que tais exemplares constituíam uma espécie diferente de S. haematobium (Pirajá da Silva 1908a, b, 1909; Katz 2008). Todos esses indícios destacados pelo médico brasileiro contribuíram fortemente para a consolidação da espécie S. mansoni na comunidade científica internacional da época (Andrade 2002; Katz 2008). A distribuição geográfica do S. mansoni abrange o continente africano, a América do Sul e as Antilhas (Rey 2001). Os vermes normalmente determinam uma infecção assintomática ou oligossintomática, a depender principalmente da carga parasitária e de características do hospedeiro; o quadro inicial é geralmente 20 Considerações Iniciais discreto, com Dissertação de Mestrado exantema (erupções cutâneas), prurido (coceira) e outras manifestações alérgicas locais, devido à penetração das cercárias. Com o tempo (cerca de oito dias após a infecção), os vermes começam a atingir o sistema porta intra-hepático e amadurecem. Febre (aumento da temperatura corporal), eosinofilia (aumento da taxa de eosinófilos no sangue), linfadenopatia (inflamação dos linfonodos), esplenomegalia (aumento patológico do volume do baço) e urticária (lesão cutânea, causada por edema localizado) podem manifestar-se. O fígado pode aumentar também de tamanho (hepatite difusa). Ulcerações necróticas hemorrágicas da mucosa disseminam-se por todo o intestino. Com a produção continuada de ovos, lesões nodulares (granulomas) levam a extensa fibrose do fígado e outros órgãos, como o baço. Casos graves exibem fibrose periportal, hipertensão porta e hepatoesplenomegalia, com acentuado comprometimento do funcionamento dos órgãos. Lesões cardiopulmonares, renais e neurológicas também podem ocorrer, devido à embolização de ovos para tais regiões. O rompimento de varizes esofagianas pode causar o óbito do paciente (Rey 2001; Lenzi et al. 2008). I. 2. 4 – O Ciclo Biológico do Schistosoma mansoni Eventos complexos são decisivos para a patogênese, o sucesso reprodutivo e a continuação do ciclo biológico dos esquistossomos (Fig. 1.2). De forma simplificada, um vertebrado infectado libera ovos de S. mansoni em suas fezes. Caso esses ovos atinjam a massa de água, em condições adequadas de temperatura, luminosidade, salinidade e pH, há a eclosão de uma forma larvar, chamada miracídio. Os miracídios nadam livremente e têm a capacidade de infectar caramujos do gênero Biomphalaria. Nesses hospedeiros intermediários, uma série de divisões celulares e modificações morfológicas levam à formação de cercárias. A cercária é o agente penetrante na pele ou na mucosa de mamíferos suscetíveis (humanos e outros primatas, carnívoros, marsupiais, edentatas, arctiodáctilos e insetívoros). Tais mamíferos recebem a denominação de hospedeiros definitivos, por abrigarem a forma do parasito que realiza reprodução sexuada. Aspectos da localização e do reconhecimento, bem como a subsequente penetração através da pele, as fases de desenvolvimento e a migração até o sistema porta-hepático intestinal desses mamíferos suscetíveis foram revistos recentemente em um capítulo de livro ainda a ser publicado (Lenzi et al. 2008a) no livro “Esquistossomose mansoni: uma visão multidisciplinar” (Carvalho et al. 2008). Esse 21 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado capítulo, intutilado “Migração e desenvolvimento do Schistosoma mansoni no hospedeiro definitivo” (Lenzi et al. 2008a). Figura 1.2. Ciclo biológico de Schistosoma mansoni. O casal em cópula aloja-se preferencialmente nas veias porta e mesentéricas do hospedeiro mamífero. A fêmea libera os ovos na corrente sanguínea, que são carregados passivamente até ficarem retidos em delgados capilares do sistema porta-hepático intestinal. Os ovos devem ser eliminados junto com as fezes para dar continuidade ao ciclo. Na água, os miracídios eclodem e penetram em caramujos do gênero Biomphalaria, se desenvolvendo em esporocistos primários e secundários, até originarem as cercárias, forma infectante para o vertebrado suscetível. Após a penetração em hospedeiro definitivo, as cercárias se transformam em esquistossômulos, que amadurecem no sistema porta-hepático intestinal. Fonte: Panasco MS. Estudo morfo-funcional do tecido linfo-mielóide celomático em camundongos normais e infectados por Schistosoma mansoni, sua caracterização em humanos e resposta a vários outros agentes infecciosos e parasitários [tese]. Rio de Janeiro: Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz; 2006. 22 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I. 2. 5 – Desenvolvimento Embrionário dos Platielmintos Diversos livros-texto sobre embriologia animal ou humana, zoologia geral ou de biologia do desenvolvimento propriamente ditos têm como capítulos introdutórios extensas revisões sobre conceitos fundamentais para a compreensão dos fenômenos biológicos relacionados ao desenvolvimento dos animais e suas relações filogenéticas. Com o objetivo de facilitar o entendimento dos termos utilizados nesse trabalho e embasar as discussões subsequentes, alguns desses conceitos serão sumariados a seguir. Exceto quando indicado, as informações dessa seção foram extraídas de Gilbert (2003) e Brusca e Brusca (2003). I.2.5.1 – Conceitos básicos em biologia do desenvolvimento Tradicionalmente, o estudo do desenvolvimento animal era conhecido como embriologia e compreendia a fase de um organismo entre a fertilização e o seu nascimento. No entanto, o desenvolvimento não termina ao nascimento. A maioria dos animais se mantém em constante renovação de células, mesmo durante o envelhecimento. Por sua vez, alguns organismos sofrem metamorfose ou podem apresentar uma notável capacidade de regeneração, como as planárias. Por essa razão, a disciplina que estuda os processos embrionários e do desenvolvimento passou a ser conhecida como biologia do desenvolvimento. Basicamente, o desenvolvimento busca gerar diversidade celular e ordem, além de garantir a continuidade da vida, de uma geração para a seguinte. De forma geral, as células dos animais se organizam em unidades funcionais, primeiramente como tecidos e então como órgãos, podendo formar sistemas de órgãos. Nesse tipo de divisão didática, cada uma dessas estruturas tem papéis específicos, inter-relacionados e interdependentes, que sustentam a vida de todo o organismo. Suas atividades complexas são coordenadas em padrões adaptativos previsíveis, também interdependentes. Segundo Maturana e Varela (1994), a organização caracteriza-se como o conjunto de relações entre os seus componentes, que define a identidade do sistema. Organização difere de estrutura, que configura fisicamente os componentes estruturais e suas relações concretas. A estrutura do sistema pode alterar-se sem que haja perda de organização percebida pelo observador. Isso acontece durante o desenvolvimento de um ser vivo: fenótipos adultos resultam a partir de sequências hierárquicas específicas dos estádios do desenvolvimento e padrões evolutivos revelam-se, em grande parte, através das ontogenias. 23 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado A ontogenia de um organismo do reino animal tem início com a fecundação, que é resultante do encontro de duas células sexuais especializadas, os gametas. O gameta masculino ou espermatozóide, localiza, reconhece e penetra ativamente no gameta feminino, ou oócito. Nesse momento, ocorre a fusão dos pró-núcleos haplóides em um núcleo diplóide, que contém as metades do genoma dos genitores. O zigoto sofre uma série de divisões mitóticas, conhecidas coletivamente por clivagem, que dividem o grande volume de citoplasma em numerosas células nucleadas menores, os blastômeros. As divisões celulares são frequentemente referidas como iguais ou desiguais, indicando tamanhos comparativos entre os blastômeros. Três tipos de blastômeros podem ser produzidos a partir de diferentes modos de clivagem: em divisões iguais, as células resultantes possuem o mesmo volume e recebem o nome de mesômeros; em divisões desiguais, originam-se células grandes, ou macrômeros, e células menores, os micrômeros. Quando as células resultantes são apenas levemente diferentes em tamanho, diz-se que a divisão celular foi sub-igual. O volume citoplasmático das células-filha não aumenta durante a clivagem, devido à supressão do período de crescimento entre as divisões celulares (Fig. 1.3). Certos aspectos dos padrões de clivagem são determinados pela quantidade e distribuição de nutrientes, coletivamente designados como vitelo, que auxiliam no desenvolvimento inicial do embrião. Em geral, o vitelo retarda ou mesmo impede as divisões celulares. Alguns fatores citoplasmáticos maternos, como reguladores protéicos e RNAm, também são determinantes na clivagem, influenciando o ângulo de formação do fuso mitótico e o tempo de sua polimerização. Figura 1.3. Ciclo celular de blastômeros e células somáticas. (A) O simples ciclo celular bifásico de precoces blastômeros de anfíbio tem apenas dois estados, S (de síntese de DNA, do inglês DNA synthesis) e M (de mitose, do inglês mitosis). A síntese de ciclina B (do inglês, 24 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado cyclin B) permite a progressão para M, enquanto a degradação de ciclina B permite que as células passem para a fase S. (B) Ciclo celular de uma típica célula somática. A mitose é seguida de uma fase de “intérfase” (do inglês, interphase). Esse período é subdividido nas fases G1, S e G2. As células que estão diferenciando-se estão usualmente “fora” do ciclo celular, em uma fase G1 estendida, denominada G0. As ciclinas responsáveis pela progressão através do ciclo celular e suas respectivas quinases (do inglês, kinase) são mostradas nos seus pontos de regulação do ciclo celular. Fonte: Gilbert SF. Developmental Biology. 7ª ed. Sunderland: Sinauer Associates. 2003. A produção de vitelo (vitelogênese) é, geralmente, a fase mais longa da produção de ovos. Todavia, sua duração varia enormemente entre as espécies e suas taxas de produção são dependentes das estratégias empregadas. Por exemplo, espécies oportunistas (ou r-selecionadas) produzem uma grande quantidade de ovos e, por isso, necessitam fazer uma rápida conversão de nutrientes para a produção de vitelo; espécies especialistas (ou k-selecionadas), por outro lado, utilizam padrões mais vagarosos e, consequentemente, têm uma menor produção de ovos. Zigotos isolécitos contêm uma quantidade relativamente escassa de vitelo, uniformemente distribuída por todo seu citoplasma. Nesse caso, a clivagem é total ou holoblástica, isto é, o sulco de clivagem estende-se por toda a célula. Esse tipo de clivagem é encontrado em equinodermos, anfioxos, anelídeos, moluscos, platielmintos, tunicados, mamíferos e nematóides. Em anfíbios, a disposição moderada de vitelo em seus zigotos (mesolécito) causa um ligeiro deslocamento dos sulcos de clivagem. Em certos casos, pode ocorrer concentração de vitelo em alguma região da célula-ovo, usualmente definindo sua polarização (eixo animalvegetal): o pólo rico em vitelo é denominado pólo vegetal, enquanto que o outro, com pouco ou nenhum vitelo, é chamado pólo animal. Essa polaridade pode ser aparente ou tornar-se reconhecível somente com o prosseguimento do desenvolvimento. Zigotos com esse padrão são conhecidos como telolécitos e sofrem clivagem meroblástica, onde somente uma parte do citoplasma é clivada. Frequentemente, o núcleo desses zigotos fica deslocado para o pólo animal. Ovos telolécitos ocorrem em cefalópodes, peixes, répteis e pássaros. Na maioria dos insetos, o vitelo concentra-se no centro do zigoto. Tal localização define os ovos como centrolécitos. As divisões mitóticas ocorrem superficialmente (clivagem superficial), somente em uma estreita região do citoplasma na periferia da célulaovo. Os padrões de clivagem recebem ainda outros nomes específicos, segundo as orientações de seus sulcos de divisão (Fig. 1.4). A Figura 1.5 sumaria esses 25 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado padrões. Em razão do objeto de estudo dessa dissertação, apenas a clivagem em espiral, presente em platielmintos, anelídeos e moluscos, será detalhada a seguir. Detalhes sobre os outros tipos de clivagem podem ser encontrados em Gilbert (2003). Figura 1.4. Planos da clivagem holoblástica total. (A) Clivagem igual. (B) Clivagem desigual produz micrômeros e macrômeros. (C-E) Planos de clivagem em relação ao eixo animal-vegetal do zigoto. (C) Clivagem paralela longitudinal ao eixo (=meridional), animal-vegetal. (D) Clivagem equatorial, perpendicular ao eixo animal-vegetal e dividindo o zigoto em duas metades animal e vegetal iguais. (E) Clivagem latitudinal, perpendicular ao eixo animal-vegetal, mas sem passar pelo plano equatorial. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. 26 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.5. Resumo dos principais padrões de clivagem. Para mais informações, ver Gilbert SF. Developmental Biology. 7ª ed. Sunderland: Sinauer Associates. 2003. 27 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Na clivagem holoblástica espiral, os planos de clivagem são formados em ângulos oblíquos. Com isso, as células-filha se deslocam para sobre os sulcos de clivagem entre duas outras células (Fig. 1.6). Quando a divisão envolve o deslocamento das células no sentido horário (visto do pólo animal), ela é chamada dextrotrópica; quando ocorre no sentido anti-horário, recebe o nome levotrópica. Esses tipos de giro ocorrem em alternância, aproximadamente até o estádio de 64células. Todavia, as divisões celulares não são necessariamente sincrônicas. Portanto, nesse padrão de clivagem, as células assumem a orientação mais termodinamicamente estável de agregação. Figura 1.6. Clivagem em espiral do molusco Trochus. (A) Visão do pólo animal. (B) Visão do lateral. As células derivadas do blastômero A estão coloridas. Os fusos mitóticos, representados apenas nos estádios iniciais, dividem as células desigualmente e em um ângulo oblíquo aos eixos vertical e horizontal. Fonte: Gilbert SF. Developmental Biology. 7ª ed. Sunderland: Sinauer Associates. 2003. Geralmente, os embriões que realizam esse tipo de clivagem sofrem menos divisões celulares antes de se reorganizarem para a estruturação de seus tecidos (processo conhecido como gastrulação, relatado adiante), o que facilita a identificação das linhagens celulares formadas. Representações gráficas dessa diferenciação celular em um embrião são comumente chamadas de mapas de destino. Atualmente, corantes vitais ou marcadores genéticos podem ser usados com essa finalidade. As células individuais são acompanhadas para verificar que 28 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado estruturas da larva ou do adulto elas originarão. Isso é possível porque o destino celular é estreitamente regulado por interações célula-célula ou pela distribuição assimétrica particular de moléculas de padronização (morfógenos). Em alguns casos, os destinos celulares são determinados muito inicialmente no desenvolvimento, ainda na primeira ou segunda clivagem. Quando isso ocorre, a clivagem é dita determinada, pois o blastômero faltante impede o correto desenvolvimento posterior. Em outros casos, alguns animais mantêm seu adequado padrão de desenvolvimento, mesmo quando seus blastômeros são separados durante os estádios iniciais de duas ou quatro-células, ou mesmo em estádios mais tardios. Nesse caso, os blastômeros que se perdem durante o desenvolvimento são substituídos por outros e a clivagem é dita indeterminada. Com isso, os destinos celulares são determinados apenas mais tardiamente no desenvolvimento. Em 1892, ao estudar o desenvolvimento embrionário do poliqueto Neanthes succinea, o zoólogo e geneticista americano Edmund B. Wilson propôs um sistema de codificação na determinação dos destinos celulares para padrões de clivagem em espiral (Wilson 1892). Tal sistema tem aplicação geral, servindo como referência para a descrição dos padrões de clivagem de outros grupos animais. No início da clivagem em espiral, após a primeira divisão, as duas célulasfilha recebem os códigos AB e CD. Em seguida, no estádio de 4-células, as células resultantes são codificadas como A, B, C e D, segundo o sentido horário, quando analisadas a partir do pólo animal. Essas quatro células são referidas como um quarteto de macrômeros, podendo ser coletivamente codificadas por Q. A clivagem subsequente é desigual e as quatro células menores são deslocadas em modo dextrotrópico, posicionando-se no pólo animal da mórula. Tais células formam o primeiro quarteto de micrômeros (coletivamente chamadas de células 1q) e recebem os códigos individuais 1a, 1b, 1c e 1d. Mesmo que macrômeros e micrômeros possam ter tamanhos similares em alguns casos, tais termos são sempre utilizados na descrição da clivagem em espiral. Nesse sistema, o algarismo que precede as letras indica o número de vezes que os macrômeros originais (Q = A, B, C, D) se dividiram para corresponder ao número do quarteto de micrômeros produzidos, isto é, o algarismo “1” no embrião no estádio de oito-células indica que as células Q dividiram-se uma vez. As letras minúsculas referem-se aos respectivos macrômeros de origem, enquanto as letras maiúsculas continuam designando os macrômeros (agora também precedidos pelo algarismo “1”, indicando a formação do primeiro conjunto de micrômeros). Assim, a mórula no estádio de oito-células possui quatro pares de células-filha (1Q = 1A, 1B, 1C, 1D; 1q = 1a, 1b, 1c, 1d): 29 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado 1a A 1b 1c B 1A C 1B 1d D 1C 1D A clivagem seguinte, do estádio de oito para 16-células, ocorre de modo levotrópico. Os macrômeros 1Q se dividem para produzir um segundo quarteto de micrômeros (2q = 2a, 2b, 2c, 2d). O primeiro quarteto de micrômeros (1q) também se divide, formando oito células-filha. Tais células continuam sendo identificadas pela letra correspondente ao macrômero-pai, mas passam a ostentar também numerais expoentes. Assim, o micrômero 1a (do embrião de 8-células) produz duas células-filhas, codificadas por 1a1 e 1a2. O expoente “1” se refere à célula fisicamente mais próxima do pólo animal, enquanto que a outra célula recebe expoente “2”. Apenas os prefixos dos macrômeros são modificados com as divisões subsequentes (indicando o número de divisões individuais que tais células sofreram). O estádio de 16-células, portanto, inclui as seguintes células: Derivadas de 1q Derivadas de 1Q 1a1, 1b1, 1c1, 1d1 1a2, 1b2, 1c2, 1d2 2q = 2a , 2b, 2c, 2d 2Q = 2A , 2B, 2C, 2D Na transição do estádio de 16 para 32-células, a próxima clivagem ocorre com o deslocamento das células de modo dextrotrópico. Os macrômeros 2Q dividem desigualmente, originando o terceiro quarteto de micrômeros (3q = 3a, 3b, 3c, 3d) e outro quarteto de macrômeros-filho (3Q = 3A, 3B, 3C, 3D). Todos os doze micrômeros previamente existentes também se dividem. Desse modo, expoentes são adicionados às células derivadas dos primeiro e segundo quarteto de micrômeros, segundo a regra de posicionamento anteriormente mencionada. Portanto, a célula 1b1 divide-se para produzir as células 1b11 e 1b12; a célula 1a2 produz as células 1a21 e 1a22; a célula 2c origina as células 2c1 e 2c2 e assim por diante. Os expoentes não devem ser considerados como números de dois dígitos (isto é, “vinte e um” ou “vinte e dois”), mas interpretados como sequências de dois dígitos (isto é, “um-um”, “um-dois”, “dois-um” ou “dois-dois”), refletindo a linhagem precisa de cada célula. O estádio de 32-células é composto das células: 30 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado 1a11, 1b11, 1c11, 1d11 1a12, 1b12, 1c12, 1d12 Derivadas de 1q 1a21, 1b21, 1c21, 1d21 1a22, 1b22, 1c22, 1d22 Derivadas de 2q Derivadas de 2Q 2a1, 2b1, 2c1, 2d1 2a2, 2b2, 2c2, 2d2 3q = 3a , 3b, 3c, 3d 3Q = 3A , 3B, 3C, 3D A divisão subsequente, para o estádio de 64-células, segue o mesmo padrão, com as alterações apropriadas na codificação. O deslocamento das células ocorre de modo levotrópico, resultando nas seguintes células: 1a111, 1b111, 1c111, 1d111 1a112, 1b112, 1c112, 1d112 1a121, 1b121, 1c121, 1d121 1a122, 1b122, 1c122, 1d122 Derivadas de 1q 1a211, 1b211, 1c211, 1d211 1a212, 1b212, 1c212, 1d212 1a221, 1b221, 1c221, 1d221 1a222, 1b222, 1c222, 1d222 2a11, 2b11, 2c11, 2d11 2a12, 2b12, 2c12, 2d12 Derivadas de 2q 2a21, 2b21, 2c21, 2d21 2a22, 2b22, 2c22, 2d22 Derivadas de 3q Derivadas de 3Q 3a1, 3b1, 3c1, 3d1 3a2, 3b2, 3c2, 3d2 4q = 4a , 4b, 4c, 4d 4Q = 4A , 4B, 4C, 4D 31 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado O sistema de codificação de Wilson é simples e bastante elegante, pois cada codificação conta a história e a posição de cada célula no embrião. Por exemplo, no embrião de 32-células, o código 1d11 indica que: (1) a célula deriva do primeiro quarteto de micrômeros; (2) que seu macrômero de origem é a célula D; (3) que o micrômero original 1d se dividiu duas vezes desde a sua formação, e; (4) que essa célula particular está na região mais apical do embrião, em relação às suas célulasirmãs. Nenhuma das células divide o mesmo código, possibilitando a identificação individual precisa dos blastômeros e de suas linhagens (ver Fig. 1.6). Em certos animais, padrões característicos de distribuição celular, formados pela orientação de alguns micrômeros apicais do primeiro quarteto, aparecem tardiamente. Mais próximas do topo, as células 1q111 assumem um aspecto semelhante a uma roseta. Em anelídeos e equiúros, os micrômeros 1q112 parecem formar uma cruz grosseira nos ângulos retos da roseta. Essa cruz recebe o nome de cruz anelídeo. Em moluscos e sipunculados, tal cruz persiste e, adicionalmente, forma-se outra cruz a partir das células 1q12 e suas derivadas. A cruz molusco posiciona-se entre as células da cruz anelídeo (Fig. 1.7). Essas cruzes são características embriológicas únicas, importantes na determinação das relações filogenéticas naturais entre certos grupos de metazoários. Figura 1.7. Clivagem em espiral. (A-D) Divisões sincrônicas, até o estádio de 32células. As células estão marcadas segundo o sistema de codificação de E.B. Wilson (visão do pólo animal). (E) Representação esquemática de um embrião composto aproximadamente no estádio de 64-células, mostrando as posições de roseta, cruz anelídeo e cruz molusco. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. 32 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Ao final da clivagem, os blastômeros do embrião compõem uma estrutura denominada blástula, que antecede a formação das camadas germinativas. Pelo menos quatro tipos são identificados nos invertebrados: (1) a celoblástula, (2) a estereoblástula, (3) a discoblástula e (4) a periblástula. A celoblástula é uma esfera oca, formada por uma parede celular. O espaço no interior dessa esfera de células é chamado de blastocele, ou de cavidade corporal primária. Por sua vez, a estereoblástula é uma esfera sólida de células, obviamente sem blastocele. Esse é o tipo de blástula dos platielmintos. Na discoblástula, um disco de células se localiza no pólo animal do embrião, sobre a massa de vitelo não clivada. Finalmente, a periblástula é similar à celoblástula, mas a cavidade interior é preenchida por vitelo acelular. Nos mamíferos, a blástula é chamada de blastocisto. Após o término da clivagem, as células primordiais da blástula se reorganizam em camadas germinativas através de um processo chamado gastrulação. Usualmente, tal processo envolve todo o embrião em uma combinação de alguns tipos básicos de movimentos celulares: (1) invaginação, (2) involução, (3) ingressão, (4) delaminação e (5) epibolia. Na invaginação, ocorre uma dobra de uma camada de células (frequentemente, no pólo vegetal) para o interior do embrião, como um saco. A camada celular interna é chamada de endoderma e o saco, por ela definido, delimita o intestino primitivo, ou arquêntero. A camada celular que se mantém externamente é denominada ectoderma. Na involução, as células nas extremidades do embrião (geralmente uma discoblástula) proliferam sob o disco, estendendo-se adjacentes à superfície basal das células que permanecem no exterior. Na ingressão, algumas células se separam da superfície do embrião e migram independentemente para a blastocele, eventualmente preenchendo-a como uma sólida massa de endoderma. Na ingressão unipolar, esse processo ocorre somente no pólo vegetal, enquanto na ingressão multipolar, ocorre por praticamente toda a blástula. Na delaminação, uma camada celular da blástula se divide em duas camadas mais ou menos paralelas. Embora semelhante à ingressão, esse tipo de movimento celular resulta na formação de uma camada de células inteiramente nova ou, eventualmente, uma massa sólida de endoderma. Na epibolia, há a expansão do ectoderma presuntivo em volta das camadas mais profundas do embrião. As células do pólo animal proliferam rapidamente em direção ao pólo vegetal, empurrando as células para baixo para circundar o endoderma. Pode ocorrer também pela modificação de suas formas ou por diversas camadas intercalando-se em menos camadas. Frequentemente, os três mecanismos ocorrem concomitantemente. Tipicamente, 33 o arquêntero é formado Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado secundariamente, como um espaço dentro do endoderma desenvolvido. A Figura 1.8 representa esquematicamente tais movimentos celulares. As camadas germinativas do embrião regem a formação de sistemas de órgãos específicos. Uma característica marcante da unidade dos metazoários é a consistência dos destinos dessas camadas. O ectoderma gera a camada mais externa do embrião (epiderme) e o sistema nervoso; o endoderma transforma-se na camada mais interna do embrião, originando o epitélio do tudo digestório e órgãos associados; uma terceira camada, quando presente, posiciona-se entre o ectoderma e o endoderma, constituindo o envoltório celômico, o sistema circulatório e a maioria das estruturas internas de suporte e musculatura. Quando a terceira camada deriva do endoderma, ela é denominada endomesoderma, ou mesoderma verdadeiro. Geralmente, é simplesmente referida como mesoderma. Figura 1.8. Tipos de movimentos celulares durante a gastrulação. A gastrulação de qualquer organismo em particular é um conjunto de diversos desses movimentos. Fonte: Gilbert SF. Developmental Biology. 7ª ed. Sunderland: Sinauer Associates. 2003. Dois processos básicos podem originar o mesoderma. Na maioria dos filos que realizam clivagem espiral (p.ex. platielmintos, anelídeos e moluscos), um único micrômero – a célula 4d ou mesentoblasto – produz o mesoderma por proliferação, se posicionando entre o arquêntero (endoderma) e a parede corporal (ectoderma). As outras células do quarteto 4q e as células 4Q usualmente contribuem para o endoderma; em outros táxons (p.ex. equinodermos e cordados), o mesoderma surge a partir da parede propriamente dita do arquêntero (i.e., do endoderma préformado), como folheto sólido ou como bolsa oca (Fig. 1.9). Os organismos que apresentam essas três camadas são agrupados como triploblásticos. Entretanto, alguns organismos como os poríferos, cnidários e ctenóforos, carecem de um mesoderma verdadeiro. A camada intermediária é 34 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado derivada do ectoderma, sendo em grande parte acelular. Por tal razão, é referida por ectomesoderma. Esses animais são considerados diploblásticos. Figura 1.9. Modos de formação do mesoderma na gástrula tardia. Secção frontal. (A) Mesoderma forma-se a partir de derivados dos mesentoblastos. (B) Mesoderma formado por embolsamento arquentérico. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. A partir da aquisição evolutiva de um mesoderma verdadeiro, os filos triploblásticos alcançaram novas sofistificações corporais, que possibilitaram o aumento de sua complexidade estrutural. Uma das mais importantes tendências na evolução foi o surgimento de uma cavidade corporal preenchida por um fluído, entre parede corporal externa e o tubo digestório. Essa nova organização, de “umtubo-dentro-de-outro-tubo”, permitiu que os órgãos internos (tubo digestório e seus anexos) não fossem mais espacialmente limitados pelos seus pontos de contato com a parede corporal, exceto nas suas extremidades. Além de servir para amortecer mecanicamente o contato entre esses dois grandes tubos independentes, a cavidade corporal preenchida por fluído possibilitou o desenvolvimento e a expansão de novas estruturas dentro do corpo. Outrossim, a câmara corporal serviu também como uma câmara de armazenamento de produtos corporais, bem como exerceu os papéis de meio para circulação e de esqueleto hidrostático incipiente. Em certos triploblásticos, no entanto, o mesoderma verdadeiro não origina dessa cavidade corporal. Ao invés disso, produz um mesênquima, no qual as células ficam esparsamente espalhadas em uma matriz gelatinosa (ou mesóglea). O grupo acelomado (do grego a, “sem”; coel, “oco”, “cavidade”) é composto por Platyhelminthes, Entoprocta, Gnathostomulida e Gastrotricha. Por sua vez, virtualmente todos os outros animais triploblásticos desenvolvem uma cavidade 35 Considerações Iniciais preenchida por fluído Dissertação de Mestrado entre a parede corporal e o intestino. Animais blastocelomados (p.ex. rotíferos, nematóides e outros) possuem uma cavidade revestida apenas parcialmente pelo mesoderma; como na maioria dos casos esse espaço representa resquícios da blastocele, essa estrutura é atualmente referida como blastoceloma. Já os metazoários eucelomados (p.ex. moluscos, anelídeos, artrópodes e cordados) têm a cavidade corporal originada a partir do mesoderma propriamente dito e revestida completamente por uma delgada membrana de origem também mesodérmica, chamada peritôneo. Essa cavidade é referida como celoma verdadeiro (ou euceloma). A formação do celoma está intimamente relacionada com a formação do mesoderma. Quando o mesoderma é produzido pela proliferação do mesentoblasto, a cavidade corporal origina-se por esquizocelia. As massas sólidas de mesoderma, localizadas lateralmente no embrião, expandem-se e tornam-se ocas; eventualmente, transformam-se em espaços celômicos, de parede celular delgada (Fig. 1.10). A quantidade de tais espaços pareados pode variar enormemente, estando frequentemente associada com a segmentação (p.ex. em anelídeos). Na enterocelia, o surgimento do celoma ocorre concomitantemente com a formação do mesoderma. Nesse caso, ambos os eventos compreendem o mesmo processo, que é chamado de embolsamento arquentérico. Nele, expansões em forma de bolsa se desprendem do arquêntero como compartimentos celômicos completos e suas paredes celulares são definidas como mesoderma. Em alguns casos, primeiro surge o mesoderma como um folheto sólido; posteriormente, essa massa celular torna-se uma bolsa oca. Frequentemente, a conclusão da formação do celoma por enterocelia define um arranjo tripartido, no qual as cavidades corporais são designadas protocele, mesocele e metacele (Fig. 1.11). Mesmo com as camadas germinativas estabelecidas, os órgãos não se formam independentemente: interações celulares e novos rearranjos teciduais precisam ocorrer para produzi-los. Esse processo é chamado de organogênese. Nele, diversos órgãos do jovem organismo podem ser formados por células de mais de uma camada germinativa. A comunicação celular é essencial, seja entre células adjacentes ou entre células distantes. Sinais moleculares, como hormônios, fatores de crescimento e morfógenos, modificam o comportamento celular de determinados tecidos, em momentos adequados. Esse fenômeno é coletivamente conhecido por indução, enquanto tal aptidão de resposta a um determinado indutor específico é denominada competência. A competência de resposta é ativamente adquirida durante o desenvolvimento. Alguns tipos celulares realizam longas migrações até se estabelecerem em sua localização final. Nesse momento, o reconhecimento seletivo 36 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado e as adesões célula-célula ou célula-matriz extracelular necessitam ser altamente precisos. A própria morte celular, programada e estreitamente regulada, auxilia na modelagem de algumas estruturas. Ao final da organogênese, o jovem organismo emerge para o ambiente externo, seja através da eclosão do ovo ou pelo nascimento. Entretanto, o seu desenvolvimento continua até a sua morte. Figura 1.10. Formação do celoma por esquizocelia. Secção frontal (A) Condição précelomática, com pacotes pareados de mesoderma. (B) Esvaziamento dos pacotes mesodérmicos para produzir um par de espaços celômicos ocos. (C) Proliferação progressiva de pares de espaços celômicos arranjados seriadamente. Esse processo ocorre em anelídeos metaméricos. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. Figura 1.11. Formação do celoma por enterocelia. Secção frontal (A) Embolsamento arquentérico. (B) Proliferação e subsequente esvaziamento de uma placa de mesoderma a partir do arquêntero. (C) Arranjo tripartido típico dos celomas em um embrião deuterostomado. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. 37 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I.2.5.2 – Filogenia dos platielmintos, com ênfase em Schistosomatidae e Schistosoma Basicamente, o termo filogenia refere-se ao relacionamento evolutivo entre organismos, desde o aparecimento das primeiras espécies até o presente. Todavia, até pouco tempo atrás, a tarefa de remontar tal história evolutiva esbarrava na ausência de testemunhos fósseis adequadamente preservados. Provavelmente, os ancestrais metazoários careciam de estruturas rígidas que pudessem favorecer o processo de preservação (fossilização) por centenas de milhares de anos, desde o período Pré-cambriano e o início do Cambriano. Portanto, a solução seria fazer uma “paleontologia sem fósseis” – termo cunhado pelo biólogo molecular Sean Carrol (segundo DiSilvestro 1997) – ou melhor, procurar no genoma das espécies atuais pistas sobre seus ascendentes mais próximos. Tais pistas são encontradas em genes homólogos. Isso somente foi possível com o advento e o aperfeiçoamento de técnicas moleculares, como o sequenciamento e alinhamento de ácidos ribonucléicos (p.ex. DNA, DNAmt, RNAr, RNAmi) e de proteínas. Homologia é um conceito-chave na biologia comparativa, pois se refere a similaridades compartilhadas entre grupos taxonômicos, a partir de uma mesma característica presente em um ancestral em comum (Creighton 1999). Em filogenética sistemática (ou cladística), uma característica ancestral é dita plesiomórfica, enquanto o seu estado derivado (novo) é referido como apomórfico. Quando esse estado derivado é restrito a um único táxon, é chamado de autapomorfia; mas se compartilhado por dois ou mais táxons, é nomeado de sinapomorfia. Já que sinapomorfias são características homólogas herdadas de um ancestral comum imediato, todos os homólogos podem ser considerados sinapomorfias em (apenas) um único nível do relacionamento filogenético; em todos os níveis inferiores, eles constituem simplesiomorfias. Assim, em certo nível filogenético, todas as características homólogas definem grupos monofiléticos. Nesse grupo, todos os seus membros são relacionados entre si por uma história única de descendência (com modificações) a partir de um ancestral comum. Quando alguns de seus descendentes não estão contidos nesse grupo, ele é dito parafilético. Assim, o termo que nomeia o clado (i.e., o nome do táxon, tal como “Turbellaria”) deve ser escrito utilizando-se aspas, para indicar o seu status parafilético. Por sua vez, um grupo é polifilético quando compreende integrantes que surgiram de dois ou mais ancestrais imediatos diferentes (Fig. 1.12). 38 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.12. Dendogramas exemplificando três tipos de táxons. O táxon W, que compreende três espécies, é monofilético, pois contém todos os descendentes (espécies C e D) do ancestral comum imediato (espécie B), mais esse ancestral. O táxon X é parafilético, pois inclui um ancestral (espécie A), mas somente alguns de seus descendentes (espécie E a I, deixando de fora as espécies B, C e D). O táxon Y é polifilético porque contém táxons que não são derivados de um mesmo ancestral comum imediato; as espécies M e P podem parecer similares como resultado de convergência evolutiva ou paralelismo e, portanto, foram agrupadas juntas em um único táxon. O táxon Z é parafilético. Nesse caso, trabalhos adicionais nas espécies de J a P devem, eventualmente, revelar a correta relação entre os táxons. A espécie M deve ser classificada com as espécies K e L; já a espécie P, com as espécies N e O. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. Embora originalmente o termo homologia fosse mais utilizado para características morfológicas, o emprego da biologia molecular tornou a utilização desse conceito bastante trivial na análise filogenética de genes e proteínas. Genes homólogos podem ser: parálogos, quando surgem por duplicação de um mesmo gene em uma espécie ancestral em comum, ou ortólogos, quando são passados como cópias simples durante os eventos de especiação. A comparação entre táxons intimamente relacionados, ou mesmo entre táxons distantes, se baseia na condição de que, em duas espécies diferentes, genes ortólogos são expressos em uma posição similar; essas áreas ou regiões são consideradas homólogas, mesmo quando entre filos. Tais genes, portanto, devem ter estados presentes em seu último ancestral comum, mantendo-se presentes nas duas novas espécies dado o seguimento da especiação (Fig. 1.13). Em geral, os genes ortólogos têm a mesma função em cada uma das espécies resultantes e somente eles podem ser utilizados para a reconstrução de árvores filogenéticas (ou seja, da genealogia). Por sua vez, os genes parálogos estão no genoma como membros de uma família gênica, tendo usualmente adquirido diferentes funções no transcurso da evolução da espécie em questão. 39 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.13. Geração de genes ortólogos e parálogos. Para detalhes, ver o texto. Fonte: Creighton TE. Encyclopedia of Molecular Biology. Vol. 1-4. Nova York (NY): John Wiley e Sons. 1999. A comparação entre genes de várias espécies abriu uma perspectiva inteiramente nova para a análise da evolução. Embora a genética de populações tenha estabelecido o princípio de que a evolução se deve às alterações nos genes, nenhum exemplo havia sido identificado até o momento. Assim, permanecia a pergunta de como as mudanças evolutivas podiam ocorrer. A revelação somente surgiu com a descoberta dos genes que controlavam a embriogênese em moscas. Esses genes têm homólogos exatos na maioria dos animais, desempenhando as mesmas funções, ou seja, animais tão diversos quanto vermes, moscas e camundongos possuem os mesmos conjuntos de genes envolvidos com a formação e diferenciação de suas características morfológicas e fisiológicas. “A construção das formas depende da ativação e desativação de determinados genes em diferentes momentos e posições ao longo da embriogênese”, registrou Carrol (2005). A partir daí, estabeleceu-se uma nova síntese evolutiva, cujo princípio fundamental propõe que “a evolução é causada por modificações herdáveis no desenvolvimento dos organismos” (ver Valentine 1997 e Gilbert 2003). A importância da embriogênese para a evolução, todavia, já havia sido sugerida há mais de um século, por Darwin (1859; 1871), Huxley (1863) e Roux (1894). Surgiu, enfim, um novo campo interdisciplinar na biologia – a biologia evolutiva do desenvolvimento, ou simplesmente “evo-devo”. Apesar dos recentes avanços moleculares, a origem e a filogenia do filo Platyhelminthes (do grego platy, achatado; helminth, verme) ainda permanecem bastante controversas. Predominantemente, os representantes desse grupo são parasitas pertencentes às classes Trematoda (como no caso do objeto desse 40 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado trabalho, o S. mansoni), Monogenea ou Cestoda. Completa o filo outro grupo, conhecido por Turbellaria, preponderantemente de vida-livre. Como será visto adiante, essa antiga classe é considerada inválida, por não ser monofilética (Tyler et al. 2006). O termo “turbelário”, no entanto, pode ainda ser aplicado aos vermes anteriormente contidos nesse táxon. Tradicionalmente, a origem dos platielmintos era postulada estar relacionada ao surgimento da simetria bilateral ou mesmo com a origem dos metazoários, como revisto por Brusca e Brusca (2003). A hipótese ciliado-para-acelomado remete à teoria sincicial para a origem da condição metazoária. Nessa teoria, o ancestral metazoário seria um protista ciliado, multinucleado e bilaterado. Com hábito bêntico, tal ancestral rastejaria sobre o substrato com sua abertura oral voltada baixo; seus núcleos então teriam se separado entre si, pela formação de membranas celulares e a epiderme celular resultante circundaria uma massa sincicial interna, definindo uma criatura semelhante a um platielminto. Tal hipótese, entretanto, não é mais sustentável em sua forma original. Em diversos acelomados, a natureza sincicial do endoderma é, provavelmente, secundariamente derivada de um ancestral com um intestino celular. Outra proposta foi nomeada de hipótese ctenóforo-policlado, sugerindo que um ctenóforo achatado teria originado um turbelário policlado. Nesse cenário, tal ancestral assumiria um estilo de vida bêntico, também rastejante, com a boca direcionada para o substrato. A condição bilaterada teria sido obtida com a redução dos tentáculos e seu posterior posicionamento junto ao órgão sensorial apical. Pelo menos em teoria, a organização policlada teria sido alcançada com o aumento da ramificação intestinal e a formação de uma faringe pregueada. Todavia, essa hipótese também não possui mais sustentação científica. Atualmente, ainda persistem outros cenários alternativos. Em um deles, os platielmintos teriam surgido a partir de uma série de reduções em um ancestral vermiforme celomado (teoria arquicelomado). Isso implicaria que os surgimentos do eixo dorso-ventral (simetria bilateral) e do mesoderma provavelmente teriam ocorrido simultaneamente com os aparecimentos do celoma e da segmentação corporal. Dessa forma, os animais acelomados (bem como os blastocelomados) teriam sido originados a partir de um clado celomado, segmentado e derivado de cnidários acelomados, radialmente simétricos e não-segmentados (ver revisão por Baguñà et al. 2008). Essa idéia sugere que as bolsas gástricas dos cnidários seriam homólogas com as bolsas gástricas (enteroceles) que formam as cavidades celômicas dos deuterostomados (ver Willmer 1990; Rieger e Ladurner 2001). Seria possível, portanto, que tais linhagens acelomadas tivessem surgido por neotenia 41 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado dos estádios embrionários desse ancestral celomado, isto é, que o desenvolvimento somático desses animais tenha sido retardado em algum estádio larvar de corpo sólido (ou mesmo com blastoceloma), antes da formação da cavidade celômica propriamente dita. Outro cenário mais gradual vem despertando progressivo interesse científico atualmente. Nele, os turbelários platelmintos teriam surgido por progênese (obtenção de maturidade sexual em formas larvais) a partir de uma protoplânula (ou arquiplânula) pelágica ancestral, radialmente simétrica e diploblástica (teoria planulóide-acelomado; von Graff 1882). A plânula é o tipo larvar básico dos cnidários atuais. De fato, um crescente conjunto de evidências morfológicas e moleculares tem sugerido que os cnidários são, de fato, bilaterados verdadeiros secundariamente derivados para simetria radial (externa), devido ao seu estilo de vida predominantemente séssil (Finnerty et al. 2004; Martindale 2005; Baguñà et al. 2008). Os indícios que suportam esse panorama referem-se às homologias entre o eixo oral-aboral (O-AB) dos cnidários e o eixo antero-posterior (A-P) dos bilaterados, bem como entre o “eixo diretivo” dos cnidários e o eixo dorso-ventral (D-V) dos bilaterados. Inicialmente baseada na expressão assimétrica transitória de genes ortólogos cnidários caracterização da BMP2/4/dpp, expressão tal relação assimétrica de vem sendo outros corroborada genes, envolvidos pela na diferenciação do endoderma, mesoderma e neural (Martindale 2005; Matus et al. 2006). Assim, a análise filogenética com marcadores quantitativos, como genes ribossomais (18S+28S) e nucleares, bem como com marcadores qualitativos, como agregados de genes HOX e conjuntos de RNAmi, têm reforçado o posicionamento dos cnidários como grupo-irmão de um clado bilaterado menos abrangente, chamado Triploblastica. Esse clado, portanto, compreende os bilaterados atuais com mesoderma verdadeiro (Baguñà et al. 2008). É possível que o último ancestral comum dos bilaterados tenha sido pequeno, bêntico, com desenvolvimento direto e sem segmentos, cavidades celômicas, nefrídeos e um cérebro verdadeiro (Jondelius et al. 2002). Dentro de Triploblastica, teria então ocorrido a ramificação precoce do clado parafilético “Acoelomorpha”, inicialmente com os vermes Acoela e, posteriormente, com os Nemertodermatida (Carranza et al. 1997; Ruiz-Trillo et al. 1999, 2002, 2004; Sempere et al. 2007; Wallberg et al. 2007; Philippe et al. 2007; Baguñà et al. 2008). Os representantes atuais dos “Acoelomorpha” possuem organização corporal muito simples, carecendo de nefrídeos, glândulas digestivas, cordões nervosos longitudinais e uma massa nervosa verdadeira, com neurópilo (Ehlers 1984, 1985; 42 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Raikova et al. 1998; Reuter et al. 1998). Eles ainda compartilham um sistema ciliar radiculado, cílios curvados e, provavelmente, padrão de clivagem espiral duetosímile (Smith et al. 1986; Haszprunar 1996). Tradicionalmente, os acelomorfos eram agrupados como ordens da classe Turbellaria, do filo Platyhelminthes (revisto por Brusca e Brusca 2003). Atualmente, esse novo clado é considerado grupo-irmão dos Eubilateria ou, como também referido por alguns autores, dos Nephrozoa, devido ao aparecimento de um sistema excretor (Jondelius et al. 2002; Ruiz-Trillo et al. 2002; Sempere et al. 2007; Baguñà et al. 2008). Nesse cenário, as apomorfias de todos os bilaterados seriam o estabelecimento e consolidação de um novo eixo D-V e a subsequente simetria bilateral, além do aparecimento de um agregado básico de genes HOX (dois genes HOX/dois genes ParaHOX) e um conjunto mínimo (dois de três genes) de RNAmi. Baguñà et al. (2008) ainda destacaram que outra apomorfia importante dos Triploblastica é a reunião de células nervosas na extremidade anterior, de onde feixes longitudinais de fibras nervosas se originam. Provavelmente, esses caracteres surgiram concomitantemente à primeira expansão dos agregados HOX/ParaHOX (grupo três e genes HOX centrais) e a novos RNAmi (Baguñà et al. 2008). As plesiomorfias desse grupo, compartilhadas com os ctenóforos, seriam um eixo A-P (O-AB nos cnidários e ctenóforos), diploblastia (ectoderma e endoderma) e a presença de um mesoderma verdadeiro (Burton 2008). Após a divergência dos “acelomorfos” e de outros grupos acelomados/pseudocelomados atuais (Xenoturbellida) ou extintos, a radiação dos Nephrozoa (ou eubilaterados) resultou em protonefrídeos, um intestino ininterrupto e o desenvolvimento progressivo de um sistema nervoso mais concentrado (camadas de células nervosas circundando um neurópilo e definidas como cordas nervosas ventrais). O aparecimento de estruturas mais elaboradas também foi acompanhado por conjuntos completos de agregados de genes HOX/ParaHOX e novos grupos de RNAmi (Baguñà et al. 2008). Dentro dos nefrozoários encontram-se dois grandes clados: os protostomados e os deuterostomados. Os protostomados (do grego proto, “primeiro”; stome, “boca”) foram assim denominados porque sua boca é formada primeiro, perto ou na abertura do tubo digestório. Quando presente, o ânus se forma posteriormente, em outra localização. Nesse grupo, outra grande divisão pode ser feita: a linhagem Lophotrochozoa é caracterizada por apresentar clivagem espiral, uma forma característica de alimentação através de um conjunto de tentáculos que circundam a boca (lofóforo) ou uma forma comum de larva ciliada, nadadora (trocófora) (Halanych et al. 1995). Todavia, é possível que esse agrupamento necessite ser revisado, pois nem todos os 43 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado seus membros possuem um lofóforo ou mesmo uma larva trocófora (Giribet 2002; Brusca e Brusca 2003; Sánchez Alvarado 2003). Platielmintos, briozoários, anelídeos e moluscos são alguns de seus representantes; por sua vez, nos Ecdysozoa, estão agrupados os animais que realizam muda de seus esqueletos externos (exoesqueleto), como no filo Nematoda (vermes cilíndricos) e no filo Arthropoda (insetos, aracnídeos, ácaros, crustáceos e miriápodes). Cada uma dessas duas linhagens é considerada monofilética. Nos deuterostomados (do grego deutero, “segundo”; stome, “boca”), a abertura oral surge somente após a formação da abertura anal. Ao contrário dos protostomados, nesse grupo, o blastóporo define o local do ânus. Cordados e equinodermos são seus representantes, embora os adultos dos equinodermos exibam simetria radial; suas larvas são originariamente bilaterais. Assim, os platielmintos têm uma posição central em todos os cenários sobre a história primordial dos bilaterados. Todavia, a ausência de sinapomorfias convincentes tem dificultado o agrupamento natural de seus membros, i.e., a formação de táxons monofiléticos (Carranza et al. 1997; revisto em Baguñà e Riutort 2004a, b). Na realidade, as características usualmente consideradas como autapomorfias dos platielmintos são questionáveis. A posse de neoblastos (célulastronco capazes de substituírem outras células já diferenciadas), como apontado por Ehlers (1986), ainda não foi devidamente avaliada em diversos outros filos. A presença de um intestino em fundo-de-saco (i.e., ausência da abertura anal) é, provavelmente, uma retenção de uma condição primitiva (simplesiomorfia) dos eumetazoários, que também precisa ser reapreciada em outros bilaterados (p.ex. Gnathostomulida, Gastrotricha) (revisto em Baguña e Riutort 2004a; Philippe et al. 2007). Ehlers (1985, 1986, 1995) ainda propôs como características autapomórficas dos platielmintos a presença de protonefrídeos (na realidade, uma sinapomorfia dos Nephrozoa) e de células epidérmicas multiciliadas sem centríolos, além da ausência de mitose em células somáticas em todos os estádios pós-embrionários (ver também Ax 1987). Entretanto, diversos autores têm contestado tais características (Smith et al. 1986; Rohde 1990). De fato, como visto anteriormente, o filo Platyhelminthes é polifilético em pelo menos duas de suas ordens (Acoela e Nemertodermatida) (Carranza et al. 1997; Littlewood et al. 1999a; Ruiz-Trillo et al. 1999, 2002, 2004; Jondelius et al. 2002; Pasquinelli et al. 2003; Telford et al. 2003; ver Baguñà e Riutort 2004a; Sempere et al. 2007; Wallberg et al. 2007; Philippe et al. 2007; Baguñà et al. 2008). Dessa forma, os Platyhelminthes stricto sensu podem ser subdivididos em ainda duas distintas linhagens (ver Ruiz-Trillo et al. 1999; Baguñà e Riutort 2004a; 44 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Telford et al. 2005). Os Catenulida ocupam uma posição mais basal. Eles possuem uma massa nervosa verdadeira, com neurópilo e cordões nervosos; um único protonefrídeo, localizado dorso-medianamente; um sistema reprodutor completo, com testículos e poro genital masculino localizados dorsalmente na metade anterior do corpo, além de espermatozóides imóveis, aciliares (ver Baguñà e Riutort 2004a). Os Rhabditophora compreendem um táxon monofilético, assim denominado devido à presença, pelo menos primitivamente, de rabditos lamelados (secreções sólidas com uma camada cortical composta de lamelas arranjadas concentricamente e uma medula, de consistência homogênea para granular) (Ax 1996). Outras sinapomorfias do grupo referem-se a um par de órgãos glandulares adesivos e a presença de protonefrídeos pareados com bulbo flamejante multiciliado e canal celular interdigitante para formar uma barragem (Ehlers 1985; Littlewood et al. 1999a). Os rabditóforos reúnem a maioria das espécies, primariamente abrangendo os Macrostomorpha e os Trepaxonemata. Os Macrostomorpha dividem-se ainda em Haplopharyngida e Macrostomida; nos Trepaxonemata, encontram-se os Polycladida basais e os Neoophora. O termo Neoophora se refere ao modo de desenvolvimento dos ovos, no qual pequenos oócitos são circundados por células vitelínicas individualizadas, formadas por um órgão especializado (vitelário); nos táxons mais ancestrais, como macrostomídeos e policlados, os oócitos propriamente ditos são ricos em vitelo e realizam um tipo modificado de clivagem em espiral (Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000; Morris et al. 2004). Eles formam um grupo parafilético, conhecido por “Archoophora”. Os neoóforos se dividem ainda em “Lecithoepitheliata” e Eulecithophora. Os eulecitoforados então abrangem os clados Prolecithophora, Rhabdocoela e “Seriata”. Os Rhabdocoela são ainda divididos em mais seis sub-clados: “Dalyellioida”, Endoaxonemata, Kalyptorhynchia, “Typhloplanoida”, Temnocephalida e Revertospermata. Por sua vez, os Revertospermata estão reunidos os Fecampiida e os Mediofusata. Os Mediofusata ainda abrangem as famílias Urastomidae, Genostomatidae e o grupo parasita Neodermata, que inclui as tradicionais classes Trematoda, Cestoda e Monogenea. Os “Seriata” são parafiléticos (Carranza et al. 1997). Eles reúnem os Proseriata, Bothrioplanida e Tricladida, que ainda é subdividido em Maricola, Cavernicola, Paludicola e Terricola (Tyler et al. 2006; ver também Norén e Jondelius 1999, 2002; Lockyer et al. 2003a). Os Neodermata são um grupo monofilético, como primeiramente proposto por Ehlers (1984, 1985) (Littlewood et al. 1999b). As sinapomorfias desse grupo são: substituição da epiderme larvar por uma neoderme com pericários abaixo da superfície (tegumento sincicial), ausência de radículas ciliares verticais dos cílios 45 Considerações Iniciais epidérmicos, Dissertação de Mestrado presença de colares elétron-densos de receptores sensoriais “neodermato-símile” característicos, axonemas dos espermatozóides incorporados no corpo celular por fusão próximo-distal e incorporação de hospedeiro vertebrado no ciclo de vida. Dentro dos Neodermata, a análise gênica de pequenas (SSU) e grandes (LSU) subunidades de RNAr agrupa os Trematoda e os Cestoda, embora nenhuma sinapomorfia morfológica seja conhecida para esse clado (Lockyer et al. 2003). Nesse trabalho, o suposto clado Cercomeromorphae (Monogenea + Cestoda) foi rejeitado, ainda que não significativamente. Os trematódeos ainda dividem-se em Aspidogastrea e Digenea (Littlewood et al. 1999a; Rohde 2001). Entre os cestódeos, agrupam-se os Gyrocotylidea, Amphilinidea e Eucestoda. Por fim, Monopisthocotylea e Polyopisthocotylea definem o monofilético táxon Monogenea, grupo-irmão de Trematoda + Cestoda (Littlewood et al. 1999b; Lockyer et al. 2003). Um sumário dessas supostas relações filogenéticas apresentadas está representado na Fig. 1.14. Tais relações ainda estão sendo avaliadas em novas investigações. É provável que, em breve, outros indícios morfológicos e moleculares possam resultar em modificações adicionais nesse cenário. A neoderme foi, provavelmente, uma importante aquisição evolutiva ao parasitismo nos platielmintos stricto sensu. A localização dos pericários em camadas mais profundas do tegumento possivelmente foi útil na proteção contra reações abrasivas ou imunológicas. Nesse contexto, a ausência de radículas verticais nas placas epidérmicas ciliadas das formas larvais pode ter facilitado a sua liberação durante a infecção de um hospedeiro. Além disso, a neoderme possui um importante papel na aquisição de nutrientes, através de uma área superficial bastante aumentada por microvilosidades, microcristas e concavidades, além de um vigoroso glicocálice envolvido na incorporação ativa de nutrientes e seu transporte subsequente (Halton 1997; Tyler e Tyler 1997). Na realidade, uma variedade de adaptações comportamentais foi necessária para o estabelecimento do parasitismo entre os platielmintos. Entre elas, a localização e o reconhecimento do hospedeiro suscetível, a adesão de ovos e sua eclosão em resposta a sinais do hospedeiro, ritmos endógenos de eclosão e comportamentos especiais das larvas. De fato, não houve apenas uma única inovação crítica ao sucesso dos platielmintos parasitas. Como outras associações ecológicas, o parasitismo surgiu diversas vezes entre os “turbelários” (ver Littlewood et al. 1999b). 46 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.14. Resumo das relações filogenéticas dos platielmintos. Para mais detalhes e referências, ver o texto. O último suposto ancestral comum dos Neodermata ainda é incerto. Littlewood e colaboradores (1999b) postularam que o ciclo de vida desse ancestral era direto, por um único hospedeiro vertebrado. A favor dessa hipótese, os autores argumentaram que os hospedeiros vertebrados são comuns nos ciclos de vida de todos os Neodermata atuais e que a aceitação do endoparasitismo como modo primordial de interação seria mais parcimoniosa, já que apenas os Monogenea apresentam hábito ectoparasita, ao passo que mantêm a neoderme (Littlewood et al. 1999b). Controversamente, Zamparo e colaboradores (2001) defendem que esse ancestral tinha um ciclo de vida com dois hospedeiros, relacionado com a adição de um hospedeiro vertebrado ao plesiomórfico ciclo de vida direto em um hospedeiro artrópode, como primeiramente sugerido por Brooks e colaboradores (Brooks et al. 1985; Brooks 1989a, b; Brooks e McLennan 1993). Nesse cenário, o endoparasitismo de vertebrados pode ter surgido a partir da predação de artrópodes (Zamparo et al. 2001). Dentre os trematódeos, a separação dos Aspidogastrea e Digenea provavelmente ocorreu concomitantemente com a divergência dos condrictes (p.ex., tubarões e raias) e osteíctes (peixes ósseos) (Brooks et al. 1989a). Os trematódeos 47 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado digenéticos são bastante comuns em membros de todas as classes de vertebrados, exceto nos Chondrichthyes. Nesses animais, apenas poucos vermes digenéticos conseguem lidar com a uréia presente em seus tecidos (ver Schmidt e Roberts 2000). Por outro lado, os Cestoda são tolerantes à uréia e podem, inclusive, degradá-la; com isso, uma diversa gama de cestódeos pode ser encontrada em raias e tubarões (Read et al. 1959; ver Caira e Jensen 2001). Os Digenea talvez representem o maior grupo de metazoários endoparasitas, com cerca de 18.000 espécies nominais (Cribb et al. 2001). Recentemente, Olson e colaboradores (2003) estimaram a filogenia dos Digenea via parsimônia máxima e inferência Bayesiana, ao analisar duas sequências gênicas ribossomais (SSU e LSU) de 163 táxons de vermes digenéticos (compreendendo 77 famílias nominais) e sete táxons de Aspidogastrea como grupo-externo (representado três famílias). Os autores concluíram que os trematódeos digenéticos se ramificam em dois clados principais: os Plagiorchiida e um segundo grupo, que foi nomeado Diplostomida. Os Plagiorchiida compreendem um vasto grupo de 13 linhagens independentes (para mais detalhes, ver Olson et al. 2003). Os Diplostomida se dividem ainda em outras três linhagens: os Brachylaimoidea, no qual os Leucochloridiidae foram agrupados dentro de “Brachylaimidae”; os Diplostomoidea, com Diplostomidae e “Strigeidae” misturados, e; os Schistosomatoidea, que reúnem as famílias de ambiente sanguíneo Sanguinicolidae (parasitas de peixes), “Spirorchiidae” (parasitas de tartarugas) e Schistosomatidae, além de Clinostomidae (Brooks et al. 1985, 1989a, b; Olson et al. 2003). Embora os clinostomídeos não residam no sangue de seus vertebrados, eles possuem uma íntima relação com as famílias supracitadas, como primeiramente sugerido por La Rue (1957). Uma prega natatória corporal dorsal na cercária pode ser a sinapomorfia dos Schistosomatoidea, embora reduzida nos Spirorchiidae e aparentemente secundariamente ausente nos Schistosomatidae (Pearson 1992); sua presença ocorre nos Clinostomidae, sugerindo seu agrupamento dentro desse clado. Ademais, Olson e colaboradores (2003) apontaram que o táxon Schistosomatoidea somente é monofilético com a inclusão da família Clinostomidae. Por outro lado, a análise individual ou combinada dos genes ribossomais SSU e LSU indica que a família Spirorchiidae é, de fato, parafilética; seus membros, entretanto, são agrupados basalmente dentro de Schistosomatoidea, enquanto os monofiléticos esquistossomatídeos ocupam uma posição mais derivada (Snyder 2004). Das mais de 100 famílias nominais de vermes digenéticos, com mais de 10.000 espécies reunidas, apenas duas não são hermafroditas (LoVerde e Chen 48 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado 1991; Platt e Brooks 1997). Entre essas duas, a família Schistosomatidae reúne membros que parasitam pássaros, mamíferos e crocodilos, além de usarem um gastrópode como hospedeiro intermediário. Usualmente, seus representantes estão associados a ambientes de água doce, em regiões temperadas e tropicais. Os esquistossomatídeos ainda podem ser subdivididos em quatro clados: ocupando uma posição basal, o clado AO, composto pelos gêneros Autrobilharzia e Ornithobilharzia, forma Orientobilharzia definem o grupo-irmão o clado de SO; Schistosoma; Heterobilharzia já e Schistosoma e Schistosomatium compreendem o clado HS, e; com uma posição mais derivada, o clado BTDG abrange Bilharziella, Trichobilharzia, Dendritobilharzia e Gigantobilharzia (Lockyer et al. 2003; Olson et al. 2003; Snyder 2004) (Fig. 1.15). A localização basal do clado AO reforça o posicionamento de três gêneros de espirorquídeos que parasitam tartarugas marinhas como grupo-irmão monofilético de Schistosomatidae, ainda que a família Spirorchiidae seja parafilética e taxonomicamente inválida (Snyder 2004; ver também Brant e Loker 2005). Como todos os espirorquídeos, as cercárias das espécies de Autrobilharzia e Ornithobilharzia possuem ocelos (Lockyer et al. 2003). Outros cinco gêneros exclusivamente parasitam tartarugas (como hospedeiro definitivo) e caramujos (como hospedeiro intermediário) de água doce. Eles ocupam uma posição basal na filogenia dos trematódeos sanguíneos de tetrápodes (Snyder 2004). De fato, as tartarugas marinhas são consideradas derivadas de um ancestral criptodiro de água doce, que divergiu há cerca de 90-120 milhões de anos (Shaffer et al. 1997). Isso sugere que os espirorquídeos marinhos originaram-se a partir de um ancestral dulcícola, que passou a infectar gastrópodes e tartarugas de ambientes marinhos. Além disso, esse cenário assume um destacado papel na origem dos esquistossomatídeos e seu respectivo estado dióico, já que seus membros atuais mais basais (gêneros Autrobilharzia e Ornithobilharzia) também utilizam gastrópodes marinhos como hospedeiros intermediários e possuem pronunciado dimorfismo sexual. Nesse caso, é possível que um ancestral espirorquídeo tenha conseguido colonizar uma ave marinha como hospedeiro vertebrado (Snyder 2004; Brant e Loker 2005; ver também a revisão de Platt e Brooks 1997). Outros autores sugerem que os esquistossomatídeos originaram como parasitos de crocodilos e evoluíram secundariamente dentro das aves e então mamíferos (Carmichael 1984; Basch 1991; Morand e Müller-Graf 2000). 49 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.15. Filograma dos trematódeos de tetrápodes. Baseado em inferência Bayesiana de dados combinados das subunidades ribossomais pequena e grande de DNA. A topologia da árvore é idêntica à produzida por análise de parcimônia máxima dos dados combinados. As famílias as quais pertencem os gêneros dos trematódeos de peixes ou de tetrápodes estão indicadas à direita da figura; Clinostomum pertence à Clinostomidae. Os hospedeiros definitivos estão indicados por ícones a direita dos nomes dos gêneros. Para maiores informações, ver Snyder SD. Phylogeny and paraphyly among tetrapod blood flukes (Digenea: Schistosomatidae and Spirorchiidae). Int J Parasitol. 2004 Nov;34(12):1385-92. Indícios adicionais são necessários para determinar a origem da diocia nesses vermes. Coincidentemente, outras características singulares entre os Digenea surgiram nos esquistossomatídeos (discutidas por diversos autores, como Grossman et al. 1981; Short 1983; Carmichael 1984; Basch 1990; Combes 1991; Basch 1991; Després e Maurice 1995; Platt e Brooks 1997; Morand e Müller-Graf 2000; Snyder 2004; Brant e Loker 2005). A aquisição de corpos mais finos provavelmente favoreceu o pareamento entre vermes de diferentes sexos (exceto em Schistosomatium), bem como a cooperação e divisão de funções entre machos e fêmeas. Geralmente, a fêmea possui um corpo pouco musculoso, com menos 50 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado parênquima e faringe reduzida; isso dificulta a sua migração intravascular e a sua digestão. O macho é o oposto, i.e., ele abriga a fêmea no seu canal ginecóforo, diminuindo o contato dela com sistema imunológico do hospedeiro, além de transportá-la pela vasculatura hepático-intestinal; os machos aproveitam para inseminar constantemente as fêmeas. Além disso, a musculatura desenvolvida do macho auxilia no processo digestório da fêmea, através de inúmeras contrações. Com uma menor quantidade de tecidos, as reservas energéticas das fêmeas ficam direcionadas para a produção de ovos e o tamanho mais delgado permite que elas atinjam vasos de menor calibre, para ovipor. A oviposição em vasos pequenos aumenta as chances de que os ovos abandonem o território vascular e atinjam a luz intestinal (Basch 1990; Read e Nee 1990; Platt e Brooks 1997; Morand e MüllerGraf 2000). Outras características apontadas como possíveis causas para a diocia dos esquistossomatídeos se referem à endotermia (Grossman et al. 1981; Short 1983) e à mudança do ambiente arterial para o venoso, acompanhada pelo desenvolvimento de um sistema porta homeotérmico e a subsequente colonização de hospedeiros terrestres, como proposto por Basch (1991). Embora Morand e Müller-Graf (2000) tenham refutado essa hipótese ao destacar a localização arterial de Griphobilharzia em crocodilos (ver Platt et al. 1991), Brant e Loker (2005) defendem que Griphobilharzia amoena esteja, de fato, mais intimamente relacionada aos espirorquídeos de tartarugas de água doce. Duas implicações então emergem: a variedade de hospedeiros dos espirorquídeos passa a incluir outros répteis e os esquistossomatídeos parasitam apenas hospedeiros endodérmicos (Brant e Loker 2005). A colonização do sistema venoso pode ainda ter conduzido a evolução dos esquistossomatídeos ao causar constantes flutuações ambientais, como aquelas geradas pelos elaborados sistemas imunológicos dos hospedeiros (Combes 1991). A habilidade em responder a essas alterações seria favorecida pela presença de um mecanismo de geração de variabilidade genética, como a reprodução cruzada ou a existência da diocia. Nesse contexto, a sofistificação dos sistemas imunológicos dos vertebrados teria um papel central na co-evolução dos esquistossomatídeos. No entanto, outras duas espécies de esquistossomatídeos residem no sistema arterial de seus hospedeiros (ver revisão de Loker e Brant 2006): Dendritobilharzia pulverulenta parasita patos, liberando seus ovos em artérias relativamente grandes, que são depois carregados pelo fluxo sanguíneo para os leitos capilares do intestino, e; Schistosoma hippopotami, que se localiza preferencialmente em artérias pulmonares e nas câmaras direitas do coração, assim como nas principais veias e no sistema porta hepático do hipopótamo. Os sítios de oviposição não são 51 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado conhecidos e poucas informações estão disponíveis sobre essa espécie de esquistossomo (Kruger et al. 1988). É possível que tais espécies sejam exceções à regra (Loker e Brant 2006). Assim, estudos adicionais são ainda necessários. Por fim, há 14 gêneros reconhecidos na família Schistosomatidae, com cerca de 100 espécies de esquistossomos (Khalil 2002). Dessas, cerca de 20 espécies estão incluídas no gênero Schistosoma. Tais espécies foram inicialmente divididas em quatro grupos, tendo como base a morfologia de seus ovos, do gênero do hospedeiro intermediário encontrado naturalmente infectado e nas suas respectivas distribuições geográficas (ver Rollinson e Southgate 1987). Cada grupo foi nomeado a partir de seu exemplar considerado mais importante. Todavia, a partir da análise filogenética de três genes (SSU, LSU e citocromo oxidase 1 mitocondrial), Lockyer e colaboradores (2003b) sugeriram que o gênero Orientobilharzia seja sinônimo de Schistosoma. Contudo, o tradicional agrupamento foi pouco comprometido, sendo agora melhor representado por seis linhagens. O grupo “japonicum” posiciona-se fortemente na base, como grupo-irmão de todos os outros esquistossomos (Snyder e Loker 2000; Lockyer et al. 2003b; Webster et al. 2006). Por esta razão, é provável que o último ancestral comum do gênero Schistosoma tenha surgido na Ásia (Hirai et al. 2000; Morgan et al. 2003; Agatsuma 2003). O grupo inclui S. japonicum, S. sinensium, S. mekongi e S. malayensis. A espécie S. hippopotami ramifica-se individualmente, como um clado africano (Morgan et al. 2003; Webster et al. 2006). Orientobilharzia e S. incognitum definem um terceiro clado, ainda pouco resolvido (Lockyer et al. 2003b; Webster et al. 2003). O grupo “mansoni” é definido pela espécie S. mansoni, objeto dessa dissertação, e por S. rodhaini, que parasita roedores. O grupo “indicum” é formado pelas espécies S. indicum, S. nasale e S. spindale, enquanto o grupo “haematobium” compreende as espécies S. haematobium, S. mattheei, S. intercalatum e S. guineensis, que infectam o homem e as espécies S. margrebowiei, S. leiperi, S. bovis e S. curassoni parasitam principalmente ovelhas e o gado (Webster et al. 2006). Pelo menos 165 milhões de bovinos são afetados pela esquistossomose (de Bont e Vercruysse 1997). Na África, a divergência entre os grupos “mansoni” e “haematobium” provavelmente ocorreu há mais de cem milhões de anos, que corresponde ao tempo de divergência dos respectivos hospedeiros caramujos, Biomphalaria e Bulinus (Davis et al. 1980, 1993). Por outro lado, a colonização da América do Sul pelo S. mansoni parece ser bem mais recente, causada pelo advento do tráfego negreiro oriundo da África Ocidental (Snyder e Loker 2000; Morgan et al. 2005). Todos os 52 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado isolados brasileiros de S. mansoni têm haplotipos de DNAmt praticamente idênticos, sugerindo a ocorrência de efeito fundador no seu estabelecimento e dispersão (Morgan et al. 2005). I.2.5.3 – Visão geral do desenvolvimento embrionário dos platielmintos Como descrito anteriormente, a filogenia dos platielmintos ainda é bastante controversa e o estudo da embriogênese desse grupo pode auxiliar na determinação das suas relações de parentesco. De fato, o desenvolvimento e a reprodução podem estar estreitamente interligados nesse grupo, principalmente entre os “turbelários” terrestres e dulcícolas. Eles possuem uma impressionante capacidade regenerativa (revisto por Egger et al. 2007). A reprodução assexuada pode ocorrer por fissão transversal simples, fissão transversal múltipla e fragmentação. Por sua vez, os trematódeos (como no caso de S. mansoni) multiplicam assexuadamente suas formas larvais em determinado ponto de seus ciclos, o que determinou uma importante aquisição adaptativa na sobrevivência dessas espécies. Já a reprodução sexuada assegura a variabilidade da prole pelo intercâmbio de material genético, mesmo nos platielmintos hermafroditas. De fato, uma grande variedade de formas do sistema reprodutor é encontrada nos platielmintos: no sistema masculino, os testículos podem ser únicos, pareados ou múltiplos; enquanto que no sistema feminino, a organização depende do tipo de ovo produzido. Nessa seção, o desenvolvimento embrionário dos táxons de platielmintos será brevemente exemplificado a partir de algumas espécies selecionadas. Uma comparação das estratégias de desenvolvimento nos diferentes táxons de platielmintos está representada na Fig. 1.16. 53 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.16. Estratégias de desenvolvimento em diferentes táxons de platielmintos. Representação esquemática de secções sagitais de embriões em diferentes estádios (A zigoto fertilizado; B clivagem; C gastrulação/camadas germinativas; D organogênese; E embrião maduro). Os diferentes tipos de tecidos estão destacados em cores diferentes (ver legenda). Para maiores informações, ver Hartenstein V, Ehlers U. The embryonic development of the rhabdocoel flatworm Mesostoma lingua (Abildgaard, 1789). Dev Genes Evol. 2000 Sep;210(89):399-415. 54 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I.2.5.3.1 – “Arcoóforos” Os membros desse grupo são reunidos por conveniência, pois todos têm ovos endolécitos, i.e., os oócitos propriamente ditos são ricos em vitelo. Tipicamente, eles também possuem um órgão produtor tanto de ovos quanto de vitelo. Tal órgão é o germovitelário, que pode ser único ou pareado. Contudo, esse grupo não é taxonomicamente válido. Acoela e Nemertodermatida Embora diversas evidências moleculares recentes e alguns indícios morfológicos considerem os Acoela e os Nemertodermatida como grupos externos aos platielmintos stricto sensu (Carranza et al. 1997; Littlewood et al. 1999a; RuizTrillo et al. 1999, 2002, 2004; Reuter et al. 2001; Jondelius et al. 2002; Pasquinelli et al. 2003; Telford et al. 2003; Baguñà e Riutort 2004a, b; Egger e Ishida 2005; Sempere et al. 2007; Wallberg et al. 2007; Philippe et al. 2007; Baguñà et al. 2008), a embriogênese desses grupos será sumariada para comparação. Os acoelos possuem organização corporal muito elementar: quando presente, a faringe é simples; a cavidade digestória não é permanente; a boca ou faringe levam a uma massa sincicial sólida ou a uma massa celular endodérmica. Esses animais são pequenos (1-5 mm) e marinhos. Alguns poucos são planctônicos ou simbiontes (Brusca e Brusca 2003). A espécie Neochildia fusca tem um padrão de clivagem espiral em dueto, no qual a segunda clivagem ocorre em um plano oblíquo levotrópico em relação ao eixo animal-vegetal. No estádio de quatro-células, o plano da primeira clivagem corresponde ao plano de simetria bilateral. As clivagens restantes são simétricas ao plano sagital. Os primeiros três duetos de micrômeros originam somente derivados ectodérmicos; o ectomesoderma não se forma. O terceiro dueto de macrômeros forma o endomesoderma, com a complexa estruturação de fibras musculares circulares, longitudinais e oblíquas, além do parênquima periférico e central. Os acoelas exibem um padrão único de desenvolvimento, pouco parecido com outros espiralianos (p.ex. policlados) (Henry et al. 2000). Os Nemertodermatida também possuem uma simples faringe, quando presente. A cavidade digestória possui processos interdigitantes a partir de seu revestimento intestinal. Os espermatozóides são uniflagelados, enquanto os outros platielmintos possuem espermatozóides com dois ou nenhum flagelo. Habitam em zonas marinhas subtidais de lodo e areia. Um gênero (Meara) é parasita de pepinosdo-mar (Brusca e Brusca 2003). Não foram encontradas informações sobre o desenvolvimento embrionário desse grupo. 55 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Catenulida Os vermes catenulídeos são alongados, marinhos ou dulcícolas; possuem uma faringe simples e um sistema digestório em fundo de saco elementar. Em alguns casos, o mesênquima é reduzido em uma matriz fluída (Brusca e Brusca 2003). Os catenulídeos reproduzem-se assexuadamente por fissão transversal, formando cadeias de zoóides (Hyman 1951; ver também Egger et al. 2007). No entanto, não foram encontradas informações sobre o desenvolvimento embrionário desse grupo. Macrostomorpha Esse táxon compreende os Haplopharyngida e os Macrostomida. Como observado em acoelos e catenulídeos, o modo de reprodução dos macrostomorfos está intimamente associado com a capacidade regenerativa (revisto por Egger et al. 2007). Os Haplopharyngida são organismos diminutos, com até 6 mm de comprimento, e possuem uma probóscide e uma faringe simples. A probóscide separa-se da faringe, sob a extremidade anterior do corpo. O poro anal é ligeiramente desenvolvido, mas permanente. O cérebro é encapsulado por uma membrana única (Brusca e Brusca 2003). Não foram encontradas informações sobre o desenvolvimento embrionário desse grupo. Os macrostomídeos são pequenos e predominantemente intertidais, marinhos ou dulcícolas. Possuem uma faringe elementar e um intestino em fundode-saco também simples (Brusca e Brusca 2003). A espécie Macrostomum sp. sofre um padrão de clivagem espiral modificado, em quartetos; os micrômeros não são tão menores em comparação com os macrômeros. A estereoblástula resultante é circundada por uma camada vitelínica externa, que se origina a partir de grandes células vegetais periféricas. Tais células vegetais se destacam do embrião e achatam-se (membrana externa, do inglês hull membrane). Essas células, primeiramente descritas por Seilern-Aspang (1957) para M. appendiculatum e Tyler (1981) para M. hystricinum, formam o envoltório vitelínico externo, que gradualmente desaparece durante o desenvolvimento (Morris et al. 2004). Células periféricas anteriores e laterais geram o primórdio somático, que formará a parede corporal e o sistema nervoso. No centro do embrião, algumas células originam o grande primórdio digestório, rico em vitelo. Os primórdios da faringe e da massa nervosa aparecem como densidades simétricas antero-ventrais, dentro do primórdio somático. O neurópilo central da massa nervosa é formado a partir da extensão dos axônios neuronais. A camada celular mais externa do primórdio somático diferencia-se em epitélio epidérmico ciliado. Outros cílios surgem no lúmen do 56 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado primórdio faringiano, no sistema protonefridial e, mais tardiamente, no lúmen intestinal. Em seguida, o primórdio somático estende-se ao redor da superfície ventral e dorsal, formando completamente a parede corporal. Os precursores musculares se diferenciam em miofilamentos de uma rede ortogonal de fibras circulares, diagonais e longitudinais altamente organizadas. Por fim, neurônios do primórdio nervoso originam uma comissura no neurópilo, da qual se estende posteriormente um par único de troncos nervosos ventro-laterais (cordões longitudinais principais). O lúmen do primórdio faringiano fusiona-se proximalmente com a epiderme ventral e distalmente com o intestino, formando um tubo digestório contínuo. O corpo da larva assume um formato em “U”, enquanto o sistema nervoso enfim se condensa. Nesse momento, a larva está pronta para eclodir (Morris et al. 2004). Polycladida A maioria dos vermes policlados possui faringe pregueada e intestino multiramificado, com divertículos. Esses animais compreendem um grupo diverso, com formas relativamente grandes; geralmente, habitam zonas litorâneas, especialmente nos trópicos. São, predominantemente, bentônicos e de vida-livre. Poucos são pelágicos ou simbiontes (Brusca e Brusca 2003). Diversos policlados tiveram sua embriogênese documentada (Lang 1884; Surface 1907; Kato 1940; Boyer et al. 1996, 1998; Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000; Younossi-Hartenstein et al. 2000). Em geral, os dois primeiros planos de clivagem são oblíquos ao plano de simetria bilateral e os blastômeros do estádio de quatro-células têm, aproximadamente, o mesmo destino daqueles de outros Spiralia mais derivados (Henry et al. 1995). O estádio de quatro-células de Hoploplana inquilina consiste de dois blastômeros vegetais grandes, que se encontram sobre o sulco de clivagem, e dois blastômeros menores, no pólo animal. A segunda clivagem dá origem ao primeiro quarteto de micrômeros, que produzirá a maioria do ectoderma anterior e lateral da larva resultante. O segundo quarteto de micrômeros forma o ectoderma dorsal e ventral, além dos músculos circulares. Já o terceiro quarteto de micrômeros origina apenas pequenos clones de ectoderma. Como observado por Surface (1907) e Kato (1940), somente a célula 4d do quarto quarteto contribui para a estrutura interna da larva, produzindo o endoderma, o mesênquima e os músculos longitudinais (Boyer et al. 1998). Contudo, segundo van den Biggelaar e colaboradores (1997), a célula 4d se divide assimetricamente em células-filha animal (4d1) e vegetal (4d2). Apenas a célula 4d1 se divide então simetricamente em 57 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado células-tronco esquerda e direita dos cordões mesodérmicos. O mesentoblasto em policlados forma-se então uma geração após do que em moluscos e anelídeos (van den Biggelaar et al. 1997). Além disso, o quarto quarteto de células 4a, 4b e 4c não forma apenas endoderma, mas contribui também para a formação do ectoderma (Boyer et al. 1996). A figura 1.17 exibe os estádios iniciais do desenvolvimento dos policlados. Ao final da embriogênese dos policlados, dois tipos larvais podem emergir: a larva de Müller, com oito lobos ventrais ciliados, e; a larva de Götte, com apenas quatro (Fig. 1.18) (Nielsen 1995; Brusca e Brusca 2003). Na espécie Imogine mcgrathi, os quartetos de micrômeros 1-3 formam uma camada dupla irregular de células mesenquimais, que se expande durante a gastrulação (por epibolia) sobre o quarto quarteto de micrômeros. O micrômero 4d se divide em diversos precursores mesendodérmicos grandes, que definem o lado ventral do embrião. Essas células formam com os micrômeros sub-superficiais do pólo animal uma profunda camada, que originará todas as estruturas internas do embrião (sistema nervoso, musculatura, protonefrídeos e intestino). Os micrômeros 4a-c são células vitelínicas grandes que são incorporadas no lúmen intestinal; elas não contribuem para o epitélio desse órgão. Logo após a gastrulação, ocorre a diferenciação celular, em um padrão bastante similar ao dos rabdocelos (Hartenstein e Ehlers 2000; Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000): as células da superfície assumem características epiteliais e formam cílios; já outras células um pouco mais profundas, posicionadas lateralmente, formam os protonefrídeos. Na região anterior do embrião, um agregado de cerca de 50 células forma a massa nervosa. A pigmentação dos ocelos ocorre assincronicamente. A faringe forma-se a partir de uma invaginação ectodérmica, que se fusiona posteriormente com o intestino densamente ciliado. Após cerca de sete dias, uma larva tipo de Götte está pronta para eclodir (Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000). 58 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.17. Clivagem em espiral de um policlado. Visão do pólo animal, excetuando o estádio de quarto quarteto (fourth quartet), visto do pólo vegetal. O grande quarto quarteto de micrômeros (4a-4d) e os diminutos macrômeros (4A-4D) são característicos desse grupo. No estádio de 4-células, os blastômeros B e D encontram-se no sulco de clivagem vegetal. Tipicamente, os micrômeros derivados dos quadrantes B e D encontram-se no sulco de clivagem animal. Para maiores informação, ver Boyer BC, Henry JJ, Martindale MQ. The cell lineage of a polyclad turbellarian embryo reveals close similarity to coelomate spiralians. Dev Biol. 1998 Dec 1;204(1):111-23. Figura 1.18. Larva de Müller. Visão da “face” da larva do policlado Planocera. Fonte: Brusca RC, Brusca GJ. Invertebrates. 2ª ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates. 2003. 59 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I.2.5.3.2 – Neoóforos Como mencionado, esse é um táxon monofilético. A sinapomorfia de todos os seus integrantes é a produção de ovos ectolécitos, ou seja, de oócitos pequenos, circundados por células acessórias individualizadas. Essas células são as células vitelínicas, produzidas por um órgão especializado, chamado vitelário, ou glândulas vitelínicas. “Lecithoepitheliata” Esse grupo parafilético apresenta variadas organizações de faringe, mas intestino simples. Cerca de 30 espécies estão reunidas nesse clado por dividirem uma condição intermediária entre ovos endolécitos e ectolécitos (Brusca e Brusca 2003). Poucas informações sobre a embriogênese desse grupo foram encontradas. Segundo Hartenstein e Ehlers (2000), citando Reisinger et al. 1974a, b), o quarteto de micrômeros expande-se (por epibolia) sobre os macrômeros, incluindo parte do vitelo dentro da cavidade corporal embrionária primária. As células ectodérmicas “extra-embrionárias” dão origem a uma membrana externa (hull membrane) transitória, enquanto que alguns dos micrômeros reconstituem o ectoderma embrionário propriamente dito: a monocamada plana formada define a superfície ventral do primórdio embrionário. Esse ectoderma embrionário gradualmente cresce, circundando o embrião e o vitelo localizado abaixo da membrana externa. A epiderme então se diferencia e as camadas internas do primórdio embrionário originam a massa nervosa, a musculatura, a faringe e os nefrídeos. Prolecithophora Os prolecitóforos têm uma faringe pregueada ou bulbosa e intestino simples. São animais pequenos, de vida-livre, marinhos ou dulcícolas (Brusca e Brusca 2003). Não foram encontradas informações sobre o desenvolvimento embrionário desse grupo. “Seriata” Esse grupo parafilético reúne os Proseriata, os Bothrioplanida e os Tricladida. Os Seriata possuem uma grande capacidade regenerativa, que é utilizada como estratégia de reprodução assexuada. De fato, essa habilidade em Bothrioplanida ainda não foi extensivamente avaliada (revisto por Egger et al. 2007). Por causa dessa impressionante característica, o táxon Tricladida tem recebido especial atenção. Seus membros possuem uma faringe cilíndrica pregueada e o intestino tri- 60 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado ramificado, com numerosos divertículos (Brusca e Brusca 2003). As planárias (p.ex. Dugesia e Schmidtea) estão entre os representantes mais conhecidos e melhor estudados desse grupo. Na espécie de planária Schmidtea polychroa, os ovos possuem de dois a seis oócitos envoltos por células vitelínicas, que se fusionam em um sincício. Particularmente, os triclados têm um tipo único de clivagem entre os platielmintos, denominado anarquia dos blastômeros. Ao invés de formar uma mórula ordenada de micrômeros e macrômeros, os blastômeros perdem o contato e migram ativamente para diversas posições, dentro do sincício vitelínico. Mais tarde, a maioria dos blastômeros se reassocia para formar o embrião. No entanto, alguns blastômeros permanecem no vitelo e sofrem divisões como uma população de células espalhadas. Outro grupo de blastômeros se diferencia em uma epiderme embrionária transitória (membrana externa, do inglês hull membrane), que circunda parcialmente o sincício vitelínico e a faringe embrionária. A membrana externa mantém uma abertura pela qual o vitelo exterior pode movimentar-se para dentro da cavidade gástrica limitada por ela, no centro do sincício vitelínico. Essa abertura tem um anel muscular que atua como faringe e define o pólo posterior do embrião. O sincício e os blastômeros contidos na cavidade gástrica são então comprimidos em uma delgada camada periférica. Perto da faringe, precursores de cordões nervosos ventrais bilateralmente simétricos estendem-se para a região anterior. Uma massiva proliferação celular dá então início à diferenciação dos primeiros tecidos embrionários definitivos, enquanto grandes células ricas em vitelo, que revestiam o sincício, formam a gastroderme. O sincício vitelínico externo é reabsorvido e as células embrionárias contidas nele diferenciam-se em um arcabouço irregular de células musculares e nervosas. A epiderme embrionária transitória é enfim substituída por células epidérmicas verdadeiras. Populações frouxamente espalhadas de células em diferenciação consolidam estruturalmente os órgãos do embrião, que assume uma característica vermiforme. Os eventos morfogenéticos da embriogênese de S. polychroa assemelham-se ao cenário regenerativo. Para informações adicionais e outras referências, ver Cardona et al. (2005). Rhabdocoela Os rabdocelos formam um grupo diverso e amplo, dividido em “Dalyellioida”, Endoaxonemata, Kalyptorhynchia, “Typhloplanoida”, Temnocephalida e Revertospermata. Todos os rabdocelos possuem uma faringe bulbosa e intestino em 61 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado fundo-de-saco simples, sem divertículos. Os ovários são completamente separados do vitelário (Brusca e Brusca 2003). Aparentemente, o tifloplanóide Mesostoma lingua não segue o padrão típico para a clivagem em espiral: os quartetos regulares de macrômeros e micrômeros não foram identificáveis por Hartenstein e Ehlers (2000). No centro do ovo, o zigoto sofre quatro ou cinco clivagens, dando origem a um disco sólido, grosseiramente circular (estereoblástula). Esse disco migra para a periferia do ovo, onde adquire simetria bilateral: o contato com a superfície do ovo define a futura superfície ventral do embrião. Ao contrário dos neoóforos basais (p.ex. “Lecithoepitheliata”), a membrana externa (hull membrane) é formada pelas células vitelínicas, ao invés dos blastômeros. Essa membrana circunda todo o vitelo, desde o início da embriogênese. Os primeiros primórdios de órgãos (massa nervosa e faringe) surgem a partir de massas mesenquimais de células. Não há gastrulação em Mesostoma e a organogênese tem início com a formação do epitélio epidérmico na superfície ventral do embrião. Células mais internas se diferenciam em neurônios, células musculares (somáticas e da faringe) e em células epiteliais faringianas e excretoras (protonefrídeos). A diferenciação dos ocelos destaca-se pela produção de pigmentação. A massa nervosa compacta-se, enquanto as células musculares (miócitos) assumem aspecto filiforme. Contrações da larva tornam-se aparentes em ovos vivos, quando a larva está pronta para eclodir (ver Hartenstein e Ehlers 2000). A embriogênese de outra espécie de rabdocelo, o dalielídeo Gieysztoria superba, apresenta diversas similaridades com Mesostoma, como a clivagem irregular, o primórdio embrionário mesenquimal e a ausência de gastrulação. Entretanto, em comparação com outros rabdocelos, Gieysztoria exibe uma precoce diferenciação do epitélio intestinal e no aparelho genital masculino. Na metade da embriogênese, a camada epidérmica invagina (“invaginação embrionária”), deslocando o embrião para o centro do vitelo. Em seguida, a organogênese tem início. Nos estádios finais do desenvolvimento, o embrião everte-se de volta à superfície, onde o primórdio epidérmico expande-se ao redor do vitelo para fecharse dorsalmente. No Mesostoma, essas estruturas são formadas após a eclosão (ver Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000). A embriogênese dos rabdocelos temnocefalídeos Craspedella pedum e Diceratocephala boschmai também foi estudada por Younossi-Hartenstein e Hartenstein (2001). Monogenea A maioria de seus membros é ectoparasita, usualmente de peixes. Poucos são endoparasitas de vertebrados ectotérmicos (Brusca e Brusca 2003). Possuem 62 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado um corpo recoberto por tegumento, a ventosa oral é reduzida ou ausente e não possuem acetábulo. Esses animais têm um pró-haptor anterior e um órgão posterior de fixação, o opistohaptor. O ciclo de vida passa apenas por um único hospedeiro (Brusca e Brusca 2003). A embriogênese desse grupo é bastante peculiar. Em Gyrodactylus sp., cada geração de embriões é sequencialmente encapsulada e nutrida pela sua geração anterior, por pelo menos 20 gerações (Braun 1966; Harris 1998). Isto é, os embriões se desenvolvem dentro de outros mais antigos, que surgiram a partir do mesmo zigoto. Todos os embriões dentro desse grupo têm o mesmo genótipo (Harris 1993, 1998). A reprodução dessa espécie segue um padrão específico: o desenvolvimento da primeira progênie ocorre assexuadamente, enquanto seu progenitor ainda é um embrião. As progênies subsequentes se desenvolvem a partir de oócitos, que adentram o útero após o nascimento da geração precedente. Somente após o início do desenvolvimento da segunda progênie, o sistema reprodutor masculino torna-se funcional (Harris 1985) e as progênies subsequentes desenvolvem-se tanto partenogeneticamente quanto sexualmente (Harris 1993). Após a entrada de um oócito no útero, a primeira clivagem divide o zigoto longitudinalmente em dois blastômeros iguais, os quais podem ser encontrados dissociados no útero, devido à atividade muscular do progenitor. A dissociação e redistribuição das células dentro do útero continuam enquanto as clivagens iniciais prosseguem. As células podem mover-se livremente e se associarem ou se dissociarem umas das outras (anarquia dos blastômeros, como nos triclados). Subsequentemente, pares de micrômeros posicionam-se predominantemente na região anterior, sobre o sulco entre dois macrômeros. O destino de células individuais é de difícil determinação por técnicas convencionais de microscopia. Diversos rearranjos ocorrem no estádio de oito-células. A clivagem não é em mosaico, mas deve ser altamente regulada. A presença de um ou dois macrômeros quiescentes dentro da massa de micrômeros também é fonte de variação: eles podem se dividir entre os estádios de 30 a 150-células (Fig. 1.19). Os mecanismos de diferenciação e separação do tegumento de um dos embriões (progênie) e da parede uterina do outro (progenitor) ainda não são conhecidos. Estruturas como o intestino, o sistema excretor e o aparelho de adesão se diferenciam mais tarde, pósembrionariamente (Cable e Harris 2002). Para informações adicionais, ver os trabalhos de Cable et al. (1998), Cable et al. (2002) e Cable e Harris (2002). 63 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Figura 1.19. Desenvolvimento inicial de embriões F1 de Gyrodactylus gasterostei. Representação esquemática a partir de preparações inteiras, visualizadas por microscopia de contraste de fase. A Segunda e terceira clivagem, gerando micrômeros e macrômeros. B Conformações diferentes dos estádios de oito-células. C Ambos os macrômeros em divisão, nos estádios de 50- e 150-células. Para maiores informações, ver Cable J, Harris PD. Gyrodactylid developmental biology: historical review, current status and future trends. Int J Parasitol. 2002 Mar;32(3):255-80. Trematoda Como mencionado anteriormente, os trematódeos têm um tegumento especializado e duas ventosas. A maioria de seus membros é endoparasita de dois ou três hospedeiros durante o seu ciclo de vida (Brusca e Brusca 2003). Em geral, pouco se sabe sobre a embriogênese dos ovos de trematódeos: apenas as espécies de importância médica ou veterinária foram alvos de alguns estudos (p.ex., para Schistosoma, ver Vogel 1942; Prata 1957; para Fasciola, Horstmann 1962; Schmidt 1998; para Echinostoma, Idris e Fried 1996; Schmidt 1998; Fujino et al. 2000). Uma revisão das informações disponíveis sobre o desenvolvimento embrionário dos ovos de S. mansoni será apresentada na seção 2.6. 64 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Cestoda Exclusivamente endoparasitas, as tênias possuem um corpo recoberto por tegumento, dividido em um escólex anterior, um curto pescoço e um estróbilo. O estróbilo é formado por uma série de segmentos, ou proglótides. O tubo digestório é ausente (Brusca e Brusca 2003). A morfologia do primeiro estádio larval pode variar bastante entre os diferentes subtáxons de Cestoda. Os girocotilideanos e anfilinidianos, que parasitam peixes marinhos, produzem uma larva licófora, que exibe diversas características das larvas ou formas juvenis de platielmintos de vidalivre (Rohde e Georgi 1983; Xylander 1986, 1987). As larvas licóforas possuem um corpo alongado, uma massa nervosa anterior, um sistema de protonefrídeos pareados e uma epiderme ciliada. Na região distal, os girocotilidianos e anfilinidianos têm um conjunto de dez ganchos para fixação ao hospedeiro crustáceo, que necessitam ativamente localizar e penetrar. Os cestódeos mais derivados (Cestoidea), que são parasitas de vertebrados aquáticos e terrestres, possuem dois tipos de larvas: coracídio, para aqueles de ambiente aquático, e oncosfera, para os terrestres. Nos dois casos, as larvas têm estrutura simplificada e precisam ser ingeridas pelo hospedeiro para continuarem seus ciclos de vida. Ambas as larvas são diminutas esferas (menos de 20 µm de diâmetro), com até 100 células (revisto em Rybicka 1966; Ubelaker 1980). Em Hymenolepis diminuta, a oncosfera madura tem menos de 50 células. No início da embriogênese, o oócito sofre clivagem total e desigual (a clivagem em espiral não é aparente), gerando cinco grandes macrômeros e diversos micrômeros. Os primeiros dois macrômeros fusionam-se em para formar o envoltório externo. Os três macrômeros restantes formam outro sincício, que se expande e envolve a massa de micrômeros em divisão. O envoltório interno, ou embrióforo, é desprovido de cílios e resistente, sendo considerado homólogo à epiderme ciliada primária de outras larvas de cestódeos. Os micrômeros sofrem diversas outras divisões, formando uma massa mesenquimal bilateralmente simétrica. Aparentemente, não há folhetos embrionários na massa celular e a gastrulação também parece não ocorrer (ver Hartenstein e Jones 2003). A diferenciação celular tem início com a formação de três pares de ganchos (descrito por Swiderski 1973, para Catenotaenia pusilla), cujos primórdios aparecem adjacentes aos grandes núcleos ovóides dos oncoblastos. Os ganchos crescem e rompem a membrana dessas células, alcançando seu tamanho e forma (lâmina, colar ou haste) finais. Entre os oncoblastos, dois pares de células precursoras das glândulas epidérmicas se localizam no pólo posterior do embrião. Essas células precursoras se achatam e emitem projeções em direção à região 65 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado anterior do embrião, onde encontram processos semelhantes, de outras células glandulares. Ao lado do par de precursores das glândulas epidérmicas anteromediais, localizam-se precursores neurais, que emitem pequenos processos direcionados posteriormente. Nesse momento, os mioblastos se diferenciam em fibras musculares ao redor dos ganchos e da parede corporal. A parede corporal compreende uma fina camada sincicial e o epitélio embrionário. Esse epitélio envolve o sistema de células glandulares, formando-se pelo posicionamento do corpo celular de uma célula binucleada em camadas profundas, no centro da oncosfera; ele corresponde à neoderme sincicial, não-ciliada, que forma o tegumento dos cestódeos. A glândula de penetração origina-se a partir de um sincício de células repletas com grânulos, arranjadas em “U”. Ao término da embriogênese, a oncosfera, ao ser ingerida, perde seus envoltórios protetores e penetra na parede intestinal do hospedeiro primário. Na cavidade corporal, a oncosfera sofre metamorfose em um segundo tipo larva, chamado cisticercóide (ver Hartenstein e Jones 2003). I. 2. 6 – Desenvolvimento Embrionário do Ovo de Schistosoma mansoni Historicamente, a biologia dos ovos dos esquistossomos vem sendo tratada apenas marginalmente, com a atenção voltada principalmente para a formação de granulomas e o efeito de tratamentos quimioterapêuticos na oviposição das fêmeas. Apesar dos recentes avanços em estudos moleculares (genômica, transcriptômica, glicômica, lipidômica e outros), os ovos continuam sendo considerados como uma entidade única, invariável durante o tempo. Obviamente, isso não é verdade e os ovos provavelmente apresentarão perfis de expressão gênica e ativação de proteínas distintos durante a sua embriogênese. Todavia, apenas estudos esporádicos abordam o desenvolvimento embrionário do ovo, alguns ainda superficialmente (ver Neill et al. 1988; Swiderski 1984, 1994; Ashton et al. 2001; Freitas et al. 2007). A escassez de informações sobre essa fase do ciclo dos esquistossomos pode ser reflexo das dificuldades técnicas para estudá-los (ver Neill et al. 1988; Ashton et al. 2001; Jurberg et al. 2008a). A seguir, as informações disponíveis sobre a biologia do desenvolvimento dos ovos de S. mansoni serão sumariadas. I.2.6.1 – Fecundação Na fêmea acasalada, logo após deixar o ovário, o oócito maduro é provavelmente fecundado na porção posterior do oviducto. Nessa região, Erasmus 66 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado (1973) identificou a presença de espermatozóides em fêmeas maduras, mas não em fêmeas imaturas ou de infecções unissexuais. Também conhecido como receptáculo seminal, essa câmara no oviducto possui paredes lamelares que ajudam a reter os espermatozóides (Spence e Silk 1971). Em S. japonicum, Yang e colaboradores (2003) observaram que a fecundação ocorre em uma região especial, carente de lamelas, logo antes do receptáculo seminal. Como sugerido, isso possibilitaria que os espermatozóides tenham livre movimentação para encontrar e fecundar um oócito. Grânulos corticais nos oócitos maduros evitam a polispermia (fecundação múltipla) (Erasmus 1973; Orido 1988). Tais grânulos não são observados após a fecundação (Orido 1988) ou em oócitos de fêmeas de infecções unissexuais (Erasmus 1973). Em mamíferos, grânulos desse tipo rapidamente se fusionam com a membrana plasmática do oócito após a penetração do espermatozóide. Diversas enzimas são liberadas, atuando na modificação ou destruição de sítios de ligação de receptores para os espermatozóides. Além disso, uma espessa camada é formada, impossibilitando a entrada de outros espermatozóides. Os mecanismos bioquímicos que regem esse fenômeno ainda são desconhecidos nos esquistossomos. Com a fecundação, a primeira divisão meiótica é completada e os cromossomos reaparecem. O zigoto é formado a partir da fusão dos pró-núcleos masculino e feminino, após a segunda divisão meiótica e a extrusão do corpúsculo polar, como observado em S. japonicum (Yang et al. 2003). A célula-ovo passa através do receptáculo seminal cheio de espermatozóides, migra pelo oviducto e então pelo vitelo-oviducto. Nesse momento, células vitelínicas maduras circundam o zigoto (modo de desenvolvimento ectolécito, característico em vermes neoóforos). O preciso número de células vitelínicas ao redor do zigoto de S. mansoni ainda é incerto – variando de 20 a cerca de 40 células (Erasmus 1987; Smyth e Clegg 1959; Smyth e Halton 1983; Wells e Cordingley 1991). Então, as contrações musculares dos vermes em cópula auxiliam a rápida passagem desse aglomerado celular para o oótipo, onde ocorre a formação da casca (Moczon et al. 1992). I.2.6.2 – Formação da casca do ovo A formação do ovo propriamente dito tem início com a polimerização de sua casca em uma câmara especializada do sistema reprodutor da fêmea. Nessa câmara, ou oótipo, a massa de células vitelínicas que circunda o zigoto encontra um ambiente viscoso, ligeiramente alcalino (pH 7,0-7,5), devido às secreções das glândulas de Mehlis (Wells e Cordingley 1991). O meio alcalino provoca a secreção de vesículas ácidas, que contêm as proteínas precursoras da casca e enzimas fenol 67 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado oxidases. De fato, todos os componentes necessários para a formação da casca estão presentes nessas vesículas (Wells e Cordingley 1991), tendo sido previamente sintetizados pelas células vitelínicas, ainda nas glândulas vitelínicas (vitelário) (Threadgold 1982; Koster et al. 1988; Erasmus 1987). Assim, é possível que o sinal desencadeante para a formação da casca seja uma pequena molécula (ainda desconhecida) que interaja com um receptor nas células vitelínicas, disparando uma série de eventos intracelulares (Berridge e Irvine 1989). Esses eventos culminam no aumento do cálcio intracelular, que causa a exocitose dessas vesículas (Wells e Cordingley 1991). A exocitose das vesículas ácidas diminui ligeiramente o pH do fluído em torno da massa celular, suficiente para prevenir a fusão imediata dos grânulos precursores da casca. Nesse momento, o oótipo se contrai vigorosamente e relaxa por algumas vezes, provavelmente modelando a nova casca em seu formato característico (Wells e Cordingley 1991). A casca do ovo se forma então pela ligação cruzada de monômeros de pelo menos três famílias distintas de proteínas – P14, P34 e P48 (Ebersberger et al. 2005), presumivelmente em um processo baseado no enrijecimento de quinonas mediado por fenol oxidases (Wells e Cordingley 1991; Fitzpatrick et al. 2007). A inibição de duas dessas enzimas (tirosinases 1 e 2, ou SmTYR1 e SmTYR2), mediada pela incubação de ácido de Kojic em cultura de vermes adultos, diminui significantemente a produção de ovos fenotipicamente normais, sem defeitos em suas cascas (Fitzpatrick et al. 2007). Outro inibidor da atividade dessa família de enzimas, o dietilditiocarbamato (DDC), também previne a formação da casca de ovos em esquistossomos (Bennet e Gianutsos 1978). A polimerização da casca do ovo, como suposto por Wells e Cordingley (1991), seria resultado da perda das cargas positivas na superfície dos grânulos precursores da casca, na interface de contato com as secreções alcalinas das glândulas de Mehlis. Com isso, os grânulos precursores se fusionariam e enrijeceriam. A ocorrência de microespinhos apenas na superfície externa da casca seria resultante desse contato com o ambiente alcalino das secreções do oótipo. Ao final de sua formação, a casca emite fluorescência natural (autofluorescência) quando observada em microscopia de fluorescência (Wells e Cordingley 1991). Observações na formação da casca dos ovos de Fasciola hepatica sugerem que esse mecanismo possa ser comum para outras espécies de trematódeos (Colhoun et al. 1998). 68 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado I.2.6.3 – Desenvolvimento embrionário dos ovos Após a formação da casca no oótipo, o ovo é liberado no útero da fêmea, onde fica brevemente. A curta permanência no útero suscita questionamentos sobre a importância desse órgão no desenvolvimento dos ovos. Como diversos outros helmintos parasitas, o S. mansoni apresenta padrão oportunista (r-selecionado) de produção de ovos e precisa direcionar rapidamente os nutrientes absorvidos pelas fêmeas para a geração dos ovos e, em especial, das células vitelínicas. As fêmeas produzem cerca de 300 ovos por dia (Moore e Sandground 1956; Pellegrino e Coelho 1978), cerca de um ovo a cada cinco minutos. Todavia, outros autores reportaram valores diferentes para o número de ovos produzidos por dia pelas fêmeas (Faust et al. 1934; Valadares et al. 1981; Cheever 1994a, b; Lenzi JA 1998). Essa variação pode ter sido causada pelo ser emprego de métodos, animais e/ou isolados de S. mansoni diferentes. De fato, a maioria dos trabalhos aponta para números entre 150 a 300 ovos por fêmea/dia. Nesse caso, as fêmeas chegam a gerar até 12.000 células vitelínicas por dia. Os ovos são então ovipostos na corrente sanguínea do hospedeiro vertebrado, ainda imaturos. Nesse momento, eles possuem cerca de 112 µm de comprimento por 44 μm de largura (Ashton et al. 2001) e exibem um conspícuo espinho lateral, característico da espécie S. mansoni. Nos tecidos do hospedeiro ou em cultura, o desenvolvimento embrionário completo tem duração de seis a sete dias (Prata 1957; Pellegrino et al. 1962; Michaels e Prata 1968). Swiderski (1984) descreveu sucintamente as fases iniciais da embriogênese dos ovos: a clivagem é total e desigual, gerando blastômeros de três tipos. Os micrômeros e mesômeros darão origem ao miracídio; enquanto os macrômeros e alguns mesômeros formarão os envoltórios do ovo ao redor do embrião em desenvolvimento. Nenhuma menção à organogênese foi feita. Três camadas da casca são morfologicamente distintas à microscopia eletrônica de transmissão: o envoltório externo ou camada de Reynolds é ausente nos ovos mais prematuros e engrossa progressivamente conforme o ovo amadurece, principalmente nos pólos. Esse envoltório se forma a partir de dois macrômeros que se soltam em pólos opostos da superfície do embrião e se fusionam com o sincício vitelínico, previamente formado a partir de resquícios das células vitelínicas. Ele transforma-se em uma matriz acelular e fibrilar que se posiciona entre a margem interna da casca do ovo propriamente dita e o outro envoltório do ovo. O envoltório interno, mais conhecido por envoltório de von Lichtenberg, é formado por três a quatro mesômeros que também se destacam da superfície do embrião em desenvolvimento após a formação do envoltório externo. O citoplasma dessas 69 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado células também se fusiona em uma camada que envolve o embrião, logo abaixo do envoltório externo. Em estádios avançados da embriogênese do ovo, esse envoltório é caracterizado pela presença de núcleos grandes e achatados pertos dos pólos do ovo, apresentando nucléolos esféricos evidentes e densas ilhas de heterocromatina. Conforme o miracídio amadurece, os núcleos se deterioram; o citoplasma contém retículo endoplasmático rugoso bem desenvolvido, numerosas gotículas lipídicas e extensos agregados de rosetas α de glicogênio e de partículas β de glicogênio; por fim, a lacuna de Lehman é o espaço entre a membrana plasmática apical do envoltório interno e o próprio embrião. Durante os momentos mais iniciais do desenvolvimento, essa cavidade é preenchida por um fluído elétron-luminescente, com corpúsculos lipóides espalhados, espirais mielinóides e resquícios de células vitelínicas e/ou células vitelínicas ainda íntegras. Nos estádios mais tardios, essa lacuna contém discretas massas grandes de material grânulo-focular, os corpúsculos de Cheever (Neill et al. 1988; Swiderski 1994). Classicamente, entretanto, o amadurecimento dos ovos dos esquistossomos é classificado apenas considerando as dimensões do embrião em relação ao tamanho do ovo propriamente dito (Vogel 1942; Prata 1957). Essa classificação foi denominada de oograma (Pellegrino et al. 1962; Cunha et al. 1962). No estádio I, o embrião mede cerca de um terço do diâmetro transversal do ovo. No estádio II, ele ocupa um pouco mais da metade do diâmetro transversal do ovo. Já no estádio III, o embrião alonga-se e passa a ocupar cerca de 2/3 do diâmetro longitudinal do ovo. O estádio IV engloba os embriões que ocupam todo o interior do ovo, que ainda apresenta alguns vestígios de vitelo em seus pólos. O último estádio (estádio V) refere-se ao miracídio completamente desenvolvido, que apresenta movimentação, batimento ciliar, contração muscular e atividade das células-flama. Obviamente, o estádio V é mais facilmente determinado em observados frescos de esmagados de intestino ou em ovos isolados viáveis. As mudanças na abundância desses diferentes estádios do desenvolvimento, i.e, no oograma, têm sido utilizadas como um critério simples, sensível e confiável na avaliação primária de drogas para a esquistossomose (Pellegrino e Faria 1965). Ao final da embriogênese, os ovos necessitam sair do território vascular e atravessar a parede do intestino, especialmente a camada mucosa (que engloba o epitélio e a lâmina própria), para serem liberados junto com as fezes, dando continuidade ao complexo ciclo biológico do parasito (ver Fig. 1.2). Nessa fase, os ovos maduros podem permanecer vivos nos tecidos do hospedeiro por um período máximo de 12 dias (Prata 1957; Cançado et al. 1965). Ao atravessarem a mucosa 70 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado intestinal, os ovos são eliminados com as fezes e eclodem caso alcancem condições adequadas em tempo útil (ver revisão de Coelho et al. 2008). I. 2. 7 – Reação Granulomatosa (Granuloma Periovular) Os ovos liberados pelas fêmeas de S. mansoni começam a se desenvolver já na corrente sanguínea do hospedeiro, sendo carregados passivamente para diversos órgãos, como fígado, intestino delgado e grosso, pâncreas, baço e pulmões. Ao atingirem vasos de menor calibre, os ovos ficam retidos e podem atuar como agentes granulomatogênicos, isto é, causar um tipo de reação inflamatória peculiar, denominada granuloma. Entretanto, é interessante notar que, de alguma maneira, a formação dos granulomas seja dependente do amadurecimento dos ovos, como destacado por Prata (1957). Ele relatou jamais ter encontrado granulomas cercando ovos imaturos isolados. No intestino, a reação inflamatória intravascular inicial ao redor dos ovos possibilita que estes saiam dos vasos e atinjam os tecidos adjacentes (Lenzi et al. 1987). É possível que os ovos também possam ser passivamente transferidos para o espaço perivenular pela ação não-específica de células endoteliais (File 1995). Às vezes, agregados de ovos comprometem o fluxo sanguíneo, gerando necrose da parede vascular (Bloch 1980). A passagem dos ovos pela mucosa intestinal é dependente de células inflamatórias periovulares, especialmente macrófagos e eosinófilos, que degradam a membrana basal epitelial e, com isso, criam um ambiente de fácil penetração para os ovos. Assim, o peristaltismo intestinal expulsa os ovos para a sua luz (Lenzi et al. 1987, 1991) e, ao atingirem as fezes, os ovos podem dar continuidade ao ciclo desse parasito, caso encontrem condições adequadas para a eclosão dos miracídios. No fígado, a retenção dos ovos embolizados nos finos vasos portais causa a dilatação dos ramos periportais. Caso a produção de ovos continue, a subsequente oclusão desses ramos pode provocar reação granulomatosa, angiogênese e fibrose. O granuloma esquistossomótico é um sistema adaptativo complexo de células migrantes e componentes heterogêneos de matriz extracelular que se organizam em uma estrutura dinâmica, ao redor do ovo. Como sistema complexo, o granuloma é caracterizado pelas seguintes propriedades: (1) dinamismo, (2) irreversibilidade, (3) homeostasia, (4) agregação, (5) não-linearidade, (6) fluência, (7) diversidade, (8) rotulagem, (9) modelos internos, (10) blocos de construção ou de montagem (Lenzi e Romanha 2003; Lenzi et al. 2006; Romanha 2007). Basicamente, o granuloma é 71 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado uma reação inflamatória crônica local, compacta e organizada, caracterizada pela presença de células da linhagem macrofágica, onde outros tipos celulares (p.ex. células epitelióides) também podem estar presentes (ver Lenzi et al. 1998). A literatura sobre o granuloma esquistossomótico por S. mansoni é bastante extensa e inumeráveis revisões já foram realizadas (p.ex. Lenzi et al. 1998; Cummings e Nyame 1999; Weinstock et al. 1999; Rumbley e Phillips 1999; Stadecker 1999a, b; Boros 1999; Wynn 1999; Infante-Duarte e Kamradt 1999; Stadecker et al. 2001; Cheever et al. 2002; Asahi e Stadecker 2003; Stavitsky 2004; Wynn et al. 2004; Abath et al. 2006; Wilson et al. 2007; Lenzi et al. 2008b). Por isso, apenas alguns aspectos-chave da granulomatogênese, relacionados com o desenvolvimento dos ovos, serão destacados a seguir. I.2.7.1 – Antígenos solúveis do ovo Durante a presença dos ovos nos tecidos do hospedeiro, alguns de seus componentes são ativamente secretados ou mesmo disponibilizados para o meio circundante após a morte e desintegração do ovo. Acredita-se que a reação granulomatosa periovular atue na contenção da difusão desse material exógeno ao hospedeiro (Adams 1983; Reis e Andrade 1987), coletivamente conhecido como “antígeno solúvel do ovo”, ou SEA, do inglês soluble egg antigen. O granuloma, portanto, impediria que tais antígenos alcançassem o sistema vascular e fossem então levados para outros órgãos, distantes de seu local original de produção (p.ex., fígado). No entanto, a produção acentuada de ovos e o consequente elevado número de granulomas podem ocasionar fibrose hepática, hepatoesplenomegalia e hipertensão portal. Tradicionalmente, considerava-se que o SEA era composto por pelo menos trinta glicoproteínas imunogênicas, com peso molecular aparente variando de 10 a mais de 200 kDa (Asahi et al. 1999; Stadecker et al. 2001). Entretanto, um estudo recente utilizando Tecnologia de Identificação Multidimensional de Proteínas (do inglês, Multidimensional Protein Identification Technology) apontou, de fato, 188 proteínas secretadas pelo ovo (“secretoma do ovo”). Essas proteínas estão envolvidas em balanço redox, chaperonamento e montagem protéica, no desenvolvimento e na sinalização celular, na remoção de detritos e em cascatas metabólicas e modulação da resposta imunológica. Além disso, 32 novas proteínas, ainda não caracterizadas, foram também identificadas (Cass et al. 2007). No caso da granulomatogênese, a atividade das proteínas imunogênicas está restrita à presença de unidades terminais LacNAc (Galβ1-4GlcNAc, como na asialofetuina) ou LacdiNAc (GalNAcβ1-4GlcNAc) (van de Vijver et al. 2006), 72 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado previamente identificadas nos ovos de esquistossomos por Khoo e colaboradores (1997). O SEA também medeia a migração tecidual dos ovos e sua adesão ao endotélio vascular, bem como a passagem para a luz intestinal, agregação plaquetária e processos relacionados à angiogênese (Lenzi et al. 1987; Ngaiza e Doenhoff 1990; File 1995; Lejoly-Boisseau et al. 1999; Loeffler et al. 2002; Stanley et al. 2003; Doenhoff et al. 2003). Ao atingir o meio periovular, os antígenos do ovo são internalizados e processados por células dentríticas derivadas de monócitos e apresentados às células T via MHC de classe II (van Liempt et al. 2007). Suas imunogenicidade e patogenicidade irão variar de acordo com fatores geneticamente determinados do hospedeiro, como os haplotipos de MHC e o repertório de células T (revisto por Abath et al. 2006). Apesar dos recentes avanços na imunopatologia da inflamação granulomatosa na esquistossomose, a origem da maioria desses antígenos e seus epítopos de células T permanecem amplamente desconhecidos (Asahi e Stadecker 2003). A imunolocalização das proteínas totais secretadas pelo ovo (ESP) identificou o envoltório interno do ovo, também conhecido como envoltório de von Lichtenberg, ao invés do miracídio propriamente dito, como fonte dessas proteínas (Ashton et al. 2001). Quando madura, tal estrutura possui um retículo endoplasmático rugoso desenvolvido, que indica elevados níveis de síntese protéica, e grandes agregados de material granular, que pode significar o armazenamento dessas proteínas recémsintetizadas antes da sua exocitose (Ashton et al. 2001). Esse envoltório surge precocemente no desenvolvimento do ovo (Swiderski 1994; Ashton et al. 2001) (ver seção 2.6). Anticorpos monoclonais anti-LacdiNAc também revelaram a localização desse carboidrato na superfície externa da casca do ovo (van Remoortere et al. 2000; van den Berg et al. 2004). Outro estudo também localizou uma importante proteína do ovo (IPSE/alfa-1), capaz de estimular basófilos a degranularem e liberarem IL-4, na mesma região adjacente a casca (Schramm et al. 2006). Entretanto, como os próprios autores reconheceram, os momentos nos quais a síntese dessas moléculas tem início e que seus estímulos indutores ainda permanecem desconhecidos. Assim, é preciso não apenas identificar quais antígenos ocorrem, mas determinar suas estruturas e suas localizações espaciais durante o desenvolvimento do ovo; se os antígenos são secretados ou não e ainda se eles são compartilhados com outras fases do ciclo de vida do esquistossomo. A seguir, uma breve descrição dos antígenos ovulares secretados mais abundantes será apresentada (ver também Stadecker et al. 2001; Asahi e Stadecker 2003; Cass et al. 2007). Os outros antígenos secretados, com abundância relativa intermediária ou mínima, foram sumariados em Cass e colaboradores (2007). 73 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado IPSE/alfa-1 (ou ainda Sm-p25) É o antígeno de maior abundância relativa no secretoma do ovo (Cass et al. 2007). Inicialmente chamado de alfa-1 (Dunne et al. 1991), esse antígeno é idêntico ao princípio indutor de IL-4 dos ovos de S. mansoni (IPSE, do inglês IL-4-inducing principle of S. mansoni eggs) (Schramm et al. 2006) e ao antígeno Sm-p25 (Schramm et al. 2003). Esse antígeno é uma glicoproteína estádio-específica de 20 kDa, que forma um homodímero de 40 kDa com capacidade de estimular a desgranulação de basófilos e a liberação de IL-4 (Schramm et al. 2003, 2006). Essa interleucina atua na proliferação de células T e na mudança de fenótipo da resposta imunológica para Th-2, bem como na proliferação de mastócitos, megariócitos e precursores eritróides; além de estimular a secreção de anticorpos por linfócitos B (troca de isotipo para IgE) (Abbas e Lichtman 2005). A localização de IPSE/alfa-1 se restringe à área subjacente a casca, presumivelmente nos envoltórios interno (envoltório de von Lichtenberg) e externo (camada de Reynolds) do embrião maduro, e no entorno dos ovos, bem como em algumas células da camada central do granuloma (Schramm et al. 2006). Ômega-1 Segundo antígeno em abundância relativa no secretoma do ovo (Cass et al. 2007), o antígeno ômega-1 foi primeiramente caracterizado por Dunne e colaboradores (1991) como uma glicoproteína monomérica estádio-específica, de 31 kDa e pI maior que 9,0. Esse antígeno é uma ribonuclease funcional, com atividade hepatotóxica (Dunne et al. 1991; Fitzsimmons et al. 2005). Não há ainda dados disponíveis sobre a sua localização e produção durante o desenvolvimento do ovo e a granulomatogênese. Sm-p40 e proteínas de choque térmico (HSPs) Outro antígeno de grande abundância relativa no secretoma do ovo (Cass et al. 2007), a proteína de 40 kDa do S. mansoni (Sm-p40) foi primeiramente identificada por Nene e colaboradores (1986) em ovos e miracídios. A sua sequência de 354 resíduos de aminoácidos compartilha homologia com a família de αcristalinas e de proteínas de choque térmico (HSPs) (Nene et al. 1986; Cass et al. 2007). As α-cristalinas podem atuar como chaperonas para outros antígenos do ovo durante a migração tecidual, prevenindo a agregação de proteínas e facilitando a sua montagem (Nene et al. 1986; Horwitz et al. 1992). É possível também que esse antígeno possa de alguma forma proteger o ovo dentro do ambiente oxidativo do 74 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado granuloma (Cass et al. 2007). Nas cepas murinas H-2k, C3H e CBA (formadoras de granulomas grandes), o antígeno Sm-p40 causa uma forte resposta celular Th CD4+; em contraste, evoca respostas muito mais fracas na cepa BL/6, que forma granulomas consideravelmente menores (Fanning et al. 1981; Cheever et al. 1987; Hernandez et al. 1997a, b; Stadecker e Hernandez 1998; Stadecker et al. 2001). Em humanos, o Sm-p40 também é imunogênico (Stadecker 1999a). Isso implica que a origem genética do hospedeiro possivelmente modula a intensidade da inflamação granulomatosa e sugere que o reconhecimento diferencial dos antígenos pode ser um dos fatores determinantes (Stadecker e Hernandez 1998; Stadecker et al. 2001). Ao contrário do SEA total não-fracionado, que polariza uma resposta imunológica para o fenótipo Th-2 (Pearce et al. 1991), o antígeno Sm-p40 possui um epítopo imunodominante de célula T que evoca uma resposta fortemente inclinada ao fenótipo Th-1 e pelo menos outros dois epítopos subdominantes (Cai et al. 1996; Hernandez et al. 1998; Chen e Boros 1998; Hernandez e Stadecker 1999). Embora um anticorpo monoclonal anti-Sm-p40 já tenha sido desenvolvido (Hernandez et al. 1998; Abouel-Nour et al. 2006), não há ainda dados disponíveis sobre a localização e produção desse antígeno durante o desenvolvimento do ovo e a formação de granulomas. Proteínas de choque térmico, como HSP86/90, -70, -60, -40 e -10, também foram identificadas no secretoma do ovo (Cass et al. 2007). Em geral, essa classe de proteínas está envolvida em respostas a condições de estresse, como no aumento de temperatura. As HSP estão entre as proteínas celulares mais prolíficas, presentes de bactérias até humanos. De fato, a proteína HSP86/90 foi primeiramente identificada por Johnson e colaboradores (1989) em vermes adultos, sendo homóloga à HSP90 de Saccharomyces cerevisae e à HSP83 de Drosophila melanogaster (Johnson et al. 1989). Por sua vez, anticorpos específicos anti-HSP70 de S. mansoni foram utilizados para detectar infecções crônicas em humanos. Entretanto, foram observadas reações cruzadas contra indivíduos com filaríase ou malária. Soros de pacientes infectados com S. haematobium também reconheceram a HSP70 de S. mansoni; o mesmo não aconteceu com soro de pacientes infectados com S. japonicum (Moser et al. 1990). Já a proteína HSP60 foi previamente identificada em cercárias, vermes adultos e esporocistos. Um anticorpo monoclonal anti-HSP60 de S. mansoni também foi produzido (Tielens et al. 1993). Embora anticorpos contra esses antígenos tenham sido desenvolvidos ou estejam disponíveis comercialmente, ainda não há informações sobre a localização e síntese dessas proteínas durante o desenvolvimento do ovo e a granulomatogênese. Dados adicionais sobre as HSP40 e -10 de S. mansoni são ainda necessários. 75 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado Niemann-Pick tipo C2 (NPC2) Pela primeira vez identificada em secreções parasitárias e em Schistosoma (Cass et al. 2007), essa pequena e ubíqua proteína intra-lisossomal é essencial ao tráfego de colesterol, via compartimentos endossomais/lisossomais (Vanier e Millat 2004; Cheruku et al. 2006). As NPC2 de S. mansoni e humana compartilham 37% de identidade e 55% de similaridade (Cass et al. 2007), bem como os resíduos de aminoácidos Phe-66, Val-96 e Tyr-100 essenciais para a ligação com o colesterol (Ko et al. 2003; Cass et al. 2007). Essencial para o funcionamento da NPC2 humana, um sítio de N-glicosilação foi predito na NPC2 de S. mansoni (Cass et al. 2007). O papel da NPC2 nos ovos precisa ser avaliado, mas é possível que ela esteja envolvida na absorção de colesterol, bem como de outros glicolipídeos. A NPC2 de S. mansoni pode ainda participar na permuta de moléculas imunomodulatórias com o hospedeiro (Cass et al. 2007). Por exemplo, Sprong e colaboradores (2006) observaram que glicoproteínas circulantes de S. mansoni em partículas lipoprotéicas de baixa-densidade do hospedeiro rompem com homeostasia de lipídeos nas células imunológicas, induzindo apoptose. Frutose-1,6-bisfosfato aldolase Identificada no secretoma do ovo (Cass et al. 2007), essa enzima da cascata glicolítica foi primeiramente clonada e caracterizada por El-Dabaa e colaboradores (1998). Composta por 363 resíduos de aminoácidos, essa proteína apresenta 66% e 65% de identidade com as isoenzimas humanas C e A, respectivamente. Entretanto, ensaios de ativação e ligação ao substrato sugerem que esse antígeno assemelha-se a aldolase tipo A. Usando anticorpos contra a enzima recombinante purificada, uma banda de 40 kDa foi reconhecida em extratos de cercárias, de esquistossômulos (cinco e 25 dias), de vermes adultos e de ovos. Em vermes adultos, sua localização é tegumentar (El-Dabaa et al. 1998). Não foram realizadas imunolocalizações nas outras fases do ciclo. Peptidilglicina alfa hidroxilante mono-oxigenase (SmPHM) A SmPHM foi primeiramente clonada e caracterizada por Mair e colaboradores (2004). Essa enzima é fundamental para a conversão de um peptídeo intermediário glicina-estendido em um produto aminado na extremidade Cterminal. A SmPHM foi localizada por todo o sistema nervoso dos vermes adultos, na massa nervosa anterior, nos cordões nervosos longitudinais dorsais e nas comissuras transversais interconectantes. Nos machos, a SmPHM foi identificada nos plexos nervosos subtegumentares e dentro dos tubérculos. Já nas fêmeas, a 76 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado SmPHM também estava presente nas células nervosas e fibras do oótipo. Ultraestruturalmente, a SmPHM se localiza na rede-trans do complexo de Golgi e em vesículas secretoras dos nervos centrais e periféricos de ambos os vermes. A ampla presença dessa enzima confirma o importante papel dos neuropeptídeos aminados nos esquistossomos, como os peptídeos FMRFamida-relacionados (FaRPs) e os neuropeptídeos Fs (NPFs) que terminam com uma fenilalanina-amida (Day e Maule 1999; Mair et al. 2004). Nos ovos, a SmPHM foi identificada no secretoma e localizada na superfície externa da casca, via reação de precipitação ao redor do ovo (COPT; do inglês, circumoval precipitin reactions) (Cass et al. 2007). Glutationa S-transferase de 26 kDa (SmGST-26) Também identificada no secretoma do ovo com uma abundância relativamente alta (Cass et al. 2007), essa proteína antioxidante foi clonada em vermes adultos por Trottein e colaboradores (1990) e Henkle e colaboradores (1990). Sua sequência predita de resíduos de aminoácidos mostrou forte homologia com GST-26 de S. japonicum (SjGST-26) e um menor nível de homologia com as isoenzimas GST de classe µ dos mamíferos. Além disso, não foi constatada homologia significante com a SmGST-28. Ultraestruturalmente, a SmGST-26 foi identificada no tegumento e em células parênquimais subepidérmicas, da mesma forma que SmGST-28. Por sua vez, apenas SmGST-26 é encontrada nas digitações citoplasmáticas da câmara apical delineada pelo corpo celular dos protonefrídeos, sugerindo que esse antígeno seja ativamente excretado pelos vermes adultos (Trottein et al. 1990). Cass e colaboradores (2007) localizaram essa proteína ao redor do ovo, via COPT. Dados adicionais sobre a localização e síntese dessa e outras GSTs durante o desenvolvimento do ovo e a granulomatogênese são necessários. Fosfoenolpiruvato carboxiquinase-GTP (SmPEPCK) Essa enzima da cascata gliconeogênica e outras três (glicose-6-fosfatase, frutose-1,6-bisfosfatase e piruvato carboxilase) foram detectadas em homogenatos de vermes adultos por Tielens e colaboradores (1991). Em condições anaeróbicas, esporocistos de S. mansoni produzem lactato e uma ampla quantidade de sucinato, via atividade da SmPEPCK. Na presença de oxigênio, esse estádio larval deriva a maior parte de sua energia a partir da degradação aeróbica de glicose a dióxido de carbono (Tielens et al. 1992). Ainda em esporocistos, essa enzima participa na gliceroneogênese (produção de glicerol a partir de precursores, como a glutamina) (Khayath et al. 2006). Também identificada no secretoma do ovo (Cass et al. 2007), 77 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado essa enzima de 62 kDa possui uma forte ação estimulatória na proliferação de células T CD4+ de camundongos C57BL/6 infectados (Asahi et al. 1999). Por sua vez, embora uma SmPEPCK recombinante de 626 resíduos de aminoácidos também evoque uma forte resposta proliferativa de células Th CD4+ em camundongos C57BL/6, CBA e BALB/c, a resposta imunológica é polarizada para o fenótipo Th-1, com significante produção de INF-gama e, em dimensão, de IL-2 e IL-5. Um epítopo de célula T, de doze aminoácidos (DKSKDPKAHPNS), foi demonstrado na região dos resíduos 398 a 409 (Asahi et al. 2000). Não há ainda informações sobre a localização desse antígeno durante o desenvolvimento do ovo e a granulomatogênese. Tioredoxina peroxidase 1/Peroxiredoxina 1 (SmTPx-1/SmPrx-1) Membro de uma ampla e ubíqua família de proteínas antioxidantes, conhecidas como peroxiredoxinas, essa enzima de 26 kDa foi primeiramente identificada por Kwatia e colaboradores (2000) em vermes machos e fêmeas. Já Williams e colaboradores (2001) apontaram sua presença no envoltório interno (envoltório de von Lichtenberg) de ovos maduros, bem como sua secreção para o meio periovular (confirmado por Cass et al. 2007). Essa enzima consiste de 185 resíduos de aminoácidos, com dois resíduos de cisteína (48 e 169) funcionais (Kwatia et al. 2000). A SmTPx-1/SmPrx-1 estimula a proliferação significativa de células T CD4(+) em camundongos C57BL/6 e CBA com oito semanas e meia de infecção, além de uma produção mista de citocinas dos tipos Th-1 e Th-2. A produção de anticorpos mais significante ocorre após o início da oviposição (Williams et al. 2001). No miracídio, a SmTPx-1/SmPrx-1 e outra peroxiredoxina (SmTPx-2/SmPrx-2) são encontradas na papila apical (ou terebratório); nos esporocistos, elas são localizadas no tegumento sincicial e liberadas com as proteínas secretadas/excretadas durante a transformação da larva em cultura, sugerindo sua participação antioxidante também na fase intra-molusco (Vermeire e Yoshino 2007). Tioredoxina glutationa reductase (SmTGR) Essa enzima antioxidante multifuncional possui uma abundância relativa intermediária no secretoma ovo (Cass et al. 2007), mas será abordada devido a sua destacada posição como novo alvo quimioterapêutico (Sayed et al. 2008). Primeiramente identificada por Alger e Williams (2002) em vermes adultos, a SmTGR é a principal responsável pelas atividades tioredoxina redutase, glutationa redutase e glutaredoxina do sistema antioxidante dessa fase do ciclo. A inibição 78 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado dessa enzima por tecnologia de RNA de interferência provocou uma diminuição substancial da taxa de sobrevivência de esquistossômulos incubados em condições aeróbicas ou anaeróbicas, após quatro dias de tratamento (Kuntz et al. 2007). Uma avaliação quantitativa automatizada de alta produção (do inglês, automated quantitative high-throughput; qHTS) analisou a atividade de 71.028 compostos como potenciais inibidores da SmTGR e identificou diversas séries promissoras de amidas fosfínicas e 2-óxido oxidiazóis (Simeonov et al. 2008). O tratamento de camundongos (por cinco dias consecutivos, com injeção intraperitoneal de 10 mg/kg) em diferentes tempos de infecção (com início após 1, 23 e 37 dias de infecção) com o composto 4-fenil-1,2,5-oxadiazol-3-carbonitrila-2-óxido causou acentuada redução na carga parasitária, indicando que tal droga é eficaz contra a fase dérmica, pulmonar e adulta do parasito. Macroscopicamente, o número de granulomas hepáticos foi consideravelmente menor do que nas infecções controles (Sayed et al. 2008). Não há ainda informações sobre a localização desse promissor antígeno durante o desenvolvimento do ovo e a granulomatogênese. I. 2. 8 – Morfologia do miracídio de Schistosoma mansoni Ao atingirem uma massa de água em condições adequadas de luminosidade, salinidade, temperatura e pH, os ovos maduros eclodem rapidamente e liberam uma forma larvar ciliada, chamada miracídio (revisto por Coelho et al. 2008). O miracídio é o primeiro estádio infectivo (de caramujos) do complexo ciclo de vida do S. mansoni. A eclosão é possivelmente iniciada pela ativação de uma leucina aminopeptidase específica (Xu e Dresden 1986), em baixos níveis de salinidade (Donnelly et al. 1984). Na água, os miracídios passam a realizar rápidos movimentos no interior do ovo, até provocarem a ruptura de sua casca, que geralmente ocorre em sentido transversal (Kusel 1970). Recém liberado, os miracídios nadam em direção à luz através da agitação coordenada de seus cílios, devendo encontrar rapidamente o seu hospedeiro invertebrado suscetível para dar continuidade ao seu ciclo biológico. Os mecanismos de localização, reconhecimento e penetração nesses hospedeiros foram recentemente revistos por Coelho e colaboradores (2008) e não serão abordados nessa seção. A morfologia do miracídio de S. mansoni foi alvo de dois extensos trabalhos. Ottolina (1957) realizou a primeira descrição da anatomia, citologia e fisiologia desse estádio larval por microscopia de campo claro. Mais tarde, Pan (1980) revelou, por microscopia eletrônica de transmissão, delicados detalhes desses 79 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado componentes celulares (Fig. 1.20). O conhecimento minucioso das estruturas e sistemas de órgãos dessa larva é imprescindível para fundamentar a descrição da embriogênese dos ovos, já que o miracídio é a forma final da primeira etapa de desenvolvimento do ciclo de vida desse parasito. Suas estruturas e respectivas localizações servem como referência para a descrição dos eventos morfogenéticos que ocorrem no embrião em desenvolvimento. A seguir, portanto, uma breve descrição do miracídio será apresentada. O miracídio tem forma ligeiramente cilíndrico-cônica e cerca de 180 µm de comprimento por 60 µm de diâmetro (Ottolina 1957). Células epidérmicas ciliadas, arranjadas em placas dérmicas, permitem o movimento natatório, através de seus batimentos ciliares sincronizados. As células da epiderme formam um delgado sincício, com núcleos redondos proeminentes e intensamente basófilos, e uma conspícua membrana basal separa as células da epiderme da dupla camada muscular subjacente. Na extremidade anterior, encontra-se o terebratório ou papila apical, por onde perpassam e terminam os ductos das duas glândulas laterais – também conhecidas como glândulas de adesão – e o ducto da glândula apical ou glândula de penetração. Antigamente, a glândula de penetração era confundida com um tubo digestório primitivo ou saco digestório (Ottolina 1957). De fato, o tubo digestório primitivo está ausente nesse estádio larval (Pan 1980). No terebratório, há um conjunto de cílios maiores e espículos anteriores, provavelmente relacionados com o processo de penetração nos moluscos, bem como terminações nervosas, com funções tácteis e sensoriais (Pan 1980). O sistema excretor é formado por quatro células-flama e seus ductos coletores, que são drenados para uma ampola excretora que se abre em um poro excretor. O sistema nervoso consiste de uma massa esferóide central, com núcleos neuronais perifericamente localizados e envolvendo numerosos axônios e dendritos (neurópilo). Os núcleos são irregulares, ligeiramente ovais e achatados, contendo um pequeno nucléolo evidente. Por meio de cordões nervosos, formados por células bipolares, há a comunicação com células nervosas periféricas, que regem a contratilidade e mobilidade do miracídio, ao comandar a camada muscular subepitelial (Pan 1980). Cerca de 20 células intersticiais preenchem os espaços intercelulares e aparentemente atuam no armazenamento de energia. Células germinativas, também em número aproximado de 20, darão continuidade ao ciclo no hospedeiro invertebrado. Tais células contêm um grande núcleo pobre em heterocromatina e um proeminente nucléolo, citoplasma granular escasso repleto com numerosos ribossomos, diversas pequenas mitocôndrias e 80 Considerações Iniciais Dissertação de Mestrado poucos retículos endoplasmático rugoso e partículas β de glicogênio (Pan 1980, 1996). Uma vez que o miracídio penetra no caramujo, ele sofre uma profunda reorganização morfológica e fisiológica para desenvolver-se e multiplicar-se assexuadamente (Pan 1996). Ao final da segunda etapa de desenvolvimento do ciclo (revisto por Coelho et al. 2008), um outro estádio infectivo, chamado cercária, é liberado no meio aquático. As cercarias devem localizar, aderir e penetrar na pele ou na mucosa de mamíferos suscetíveis para dar continuidade ao ciclo de vida desse parasito (revisto por Lenzi et al. 2008a). Figura 1.20. Miracídio de Schistosoma mansoni por microscopia confocal de varredura a laser (CLSM). Plano intermediário. GA, glândula apical; mn, massa nervosa; cg, células germinativas; Ep, epiderme; c, cílios. As glândulas laterais e o terebratório não foram visualizados nesse plano focal. Coloração por carmim clorídrico. Fonte: Jurberg AD, Gonçalves T, Costa TA, Mattos ACA, Pascarelli BM, Manso PPA, Ribeiro-Alves M, PelajoMachado M, Coelho PMZ, Lenzi HL, manuscrito em preparação (artigo 2 dessa dissertação). 81 Objetivos Dissertação de Mestrado II – Objetivos 82 Objetivos Dissertação de Mestrado II – Objetivos II. 1 – Objetivo Geral Detalhar morfologicamente e classificar o desenvolvimento embrionário do ovo de S. mansoni, segundo critérios morfológicos e morfogenéticos. II. 2 – Metas 1. Descrever a embriogênese do ovo no interior da fêmea, através de análise histológica convencional ao microscópio de campo claro e de análise de fêmeas inteiras coradas com carmim clorídrico ao microscópio confocal de varredura a laser; 2. Documentar e classificar a embriogênese miracidiana de S. mansoni no hospedeiro experimental murino e em condições in vitro, a partir de critérios morfológicos e morfogenéticos, através de cortes histológicos e da análise de ovos inteiros; 3. Detalhar a diferenciação e formação dos sistemas nervoso, muscular, tegumentar e osmorregulatório do miracídio em desenvolvimento, por histologia convencional (com colorações específicas e seletivas), por microscopia confocal de ovos inteiros corados com carmim clorídrico. 83 Justificativa Dissertação de Mestrado III – Justificativa 84 Justificativa Dissertação de Mestrado III – Justificativa Com base na fundamentação teórica, o estudo detalhado da biologia do desenvolvimento dos ovos de S. mansoni poderá contribuir para: 1) uma melhor intelecção da granulomatogênese e da patogenia resultante; 2) a compreensão dos mecanismos de expulsão dos ovos do sistema vascular para os tecidos, bem como a passagem pela parede intestinal para o lúmen do órgão; 3) o entendimento dos processos básicos do desenvolvimento, como a determinação dos eixos corporais e a organogênese, visto que muitos dos mecanismos moleculares e suas cascatas de regulação são compartilhados por todos os organismos conhecidos atualmente (revisto por Rudel e Sommer 2003); 4) uma melhor compreensão das relações filogenéticas dos platielmintos; 5) o refinamento de estudos moleculares (genômica, transcriptômica, glicômica, lipidômica e outros) ao considerar os diferentes estádios da embriogênese do ovo; 6) a criação de linhagens transgênicas ou nocaute para genes específicos, e; 7) o desenvolvimento de novas estratégias quimioterapêuticas, a partir do descobrimento de novos alvos para tratamento. 85 Artigos Dissertação de Mestrado IV – Artigos 86 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Trematode embryology: a new method for whole-egg analysis by confocal microscopy Arnon D Jurberg, Bernardo M Pascarelli, Marcelo Pelajo-Machado, Arnaldo Maldonado Jr., Ester M Mota, Henrique L Lenzi Publicado no periódico Development, Genes and Evolution 2008;218:267-271. Estado do conhecimento A embriogênese de trematódeos tem sido ainda pouco explorada, principalmente devido às dificuldades técnicas para analisar seus ovos (ver, p.ex., Neill et al. 1988). A grande presença de células vitelínicas ao redor do zigoto/embrião torna árdua a visualização dos estádios iniciais do desenvolvimento em ovos vivos ou em preparações inteiras. A casca do ovo por si só também impede a impregnação adequada de resinas para a realização de estudos histológicos, imuno-histoquímicos e ultra-estruturais. A proposta dessa nota técnica é divulgar uma nova ferramenta para a análise de ovos inteiros de trematódeos (no caso, Schistosoma mansoni e Echinostoma paraensei), a partir da modificação de uma coloração amplamente utilizada no estudo morfológico de “helmintos” adultos inteiros. Questão - É possível visualizar o desenvolvimento embrionário de ovos inteiros de S. mansoni e E. paraensei, a partir de uma coloração (carmim clorídrico) que fluoresce ao microscópio confocal de varredura a laser (CLSM)? - É possível reduzir a autofluorescência da casca dos ovos com a realização de uma etapa de clareamento em hidróxido de potássio (KOH)? Resultados principais Essa técnica de coloração ao CLSM mostrou-se promissora no estudo da embriogênese dos ovos de trematódeos, destacando eventos morfológicos não distinguíveis à microscopia de campo claro. A incubação em KOH não causou os efeitos esperados de redução da autofluorescência da casca. Ao contrário, causou uma redução da fluorescência da coloração quando observada ao CLSM. 87 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 88 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 89 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 90 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 91 Artigo 1 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 92 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution The embryonic development of the parasite trematode Schistosoma mansoni Arnon D Jurberg, Tiana Gonçalves, Tatiane A Costa, Ana Carolina A de Mattos, Bernardo M Pascarelli, Marcelo Ribeiro-Alves, Pedro Paulo de A Manso, Marcelo Pelajo-Machado, Paulo Marcos Z Coelho, Henrique L Lenzi Em preparação para o periódico Development, Genes and Evolution Estado do conhecimento Apesar da sua destacada importância na infecção esquistossomótica, a biologia dos ovos tem sido considerada apenas superficialmente. Classicamente, o amadurecimento dos ovos é classificado a partir da simples relação entre os tamanhos do embrião e o da casca (Vogel 1942; Prata 1957). Pouco se sabe sobre os eventos morfológicos, moleculares e bioquímicos durante a sua embriogênese. Questão - Como ocorre o desenvolvimento embrionário dos ovos de S. mansoni? Resultados principais Nesse trabalho, descrevemos os eventos morfológicos durante a embriogênese dos ovos de S. mansoni. A partir dessas características, um novo sistema de estadiamento é proposto, dividido em dez estádios. Entretanto, como tais evidências morfológicas são de difícil visualização em ovos inteiros não-corados, correlacionamos a classificação proposta com aquela de Vogel (1942) e de Prata (1957). Comparações por modelagem estatística e análise morfológica do desenvolvimento de ovos mantidos em cultura (RPMI-1640) e isolados do hospedeiro experimental murino sugerem que a embriogênese entre esses dois grupos é similar (no fenótipo), mas ocorre em ritmos diferentes. O papel da diferenciação das estruturas embrionárias na formação de granulomas é discutido. 93 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Title page: Authors: Arnon D Jurberg, Tiana Gonçalves, Tatiane A Costa, Ana Carolina A de Mattos1, Bernardo M Pascarelli, Pedro Paulo de A Manso, Marcelo Ribeiro-Alves2, Marcelo PelajoMachado, Paulo Marcos Z Coelho1, Henrique L Lenzi Title: The embryonic development of the parasite trematode Schistosoma mansoni Institutional Affiliation: Laboratório de Patologia – Instituto Oswaldo Cruz (IOC)/Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Pavilhão Gomes de Faria. Av. Brasil, 4365 – Manguinhos. CEP: 21040-900. Rio de Janeiro, RJ. Brazil. 1Laboratório de Esquistossomose – Instituto René Rachou (CPqRR)/Fiocruz. 2Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS)/Fiocruz. Communicating author: Henrique L Lenzi E-mail address: [email protected] Telephone: 55 21 2598-4350 Fax number: 55 21 2573-8673 Number of words: 14,067 Expected printed length: ±25 pages 94 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Abstract Schistosomiasis is a water-borne parasitic illness caused by neoophoran trematodes of the genus Schistosoma. Besides its importance in schistosome’s life cycle, eggs have a central role in the pathogenesis of the disease by inducing granuloma formation. Using classical histological techniques and whole-mount preparations, the present work describes the embryonic development of Schistosoma mansoni eggs in the murine host and compares it with egg maintained under in vitro conditions (RPMI-1640 medium). Two pre-embryonic stages occur inside the female worm: the pre-zygotic stage is characterized by the release of mature oocyte from the female ovary until its fecundation. The zygotic stage encompass the migration of the zygote to the ootype, where the eggshell is formed, and then to the uterus. Fully formed eggs are laid still undeveloped, without suffering any cleavage. In the outside environment, eight embryonic stages can be defined: stage 1 refers to early cleavages and the beginning of yolk fusion. Stage 2 represents late cleavage, with the formation of a stereoblastula and the onset of outer envelope differentiation. Stage 3 is defined by the elongation of the embryonic primordium and the onset of inner envelope formation. In stage 4, the first organ primordia arise. During stages 5-7, tissue and organ differentiation occur (neural mass, epidermis, terebratorium, musculature, and miracidial glands). Stage 7 is characterized by nuclear condensation of brain neurons. Stage 8 refers to the fully formed larva, presenting muscular contraction, cilia and flame-cell beating. This staging system was compared to a previous classification, which considers only the simple relation of embryo/eggshell sizes. The differentiation of embryonic structures and their probable roles in granulomatogenesis receive particular attention. The staging system proposed here could underlie further studies on egg antigen production and its diffusion in the host tissue. 95 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Introduction Schistosomiasis is a general denomination to human infections caused by trematode worms of the genus Schistosoma. One of the main etiological agents of this disease is the species S. mansoni, which remains endemic in sub-Saharan Africa, Brazil, Egypt, and others countries (Chitsulo et al. 2000; WHO 2006). To humans, infection may be a debilitating illness affecting liver function and the kidney. Periportal fibrosis, portal hypertension, and esophageal varices may cause death. Unlike other platyhelminths, schistosomes have separate sexes and reside as couples for years in the portal hepatic system of the susceptible vertebrate host (including other mammals than humans). Among other parasitic worms, schistosomes arise as an exciting field of study for a multidisciplinary approach to parasitologists and developmental biologists. Eggs mature in the host tissues prior to be expelled into the gut lumen with the feces, but are also the major cause of illness. In brief, inside the host vasculature, each inseminated female adult worms release approximately 300 eggs/day (Moore & Sandground 1956; Pellegrino & Coelho 1978). When feces with eggs reach freshwater, a ciliated larva hatches. This so-called miracidium has to localize and penetrate a snail intermediate host of the genus Biomphalaria. Within the molluscan host, some cycles of asexual reproduction drive to the emergence of cercaria, the infecting form to humans. Cercariae actively swim towards the susceptible hosts and penetrate the skin, where a second set of morphological changes (with no reproduction) will originate the adult worms. However, about half of the laid eggs lodge in smaller blood vessels as liver sinusoids, and intestinal capillaries, where they act as granulomatogenic triggers (Warren 1978). Schistosome granulomatous response is an organized complex focal inflammatory reaction around the egg. This reaction is characterized of a set of cells of the mononuclear phagocyte lineage to protect the host tissues from egg secretions, collectively known as soluble egg antigens (SEA) (Reis & Andrade 1987; Turk 1992; Lenzi et al. 1998). 96 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Granuloma formation is strictly dependent of viable mature eggs (Sorour 1929; Espin 1941), not occurring around single immature eggs (Prata 1957). Recently, Ashton et al. (2001) suggested that the secretion of egg proteins (ESP) to periovular tissues may be related to the formation of eggshell underlying structures during schistosome egg maturation. These structures are known as the Reynold’s layer and the von Lichtenberg’s envelope (Neill et al. 1988). However, as stated by Swiderski (1994), the use of such distinct terminology is not justified since these envelopes share ontogenetic, structural, and functional similarities to other platyhelminth eggs (for example, cestodes). Further references to the schistosome eggshell structures in this paper will consider their positions within the egg. The Reynolds’ layer will be referred as the “outer envelope” and the von Lichtenberg’s envelope as the “inner envelope”. Despite its importance in pathogenesis and life cycle continuity, egg embryogenesis has been superficially considered, probably because of technical limitations. Although the eggshell is transparent, structural details of the embryonic development are not easily followed in the live, isolated eggs due to the great amount of yolk material at early stages (Jurberg et al. 2008b). The eggshell is also relatively impermeable to some embedding resins, which leads to ultrastructural observations restricted only to the surrounding envelopes and to brief notes of embryo internal structures in abstracts (von Lichtenberg 1967; Stenger et al. 1967; Michaels & Prata 1968; Race et al. 1969; Race et al. 1971; Eklu-Natey et al. 1982; Swiderski et al. 1982; Swiderski 1984, 1985, 1986a, b; Neill et al. 1988; Ashton et al. 2001; Swiderski 1994). No information on miracidial organogenesis is available so far. Classically, maturation of schistosome eggs was first classified into five stages based on a simple relation between the embryo size itself and the eggshell size (Vogel 1942; Prata 1957). Here, Vogel and Prata’s staging system will be referred in roman numerals: stage I, embryo 97 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution occupies one-third of the diameter of the egg; stage II egg, embryo occupies one-half of the diameter of the egg; stage III, embryo has two-thirds of the length of the egg; stage IV, embryo almost occupies the entire interior of the egg; stage V corresponds to the mature embryo, presenting cell-flame and cilia beating, and muscle contraction. Pellegrino´s group adapted this staging system to the “oogram” technique by calculating each stage frequency in compressed fragments of intestine as a reliable criterion for the primary screening of schistosomicidal drugs (Pellegrino et al. 1962; Cunha et al. 1962; Pellegrino & Faria 1965). Recently, Hartenstein & Ehlers (2000) introduced a different staging system for the freeliving rhabdocoel Mesostoma lingua. This system considers morphological events during its embryogenesis and has shown to be applicable for other free-living flatworms (Hartenstein & Ehlers 2000; Younossi-Hartenstein et al. 2000; Younossi-Hartenstein & Hartenstein 2000b, 2001; Ramachandra et al. 2002; Hartenstein & Jones 2003; Morris et al. 2004; Cardona et al. 2005, 2006). Briefly, stage 1 refers to early cleavages, during which the zygote divides basically in a spiral pattern. Stage 2 represents late cleavage, in which a proliferating mass (the embryonic primordium) is formed. Stage 3 is defined by the expansion and diversification of the embryonic primordium. In the stage 4 some embryonic primordia can be distinguished. Stage 5 is characterized by the onset of tissue and organ differentiation. In the stage 6 occurs the complete formation of the epidermis. During stage 7 occurs the elongation of the embryo. The neural mass primordium condenses. Finally, stage 8 refers to the fully formed mature larva. In the present paper, we describe the morphological events during S. mansoni egg embryogenesis by using histological and whole-mount techniques. Since S. mansoni mature larvae (miracidia) have no eyespots and digestive system (Pan 1980), morphological hallmarks have been determined by analyzing whole-mount miracidia prior to study egg 98 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution development. Then, a new staging system (in arabic numerals) is proposed and then further correlated to the previous existing one by Vogel (1942) and Prata (1957) (stages in roman numerals). Egg development under in vitro conditions was also evaluated considering this new staging system. Materials and Methods Parasites Five-day old Swiss Webster mice were exposed to 70 or 150 cercariae of S. mansoni (LE strain) and euthanatized in a CO2 chamber at 45-60 days after infection, in accordance to the Ethical Committee for Animal Use-Fiocruz (CEUA L-0013/07). Adult worms were recovered by direct incisions of the portal hepatic intestinal system or by perfusion (Smithers & Terry 1965), using RPMI-1640 plus heparin as the perfusing fluid (Kusel et al. 2006). Miracidia were obtained from blended livers by using a modified hatching method as described previously (Jurberg et al. 2008a). Eggs were isolated by sieving homogenized intestines (Dresden & Payne 1981) followed by purification through a Percoll gradient (Dalton et al. 1997). Histology Intestines and livers from infected mice were fixed in Carson’s modified Millonig’s phosphate-buffered formalin (Carson et al. 1973), pH 7.4, and embedded in paraffin. Recovered female worms fixed in a 70% alcohol-formalin-acetic acid solution (AFA) and embedded in paraffin were also processed as follows. Serial sections of 5 μm were stained by the following methods for bright field microscopy (BM): hematoxylin and eosin (H&E) and Lennert’s Giemsa (Lennert 1978) for cellular characterization, periodic acid-Schiff counter99 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution stained with hematoxylin (PASH) for neutral polysaccharides and glycoproteins (Lillie & Fullmer 1976), PAS-Alcian Blue pH 1.0 (PAS-AB) to differentiate between neutral and acidic mucosubstances, and Masson trichrome for collagen and smooth muscle (Bancroft & Stevens 1996). In vitro attainment of eggs To compare the maturation of eggs laid in vitro and eggs isolated from the murine host (as described above), adult worms were recovered by perfusion, and washed in RPMI-1640 with no serum supplements. They were then maintained in RPMI-1640 containing penicillin (100 U/ml) and streptomycin (100 μg/ml), and 5% bovine fetal serum at 37° C in 5% CO2 (Kusel et al. 2006). The medium was changed every two days. At these conditions, worm couples lay eggs continuously for several days. Development was followed every day under an inverted microscope, until the complete formation of the miracidium. Miracidium maturity was inferred by movements inside the eggshell, muscle contractions and flame-cell beating (Vogel and Prata’s stage V). Other cultivated eggs in different times of maturation were fixed in Carson’s Millonig-formalin for whole-egg analysis. Measurement of egg growth At each day of incubation, eggs were collected and mounted on regular flat slides using solid vaseline as spacers. For comparison of egg growth, isolated eggs from the murine host were also obtained and analyzed. Eggs were classified in accordance to the Vogel and Prata’s staging system due to the lack of morphological resolution when analyzed as unstained whole-mounts by BM. As this staging system is based on the ratio of egg size and the embryo itself, the area of the egg was defined as a simple character to compare the embryonic development between each stage under these two different conditions (isolated from the host and cultivated). At random, thirty eggs in each stage of maturation obtained at these two 100 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution conditions were measured (length and width) at 100X magnification using the KS300 software 3.0 (Zeiss), totalizing 300 eggs (Table 1). Statistical analysis The area A of each egg was estimated by considering its longest length (major axis) and its longest width (minor axis), in accordance to the area formula of an ellipse: A = (Π * major axis * minor axis) / 4. An analysis of variance, two-way ANOVA, followed by Tukey's Post Hoc Test were carried out in the R software (version 2.6.2, available at http://cran.stat.auckland.ac.nz/) with the following model for the elliptical estimated area of the egg Aij = μ + Ci + Sj + (CS) ij + εij (1) where, μ denotes the area global mean, C and S are eggs source and maturation stage main effects, respectively. Indices i and j stands for the levels of the main effects C (cultivated and isolated) and S (stages I to V). The term CS captures the interaction effect between egg source and maturation stage. Two interaction plots were built, one for each main effect. The nonparallel nature of lines connecting the mean area at levels of one main source hierarchized by the levels of the other main source suggests interaction (see Supplementary Materials). The residual ε term accounts for sources of area variation not incorporated in the model. It is expected to have mean 0 and variance sigma square, ε ~ Ν (0, δ²), for well fitted models. Modeling assumptions were confirmed after the residual diagnostics. Residuals were evaluated graphically using the Q-Q norm plot of sample quantiles versus the theoretical quantiles of the normal distribution (see Supplementary Materials), and statistically by the Shapiro-Wilk Normality test. Statistical significance was set as P ≤ 0.05. 101 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Whole-mount analyses: carmine staining and basic fuchsine staining Adult female worms, miracidia, and eggs obtained by sieving homogenized intestines or by culturing worm couples were all stained in hydrochloric carmine for confocal microscopy. Female worms were fixed in AFA and processed as described by Machado-Silva et al. (1998). Miracidia and eggs were fixed in Carson’s Millonig-formalin and stained using conical centrifuge tubes. Staining procedures were modified based on a previous work (Jurberg et al. 2008b). In brief, fixed eggs were stained overnight in carmine under agitation, dehydrated in graded alcohol series and mounted as whole-preparations in ethylene glycol between depression slides and coverslips. Tomographic images were obtained by confocal laser scanning microscopy (CLSM; LSM 510-META, Zeiss), using a HeNe 543nm laser and a LP 560 filter. Other isolated or cultivated eggs were stained in accordance to a basic fuchsine technique previous introduced by Zalokar & Erk (1977) and widely used by the Hartenstein group for studying platyhelminth embryogenesis (Hartenstein & Ehlers 2000; Younossi-Hartenstein et al. 2000; Younossi-Hartenstein & Hartenstein 2000b, 2001; Hartenstein & Jones 2003; Morris et al. 2004). Briefly, following fixation in Carson’s Millonig-formalin, eggs were washed three times in 70% ethanol (5 min each) and in distilled water (5 min). They were incubated in 2 N HCl (10 min) at 60° C for DNA desnaturation, and washed again in distilled water (5 min). After two washes in 5% acetic acid, eggs were stained for 15 min in a 2% solution of filtered basic fuchsine in 5% acetic acid. All steps were carried out using conical centrifuge tubes. Following staining, eggs were placed within a small wire mesh basket for removing cytoplasmic fuchsine in a 5% acetic acid wash. They were dehydrated in graded ethanol series (70%, 80%, 90%, 95%, and 100%; 5 min each) and mounted in ethylene glycol on depression slides. Abnormal and dead (semitransparent, without embryonic disc or granular) eggs were not examined. 102 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution The intestinal scraping technique This simple technique is based on scraping the mucosal layer by a scalpel. Fragments of 1.0 cm of small intestine from infected mice were collected, opened in full-length and washed in 0.9% saline for removing fecal debris. These fragments were dried on an absorbent paper and placed between slides and coverslips. Scraping the mucosal layer makes a thinner sample that can be microscopically examined. The oogram technique by CLSM Freshly obtained small intestines were opened lengthwise and brief washed in 0.9% saline for removing fecal debris. Then, fragments of 0.5 cm were cutted off, slightly dried in absorbent paper, and maintained strongly pressed between glass slides with rubber bands during fixation overnight in 70 % alcohol under agitation. Top slides were removed and flattened samples were stained overnight in carmine under agitation, at room temperature. Intestinal fragments were dehydrated in graded alcohol series (equal to isolated eggs) and mounted in ethylene glycol. Examination of the slides was carried out under confocal microscopy with the same settings cited above for whole-mount eggs. Results Miracidium morphology by CLSM Whole-mounted, carmine stained miracidia were analyzed under CLSM to detail internal organs as reference to classify the embryonic development of the eggs. Histological sections of mature eggs in the small intestine were also considered. The following structures were easily visualized for both methods: (1) neural mass (spherical, with a peripheral layer of onetwo small irregular nuclei circumventing an acellular mass, called neuropile), (2) lateral glands (a pair, unicellular), (3) apical gland (single, with three nuclei), (4) terebratorium (in 103 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution the apical region), (5) ciliated tegument, (6) germ cells (generally grouped at the posterior region). Although evident in the miracidium, germ cells were not considered as a reference feature due to their similarity with early immature cells (blastomeres). They possess large round nucleus, prominent nucleolus and scarce cytoplasm (Fig. 1). Female reproductive system and intrafemale egg development Just a brief period of the egg development occurs inside the female reproductive system. The single ovary presented small, hexagonal cells, with a central nucleus, lining its walls at the distal pole. Maturation occurred in the direction of the proximal pole, near a short segment of the oviduct, just before the seminal receptacle (Fig. 2a). Mature oocytes were bigger than immature ones, with a large central, basophilic nucleus. Nucleolus was evident, intensely basophilic, and presented a very prominent, slightly eosinophilic nucleolar inclusion. Cytoplasm was abundant and homogeneously blue on Giemsa-stained sections, indicating the wide presence of ribosomes or poliribosomes (Fig. 2b). In the brief prezygotic stage, each oocyte left the ovary at a single moment through the projection of its cytoplasm (pseudopod) (Fig. 2c). In the oviduct, shortly before the seminal receptacle full of sperm, the oocyte was fecundated, giving rise to the zygotic stage (also named as stage 0). The zygote passed through the sperms towards the oviduct and then the vitelline-oviduct. In the vitelline-oviduct, the zygote was surrounded by approximately 40-45 vitelline cells (vitellocytes), which leads to a production of about 13,500 vitelline cells per female worm per day. Vitelline cells were smaller than the zygote, with central, eosinophilic nucleus, and azurophilic cytoplasm full of blue-stained yolk granules on Giemsa. On PASH and Masson trichrome-stained sections, the vitelline cell cytoplasm was slightly eosinophilic with weakly red and green-blue tinge, respectively. This cell mass entered the ootype, where the eggshell was formed (Fig. 2d). At this moment, the zygotic cell did not suffer any division. The fully formed egg, with its characteristic conspicuous lateral spine, was released in the uterus (Fig. 2e). Then, it was 104 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution deposited through the gonopore just beneath the ventral sucker of the female, without suffering any cleavage, as observed on newly laid eggs in vitro (Fig. 2f). Egg growth under in vivo and in vitro conditions Eggs laid under in vitro conditions developed completely and released viable infective miracidia (data not shown). Regarding the estimated egg area as a simple character, the effect of two different environments on egg growth while embryo develops (assessed by the Vogel and Prata’s staging system under BM) was modeled according to the equation 1. Goodness of fitting was checked by graphical (Supplementary Materials) and statistical residual analysis (P ≤ 0.001). Considering only the effect of each environment in the mean area of the eggs (with no distinction in regard to egg age), a significant difference was detected between eggs obtained from host tissues and eggs cultivated in vitro (P = 0.00017). When considering only the maturation stages with no distinction in regard to egg origin, the mean egg area also differed significantly between each stage and its following one (P < 0.0001), except between the stages I and II (P = 0.976). Both main effects (egg origin and stage) interacted to explain area variability (P = 0.0001) as suggested by line crosses in its interaction plots (see Supplementary Materials). Considering matching stages of both environments between themselves, differences in mean area were statistically significant for all stages (P < 0.0001), but less impressive between eggs from stage I (P = 0.017) and not significant between mature eggs (stage V) (P = 0.445). A clear increase in egg size during miracidium embryogenesis in culture was statistically significant between each stage and its following one, although no difference in the mean areas occurred between eggs from stage I and stage II (P = 1.000). In fact, the mean area of eggs in stage II was smaller than the mean area of eggs in stage I under such in vitro conditions, despite minimum and maximum values of eggs in stage II have been bigger than in stage I. In 105 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution sequence, eggs in stage II were significant smaller than in its following stage III (P < 0.0001), which were also smaller than eggs in stage IV (P < 0.005). Eggs in stage IV were also significant smaller than mature eggs (P < 0.0001) (Fig. 3a). A similar growing pattern was also noted in eggs obtained from the murine host. Eggs in stages I and II did not differ statistically in size (P = 0.969) such as eggs in stages II and III (P = 0.390). On the other hand, eggs in stage III were significantly smaller than eggs in stage IV (P < 0.0001), and eggs in stage IV were also significantly smaller than mature eggs (stage V) (P < 0.0001) (Fig. 3b). Comparing the interaction of both main effects on egg mean area, eggs in stage I from both environments did not show significant differences among themselves (P = 0.325). Isolated eggs from stage II were significantly bigger than their matching cultivated stage (P < 0.005), while isolated stage III and stage IV-eggs were significantly smaller than their respective matching cultivated stages (P < 0.0001). No statistically significant difference between egg mean areas of mature eggs (stage V) was detected (P = 0.999) (Fig. 3c, d; Table 2). Stages in Schistosoma mansoni egg embryogenesis Stage 1 Newly laid eggs were passively carried by the blood flow until they were trapped in small vessels of the murine host. In the onset of this stage (also corresponding to Vogel and Prata’s stage I), the embryo was too small to be visible in isolated, stained or unstained, whole eggs by BM (Figs. 4a, 10). Carmine-stained eggs under CLSM and histological sections revealed that the first cleavage was total and subequal, producing two blastomeres slightly different in size (Fig. 4b). They showed a central large round nucleus, homogeneously stained but without 106 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution heterochromatin delineation (“ground glass” aspect), with a very prominent and intense basophilic nucleolus. Nucleolar inclusions were visualized under BM. The cytoplasm was abundant and homogeneously blue when stained with PASH, and Giemsa (Fig. 4b, c). These features indicate that the cells were actively engaged in protein synthesis. Embryonic cells were difficult to be seen on PAS-AB-stained slides, due to the very weak staining of both nucleus and cytoplasm (Fig. 11a). Vitelline cells exhibited an apparently vacuolated cytoplasm, slightly stained in red on PASH (Fig. 4b) and in green-blue on Masson trichrome (Fig. 4d), but heavily stained on PAS-AB-stained slides (Fig. 11a). This staining pattern suggests the presence of neutral polysaccharides or neutral glycoproteins. As soon as the first cleavages occur, the vitelline cells started to fuse into a single yolk syncytium. The remnant vitelline nuclei were small, basophilic, irregularly shaped (Fig. 4d). Following cleavages occurred asynchronously, resulting in the formation of the animal-vegetal axis. By the end of stage 1, the embryo formed a roughly circular disc, 2-3 cells in diameter (Fig. 4e). The embryonic primordium was now visible in the center of whole, unstained eggs as a clear disc, occupying about the half of the transversal length of the egg (now corresponding to Vogel and Prata’s stage II) (Figs. 4f, 10). Stage 2 The embryonic primordium increased in size (Fig. 4g, 9e, 10). The number of embryonic cells, visible in carmine-stained whole-mounts under CLSM or by histology, reached 4-6 cells wide and 6-8 cells long (Figs. 4h-m, 9e). Morphological features of embryonic cells and the yolk syncytium remained similar to the previous stage (Figs. 4h-m, 9e). Mitotic figures were visualized throughout the embryo (Figs. 4l, m). Other cells presented pycnotic nuclei on PASH, Giemsa, and Masson trichrome-stained sections (Fig. 4m), suggesting the occurrence of apoptosis during early embryonic development. Vitelline cells fused completely. Some macromeres seemed to detach from the embryo poles, adhering to the eggshell (Fig. 4l). They 107 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution will give rise to the outer envelope of the egg, also named the Reynolds’ layer. These macromeres had a large, round nucleus, with “ground glass” aspect (slightly heterochromatic). The nucleolus was round, intensely basophilic, and very prominent, with a punctiform light nucleolar inclusion. Their cytoplasms were scarce, and apparently basophilic, being stained in blue on H&E, PASH, and Giemsa (Fig. 4l). Some vitelline nuclei also seemed to adhere to the eggshell. By the end of stage 2, a solid proliferating cell mass (stereoblastula) occupied the whole transversal length of the egg (corresponding also to Vogel and Prata’s stage II) (Figs. 4m, 10). Stage 3 In whole eggs, the clear area corresponding to the embryo increased in size, assuming an elongated form, that occupies two-thirds of the longitudinal length of the egg (like in Vogel and Prata’s stage III) (Figs. 4n, 9f, 10). On histological sections, the yolk syncytium remained heavily stained in red on PAS-AB, while the embryo itself remained difficult to be visualized. Cellular differentiation began, giving rise to at least two types of cells (Figs. 4o-p, r). Type I cells preserved the immature morphology, possessing a large, round nucleus, with “ground glass” aspect, prominent nucleolus, and scarce cytoplasm, stained in blue on Giemsa. Type II cells (neuroblasts?) seemed to be concentrated in the center of the embryo. They had small, slightly irregular nucleus, with a close chromatin pattern, and scarce cytoplasm. The nucleus was slightly stained green-blue on Masson trichrome, and a punctiform nucleolus was evident. The embryo had about 7-10 cells wide, and 9-12 cells long (Figs. 4o-p, r). Several mitotic figures were seen at this stage throughout the embryo (Fig. 4r). Signs of apoptosis as pycnotic nuclei were present mainly in the periphery of the embryo (Fig. 4r). Other peripheral embryonic cells seemed to be compromised in the differentiation of the inner envelope (also known as the von Lichtenberg’s envelope). Their nuclei were slightly flattened (Fig. 4r). In the outer envelope, the differentiation initially started at stage 2 with the adhesion of 108 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution macromeres to the eggshell and subsequent syncytium formation, seemed to continue with the fusion to the yolk syncytium. Stage 4 Considering the previous stage, it was not possible to distinguish morphological changes in whole, unstained eggs (corresponding to the Vogel and Prata’s stage III) (Fig. 10). On histology, the differentiation of the inner envelope became apparent with the formation of a detaching syncytium surrounding the whole embryo (Fig. 5). On PAS-AB-stained sections, the cytoplasm of these cells were lightly stained in red, while the yolk mass was heavily stained, and the embryo itself was barely stained (Fig. 11b). On PASH, the inner envelope syncytium was also stained in red, while on Giemsa its cytoplasm was stained in blue, suggesting the wide presence of ribosomes (Figs. 5a-c). The flattened nuclei remained with their “ground glass” aspect, with a pronounced lateral nucleolus. The outer envelope was fused to the yolk syncytium and seemed to disappear progressively towards the development (Fig. 5b). These events were also visualized in whole carmine-stained eggs under CLSM (Figs. 5d-i). Vitelline nuclei were visible at the poles of the egg. In the center of the embryo, the neural mass primordium arose from a roughly spherical group of cells with small, heterochromatic nuclei, and punctiform nucleolus (type II cells). These neuroblasts were arranged in a layer of 1-2 cells thick around an acellular region (neuropile). On Masson trichrome, such nuclei stained slightly in blue-green (Fig. 5j). Immature cells (type I cells) concentrated mainly in the periphery of the embryo (Figs. 5b, c, e-i). Stage 5 The embryo occupied almost the whole egg interior, although some vitelline remnants were present at the poles (corresponding to the Vogel and Prata’s stage IV) (Fig. 6a, d-i, 10). The outer envelope assumed a thin, granular, and anucleate aspect, that difficult its visualization 109 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution on histological sections. The inner envelope was heavily stained in red with PASH and PASAB, and it kept its syncytial aspect (Fig. 6b-i). The neural mass primordium increased in size, expanding its central, acellular region (Fig. 6b, c, g-i). The epidermis started to differentiate from the most peripheral cells of the embryo (Fig. 6b, c, e-i). These small, cuboidal primordial cells fused to form another syncytium just beneath the inner envelope (Fig. 6). Such epidermal primordium had round nucleus with no pattern of heterochromatin delineation (“ground glass” aspect). Its basophilic cytoplasm were stained in blue on Giemsa sections (Fig. 6b), indicating an active engagement in protein synthesis. In the anterior region of the embryo, two large, immature cells are positioned at each side of the neural mass primordium. Stage 6 Taking into consideration the Vogel and Prata’s classification, no differences were identified between this stage and the previous analyzing whole, unstained eggs. On PASH-stained sections, the lateral, anterior immature cells exhibited cytoplasmatic granules heavily-positive to the PAS method (Fig. 7a, b). The nucleus remained large and round, without heterochromatin delineation. Nucleolus was prominent. Such cells will give rise to the lateral glands of the miracidium. An anterior group of immature, small cells presented a weaker pattern of cytoplasmic positive staining to the PAS reaction (Fig. 7a, b). This group will form the apical gland of the mature larvae. The epidermis of the anterior region of the embryo seemed to project onwards, elongating in a cone-like structure, called terebratorium (Fig. 7a, g-h). The neuropile of the neural mass primordium exhibited a weak positive stain to PAS, similarly to the embryonic parenchyma staining (Fig. 7a). In the posterior region of the embryo, groups of three to five cells with immature features (large, round nucleus with “ground glass” aspect, and scarce, basophilic cytoplasm) were positioned (Fig. 7g-i). They correspond to the germ cells of miracidia. The inner envelope showed the same features of the previous stages, with large, round, “ground glass” nuclei, and prominent nucleoli (Fig. 7a, c110 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution i). The syncytial cytoplasm was homogenously stained in red on PASH sections (Fig. 7a). At the end of this stage, the epidermal epithelium was clearly distinguishable from the mesenchyme (Fig. 7b-i). Stage 7 Elongated embryo occupied the whole eggshell interior, but no movement was observed in freshly isolated and cultivated eggs or by the oogram (Fig. 9a) and intestinal scraping techniques. A small amount of dark yolk material was positioned in the poles of the egg (Fig 10d). Eggs in this stage still correspond to Vogel and Prata’s stage IV (Fig. 10). In histological sections, the unicellular lateral glands were strongly stained in red on PASH and in green on Masson trichrome (Fig. 8a, b). They extended (gland ducts) towards the terebratorium (Fig. 8m, n). Their nuclei were smaller, irregularly round, and heterochromatic. The apical gland was formed by the fusion of three immature cells, positioned in the anterior region of the embryo and flanked by the two lateral glands (Fig. 8a). The apical gland was also stained in red on PASH and in green on Masson trichrome, but exhibited a granular, heterogeneous pattern (Fig. 8a, b). Three small, irregularly shaped nuclei were localized in center of the apical gland. They were bigger than the lateral gland nuclei. The localization and staining pattern of both lateral glands and apical glands allowed the distinction between them (Fig. 8a, b). In this stage, the neural mass exhibited nuclei condensation (Fig. 8c, d), suggesting that brain differentiation was completed. This process of neuronal nuclei condensation was followed by an increasing in neuropile volume. The neurons had small nuclei, roughly round or elongated, and heterochromatic. Posteriorly, no pattern modification occurred to the immature cells (germ cells) (Fig. 8a, b). The eggshell was thicker in the poles. Under BM, the outer envelope was difficult to be recognized in this stage. The inner envelope kept its previous characteristics (Fig. 8a, b). The subepidermical musculature was revealed throughout the embryo by the Masson trichrome staining (Fig. 8b). 111 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Stage 8 Embryos occupied the whole interior of the egg. In freshly isolated and cultivated eggs or in the oogram (Fig. 9) and the intestinal scraping techniques, they move rapidly and make circumvolutions inside the eggshell. Muscular contractions, cilia and flame-cell beating were also indicative of maturity in live eggs. They were ready to hatch if reach appropriate conditions. This stage corresponds to the final stage V of the Vogel and Prata’s classification (Fig. 10). Even in unstained eggs, the neural mass was easily recognized in the mid-anterior region of the miracidium (Fig. 10d). In sections, one to two layers of neurons were organized peripherally around the roughly round neuropile (Fig. 8d, f-g). In the anterior region, the terebratorium, the apical gland, and both lateral glands were fully formed (Fig. 8e-n). Morphological signs of gland secretions to the interior of the egg were observed inside the murine host (Fig. 8f). Epidermal cells were distributed in ciliated epidermal plates, forming a thin syncytium with round, basophilic nuclei (Fig. 8h). A conspicuous basal membrane separated the epidermal cells from the muscular adjacent layer. It was revealed in negative by the PAS-AB method (Fig. 11c). No mitotic figures were seen throughout the embryo. Germ cells were arranged posteriorly in groups of three to five cells (Fig. 8, 9d). Taking into consideration the eggshell structures, the outer envelope kept its previous features, while the inner envelope seemed less thick (Fig. 8h-n). Whole stained eggs analyzed under CLSM exhibited a granular material (Cheever corpuscules?) within the space between the apical membrane of the inner envelope and the miracidium itself (Fig. 8l-n). This space was named Lehman lacuna by Neill (1988). Discussion Based on a recently introduced morphological staging system and adapted to other flatworm species (Hartenstein & Ehlers 2000; Younossi-Hartenstein et al. 2000; Younossi-Hartenstein & Hartenstein 2000a, b, 2001; Ramachandra et al. 2002; Morris et al. 2004; Cardona et al. 112 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution 2005, 2006), the present investigation has demonstrated that the schistosome egg development is complex, and described for the first time the sequence of its morphological events up to the complete formation of the ciliated larva (miracidium) (see Fig. 10). Egg maturation under in vivo and in vitro conditions has been also evaluated statistically by using the ratio embryo/egg size as a simple character, and morphologically by using carmine staining of whole-eggs. Schistosomes have the neoophoran mode of development, in which a specialized organ (vitellarium or vitelline gland) provides individualized vitelline cells that surround the zygote in the vitelline-oviduct, before entering the eggshell forming apparatus (the ootype). The number of vitelline cells within the newly formed egg capsule of S. mansoni is not precise in the literature, varying from 20 to 40 cells (Gonnert 1955; Wells & Cordingley 1991; Swiderski 1994; Michel et al. 2003; Knobloch et al. 2006). Our preliminary findings on eggshell formation in whole-mount mature females analyzed by CLSM pointed approximately 40-45 individualized vitelline cells in each newly enclosed egg, but additional analyses must be carried out for a statistically significant result. In schistosomes, these cells probably have a key role in eggshell formation and a reduced importance in embryo nourishment (Erasmus 1975; Erasmus et al. 1982; Bobek et al. 1986; Johnson et al. 1987; Koster et al. 1988; Reis et al. 1989; Chen et al. 1992; Schussler et al. 1995; Fitzpatrick et al. 2004; Fitzpatrick et al. 2007). The eggshell has cribriform-like pores, which allow the uptake of exogenous nutrients during egg migration through host tissues (Lewert et al. 1970; Stjernholm & Warren 1974; Neill et al. 1988; Swiderski 1994). The present findings on the reproductive system of S. mansoni female worms are in accordance to Neves et al. (2005), although the morphology of the Mehlis’ gland has not been examined. These authors suggested that the Mehlis’ gland of S. mansoni mature females is formed by thick cuboidal epithelial cells with flabby chromatin, which line the ootype. Their 113 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution description is controversial, since ultrastructural investigations by Spence & Silk (1971a, b), Irie et al. (1983), and Moczon et al. (1992) have pointed a set of unicellular glands with narrow cytoplasmic projections in the lateroposterior region of the ootype as seen in other trematodes (for S. margrebowiei, see Awad & Probert 1990; for echinostomes, see Rao 1963; Lie 1965; for Fasciola spp., see Rao 1959; Threadgold & Irwin 1970; Anuracpreeda et al. 2006). In the ootype, the quite viscous secretions of the Mehlis’ gland create an alkaline interface around peripheral acidic eggshell precursor granules exocytosed from the vitelline cells. This promotes the coalescence of these eggshell precursor granules to form the eggshell (Wells & Cordingley 1991) that hardens in the female uterus by a process dependent of two tyrosinases (Swiderski 1994; Fitzpatrick et al. 2007). As noted by several authors, schistosome eggs are not retained in the female parental uterus and are laid still undeveloped. Before studying egg embryogenesis, we examined the morphology of the miracidium by histology and whole-mount preparations in order to define “hallmark” structures for each stage of embryo formation. Previously, the morphology of the fully formed, newly hatched larva of S. mansoni was extensively studied by two authors, using BM (Ottolina 1957) and transmission electron microscopy (TEM) (Pan 1980). Our findings on the miracidium morphology are in agreement with Pan (1980). But unlike Hartenstein & Ehlers (2000) for the rhabdocoel Mesostoma lingua, such references were difficult to recognize in live eggs, even under differential interference contrast microscopy (data not shown). In mature eggs, muscle contraction, cilia and flame-cell beating are easily observed and indicative of miracidium viability (Prata 1957). These movements were seen in all the techniques performed prior to fixation. However, flame-cell differentiation was not determined yet. It probable occurs late during organogenesis, perhaps starting in stage 7. Further investigations to clarify the formation of embryo excretory system are now in progress. 114 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution An alternative attempt to improve embryo survey was to remove the eggshell from live eggs, but we were not successful in the present time (data not shown). To circumvent this drawback, we had previously adapted a staining protocol for single whole-eggs by confocal microscopy (Jurberg et al. 2008b) and we now present the use of the same staining (carmine) in conjunction to the oogram technique and confocal microscopy (Fig. 9). The classical technique by Pellegrino & Faria (1965) is commonly used to infer interruption of egg-laying on chemotherapeutical evaluations, which causes changes of egg frequencies in host tissues (in this case, intestine). However, whether it occurs, this technique does not access the effect of drug treatment on the egg embryonic development. The oogram technique in conjunction to carmine staining under CLSM has revealed in great details the morphological events during egg embryogenesis in situ (Fig. 9d-f). It is important to emphasize the need to compress very well the intestinal samples during preparation. The analyses of whole eggs from in vivo and in vitro conditions could bring additional information to egg biology, especially seeking phenotypic changes in drug evaluations and in RNA interference–mediated knockdown studies, as performed by Freitas et al. (2007). It is possible that removing the eggshell will further improve embryo visualization, probably facilitating embryonic cell lineage tracing and future studies. Although difficult to visualize the described morphogenetic events in live eggs, it is possible to correlate them with Vogel and Prata’s staging system (Vogel 1942; Prata 1957) (Fig. 10). These authors do not classify the egg formation inside the female, which we divided in two stages: the prezygotic stage refers to the release of mature oocyte from the multi-lobated ovary until its fecundation in the short segment of the oviduct, just before the seminal receptacle, while zygotic stage (also stage 0) is characterized by the following migration of the early-fertilized zygote. Early cleavages correspond both to our stage 1 and Vogel and Prata’s stage I, in which the embryonic primordium is too small to be visible under BM. At 115 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution the end of this stage, the embryo becomes visible as a clear central disc, occupying one-third of the diameter of the egg. Our stage 2 represents late cleavages, in which the embryonic mass becomes bigger (stereoblastula) and occupies one-half of the diameter of the egg. This is correspondent to Vogel and Prata’s stage II. The Vogel and Prata’s stage III, when embryo elongates to occupy two-thirds of the length of the egg, was divided by us into two novel stages: in stage 3, when cellular differentiation starts producing at least two cell types, while in stage 4, the first embryonic primordium (neural mass) arises from a mesenquimal mass of cells. In the Vogel and Prata’s stage IV, embryo increases in size occupying almost the entire egg. This stage comprehends the main steps of organogenesis and can be also divided in: our stage 5, that refers to the beginning of epidermis formation; in stage 6, when occur terebratorium and miracidial glands differentiations; while in stage 7, the neural mass suffers nuclear condensation. In both staging system, the last stage (Vogel and Prata’s stage V and our stage 8) refers to the fully formed larva before hatching (Fig. 10). Comparison between the development of eggs laid in vitro and of eggs isolated from the murine host were assessed by statistical (using only the Vogel and Prata’s staging system) and morphological (using both staging systems) analyses of whole-mount eggs in different stages of maturation. Despite the lack of information on its embryonic development, schistosome eggs have been commonly maintained under culture conditions for a wide variety of purposes, as drug screening, antibody production, and RNA-interference knockdown (Asahi & Stadecker 2003; Schramm et al. 2006; Freitas et al. 2007; de Araujo et al. 2007; Cass et al. 2007). However, as reviewed by Gobert et al. (2007) for mechanically transformed schistosomula, culturing parasites in vitro should be considered with caution, especially at molecular or biochemical levels. Michaels & Prata (1968) have followed egg maturation in two distinct culture media and defined the M199 containing 10% calf serum as adequate to support egg embryogenesis and miracidial life span as well as the host environment. On the 116 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution other hand, some authors use the RPMI-1640 culture medium (Ashton et al. 2001; Kusel et al. 2006; Schramm et al. 2006). Here, we evaluated the embryonic development of S. mansoni eggs in this medium and compare it with data obtained from isolated eggs. At the conditions used here, undeveloped eggs laid in vitro are capable of mature completely and hatch when placed in water. The fully formed larva also infects Biomphalaria glabrata snails, with cercaria release (data not shown). To both environments (culture and host), eggs significantly increased in size during development, which was previously reported by Prata (1957) to eggs in the host and by Michaels & Prata (1968) to cultivated eggs. Ashton et al. (2001) confirmed this growth by calculating a factor of biomass gain in 3.33. Considering egg growth between each following Vogel and Prata’s stage, no significant difference was observed during early stages (stages I and II). In fact, unlike observed in isolated eggs in these early stages, the mean estimated area of cultivated eggs in stage II was smaller than in stage I, despite minimum and maximum values of eggs in stage II have been bigger than in stage I. This indicates a great dispersion of area values in cultivated eggs from stage II, which may be explained by a natural phenotypic plasticity of egg size under in vitro conditions. It is also possible that eggs do not increase in size during early stages of development because they probably should adapt to the new, external environment (culture or host). To both environments, eggs increased significantly in size in the following stages, reaching maximum values when mature. The statistical significant differences in the mean estimated areas of cultivated and isolated eggs between distinct stages of maturation may suggest unequal rates of maturation, since the gross morphology of each matching stage seems to be similar. Moreover, mature eggs from both environments exhibited no significant differences in area when compared among themselves. In this case, culturing eggs for studying morphological events during embryogenesis may be useful, although it should raise questions on interpreting biochemical and molecular data as stressed by Gobert et al. (2007) for schistosomula. A chief 117 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution difference among eggs cultivated in vitro refers to the lack of evident signs of death when compared with eggs from the host (Michaels & Prata 1968). Sarvel et al. (2006) used the fluorescent probe Hoechst 33258 to differentiate dead eggs from live ones by labeling nuclei of damaged cells. We tried to perform this method in conjunction to carmine staining, but we were not successful, even modifying the staining steps sequence (data not shown). As seen in culture conditions, eggs within the female reproductive system did not undergo any cleavage and the first mitotic division occurs only in the female external environment (host bloodstream or culture). The triggering signal(s) is(are) still unknown. Before the first total, unequal cleavage, vitelline cells start to fuse progressively into a single syncytium, as also reported by Swiderski (1994). Cell fusion is a key process for plant and animal development and is quite common during miracidium embryogenesis (in the formation of inner and outer envelopes, apical gland and epidermis). Other several examples are available in the literature (Podbilewicz 2006; Oren-Suissa & Podbilewicz 2007; Larsson et al. 2008). Generally, it involves bringing two lipid bilayers into close proximity, followed by the formation of a fusion pore and cytoplasmic mixing, to form a syncytium (Oren-Suissa & Podbilewicz 2007). However, nothing is known on vitelline fusion during the embryonic development of schistosome eggs. It is possible that yolk syncytium formation facilitates nutrient availability to the embryo, including the uptake of host metabolites via eggshell pores (Lewert et al. 1970; Stjernholm & Warren 1974). Remnants of the vitelline cells also fuse to two macromeres that have detached from the poles of the developing stereoblastula and adhered to the internal surface of eggshell to form the outer envelope (Reynolds’ layer), as also reported by Swiderski (1994). This starts to occur in the period that we have classified as stage 2 (late cleavage) and disappear progressively around stage 4 (organ primordia formation). Ultrastructurally, the outer envelope thickens as maturation proceeds, especially at the poles of the eggshell. In later stages, is characterized as an acellular matte of arborizing and 118 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution anastomosing electron-dense fibrils in a finely granular matrix with many free ribosomes in mature eggs (Neill et al. 1988; Swiderski 1994). On the other hand, the egg inner envelope (von Lichtenberg’s envelope) arises exclusively from peripheral embryonic cells that start to differentiate in a stage which we had classified as stage 3. Nevertheless, it becomes apparent in the following stage 4, while fusion proceeds to encircle the embryo as a detaching syncytial layer slightly positive to PAS. During these later stages, the inner envelope expands while embryo grows and adheres to the remnants of the outer envelope. Nuclei are flattened and large, with scant heterochromatin and prominent nucleoli, while the cytoplasm is thin, with developed granular reticulum, abundant polysomes, elongate mitochondria, and several lipid droplets. In mature eggs, this envelope deteriorates (Neill et al. 1988; Swiderski 1994; Ashton et al. 2001), which may facilitate the release of egg antigens to the surrounding environment. A marked change in positive reaction in PAS and PAS-AB methods occurs during the embryonic development of schistosome eggs (Fig. 11). These stainings reveal the production of neutral glycoproteins, first by the inner envelope (beginning in stage 4) and then by miracidial glands (in stage 6). Mature embryos are strongly positive to PAS reactions. This may suggest that late production of glycoproteins is related to previous observations by Prata (1957), in which granuloma formation does not occur around single immature eggs, but only around mature eggs. Indeed, Andrade & Barka (1962) first suggested that host-immunogenic antigens are polysaccharides or glycoproteins. It is now known that schistosome eggs secrete at least 188 proteins of a wide variety of functions (Cass et al. 2007), and that granulomatogenic activity is triggered specifically by glycoconjugates with terminal Galβ1-4GlcNAc (LacNAc) or LacdiNAC elements (Van de Vijver et al. 2006). The localization of these egg secreted total proteins (ESP) was attributed to egg envelopes instead of the miracidium itself (Ashton et al. 2001). However, as first pointed by Lewert & Lee (1954), miracidial glands are also positive 119 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution to the PAS reaction. Our results showed that both types of miracidial glands (lateral and apical) differentiate late in development (stages 6 and 7), producing PAS-positive granules, and secrete them to the interior of the egg in the fully formed miracidium. In this case, like in egg envelopes (Ashton et al. 2001; Schramm et al. 2006; Van de Vijver et al. 2006), it is possible that gland material also contributes to granuloma formation. Besides the production of immunogenic components, egg envelopes may play another important role, acting as a slow antigen-releasing barrier to the surrounding environment and preventing premature egg expulsion to gut lumen (Ashton et al. 2001). The differentiation of miracidial glands also strengthens this scenario, since their glycoprotein production start late during egg development. Further histochemical (lectins) and immunohistochemical studies should be performed to evaluate the role of specific egg antigens during embryo formation and to clarify the role of miracidial glands during granulomatogenesis. So far, just a few egg antigens had been located, exclusively in mature eggs (Williams et al. 2001; Schramm et al. 2006; Van de Vijver et al. 2006). Apoptosis in platyhelminths was first reported in the free-living Macrostomum sp. (Nimeth et al. 2002) and then observed in planarians during regeneration (Hwang et al. 2004). Nuclear morphology assessed by Giemsa staining is considered a reliable criterion for apoptosis determination (e.g. see Baskic et al. 2006). In schistosome egg embryogenesis, signs of programmed cell death as pycnotic nuclei were found during late cleavage, the blastula stage, and early organogenesis. Presumably, cell death is involved in tissue formation and arrangement. However, its role on tissue homeostasis during embryonic development of schistosome eggs remains to be better evaluated in further studies. Following envelopes formation, organogenesis starts to occur (beginning in stage 5). Phylogeneticaly, schistosome egg development was quite similar to the rhabdocoel pattern 120 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution showed by Mesostoma lingua, in which gastrulation does not seem to occur (see Hartenstein & Ehlers 2000). The cleavage-resulting solid blastula gives rise to organ primordia, such as neural mass, epidermis, and other organs from mesenchymal cells, but unlike rhabdocoels, schistosome embryo do not form pharynx and gut during egg development. The lack of such structures is probable associated with the parasitic lifestyle. They will appear only during miracidium-sporocyst-cercariae transformation within the snail intermediate host (Pan 1996; Dorsey et al. 2002). Another similar event is the formation of egg embryonic envelopes, which might be derivatives of the huell membrane of turbellarian flatworms. For instance, in Mesostoma, this transient membrane arises from vitelline cells that surround the embryo ventrally and disappear progressively around stage 6 (Hartenstein & Ehlers 2000). However, as other parasitic platyhelminths (e.g. cestodes) schistosomes have two envelopes, which may be also an adaptation to parasitism. They protect the developing and fully formed miracidium, act as nutrient producing and storage compartments, secrete immunogenic materials which can contribute to egg expulsion to gut lumen, and provide motility for miracidial movements prior to hatching (Neill et al. 1988; Swiderski 1994; Ashton et al. 2001; see also Conn & Swiderski 2008). Both envelopes are cellular in origin, syncytial in nature, and enclose the embryo (Swiderski 1994). Nevertheless, the outer envelope has mixed origin (from macromeres and vitelline cells) and disappears gradually such as the huell membrane, while the inner envelope arises from mesomeres and persists until egg hatching. Epidermis formation begins during stage 5 by fusion of an embryonic peripheral monolayer, just underneath the inner envelope. As differentiation proceeds, single epidermal cells form hundreds of cilia that became identifiable around stage 7 by BM and CLSM. However, it is possible that their formation start a little earlier. The body wall of S. mansoni miracidia is arranged in four tiers of 6, 8, 4, and 3 plates, from the anterior to the posterior end (Pan 1980; Eklu-Natey et al. 1985). These plates are separated from each other by epidermal ridges, 121 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution interconnected by their cell bodies and narrow cytoplasmic bridges, except in the first tier where no ridges separate them (Pan 1980; Eklu-Natey et al. 1985). As noted by Pan (1980, 1996), the terebratorium appears to be a modified epidermal ridge, which contains at least 12 peripheral sensory organelles and the openings of miracidial gland ducts. In S. mansoni, it has a ‘honeycomb’ pattern (Eklu-Natey et al. 1985). The underlying muscle layer was visible in mature embryos, but its differentiation should be detailed by immunohistochemical and ultrastructural studies. Epidermis formation, cilia growth, and terebratorium differentiation should be also detailed by TEM in further studies. Parasitic platyhelminths belong to the monophyletic group Neodermata (Ehlers 1985; Littlewood et al. 1999), in which the larval ciliated epidermis is replaced by a syncytial nonciliated epidermis with “insunk” nuclei (tegument) in the adult, called neodermis (Tyler & Tyler 1997). In late stages of miracidium embryogenesis, when the larva is almost fully formed, germ cells were evident in whole-mounts or histological sections, but were not considered as a reference feature due to their similarity with early immature cells (blastomeres). They possess large round nucleus, prominent nucleolus and scarce cytoplasm. Based on ultrastructural observations of the miracidium-sporocyst transformation in the snail host (Pan 1996), we postulate that the miracidial germ cells may be homologous to neoblasts of other platyhelminth worms, although no accounts of regeneration potential has been given for any of schistosomal evolutive stages. Both cell types have remarkable proliferative capacity and are morphologically defined by a prominent nucleus and a small rim of basophilic cytoplasm, by free ribosomes and a relatively small amount or lack of endoplasmic reticulum. Miracidial germ cells have many mitochondria unlike well-established neoblasts (Pan 1980; Gschwentner et al. 2001). 122 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution The staging system introduced by the Hartenstein group for free-living flatworms (Hartenstein & Ehlers 2000) was very useful to detail and classify schistosome egg embryogenesis. The assumption considered by Younossi-Hartenstein & Hartenstein (2001) that the temporal sequence in which homologous morphogenetic events occur, and the spatial framework in which these events unfold, is sufficiently similar between some flatworms proved to be valid also for the trematode parasite S. mansoni. However, miracidia of schistosomes do not have primitive gut and eyespots (for S. mansoni, see Pan 1980). In conclusion, this work proposes a new staging system for S. mansoni egg maturation, in which two pre-embryonic stages occur inside the female worm and then eight embryonic stages occur after egg-laying. Stage 1 refers to early cleavages and the beginning of yolk fusion. Stage 2 represents late cleavage, with the formation of a stereoblastula and the onset of outer envelope differentiation. Stage 3 is defined by the elongation of the embryonic primordium and the onset of inner envelope formation. In stage 4, the first organ primordia arise. During stages 5-7, tissue and organ differentiation occur (neural mass, epidermis, terebratorium, musculature, and miracidial glands). Stage 7 is characterized by nuclear condensation of brain neurons. Stage 8 refers to the fully formed larva, presenting muscular contraction, cilia and flame-cell beating. However, since these morphological events are difficult to visualize in live eggs, our classification should be considered simultaneously to the Vogel and Prata’s staging system whenever convenient. In the future, the staging system proposed here could contribute to a better comprehension of S. mansoni egg biology, by the generation of cell-lineage fate map and the localization of molecular components (as granuloma-triggering antigens) during embryogenesis (“egg localizome”). 123 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Acknowledgments The authors acknowledge the staffs of the Laboratório de Patologia /IOC and of the Laboratório de Esquistossomose/CPqRR for technical assistance, Mr. Bruno Eschenazi from the Setor de Produção e Tratamento de Imagens/IOC for the schematic drawing of S. mansoni embryonic development, and Dr. John R Kusel from the Glasgow University for critical review of the manuscript. ADJ and TG received fellowhips from the Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – Brazil. TAC and ACA de M received fellowhips from the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) – Brazil. The work was supported by Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). 124 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution References Andrade ZA, Barka T (1962) Histochemical observations on experimental schistosomiasis of mouse. Am J Trop Med Hyg 11: 12-16 Anuracpreeda P, Wanichanon C, Chaithirayanon K, Preyavichyapugdee N, Sobhon P (2006) Distribution of 28.5 kDa antigen in the tegument of adult Fasciola gigantica. Acta Trop 100: 31-40 Asahi H, Stadecker MJ (2003) Analysis of egg antigens inducing hepatic lesions in schistosome infection. Parasitol Int 52: 361-367 Ashton PD, Harrop R, Shah B, Wilson RA (2001) The schistosome egg: development and secretions. Parasitology 122: 329-338 Awad AH, Probert AJ (1990) Scanning and transmission electron microscopy of the female reproductive system of Schistosoma margrebowiei Le Roux, 1933. J Helminthol 64: 181-192 Bancroft JD, Stevens A (1996) Theory and Practice of Histological Techniques. 4ed. Churchill Livingstone, New York. 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Intrafemale egg development. a-b Bright field micrographs of female worms. c-f Confocal laser scanning microscope images of wholemount females (a-e) and in vitro laid egg (f) stained with hydrochloric carmine. a Female ovary. The arrow represents the direction of oocyte maturation. H&E-staining. b-c Detail of the ovary, showing mature oocytes (o). Note in b the vitelline duct full of vitelline cells (vc). Giemsa-staining. In c, a mature oocyte leaves the ovary by projecting a pseudopod (arrow). d Eggshell formation in the ootype (ot). This zygote was surrounded by 40 vitelline cells. e Egg in the uterus. This egg has 45 vitelline cells. f Early laid egg in culture. Notice no cleavage during intrafemale egg development. Plasma membranes seem to disappear progressively. z zygote; ds digestive system; sr seminal receptacle. Scale bars 50 µm. Figure 3. Statistical analysis of egg growth. a-b Only the biological relevant relationships were plotted, i.e., M-I:M-II, M-II:M-III, M-III:M-IV, and M-IV:M-V, where M is the maturation stage in roman numerals (according to the Vogel and Prata’s classification). a Simultaneous 95% confidence intervals for comparing estimated mean areas of cultivated eggs during growth under in vitro conditions (RPMI-1640 medium). b Simultaneous 95% confidence intervals for comparing estimated mean areas of isolated eggs during growth in the 136 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution murine host. The overlapping of confidence intervals with the vertical dotted line at abscissa 0 indicates no pairwise difference between maturation stages at a level of confidence set as 0.05. Positive significant mean differences are bigger than 0 for the lower intervals, while negative significant mean differences are lower than 0 for higher intervals. See details in the text. c Box plot of egg area in different stages of maturation (M) in regard to egg source (S). S1 refers to eggs obtained from the host and S2 refers to eggs maintained in culture. d Simultaneous 95% confidence intervals for comparing estimated mean areas of each matching stages for both sources (isolated and cultivated), i.e. M-I:M-I, M-II: M-II, M-III:M-III, MIV:M-IV, and M-V:M-V. Figure 4. Early stages of S. mansoni embryonic development. a, f, g, n Bright field micrographs of whole eggs obtained from the host. a, g, n Basic fuchsine-staining. f Unstained egg. b-e, l, m, q, r Bright field micrographs of eggs in the intestine of the host. b, l, m, r PASH-staining. c Giemsa-staining. e Masson trichrome-staining. q PAS-AB pH 1.0. h-j, o, p Confocal laser scanning microscope images of wholemount eggs stained with hydrochloric carmine. Both eggs were obtained from the host. a-f Stage 1, early cleavage. a The embryonic disc is not visible. The egg is full of yolk (yk). Note yolk nuclei. b, c, e Embryonic cells (em) in early cleavage. The surrounding vitelline cells fuse. d Detail of the vitelline cells stained in green. Cytoplasmic vacuoles seem to occur. e Transversal section of the vegetal pole, showing six macromeres. f Late stage 1. The light embryonic disc (em) in the center of the egg. Yolk is dark. g-m Stage 2, late cleavage. g The embryonic disc (em) increases in size, occupying one-half of the diameter of the egg. h, j Virtual sections of the same egg, showing the stereoblastula. i Detail of h (inset). A highly vacuolated vitelline cell in degradation process. l, m The stereoblastula exhibits several mitotic figures (mi) and pycnotic nuclei (py). A macromere detaches from the embryo and adheres to the eggshell, giving rise to the outer envelope (oe). n-r Stage 3. n The embryonic disc (em) elongates. o, p 137 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Virtual sections of the same egg reveal at least two types of cells (considering the nuclear morphology) and the outer envelope (oe). q A marked difference on the staining pattern between the embryonic cells and the yolk syncytium is evident. Yolk (yk) is stained with the PAS reaction, indicating a rich neutral glycoconjugate content. r The embryo still exhibits several mitotic figures (mi) and some pycnotic nuclei (py). At one pole some cells seems to be compromised with the inner envelope (ie) differentiation. Scale bars 20 µm. Figure 5. Stage 4 of S. mansoni embryonic development. a-c, j Bright field micrographs of eggs in the intestine of the host. a-c Giemsa-staining. j Masson trichrome-staining. d-i Confocal laser scanning microscope images of the same whole-mounted egg isolated from the host stained with hydrochloric carmine. a, b Parasagittal sections of the embryo reveal the differentiation of the inner envelope (ie) and at least two types of cells (tI and tII). Type II cells are probably differentiating neuroblasts and concentrate in the interior of the embryo. In b, the outer envelope (oe) seems to fuse with the yolk (yk). Pycnotic nuclei (py) are also visible. c Transversal section of the embryo, showing the syncytial aspect of the inner envelope and the localization of type-I (tI) and type-II (tII) cells. d-i Virtual sections of the same egg in ventral view, showing the outer envelope (oe), the inner envelope (ie), cell types I and II (tI and tII), and the onset of the neural mass formation. j Parasagittal sections of the embryo reveal the differentiation of the neural mass primordium (nmp) with an acellular central region, called neuropile (np). Notice the neuroblast nuclei stained in green on Masson trichrome. Scale bars 20 µm. Figure 6. Stage 5 of S. mansoni embryonic development. a Bright field micrograph of a whole egg obtained from the host, stained with basic fuchsine. The embryo occupies almost the entire egg. Some yolk is located at the poles. Notice a more stained round mass in the mid-region of the embryo. It is the neural mass primordium (nmp). b, c Bright field 138 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution micrographs of eggs in the intestine of the host. b Giemsa-staining. c PASH-staining. d-i Confocal laser scanning microscope images of the same whole-mounted egg stained with hydrochloric carmine. This egg was obtained from in vitro cultivation. b Parasagittal section of the embryo shows the neural mass primordium (nmp) and its acellular neuropile (np), the inner envelope (ie) and the onset of epidermis (epi) formation, by the fusion of some peripheral cells. Type-I cells (tI) are spread mainly at the poles of the embryo. They will give rise to the miracidial glands and to the germ cells. c Transversal section of the embryo, detaching the neural mass primordium (nmp), its neuropile (np), and the syncytial epidermis primordium (epi). The neuropile (np) has a slight staining in red on PASH sections. d-i Virtual sections of the same egg in ventral view, showing the inner envelope (ie), the epidermis (epi) primordium, yolk (yk), type-I cells (tI)), the neural mass primordium (nmp), and its acellular neuropile (np). Scale bars 20 µm. Figure 7. Stage 6 of S. mansoni embryonic development. a-c Bright field micrographs of eggs in the intestine of the host. a, b PASH- staining. c Masson trichrome-staining. d-i Confocal laser scanning microscope images of the same whole-mounted egg isolated from the host stained with hydrochloric carmine. . a, c Parasagittal sections of the embryo reveal the differentiation of miracidial glands and of the terebratorium (t). a Just above the neural mass primordium (nmp) two laterally located type-I cells start to produce PAS-positive cytoplasmic granules and will give rise to the lateral glands (lg). More anteriorly, other three type-I cells also produce PAS-positive granules and will fuse to form the apical gland (ag). The inner envelope (ie) is also positive to the PAS reaction. b Transversal section of three different eggs. Notice the positive PAS-staining only in some type-I-like cells. c The epidermis (epi) is almost fully formed, but no underlying musculature and cilia were revealed by the Masson trichrome-staining (compare to Figs. 8b, g). d-i Virtual sections of the same egg in ventral view, showing the inner envelope (ie), the epidermis (epi) primordium, yolk (yk), the 139 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution terebratorium (t), the formation of the two lateral glands (lg) and the three apical gland (ag) nuclei, the neural mass primordium (nmp) and its acellular neuropile (np), and some germinal cells (gc). Scale bars 20 µm. Figure 8. Stages 7 and 8 of S. mansoni embryonic development. a-d, f, g Bright field micrographs of eggs in the intestine of the host. a, c, d, f PASH- staining. b, g Masson trichrome-staining. e Bright field micrographs of whole eggs obtained from the host, stained with basic fuchsine. h-n Confocal laser scanning microscope images of the same wholemounted egg isolated from the host, stained with hydrochloric carmine. a, b, c Stage 7. a, b Parasagittal sections of the embryos showing that the embryonic development is almost complete. Notice the morphology of neuronal nuclei. They are bigger than in stage 8 and present a lighter staining pattern. In a, the apical gland (ag) is completely fused and the lateral glands (lg) are also formed. The basement membrane (bm) is distinguishable on PAS-stained sections. In b, the epidermis (epi) is fully formed, presenting cilia (c). Masson trichromestaining reveals its underlying musculature (mu). The apical gland (ag) presents a granular pattern of staining when compared with the lateral glands (lg). c Detail of the neural mass primordium (nmp) from Fig. 8a. d Detail of the mature neural mass (nm) from Fig. 8f. Compare c and d to notice the nuclear condensation of neuronal nuclei and the increase of neuropile (np) size. The mature neural mass has smaller neuronal nuclei, with a stronger pattern of staining. d-n Stage 8, mature egg. e In whole-stained mature egg, the neural mass (nm), the terebratorium (t), and some germinal cells (gc) are visible under BM. f, g Parasagittal sections of the mature larvae. In f, the PAS-positive gland contents seem to be secreted to the interior of the egg in the murine host. In g, compare the staining pattern between the apical gland (ag) and the lateral gland (lg) on the Masson trichrome sections. Neuronal nuclei seem to be tightly compacted and darker than in stage 7 (compare to Fig. 8b). h-n Virtual sections of the same egg in ventral view, showing the mature miracidium ready to 140 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution hatch. It is possible to distinguish the epidermal plates and their cilia (c), the inner envelope (ie), a space between this envelope and the fully formed epidermis (epi), called Lehman lacuna (l), the terebratorium (t), the pair of lateral glands (lg), the apical gland (ag), the mature neural mass (nm) and its acellular neuropile (np), and the germinal cells (gc). Scale bars 20 µm. Figure 9. The oogram technique by brightfield and confocal microscopies. a-c Bright field micrographs of compressed fragments of S. mansoni-infected mouse intestines (oogram technique). a Classical oogram. Three mature eggs are shown. b, c Compressed intestinal fragments stained with hydrochloric carmine under BM. It is difficult to identify the stages of maturation in each egg. d, e, f Confocal laser scanning microscope images of carmine-stained fragments of compressed intestines. d Two mature eggs (stage 8) shown in a sagittal section and a third egg in an oblique view (nm, neural mass; np, neuropile; lg, lateral glands; gc, germinal cells). e Stage 2 egg, with the developing embryo (em). The stereoblastula and the yolk are visible. f Stage 3 egg, with an elongate embryo (em) and some yolk (yk). Scale bars 100 µm. Figure 10. Comparison between the staging systems of S. mansoni egg maturation. a-e Bright field micrographs of whole, unstained eggs isolated from the murine host, in accordance to the Vogel and Prata’s staging system. a Stage I. b Stage II. See Fig. 4f to an egg in early stage II. c Stage III. d Stage IV. e Stage V (mature egg). Notice the increase in embryo size in relation to egg size itself. Scale bar 20 µm. More details in the text. f Schematic drawings of the major events of egg embryogenesis in ventral view. Anterior is at the top and posterior at the bottom. The number at the bottom left of each drawing indicates the embryonic stage regarding the morphological events, as defined in the text. Tissues are shaded in different colors as shown at the bottom right of the panel. Dotted lines indicate cell fusion. Cilia were 141 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution not represented. They arise in late stage 7. Drawings are not in scale. For more informations on the morphological events during embryogenesis, see the text. The zygotic stage (also stage 0) occurs inside the female worm, from the formation of the eggshell in the ootype. Stage 1 corresponds to Vogel and Prata’s stage I. Stage 2 to Vogel and Prata’s stage II, and Stages 3 and 4 to Vogel and Prata’s stage III. Stages 5, 6, and 7 occur during Vogel and Prata’s stage IV. Finally, the mature embryo in stage 8 corresponds to Vogel and Prata’s stage V. Figure 11. Patterns of PAS-positive reaction during S. mansoni egg embryogenesis. a-c Light microscope micrographs of eggs in the intestine of the host, stained by the PAS-AB method. a Eggs in stage 1 show positive reaction only in the yolk. No positive reaction stains the embryo (em) itself. b During the stage 4, a light positive reaction stains the inner envelope (ie). The embryonic primordium (em) remains negative to the PAS reaction. c Mature eggs (stage 8) are completely positive to the PAS reaction, except by the neural mass (nm) and the basement membrane (bm), that are slightly stained. It is possible to distinguish the neuronal nuclei and the neuropile (np) due to this negative staining. 142 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Table 1. Experimental design Stagesa Source total I II III IV V isolated 30 30 30 30 30 150 cultivated 30 30 30 30 30 150 total 60 60 60 60 60 300 a according to Vogel and Prata’s staging system Table 2. Estimated mean areas (µm2) during S. mansoni egg growth in mice (isolated) and under in vitro conditions (cultivated). Source Stagesa Isolated SD Cultivated SD P value I 3812.74 243.66 3492.87 450.73 0.325 II 3974.96 406.26 3442.46 394.08 0.005b III 4280.97 464.45 5422.56 560.71 0.0001b IV 5003.54 870.83 5948.06 428.83 0.0001b V 6832.23 576.61 6730.61 510.27 0.999 a according to Vogel and Prata’s staging system b statistical significance (P < 0.05) 143 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 1 144 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 2 145 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 3 146 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 4 147 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 5 148 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 6 149 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 7 150 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 8 151 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 9 152 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 10 153 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Figure 11 154 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Electronic Supplementary Material 1 155 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Electronic Supplementary Material 2 156 Artigo 2 Jurberg et al. – Development, Genes and Evolution Electronic Supplementary Material 3 157 Considerações Finais Dissertação de Mestrado V- Considerações Finais 158 Considerações Finais Dissertação de Mestrado V – Considerações Finais V. 1 – Discussão Os últimos avanços na biologia dos esquistossomos foram principalmente impulsionados pelos recentes adventos técnicos em Biologia Molecular e Bioquímica (proteômica), o que gerou uma enorme quantidade de dados (como em VerjovskiAlmeida et al. 2003, 2004, 2007; Cass et al. 2007). Usando técnicas tradicionais (p.ex. histologia e cultura de vermes) e microscopia óptica avançada (CLSM), essa dissertação buscou responder uma das lacunas da biologia dos esquistossomos, isto é, como acontece o desenvolvimento embrionário dos ovos de S. mansoni. De fato, a biologia dos ovos vem sendo considerada apenas marginalmente, como destacado na Fundamentação Teórica. Em geral, os ovos são tratados como uma entidade invariável durante o tempo (desenvolvimento embrionário). Provavelmente, tal prática é resultante da ampla presença de ovos maduros após procedimentos de isolamento a partir de intestinos e fígados de animais infectados (Dresden e Payne 1981) ou da dificuldade em separar grandes quantidades de ovos em estádios distintos de amadurecimento. No entanto, em estudos moleculares, essa generalização pode gerar resultados equivocados sobre a expressão de algum gene ou a presença de alguma proteína, por exemplo. Nesse caso, portanto, é necessário um esforço maior e mais refinado na obtenção e separação dos ovos, ou ainda, o emprego de kits de extração e técnicas de ampliação de material mais sensível e eficaz para a avaliação dos mecanismos moleculares durante a embriogênese dos ovos de esquistossomos. É possível, ainda, que o desenvolvimento embrionário dos ovos tenha sido superficialmente considerado até o momento por causa de limitações técnicas impostas pela casca do ovo, ou mesmo pela grande presença de células vitelínicas nos estádios iniciais do desenvolvimento. Como resultado direto do esforço para descrever o desenvolvimento embrionário de S. mansoni, dois artigos foram elaborados e estão incluídos nos resultados dessa dissertação (Jurberg et al. 2008a; Jurberg et al. em preparação). Um terceiro artigo, sobre a localização de antígenos do ovo durante o seu desenvolvimento embrionário, está em preparação. Como consequência indireta desse trabalho (para a obtenção de miracídios), um simples aparelho de eclosão foi manufaturado e patenteado (2007). A sua avaliação experimental como método diagnóstico para a esquistossomose originou um artigo (Jurberg et al. 2008b). Outro método diagnóstico também foi desenvolvido. Por ser baseado em um princípio diferente, ele também é capaz de diagnosticar outras helmintíases além da 159 Considerações Finais Dissertação de Mestrado esquistossomose. Sua patente está ainda pendente. Por essa razão, a avaliação experimental desse outro método ainda não foi publicada. Recentemente, ambos os métodos foram também avaliados em campo. A publicação desse inquérito aguarda o término da análise das amostras e a redação do(s) manuscrito(s). V.1.1 – Sistemas de classificação Tradicionalmente, os ovos de esquistossomos são classificados a partir da relação de tamanhos entre o embrião e o ovo propriamente dito (Vogel 1942; Prata 1957). Embora útil, esse sistema de estagiamento não considera a complexidade dos eventos morfogenéticos que ocorrem durante o amadurecimento dos ovos. Assim, conforme descrito no segundo artigo científico dessa dissertação, critérios morfológicos de fácil reconhecimento em cortes histológicos e em ovos inteiros analisados sob microscopia confocal foram definidos e identificados. A partir desses critérios, foi então desenvolvimento proposto embrionário um dos novo ovos sistema de de classificação esquistossomos. Esse para o sistema, entretanto, não é de todo original, tendo sido adaptado a partir de um sistema de estagiamento inicialmente introduzido para platielmintos de vida-livre (Hartenstein e Ehlers 2000; Younossi-Hartenstein et al. 2000; Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000a, b, 2001; Ramachandra et al. 2002; Morris et al. 2004; Cardona et al. 2005, 2006). A similaridade temporal em que eventos morfológicos homólogos ocorrem entre os táxons de platielmintos possibilita que eles sejam comparados filogeneticamente (ver adiante). Todavia, os critérios morfológicos utilizados como referência não são identificáveis em ovos vivos (como em cultura ou no caso da técnica do oograma), ou em ovos inteiros sob microscopia de campo claro convencional. Por essa razão, correlacionamos o sistema de estadiamento proposto com a classificação de Vogel (1942) e de Prata (1957), conforme também exposto no segundo artigo (Jurberg et al. em preparação). Nesse mesmo artigo, apresentamos uma adaptação do protocolo de visualização de ovos inteiros individuais em CLSM (Jurberg et al. 2008a) para a análise de ovos inteiros em fragmentos de intestino comprimidos, como na técnica do oograma de Pellegrino e Faria (1965). Por exemplo, em situações de avaliações quimioterapêuticas in vivo, a utilização em conjunto de ambas as técnicas pode possibilitar a rápida inferência de alterações nas frequências de cada estádio de amadurecimento (via técnica clássica de oograma) e da visualização de alterações morfológicas nos embriões (via técnica do oograma para microscopia confocal), caso elas de fato ocorram. Nesse caso, esse novo método necessita ser ainda melhor avaliado. É importante ressaltar ainda que para a visualização adequada dos ovos, 160 Considerações Finais Dissertação de Mestrado as amostras de intestino devem ser fortemente achatadas ao serem fixadas, antes de serem coradas. Por sua vez, em ovos individualizados, a remoção da casca (malsucedida até o momento) pode facilitar o acesso ao embrião, tornando possível a construção de mapas de linhagem celular, imunomarcações em embriões inteiros e análises ultra-estruturais do embrião propriamente dito, por exemplo. Como apresentado no segundo artigo, o sistema de estadiamento proposto e a classificação introduzida por Vogel (1942) e por Prata (1957) são, de fato, complementares. Elas devem ser utilizadas de acordo com a conveniência e o objetivo de cada investigação. No entanto, em alguns casos (p.ex. ver Freitas et al. 2007), é importante considerar os eventos morfológicos da embriogênese do ovo, mesmo quando em uma primeira etapa do experimento, somente o sistema de Vogel (1942) e de Prata (1957) possa ser empregado. Por exemplo, o estádio IV de Vogel e Prata pode ser subdividido em três momentos morfológicos distintos (cronologicamente: formação da epiderme; diferenciação do terebratório e das glândulas miracidianas, e; o condensamento nuclear da massa nervosa), segundo a nossa classificação. Assim, por revelar a complexidade morfológica durante o amadurecimento dos ovos, é possível que o sistema de estadiamento apresentado aqui possa contribuir para uma melhor compreensão da biologia dos ovos. Em especial, ele pode ser empregado na busca por alterações fenotípicas e na imunolocalização (em criosecções) de antígenos do ovo durante o desenvolvimento. V.1.2 – Desenvolvimento embrionário in vivo e in vitro Diversos protocolos de cultura de vermes adultos e ovos estão disponíveis na literatura (p.ex., ver Michaels e Prata 1968; Lewis 2001; Kusel et al. 2006; Freitas et al. 2007). Esses protocolos são empregados nas mais variadas investigações, desde a preparação de SEA e produção de anticorpos monoclonais, avaliações quimioterapêuticas e em ensaios bioquímicos e moleculares, como por exemplo, transfecção e inibição da expressão gênica por técnicas de RNA de interferência. Alguns estudos avaliaram a oviposição e/ou o amadurecimento dos ovos em diferentes condições de cultura (p.ex. Michaels e Prata 1968; Schiller et al. 1975; Newport e Weller 1982a, b; Barth et al. 1996; El-Ridi et al. 1997). No entanto, pela primeira vez, detalhes dos eventos morfológicos durante a embriogênese foram revelados em ovos cultivados in vitro. Além disso, o desenvolvimento embrionário desses ovos foi comparado com o desenvolvimento de ovos isolados a partir do hospedeiro murino. A dificuldade de acompanhamento dos eventos morfológicos em ovos vivos fez necessária a utilização dos dois sistemas de estagiamento, reforçando a 161 Considerações Finais Dissertação de Mestrado complementaridade entre ambas as classificações. Em um primeiro momento, ovos isolados e ovipostos em cultura foram classificados de acordo com o sistema de Vogel (1942) e de Prata (1957) para a mensuração de seus eixos (maior comprimento e largura) e subsequente cálculo de suas áreas. A área média de cada estádio foi utilizada como parâmetro para comparação de crescimento, a partir de modelagem estatística de variância por ANOVA two-way e teste Post Hoc de Tukey, em ambiente R. Em um segundo momento, os ovos isolados e cultivados em cada estádio do desenvolvimento foram fixados e corados para análise ao microscópio confocal (segundo o novo sistema de classificação do desenvolvimento). Aparentemente, a morfologia dos ovos foi bastante similar, comparando os estádios correspondentes entre si. A avaliação conjunta desses resultados sugere que o amadurecimento (acompanhado pelo crescimento em tamanho) dos ovos in vivo e in vitro ocorreu a taxas desiguais, pois os padrões de desenvolvimento atingiram o mesmo ponto: os ovos maduros em ambas as condições não exibiram diferenças significativas entre as médias de suas áreas, os embriões maduros apresentaram as mesmas características ao microscópio confocal e os ovos, quando colocados em água, eclodiram e liberaram miracídios capazes de infectarem B. glabrata, com eliminação de cercárias. Segundo Michaels e Prata (1968), uma importante diferença morfológica nos ovos cultivados é a ausência de sinais de morte quando comparados com ovos obtidos a partir do hospedeiro. Recentemente, Sarvel e colaboradores (2006) utilizaram a sonda fluorescente Hoechst 33258 para marcação dos núcleos de células danificadas, assim diferenciando ovos mortos de ovos viáveis. Esse método, no entanto, não foi aplicado com sucesso em conjunção com a coloração por carmim clorídrico, mesmo alterando a ordem das etapas de coloração (dados não mostrados). A utilização de outros corantes fluorescentes em conjunção com essa sonda para viabilidade dos ovos precisa ainda ser avaliada. Para contornar essa limitação, uma grande quantidade de ovos foi analisada, além dos ovos com sinais evidentes de morte não terem sido avaliados. Assim, a cultura de ovos sob as condições empregadas pode ser valiosa para estudos morfológicos da embriogênese, como a determinação de mapas de destino. Todavia, em estudos moleculares e bioquímicos, cuidados especiais devem ser considerados na interpretação dos dados, como destacado por Gobert e colaboradores (2007) para esquistossômulos. 162 Considerações Finais Dissertação de Mestrado V.1.3 – Desenvolvimento embrionário e filogenia “A evolução da forma ocorre por meio de alterações no desenvolvimento embrionário” sintetizou Carrol (2006). Como visto na fundamentação teórica dessa dissertação, as relações filogenéticas dos diversos táxons de platielmintos têm certas incompatibilidades, com a persistência de alguns grupos parafiléticos. Uma suposta relação filogenética entre os diferentes táxons de platielmintos, considerando os vermes Acoela e Nemertodermatida como grupo externo aos Platyhelminthes stricto sensu, foi sumariada na Fig. 1.14. No grupo parafilético basal “Archoophora” são reunidos, por conveniência, aqueles que possuem ovos endolécitos, ricos em vitelo. Anteriormente incluídos entre os platielmintos arcoóforos, os Acoela apresentam um padrão único de desenvolvimento com clivagem espiral em dueto, pouco parecido com outros espiralianos (p.ex. policlados) (Henry et al. 2000). Nenhuma informação foi encontrada sobre a embriogênese dos Nemertodermatida. É possível que ambos os grupos possuam características embrionárias consideradas basais entre os platielmintos verdadeiros. Por sua vez, o grupo dos platielmintos verdadeiros pode ser subdividido em dois grandes ramos. Em um deles, representado pelos Catenulida, não foram encontradas informações sobre a sua embriogênese. Contudo, sabe-se que eles se reproduzem assexuadamente por fissão transversal, formando cadeias de zoóides (Hyman 1951; ver também Egger et al. 2007). Já o táxon monofilético Rhabditophora reúne os Macrostomorpha e os Trepaxonemata. Dentro dos Macrostomorpha, encontram-se os Haplopharyngida e Macrostomida; porém, não foram encontradas informações sobre o desenvolvimento embrionário dos Haplopharyngida. Os macrostomídeos apresentam uma modificação do padrão de clivagem observado nos vermes acoelos, i.e., ao invés de duetos de células, são formados quartetos. Neles, os micrômeros não são tão menores do que os macrômeros. A estereoblástula resultante é cercada por uma camada vitelínica externa transitória (membrana externa, do inglês hull membrane), a partir da diferenciação de grandes células vegetais periféricas (Seilern-Aspang 1957; Tyler 1981; Morris et al. 2004). A gastrulação nesse grupo também difere significantemente do modo espiraliano típico, que é preservado em outros arcoóforos. Como a formação do manto vitelínico externo, a gastrulação se assemelha aos estádios iniciais do desenvolvimento de neoóforos (Bresslau 1904; Hartenstein e Ehlers 2000; Morris et al. 2004). Assim, após a formação do manto vitelínico, as células no interior do embrião estabelecem um primórdio digestório rico em vitelo, formado por células grandes localizadas mais centralmente, e um primórdio somático, que consiste de células menores localizadas anteriormente. 163 Considerações Finais Dissertação de Mestrado Gradualmente, essas células expandem-se posteriormente para formar massas celulares mesenquimais achatadas, em cada lado do primórdio intestinal. Somente durante os estádios tardios da embriogênese, bem após o início da diferenciação celular, que o primórdio somático expande dorsalmente e ventralmente para encerrar o primórdio intestinal (Morris et al. 2004). Os Trepaxonemata ramificam-se ainda em duas linhagens, os Polycladida basais e os Neoophora. Uma diferença é marcante no modo de formação da parede corporal entre macrostomídeos e policlados (e outros espiralianos): nos policlados, as células da membrana externa (do inglês, hull cells) não estão presentes. O primórdio definitivo da epiderme é formado por micrômeros animais em um estádio inicial durante a gastrulação, que por movimentos epibólicos alongam-se sobre as grandes células ricas em vitelo no pólo vegetal (Surface 1907; Boyer et al. 1996, 1998; Younossi-Hartenstein e Hartenstein 2000b; Morris et al. 2004). Os platielmintos neoóforos são agrupados juntos por possuírem ovos ectolécitos, com células acessórias individualizadas (células vitelínicas), e se ramificam também “Lecithoepitheliata”, em e duas outra linhagens: monofilética, uma chamada parafilética, chamada Eulecithophora. Os “Lecithoepitheliata” reúnem cerca de 30 espécies, por dividirem uma condição intermediária entre ovos endolécitos e ectolécitos (Brusca e Brusca 2003). Poucas informações sobre a embriogênese desse grupo estão disponíveis. Por epibolia, um quarteto de micrômeros alonga-se sobre os macrômeros, formando uma membrana externa transitória (hull membrane) que circunda parte do vitelo em uma cavidade corporal embrionária primária. Outros micrômeros reconstituem o ectoderma embrionário propriamente dito, definindo a superfície ventral do embrião. Esse ectoderma se expande gradualmente, envolvendo todo o embrião e o vitelo posicionado logo abaixo da membrana externa (Reisinger et al. apud Hartenstein e Ehlers 2000). Os eulecitoforados agrupam os clados Prolecithophora, Rhabdocoela e “Seriata”. Não foram encontradas informações sobre a embriogênese dos prolecitóforos. O grupo parafilético “Seriata” possui uma grande capacidade regenerativa, utilizada como estratégia de reprodução assexuada. Ele reúne os Proseriata, os Bothrioplanida e os Tricladida. Dentre os “Seriata”, os tricladidos têm recebido especial atenção. Eles compartilham diversas características com outros neoóforos, mas são únicos em alguns aspectos. Os embriões não apresentam o padrão regular de clivagem em espiral e formam uma massa irregular de blastômeros praticamente iguais, que fica localizada no centro do vitelo. No primórdio embrionário, os órgãos se diferenciam sem a ocorrência de gastrulação e 164 Considerações Finais Dissertação de Mestrado a formação evidente de camadas germinativas. Os blastômeros são altamente móveis e deslocam-se ao redor do vitelo (fenômeno conhecido por “anarquia dos blastômeros”). A faringe embrionária diferencia-se bombeando vitelo para o embrião, dando origem à cavidade digestória. Durante esse processo, o primórdio embrionário é deslocado para a periferia do ovo. Por essa razão, uma delgada camada celular (banda germinativa) ao redor da cavidade digestória é formada. Ao contrário da organogênese de outros platielmintos, a dispersão do primórdio embrionário em estádios iniciais do desenvolvimento causa a formação irregular de camadas de células. Os diversos tipos de precursores ficam misturados e somente consolidam os primórdios de órgãos e dão forma ao embrião relativamente tarde durante o desenvolvimento. Os rabdocelos (“Dalyellioida”, representam Endoaxonemata, seis sub-clados, alguns Kalyptorhynchia, parafiléticos “Typhloplanoida”, Temnocephalida e Revertospermata). A espécie tifloplanóide Mesostoma lingua, por exemplo, parece também não seguir o padrão típico de clivagem em espiral, mas investigações adicionais são ainda necessárias (Hartenstein e Ehlers 2000). Nessa espécie, a membrana externa transitória (hull membrane) é formada exclusivamente por células vitelínicas, ao invés de blastômeros. Desde o início, a membrana externa circunda o vitelo inteiramente, de modo que a formação de uma faringe embrionária não é necessária. Não parece ocorrer gastrulação (considerando como o estabelecimento de camadas germinativas antes do aparecimento dos primórdios de órgãos). Os órgãos surgem a partir de agrupamentos homogêneos maciços de células mesenquimais. Investigações sobre genes homólogos desse grupo, que sabidamente são responsáveis pela especificação das camadas germinativas em outros animais, ainda precisam ser realizadas (para mais detalhes, ver Hartenstein e Ehlers 2000). Entre os Revertospermata estão reunidos os Fecampiida e os Mediofusata. Os Mediofusata abrangem as famílias Urastomidae, Genostomatidae e o grupo parasita Neodermata, que inclui as tradicionais classes Trematoda, Cestoda e Monogenea. Dentro dos trematódeos, como visto na Fundamentação Teórica, encontra-se a espécie estudada nessa dissertação. Nossos resultados sugerem que o desenvolvimento do ovo de S. mansoni ocorre, aparentemente, de modo similar ao padrão rabdocelo descrito na espécie M. lingua, no qual a gastrulação parece não ocorrer (ver Hartenstein e Ehlers 2000). Grupamentos de células mesenquimais também parecem originar os primórdios de órgãos. Entretanto, ao contrário dos rabdocelos, o embrião de esquistossomo não forma faringe e intestino durante o seu desenvolvimento no ovo. Provavelmente, a ausência dessas estruturas está 165 Considerações Finais Dissertação de Mestrado associada com hábito parasita. Esses órgãos somente surgem durante a transformação miracídio-esporocisto-cercária no interior do hospedeiro intermediário (Pan 1996). Outro evento similar entre esquistossomos e rabdocelos é a formação dos envoltórios embrionários, que podem ser derivados da membrana externa (huell membrane) dos turbelários. Por exemplo, no Mesostoma, essa membrana transitória surge a partir de células vitelínicas que circundam o embrião ventralmente e desaparecem progressivamente em torno do estádio 6 (Hartenstein e Ehlers 2000). Contudo, como esquistossomos em têm outros dois platielmintos envoltórios, parasitas que podem (p.ex. ser uma cestódeos), os adaptação ao parasitismo. Tais envoltórios protegem o embrião em desenvolvimento e o miracídio completamente formado, atuam como compartimentos de produção e armazenamento de nutrientes, secretam materiais imunogênicos que podem atuar na expulsão dos ovos para o lúmen intestinal e propiciam espaço para os movimentos miracidianos antes da eclosão (Neill et al. 1988; Swiderski 1994; Ashton et al. 2001; ver também Conn e Swiderski 2008). No S. mansoni, ambos os envoltórios são celulares em origem, sincicial em natureza e circundam o embrião (Swiderski 1994). Todavia, o envoltório externo tem origem mista (a partir de macrômeros e células vitelínicas) e desaparece gradualmente tal qual a membrana externa (huell membrane), enquanto o envoltório interno origina-se a partir de mesômeros e persiste até a eclosão do ovo (Swiderski 1994). Como exposto por Hartenstein e Ehlers (2000) para a espécie M. lingua, investigações adicionais sobre os destinos celulares durante o desenvolvimento (mapa de destino) e a presença de genes homólogos e suas localizações nos tecidos do embrião em desenvolvimento precisam ser realizados para esclarecer alguns dos eventos morfológicos observados nesse trabalho e acrescentar novas informações à filogenia dos platielmintos em geral e à biologia dos ovos de esquistossomo. Se, de fato, “a evolução da forma ocorre por meio de alterações no desenvolvimento embrionário” (Carrol 2006), resta determinar quais alterações no desenvolvimento embrionário dos platielmintos de vida-livre deu origem ao hábito parasita e definiu a evolução dos esquistossomos. V.1.4 – Desenvolvimento embrionário e granulomatogênese Por si só, os ovos de S. mansoni têm destacada importância na infecção esquistossomótica. Aqueles que não conseguem atingir o lúmen intestinal podem causar reações inflamatórias focais (granulomas), que comprometem o funcionamento regular de diversos órgãos, em especial, o fígado. Em casos mais 166 Considerações Finais Dissertação de Mestrado graves, a infecção pode evoluir até o óbito. Como mencionado na Fundamentação Teórica, entretanto, a formação de granulomas não ocorre ao redor de ovos imaturos isolados (Prata 1957), mas é estreitamente dependente de ovos maduros viáveis (Sorour 1929; Espin 1941). Ao contrário do que era tradicionalmente considerado (Asahi et al. 1999; Stadecker et al. 2001), os antígenos secretados pelos ovos maduros totalizam 188 proteínas (Cass et al. 2007). Utilizando soro de coelho previamente imunizado contra as proteínas totais secretadas pelo ovo (ESP), Ashton e colaboradores (2001) relataram que essas proteínas encontravam-se presentes predominantemente no envoltório interno do ovo maduro (envoltório de von Lichtenberg); em ovos maduros, tal estrutura possui retículo endoplasmático rugoso desenvolvido e grandes agregados de material granular (Ashton et al. 2001). Com isso, eles sugeriram que esse envoltório seria a fonte principal de secreções do ovo. Anticorpos monoclonais anti-LacdiNAc (GalNAcβ1-4GlcNAc) e anti-IPSE/alfa-1 também localizaram seus respectivos epítopos nessa mesma região (van Remoortere et al. 2000; van den Berg et al. 2004; Schramm et al. 2006). Mais tarde, van de Vijver e colaboradores (2006) atribuíram atividade granulomatogênica às glicoproteínas com unidades terminais LacNAc (Galβ1-4GlcNAc, como na asialofetuina) ou LacdiNAc (GalNAcβ1-4GlcNAc). Convencionalmente, as glicoproteínas podem ser demonstradas por técnicas de coloração seletivas. Glicoconjugados neutros são revelados pela reação do ácido periódico de Schiff (PAS), enquanto a diferenciação entre glicoconjugados ácidos sulfatados e carboxilados pode ser realizada por modificações do método do azul de Alciano (AB), apenas variando o pH das soluções (Kierman 1990). A utilização dessas técnicas possibilitou avaliar a presença e localização de glicoproteínas durante a embriogênese dos ovos. No entanto, ensaios histoquímicos com lectinas e imuno-histoquímicos com anticorpos monoclonais contra os recentes descobertos antígenos secretados do ovo (Cass et al. 2007) necessitam ainda serem realizados para avaliar especificamente suas respectivas produções, localizações e dispersões para o ambiente periovular durante a embriogênese dos ovos (localizoma). Nossos resultados apontaram que a diferenciação do envoltório interno do ovo, durante os estádios 3 e 4, é acompanhada por um aumento gradual de positividade à reação ao PAS. O mesmo é observado em secções coradas pelas técnicas de PAS-AB. Todavia, a produção de glicoconjugados neutros não é exclusiva desse envoltório. No estádio 6, as células precursoras das glândulas miracidianas passam a apresentar grânulos citoplasmáticos fortemente positivos ao PAS. Mais tarde, com o embrião maduro, os conteúdos glandulares parecem ser secretados para o interior dos ovos. Em secções coradas ao PAS-AB, as 167 Considerações Finais Dissertação de Mestrado glicoproteínas neutras ocupavam praticamente a totalidade dos embriões em estádios mais tardios. Glicoconjugados ácidos não foram detectados pela coloração ao AB durante toda a embriogênese. É possível que o material glandular também contribua para a formação de granulomas. Nesse caso, o conteúdo glandular liberado para o interior do ovo maduro (estádio 8) pode difundir através dos envoltórios do ovo e alcançar o meio circundante. Nesse cenário, além do envoltório interno produzir componentes imunogênicos, ele poderia atuar também como uma barreira de liberação lenta dos antígenos para o ambiente periovular, como postulado anteriormente por Ashton e colaboradores (2001). A diferenciação tardia das glândulas miracidianas também suporta esse cenário. No entanto, o papel das glândulas miracidianas na granulomatogênese ainda precisa ser melhor avaliado. O ensaio de Ashton e colaboradores (2001) com imunomarcação anti-ESP em microscopia de fluorescência convencional não deixa claro se outras estruturas do ovo maduro estavam positivas. Utilizando o mesmo modelo animal empregado nesse trabalho (camundongos Swiss Webster), Romanha (2007) demonstrou que a oviposição tem início aos 30 dias após a infecção (p.i.) (ver também Brener 1956; Lenzi JA 1998; Lenzi et al. 2008a). Como inferido nessa dissertação, os ovos são liberados na vasculatura do hospedeiro ainda sem terem sofrido qualquer clivagem. Nesse ambiente, os ovos causam uma resposta celular inicial (RI, reação inicial), que persiste preponderantemente no fígado pelos próximos cinco a sete dias de infecção (35-37 dias p.i.) (Romanha 2007). O mecanismo de sensibilização do hospedeiro para essa reação ainda é desconhecido. Todavia, a RI parece estar relacionada com o amadurecimento dos ovos, que também tem aproximadamente a mesma duração (Prata 1957; Pellegrino et al. 1962; Michaels e Prata 1968; Romanha 2007). Em seguida, com os ovos maduros, a RI é substituída pelo estádio exsudativo (E), ainda pré-granulomatoso. O estádio granulomatoso tem início a partir do 38° dia de infecção, quando os granulomas hepáticos podem apresentar-se no estádio exsudativo-produtivo (EP) inicial, com a presença de células fibroblastóides dispersas (ver também Lenzi JA 1998; Lenzi et al. 1998; Romanha 2007). Um pouco mais tarde, com 45 dias p.i., os granulomas mais velhos estão no estádio EP maduro, com a definição de três zonas (central, paracentral e periférica) bem delimitadas. Até esse momento, 15 dias se passaram desde a chegada dos primeiros ovos ao fígado. Granulomas em outros estádios mais recentes de desenvolvimento podem ser encontrados, devido à liberação contínua de ovos pelas fêmeas adultas. Em seguida, os granulomas mais velhos evoluem para o estádio produtivo (P), exibindo arranjo concêntrico compacto das fibras colagênicas na zona paracentral. 168 Considerações Finais Dissertação de Mestrado No hospedeiro, os ovos permanecem viáveis por cerca de 18-28 dias a partir da sua oviposição (Prata 1957; Lenzi JA 1998). Com a morte do miracídio no interior do ovo, o estímulo antigênico é interrompido, dando início a processos involutivos (Lenzi et al. 1998; Lenzi et al. 2006; Romanha 2007). O papel do amadurecimento dos ovos na formação dos granulomas parece estar bem definido. Todavia, como mencionado anteriormente, a participação das glândulas miracidianas ainda precisa ser melhor avaliada. De fato, os mecanismos de interação ovo-granuloma ainda precisam ser melhor compreendidos através da realização de novos estudos histoquímicos e imuno-histoquímicos. Para isso, é preciso determinar o momento preciso e a localização para cada uma das 188 proteínas secretadas pelo ovo, bem como a sua difusão ao redor dos ovos e a resposta imunológica, que é gerada em diferentes linhagens organismos hospedeiros. No momento, uma meta-análise da literatura disponível revela que apenas pouquíssimos antígenos do ovo foram localizados por anticorpos monoclonais, em trabalhos que investigaram apenas ovos maduros (Jurberg et al. em preparação). Estudos por microscopia eletrônica de transmissão podem ainda revelar detalhes adicionais sobre a organogênese do miracídio e essa relação. Todavia, a casca do ovo como barreira à impregnação de resinas é uma limitação que precisa ser superada. 169 Considerações Finais Dissertação de Mestrado V. 2 – Conclusões e Perspectivas 1. O desenvolvimento embrionário dos ovos de esquistossomosos é mais complexo do que considerado previamente por outros autores. Essa dissertação descreveu, pela primeira vez, a sequência de eventos morfológicos até a completa formação do miracídio. 2. As fêmeas de esquistossomosos possuem modo de desenvolvimento neoóforo, com a participação de um órgão especializado (glândulas vitelínicas) na produção de células vitelínicas. Essas células circundam o zigoto como uma camada celular separada. Na literatura, o número de células vitelínicas no ovo recém-formado não é preciso. Nossos resultados preliminares apontam para cerca de 40-45 células vitelínicas por ovo. 3. Uma extensa análise de um amplo número de ovos tornou possível a construção de uma sequência plausível dos eventos da embriogênese de S. mansoni; 4. O tratamento com hidróxido de potássio para a remoção da autofluorescência da casca mostrou resultados insatisfatórios para o estudo morfológico do desenvolvimento embrionário de S. mansoni e E. paraensei por CLSM. No entanto, a microscopia confocal em conjução com a técnica do carmim clorídrico possibilitou a visualização tridimensional em grandes detalhes da anatomia interna dos ovos durante o seu desenvolvimento; 5. A partir de critérios morfológicos, o desenvolvimento dos ovos pode ser dividido em dez estádios. De fato, os dois primeiros estádios são pré-embrionários e ocorrem no interior da fêmea, enquanto os outros oito estádios ocorrem no hospedeiro (ou em cultura). Resumidamente, o estádio pré-zigótico refere-se à liberação do oócito maduro pelo ovário da fêmea; o estádio zigótico (também estádio 0) compreende a fecundação a até a primeira clivagem. Os estádios subsequentes acontecem no exterior. No estádio 1, ocorrem as clivagens iniciais. O estádio 2 refere-se às clivagens tardias, com a formação de uma estereoblástula. No estádio 3, há o alongamento e a diversificação do primórdio embrionário. No estádio 4, ocorre a diferenciação de alguns primórdios (p.ex. massa nervosa). O estádio 5 é caracterizado pelo início da formação de órgãos e tecidos (p.ex. epiderme). No estádio 6, as glândulas miracidianas começam se diferenciar. No estádio 7, ocorre o condensamento nuclear dos neurônios da massa nervosa e a diferenciação do 170 Considerações Finais Dissertação de Mestrado terebratório. O estádio 8 refere-se à larva completamente formada, logo antes de eclodir; 6. A dificuldade de visualização desses critérios morfológicos em ovos inteiros nãocorados tornou necessária a correlação dos eventos observados com o sistema de Vogel (1942) e de Prata (1957) (em algarismos romanos). Tais autores não classificaram o desenvolvimento no interior das fêmeas, que dividimos em dois momentos: antes da fecundação (estádio pré-zigótico) e formação do zigoto até a primeira divisão celular (estádio zigótico ou estádio 0). As clivagens iniciais correspondem ao primero estádio de ambos os sistemas de classificação (o embrião é muito pequeno para ser visível sob microscopia de campo claro). O mesmo é verdadeiro para o estádio subsequente. No nosso estádio 2, as clivagens tardias dão origem a uma estereoblástula, que se posiciona no centro do ovo, como no estádio II de Vogel e de Prata. O estádio III de Vogel e de Prata (embrião ocupa dois terços do comprimento do ovo) pode ser dividido em dois momentos: nosso estádio 3 refere-se ao início da citodiferenciação, enquanto o nosso estádio 4 refere-se ao surgimento dos primeiros primórdios de órgãos. O estádio IV de Vogel e de Prata (aumento do embrião, que ocupa quase todo interior do ovo) compreende os principais estádios da organogênese: o nosso estádio 5 refere-se ao início da formação da epiderme; no estádio 6 ocorre a diferenciação do terebratório e das glândulas miracidianas, e; no estádio 7, a massa nervosa sofre condensamento nuclear. O último estádio para ambos os sistemas de estadiamento (estádio V de Vogel e de Prata e estádio 8) refere-se ao mirácidio completamente formado, antes de eclodir. Ambos os sistemas de estadiamento são, portanto, complementares. Sempre que pertinente, eles podem ser utizados em conjunto, a depender da conveniência e objetivos do estudo; 7. Apesar dos esforços empregados durante a realização desse trabalho (tratamentos químicos, físicos e enzimáticos), a casca do ovo permanece como uma limitação técnica à impregnação por resinas, à realização de imunomarcações e a uma melhor visualização do embrião em preparados inteiros. Novas tentativas para a sua remoção devem ser realizadas; 8. As técnicas de visualização de ovos inteiros (em ovos isolados e no oograma) apresentadas nessa dissertação parecem promissoras na busca de alterações fenotípicas durante a embriogênese em avaliações in situ e in vitro de drogas esquistossomicidas, bem como em estudos moleculares pela técnica de RNA de interferência. É possível que a remoção da casca melhore a visualização do embrião, 171 Considerações Finais Dissertação de Mestrado o que provavelmente facilitaria a construção de mapas de destino celular e outros estudos; 9. A comparação estatística da área média dos ovos durante seu desenvolvimento in vitro e in vivo indica que a idade dos ovos e o ambiente no qual eles se desenvolvem interagem para determinar seus tamanhos durante o amadurecimento. As diferenças significativas observadas na área média estimada para essas duas condições sugerem que o amadurecimento dos ovos ocorre a taxas desiguais, já que a morfologia entre os estádios correspondentes pareceu similar. Ovos mantidos em cultura (RPMI-1640) atigiram a maturidade e liberaram larvas viáveis, que infectaram caramujos B. glabrata; 10. Quando comparado com os ovos no hospedeiro, a ausência de sinais de morte (recente) em ovos mantidos em cultura dificulta a precisa avaliação do desenvolvimento embrionário nessas condições. O emprego da sonda fluorescente Hoechst 33258 para diferenciar ovos mortos não foi satisfatório quando em conjunto com a técnica do carmim clorídrico; 11. A fusão celular é um evento-chave durante a embriogênese dos ovos de S. mansoni. Eventos de fusão celular ocorrem na formação dos envoltórios da casca, na diferenciação da epiderme e da glândula apical. O(s) mecanismo(s) de fusão, no entanto, permane(m) desconhecido(s) para S. mansoni; 12. Sinais de apoptose (núcleo picnótico) foram identificados durante a clivagem tardia, o estádio de blástula e a organogênese inicial. Estudos adicionais devem ser realizados para avaliar seu papel na homeostasia tecidual durante a formação e rearranjo de tecidos; 13. Tradicionalmente, a formação de granulomas está associada à presença de ovos maduros viáveis. Os ovos liberam para o meio circundante glicoproteínas imunogênicas ao hospedeiro. Previamente, tais proteínas foram localizadas no envoltório interno do ovo (envoltório de von Lichtenberg). Nossos resultados apontaram para uma marcada mudança no perfil de reação ao PAS (que evidencia glicoproteínas neutras) durante o desenvolvimento dos ovos. A partir do estádio 4, o envoltório interno em diferenciação passou a apresentar gradual reação positiva ao PAS. Isso corrobora a literatura disponível, que atribuí a essa estrutura um 172 Considerações Finais Dissertação de Mestrado importante papel na produção e liberação de antígenos do ovo para o meio periovular. 14. Em seguida, a diferenciação das glândulas miracidianas (a partir do estádio 6) também foi acompanhada por uma grande produção citoplasmática de glicoproteínas neutras grânulares (positivas à reação de PAS). Em ovos maduros, tais conteúdos glandulares foram secretados para o interior do ovo. É possível, portanto, que o material glandular também contribua para a formação de granulomas. Como proposto anteriormente, além de seu papel na produção antigênica, o envoltório interno pode também atuar com uma barreira de lenta e gradual liberação antigênica. Nesse caso, a diferenciação das glândulas miracidianas reforçaria o cenário de granulomatogênese apenas ao redor de ovos maduros, visto que a produção de glicoproteínas somente tem início tardiamente durante o desenvolvimento. Os ovos maduros apresentaram-se fortemente positivos à reação de PAS. Estudos imunoistoquímicos e histoquímicos (lectinas) devem ser realizados para avaliar o papel da diferenciação glandular durante a granulomatogênese; 15. Filogeneticamente, o desenvolvimento dos ovos de S. mansoni apresentou-se bem similar ao padrão rabdocelo. Isso reforça a posição filogenética atual desses dois grupos. Por sua vez, as diferenças morfológicas observadas na embriogênese de S. mansoni podem estar associadas à aquisição do hábito de vida parasitário; 16. Os miracídios de S. mansoni parecem possuir uma “variação” das células totipotentes (neoblastos) de outros platielmintos (p.ex. planárias). Essas células (células germinativas) darão origem aos esporocistos durante a infecção do hospedeiro invertebrado. As células germinativas apresentam características histológicas e ultraestruturais de células imaturas (blastômeros) e são de difícil identificação durante os estádios iniciais da embriogênese (por se assemelharem aos blastômeros). É possível, portanto, que as células germinativas sejam células embrionárias que não sofreram diferenciação durante o desenvolvimento, mantendo suas características totipotentes. No entanto, o papel das células germinativas na regeneração de partes do miracídio é desconhecido; 17. O postulado de que a sequência temporal em que eventos morfogenéticos homólogos ocorrem e a estrutura espacial em que eles se desdobram é 173 Considerações Finais Dissertação de Mestrado suficientemente similar entre alguns táxons de platielmintos mostrou-se válida também para S. mansoni, mas com algumas adaptações; 18. O sistema de estadiamento introduzido por Hartenstein e Ehlers (2000) revelouse de grande valor para detalhar e classificar o desenvolvimento da embriogênese do ovo de esquistossomos. Entretanto, investigações ultraestruturais necessitam ainda serem realizadas; 19. Acreditamos que o sistema de estagiamento descrito nessa dissertação contribuirá significativamente para uma melhor compreensão da biologia dos ovos de esquistossomos, especialmente na determinação (por imuno-histoquímica) espaço-temporal da produção e liberação de antígenos do ovo; 20. Estudos adicionais com imunomarcadores (de preferência, anticorpos monoclonais) são necessários para uma completa discriminação e definição da morfogênese de cada órgão da larva (miracídio). 174 Referências bibliográficas Dissertação de Mestrado VI- Referências Bibliográficas 175 Referências bibliográficas Dissertação de Mestrado VI- Referências Bibliográficas Abath FG, Morais CN, Montenegro CE, Wynn TA, Montenegro SM. Immunopathogenic mechanisms in schistosomiasis: what can be learnt from human studies? Trends Parasitol. 2006 Feb;22(2):85-91. Abbas AK, Lichtman AH. Imunologia Celular e Molecular. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005. Abouel-Nour MF, Lotfy M, Attallah AM, Doughty BL. 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