Filosofia do esporte, ética e Educação Física, fair play ANDRÉ CODEA, HERON BERESFORD, LAMARTINE DACOSTA E ALBERTO REPPOLD Philosophy of sport, ethics and physical education, fair play Sports philosophy refers internationally to the conceptual analysis and to the questioning of sports practices and areas related to them (games, physical exercises, dance, physical education, biosciences, etc), examining major themes on ethics, epistemology, metaphysics, theory of values and aesthetics, involving the use of the body as either physical or institutional activity. Sports philosophy not only deals with insights of various fields of philosophy, but above all it generates comprehensive interpretations of sports in themselves (ICSSPE, Vade Mecum, 2000). For the appreciation of this branch of knowledge and reflection in its development in Brazil, this chapter initially describes the tradition of ethics associated with the practice of physical exercises, which arrived with Jesuit priests in 1549. This influence lasted for 200 years in the national educational system. At the end of the 18 th century, physical education, still rudimentary in Brazil, started to be understood as belonging to the hygienist medical area, but it kept its tradition linked to morals values, tendency that survived until the end of the 19th century. The very first book on physical education and sports related to philosophy was published in Brazil in 1941. The concepts presented in that work were close to the ones used and internationally followed today. Few and occasional Brazilian initiatives in sports philosophy began to appear in the 1940s. This situation was only altered in the late 1990s, when the academic production in this area became varied and regular. The sports philosophy themes that prevailed in Brazil between the 1940 and 2000 were: ethics in physical education and meaning of sports in Ancient Greece (1940s); philosophical principles of sports (1970s); epistemology (1980s); body culture, aesthetics, principles, moral development, ethics, fair play and values (1990s); and ethics, epistemology and philosophy of science (2000s). In 2003, the II Seminário de Ética em Educação Física (2nd Seminar on Ethics in Physical Education) took place in Foz de Iguaçu-PR, southern Brazil, with more than 100 participants and 21 papers presented. Definições e origens A filosofia do esporte refere-se à analise conceptual e à interrogação das práticas esportivas e áreas a elas relacionadas (jogos, exercícios físicos, dança, Educação Física, biociências etc), examinando-se temas substantivos de ética, epistemologia, metafísica, axiologia e estética, envolvendo o uso do corpo como atividade humana ou institucional. A filosofia do esporte não somente lida com insights de vários campos da filosofia, mas sobretudo gera interpretações compreensivas do esporte em si mesmo. Do ponto de vista de método de investigação, a filosofia do esporte é aparentada com a história como também se orienta por argumentação, interrogação e diálogo de modo sistemático, quer por meio de análise – ou crítica -, ou síntese, isto é, de forma especulativa. A questão mais geral encontrada neste ramo da filosofia, concerne à natureza e aos propósitos do esporte e áreas congêneres (McNamee, 2004; ICSSPE Vade Mecum, 2000). As raízes da filosofia do esporte se confundem com a própria origem da filosofia desde que Platão em sua obra seminal “A República” identificou a ginástica e a música (as artes em geral) como bases da educação. No Brasil, como nos demais países de cultura ocidental, o ponto de partida para estudos filosóficos envolvendo atividades físicas apoiou-se na Antiga Grécia e na Educação Física, sendo Inezil Penna Marinho (RJ) o pioneiro neste ramo de conhecimento em livro de 1941. Embora, a filosofia da Educação Física e do esporte tenha tido no Brasil poucas adesões entre acadêmicos, houve tendências dominantes desde Penna Marinho a saber: ética na Educação Física e sentido do esporte na Grécia Antiga (década de 1940); fundamentos filosóficos do esporte (década de 1970); filosofia da Educação Física stricto sensu e epistemologia (década de 1980); cultura corporal, estética, fundamentos, desenvolvimento moral, ética - incluíndo fair play e valores (década de 1990); e ética e epistemologia (década de 2000). Hoje, é plausível considerar o tema da ética como o fio condutor da filosofia do esporte no Brasil. A ética, por sua vez, pode ser definida como a ciência da moral. É justamente através de algum princípio ético (como o princípio ético do dever, de Kant) que se pode avaliar se o agir ou o comportamento de algum indivíduo ou de um determinado grupo social deve ser considerado como moral. A Moral é aquilo que uma determinada sociedade aceita como sendo certo, ou justo, num determinado espaço de tempo, acerca da conduta ou do comportamento social de seus integrantes. Esta expressão possui termos correlatos. O Fair Play — que não possui tradução exata para o português, sendo comumente referido como “jogo limpo” (também são usadas as expressões correto, honesto, legal) ou “espírito esportivo” — corresponde a um preceito normativo genérico de bom comportamento individual e coletivo, e respeito às regras das competições esportivas. No Brasil a primeira referência sobre a Ética e a Moral associadas à prática de exercícios físicos surgiu com a chegada dos Jesuítas, em 1549. Como referencial básico, a Ratio Atque Instituto Studiorum, que em 1599 sofreu alterações passando a chamar-se Ratio Atque Instituto Studiorum Societatis Jesu, foi o pressuposto basilar da educação jesuíta, cuja existência perdurou aproximadamente por 200 anos. A moral da Ratio consistia na idéia da construção de um Homem bom a partir da harmonização de três postulados básicos: a natureza, o hábito e a razão, que por sua vez contemplavam três momentos da educação moral: a educação física, a educação do caráter e a educação intelectual. No caso da educação física, esta era executada à tarde, após os outros momentos, com a finalidade de liberar a tensão gerada por tal educação. 1787 Publicação do “Tratado de Educação Física e Moral dos Meninos de ambos os sexos traduzidos do Francês em linguagem Portuguesa pelo Bacharel Luiz Carlos Moniz Barreto” que, embora uma publicação portuguesa, foi divulgado no Brasil por sua situação colonial. Possuía cinco de seus sete capítulos dedicados à Educação Física e moral dos meninos, do nascimento aos 20 anos. A partir deste marco, houve várias obras similares de produção portuguesa e brasileira criando uma Educação Física rudimentar e calcada em nexos de comportamento moral e de preceitos higienistas (ver “Positivismo na Educação Física e Esporte” neste Atlas), que sobreviveu até o final do século XIX. Décadas de 1970 Este período foi em princípio fundacionista como se verifica pelo exame do livro “Fundamentos Filosóficos da Educação Física”, de Mauro S. Teixeira, de São Paulo-SP. Contudo, o impacto da obra foi mínimo por carência de interlocutores. Mas Inezil Penna Marinho ainda permanecia ligado aos temas filosóficos, voltando-se também para o fundacionismo como se pode verificar com a publicação em 1971 de “Hedonismo (A Filosofia do Prazer) – De Platão e Aristóteles e Freud e Marcuse – Os Desportos como Fonte de Prazer”. No exterior, em 1972, foi fundada a Philosophic Society for the Study of Sport-PSSS, que hoje se denomina International Association for the Philosophy of Sport-IAPS, e que desde 1974 serve de base ao Journal of Philosophy of Sport (ver site Human Kinetics) e promove um encontro annual (IAPS Annual Meetings). 1790 Publicação do “Tratado da Educação Física dos Meninos para uso da Nação Portuguesa publicado por ordem da Academia Rural das Ciências de Lisboa”, pelo Dr. Francisco de Melo Franco, brasileiro e agregado à Universidade de Coimbra, em Portugal. Da mesma forma que a publicação de 1787, o estudo chegou ao Brasil, e continha doze capítulos, sendo o capítulo X dedicado ao exercício, e os capítulos VI e VII dedicados à educação moral. Estava criada a tradição e no ano seguinte, também em Portugal, publicou-se “Tratado de Educação Física dos Meninos para uso da Nação Portuguesa por ordem da Academia Real das Ciências por Francisco José de Almeida” Século XIX Em 1819, surge em Portugal e no Brasil uma nova publicação do Dr. Francisco de Melo Franco, “Elementos de Higiene ou Ditames Teoréticos e Práticos para conservar a saúde e prolongar a vida”, que apesar de ser um trabalho sobre higiene, possuía um capítulo dedicado à influência do físico sobre o moral, e outro, dedicado à influência do moral sobre o físico. Em 1829, imprimese no Brasil, na cidade de Recife-PE “Tratado de Educação Física – Moral dos Meninos”, de autoria de Joaquim Jeronymo Serpa, dentro da tradição da educação moral e dos exercícios higienistas. Esta obra é possivelmente a primeira produção em Educação Física impressa no Brasil (ver capítulo “Editoras de livros de esporte, Educação Física e lazer” neste Atlas). De qualquer modo, a tradição da postura moral em exercícios físicos estendeu-se no país ao âmbito da medicina tendo lugar a várias teses de médicos em busca de títulos doutorais sobre este tema. Em conjunto estas obras demarcam um período voltado para o aperfeiçoamento moral, contudo mais doutrinário do que filosófico, em face a que se apoiavam em nexos positivistas e de ordem jesuíta. Década de 1940 Após um período de pouco avanço na área, desde o início do século, são retomadas as publicações acerca do tema da ética na tradição primeva da Educação Física brasileira, por iniciativa de Inezil Penna Marinho, então professor da antiga Escola Nacional de Educação Física e Desportos-ENEFD, situada na cidade do Rio de Janeiro (hoje Escola de Educaçao Física da UFRJ). A obra de destaque desta fase foi o primeiro código de ética relacionado à Educação Física: “Obrigação dos professores de educação física nos estabelecimentos de ensino secundário”, publicada em 1941. No ano seguinte publicou-se “A influência da Educação Física na formação e correção do caráter”, conciliando Penna Marinho – também formado em Direito além de Educação Física - com a tradição. Mas o mesmo autor inaugurou o debate filosófico de esporte em 1945, ao publicar “Os clássicos e a educação física”, em que revivia o momento grego antigo buscando-lhe os fundamentos da prática. Década de 1980 Em 1983, publicação do Código de Ética do Educador Físico-Desportivo-Recreativo, por Jacinto Targa (1983), com base referenciada pelo autor como produção da Academia Olímpica Internacional, Grécia, emitida em Antiga Olímpia, no ano de 1975. Além do apelo à tradição, Inezil Penna Marinho consolida explicitamente a área com a obra “Introdução ao estudo da filosofia da educação física e dos desportos” (Editora Horizonte, Brasília, 1984). Esta década foi também marcada pela influência de Manuel Sérgio, português, formado em filosofia em seu país, que se fixou no Brasil, atuando como professor na Escola de Educação Física da Universidade de Campinas-UNICAMP. Em sua nova função Manuel Sérgio, levantou o debate da epistemologia a qual seria em sua opinião o horizonte de interrogação da Educação Física, inclusive modificando seu status ao considerá-la ‘Ciência da Motricidade Humana’ (Manuel Sérgio, 1988, p.18). Manuel Sérgio teve intensa participação acadêmica no Brasil – incluindo publicações várias – e estendendo o debate até o início da década seguinte, o que afinal favoreceu o crescimento de atenções sobre as temáticas filosóficas das atividades físicas. Em 1989, a Secretaria de Educação Física e Desportos do Ministério de Educação-SEED, órgão do MEC, publica “Valores Humanos, Corpo e Prevenção”, livro coletivo no tema dos exercícios físicos para a saúde com a participação de seis autores médicos e dois doutores em filosofia: Lamartine DaCosta (RJ) e Silvino Santin (RS). Os autores de especialização filosófica definiram na introdução e em suas contribuições ao livro, as interrogações da atividade física em geral dentro da moldura axiológica humana, reforçando assim indiretamente o papel da filosofia do esporte como disciplina de fundamentos para as demais relacionadas às atividades físicas no ambiente acadêmico brasileiro. Década de 1990 Neste período a filosofia do esporte produzida no Brasil alcança finalmente regularidade e delimitação de abordagens, saindo do casuísmo e oscilações, em que pese o reduzido número de especialistas e protagonistas diversos. Os temas dominantes da época foram cultura corporal, estética, fundamentos, desenvolvimento moral, ética, fair play e valores. O destaque do período foi Silvino Santin da Universidade Federal de Santa MariaUFSM, da cidade do mesmo nome no RS. Santin fez seu doutorado em filosofia na Universidade de Paris IV, Sorbonne (1971-1974), e voltando ao Brasil, escreveu oito livros nos temas da corporeidade, ética, estética, filosofia da ciência e axiologia abordando questões da Educação Física e lazer, ao longo da década de 1990 e embora não fosse formado em Educação Física. Além desta produção, Santin fez-se presente como convidado em diversos congressos e outros DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S DO ESPORTE NO BRASIL. RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006 18. 89 eventos acadêmicos de Educação Física, constituindo um efetivo vetor da popularização da filosofia do esporte no Brasil, sem que usasse tal expressão mas adotando posturas bem próximas as definições atuais do Vade Mecum-2000 do International Council of Sport Sciences and Physical Education-ICSSPE, expostas no início do presente capítulo. Em meados da década Santin transferiu-se para o mestrado em Educação Física da UFRGS, onde se aposentou mas deu continuidade ao seu envolvimento com a filosofia do esporte. Nesta meados da década, Antônio Roberto Rocha Santos (PE) recebe o título de Doutor em Ciências do Desporto pela Universidade do Porto, Portugal, defendendo tese sobre o fair play e a ética no esporte. 1993 - 1994 Publicação do artigo ‘Avaliação do desenvolvimento moral de adolescentes em relação a dilemas morais da vida diária e da prática esportiva’, por José Luis Lopes Vieira (Revista da Educação Física da Universidade Estadual de Maringá, v. 4, n. 1, p. 34, 1993). Este trabalho sinalizou o aparecimento de pesquisas em ética nos esportes por estudantes de mestrado e doutorado, bem com por professores da graduação em suas contribuições para congressos, descentralizando o saber ainda concentrado em poucos expoentes. No ano seguinte, Eduardo Montenegro, na Universidade Gama Filho do RJ, defendeu sua dissertação de mestrado relativa a uma pesquisa de campo sob a denominação “Educação Física e o desenvolvimento moral do indivíduo numa perspectiva Kohlberguiana”. Também em 1994, Maria da Graça Lisboa e Rosane Maria Batista Pereira, professoras da graduação em Educação Física da Universidade Estadual do Rio de Janeiro-UERJ, publicam o livro “Filosofia da Educação Física” (Edições EST, Porto Alegre), reforçando assim a área de fundamentos das atividades físicas. 1994 Lançamento do livro ‘A ética e a moral social através do esporte’, de Heron Beresford, pela Editora Sprint (RJ), que representou um passo à frente na literatura sobre o tema no Brasil pois era produto não só do fazer acadêmico, como em Santin, mas também representava uma linha de pesquisa em operação regular e de formação de outros pesquisadores, em duas universidades do RJ – UERJ (graduação) e Universidade Castelo Branco-UCB (mestrado). Beresford era e permanece professor de Educação Física com doutoramento em filosofia. 1996 Retomada do debate epistemológico da Educação Física por meio de um número especial da revista ‘Motus Corporis’ da UGF, Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Educação Física, reunindo os doutores Go Tani (USP), Mauro Betti (UNESP) e Hugo Lovisolo (UGF). Nesta fase, a preocupação situou-se mais em questionamentos do estatuto da Educação Física como ciência autônoma, em oposição aos posicionamentos de Manuel Sérgio. A conseqüência principal desta disputa acadêmica foi a da criação de linhas de pesquisa em epistemologia da Educação Física na Universidade Estadual de SPUNESP, em Piracicaba-SP, e na UGF, no RJ. 1997 Lançamento do texto de Pedro Ângelo Pagani, ‘A prescrição dos exercícios físicos e do Esporte no Brasil (1850-1920): cuidados com o corpo, Educação Física e formação moral’ (In Ferreira Neto, Amarílio (org). Pesquisa histórica em Educação Física 2. Vitória, Ed. da UFES, 1997). Esta contribuição constituiu uma revisão histórica da moral do esporte no Brasil, criando bases para as interpretações que se sucederam, incluindo este capítulo. Neste ano realizou-se a primeira edição do Fórum Olímpico no RJ, promovido pela UGF com 40 participantes e 13 trabalhos apresentados (coordenação de Lamartine DaCosta). Este evento – 18.90 DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S DO ESPORTE NO BRASIL. originalmente liderado pela Academia Olímpica Brasileira–AOB, órgão do COB - desde então tem incluído trabalhos sobre ética e fair play, tornando-se um dos sustentáculos da filosofia do esporte no país. Neste ano, Hugo Lovisolo, doutor em Antropologia Social, da UGF, publica pela Editora Sprint do RJ, ‘Estética, Esporte e educação Física’, ampliando a compreensão da filosofia do esporte por uma de suas principais vertentes de estudo. Guiraldell 1999 Defesa de Dissertação de Mestrado ‘Fair Play, que Fair Play?! Doutrina, ou exercício da moral?’, por Fernando Antônio dos Santos Portela, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Gama Filho, sendo orientador o Prof. Dr. Lamartine DaCosta. A este estudo se sucedeu o Grupo de Pesquisas sobre Estudos Olímpicos, no modelo CAPES-CNPq, o qual passou a incluir de modo regular estudos éticos e de fair play. O Grupo de Pesquisas da UGF em temas olímpicos incorporou a experiência de vínculos com a Academia Olímpica Internacional, na Grécia, onde Lamartine DaCosta atuava desde 1992 como conferencista e orientador de alunos de pós graduação (ver capítulo ‘Estudos Olímpicos’ neste Atlas). Neste particular, a filosofia do esporte em versão brasileira ganhou mais um ponto de apoio, traduzido por intercâmbio com o exterior. 2000 Neste ano, Alberto Reppold (RS) defende sua tese de doutorado na Universidade de Leeds, Inglaterra, na área de filosofia do esporte e em abordagem epistemológica, sob denominação de “In Search of academic identity: physical education, sport science and the field of human movement studies”. Reppold era egresso da Academia Olímpica Internacional, Grécia, e como tal por meio de intercâmbio foi admitido em Leeds e tendo como orientador um dos nomes de destaque internacional em ética do esporte, Jim Parry (ver ‘Fontes’ abaixo). Neste ano, realiza-se o I Seminário de Ética Profissional no RJ, na UCB, promovido pelo Conselho Federal de Educação Física-CONFEF (criado em 1998 pela Lei 9696) que a partir daí passou a protagonizar o desenvolvimento da ética do esporte no país. Durante o evento, três doutores especializados em ética e também formados em Educação Física – Lamartine DaCosta (UGF), Antônio Roberto Rocha Santos (UFPE) e Heron Beresford (UCB) – produziram a primeira versão do código de ética profissional em Educação Física a ser adotado pelo CONFEF. 2000 Publicação do Código de Ética da Educação Física pelo Conselho Federal de Educação Física-CONFEF, por meio da Resolução n° 25/2000. 2001 Realização do XII Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte, com o tema Sociedade, Ciência e Ética: Desafios para a Educação Física, realizado em Caxambú-MG, em outubro deste ano (ver capitulo correspondente ao CBCE neste Atlas). 2002 Realização do Fórum Olímpico 2002, com vários temas dedicados ao esporte olímpico, e em especial o tema Filosofia e Olimpismo, Ética Profissional, Violência, Doping e Fair Play nos Esportes, realizado no Rio de Janeiro-RJ, em julho deste ano. Este evento gerou seis livros, à época editados em CD-ROM. 2003 Realização em Foz do Iguaçu-PR (janeiro), do II Seminário de Ética Profissional em Educação Física, com cerca de cem participantes e 21 contribuições apresentadas. Situação Atual A filosofia do esporte no Brasil possui tradições próprias e tem tido poucas relações com exterior em seu RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006 desenvolvimento. Contudo, em 2004, foi publicado o livro “Ética Profissional em Educação Física”, pela Editora Shape do RJ, contendo as contribuições do Seminário do ano anterior de Foz de Iguaçu-PR (299 páginas). Estes trabalhos possivelmente refletem hoje direções de pesquisas e a ordem de grandeza da filosofia do esporte no Brasil, uma vez que o evento citado reuniu cerca de 100 pessoas, incluindo nomes tradicionais – Santin, Beresford, DaCosta, Rocha Santos, Reppold – e os participantes dos dois grupos de pesquisa mais produtivos do país em ética em esporte e fair play (UCB/UERJ de Beresford e UGF de DaCosta). Neste conjunto incluem-se também novos doutores formados no exterior e outros especialistas de adesão recente aos temas filosóficos de vieses esportivos no país. Nestas condições, há possibilidades de que esta temática filosófica já tenha uma massa crítica que lhe dê autosustentação e incentive maiores relações com outros países além do que foi feito até o momento via Academia Olímpica InternacionalGrécia. Na graduação de Educação Física, por exemplo, a ética como disciplina colocou-se em 14º. lugar entre outras 82 oferecidas pelas faculdades da área em levantamento de 1997 (amostra de 25% do total de faculdades do país), segundo informa DaCosta (1999). Neste inventário cabe ainda relevar a área de epistemologia cuja sustentação tem sido sinalizada com o funcionamento regular desde 2000 do Grupo de Trabalho Temático (GTT) do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte-CBCE, com a elaboração de “...estudos dos pressupostos teórico-filosóficos presentes nos diferentes projetos de delimitação da Educação Física como um possível campo acadêmico/científico”. Tal iniciativa somada aos já mencionados Grupos de Pesquisa e disciplinas envolvendo a epistemologia das atividades físicas em universidades brasileiras, sugere uma vertente adicional em crescimento e se sobrepondo aos estudos éticos da tradição. Fontes McNamee, M. J. Philosophy of sport. Journal Nurs Philosophy, vol. 5, no. 2, 2004, pp. 182 – 183; Osterhoudt, R. G., Simon, B. & Volkwein, K., Philosophy of Sport. In ICSSPE Vade Mecum – Directory of Sport Science, ICSSPE, Berlin, 2000, pp.107 – 121; McNamee, M. J. & Parry, S.J., Ethics & Sport, Routledge, London, 2002; Sérgio, M. Para uma Epistemologia da Motricidade Humana, Compêndium, Lisboa, 1988; SEED – MEC, Valores Humanso, Corpo e Prevenção, Quintas, G. (ed), 1989; Santin, S. Educação Física, Ética, Estética e Saúde. Edições EST, Porto Alegre, 1995; DaCosta, L.P. Olympic Studies, Editora UGF, 2002; Beresford, H. A Ética e a Moral Social através do Esporte. Rio de Janeiro: Sprint, 1994; Coletânea de textos em estudos olímpicos, Editores Marcio Turini & Lamartine DaCosta. Rio de Janeiro, Editora Gama Filho, 2002: Constantino, Márcio Turini. A prática do Fair Play no contexto da culturalidade: Análise de atividades de Fair Play em olimpíada escolar como reforço do desenvolvimento do espírito esportivo, Rubio, K. et al. A Areté e o Fair Play na organização do Movimento Olímpico Contemporâneo, Belém, C. M., Valores do Fair Play nas aulas de Educação Física e na prática esportiva dos alunos das Escolas Agrotécnicas Federais; Marinho, I. P. História da Educação Física no Brasil. São Paulo, Cia. Brasil, 1979; Marinho, I. P. Obrigação dos professores de educação física nos estabelecimentos de ensino secundário. Boletim de Educação Física, Rio de Janeiro.v.1, n.1, p.85-90, jun. 1941; Targa, J. Código de Ética do Educador FísicoDesportivo-Recreativo. Educação Física e Desportos, n. 4, p. 43, set 1983; www.epistemologiaeducacaofisica.hpg.ig.com.br/; DaCosta, L.P. Formação Profissional em Ed. Fis. no Brasil. Editora Furbe, Blumenau, 1999. A philosophical approach to Olympism LAMARTINE DACOSTA In “Olympic Studies”, 2002 Amateur Athletic Foundation of Los Angeles (www.aafla.org/search/search.htm) Writing of the philosophical foundation of modern Olympism in 1935, Pierre de Coubertin notes that “célébrer les Jeux Olympiques, c’est se reclamer de l’histoire” (1). Our times are clearly very different. All those sport academics who claim for more precise definitions of Olympism, surely have good grounds for doing so. But, only a few of them have been making use of adequate historical accounts in order to support their arguments. There are some attempts to move beyond this epistemological challenge. Hans Lenk aimed to relate Olympism to a social philosophy. Nobert Mueller takes another view since this philosophy should be educational. Jim Parry in turn proposes a philosophical anthropology. Lamartine DaCosta forwards a “process philosophy” in the sense of an ongoing development of Coubertin’s traditional conception of “philosophy of life” embodied by the Olympic Charter. But are we right in understanding Olympism in an ought-to-be framework? Aren’t we simply applying intersecting viewpoints from different disciplines of knowledge to construct Olympism? Yet at this point it may rightly be retorted that the way in which we all have stated the problem is misleading. Perhaps most of the efforts to define Olympism have been unhistorical in their nature, that is, in observing its qualities in practical circunstances. And to solve an epistemological problem, historical standpoints are still one the best preferred option among philosophers. After all, history is often considered the locus classicus of epistemology. Following my former suggestion that Olympism is mostly a composition of narratives on Olympic ethos created and celebrated by its adherents, let us in the light of such assumption search the subject-matter of the actual Olympic past. Doing so, we aim to disclose core meanings of Olympism in the overall historical process of the Olympic idea development. To begin, it is convenient to proceed to another presupposition that experiences of Olympism involve characteristically tensions originated by oppositions when shifting from a social or cultural situation to another. This initial hypothesis has as an argumentative ally the narrative of Socrates’ judgement that lies in the foundational thinking of western thought, including Olympism as far as Coubertin had reshaped the Olympic idea from ancient Greek culture. Thus far, in the famous judgment against Socrates in 399 B.C. a reference was made to Olympic athletes that is still thoughtprovoking to contemporary observers. As Plato describes in his Apologia, Socrates appealed to his judges for the same treatment meted out by tradition to Olympic Games heroes, if fraternity in the polis was the point at issue rather than public accusations. The verdict has remained an important issue in moral discussions ever since. Socrates was condemned to death for alleged corruption of youth, despite a life dedicated to making his fellow citizens good and wise. In fact, the philosopher and forefather of ethics suggested his own condemnation for the sake of the Athenian city-state, giving no alternative to the judges, who had to obey the law when the accusations were acknowledge as truthful. It was equally clear that the institution which provided justice should be preserved even when doing wrong. This Socratic decision remains, for skeptics, an instance of ethical relativism, an ambivalence expressed and defined in an Aristotelian epigram: “Fire burns both in Hellas and in Persia; but men’s ideas of right and wrong vary from place do place”. It is no coincidence that Olympic athletes were referred to by Socrates when he called for recognition of his efforts to improve the citizens’ social and political relations. In fact, by the 5th century BC the Olympic Games were a gathering of poets, musicians and sophists as well as athletes, all of them competing in public performances. This peculiar spirit of competition was in contradiction with the ideal of Socrates, in his search for the truth, as he proposes an exchange of arguments without winners or losers, in exact opposition to the sophist teaching. This contradiction explains the skepticism and relativism with which Socrates was interpreted by Protagoras and Gorgias, eminent sophists of Ancient Greece. By contrast, the far-reaching repercussions of Socratic conduct on western philosophy are due primarily to the fact that justice and fairness are more easily recognized by their opposites. Socrates played on this in order to sacrifice himself as a moral lesson to the polis. This historical hint has, eventually, been followed up by modern institutions which encourage ethical attitudes, including the Olympic Movement of our time. As a result, Olympism is primarily bound up in paradoxical choices, namely how to curb corruption in sports competition and management and preserve sports organizations – usually the source or agents of misconduct – while pursuing purely educational and pedagogical goals (the so-called Kalos Kagathos). For their part, sports leaders today raise objections and questions about unfairness in athletic behavior, without necessarily putting forward any answers. The emphasis on the educational purposes of Olympism can thus be seen as a source of the contradiction which exists within sport, namely the attempt to keep institutions alive while pointing our their mistakes and defects. But if Socrates’ ethical philosophy is fully taken for granted otherwise, his dramatic moral attitudes imply a real impossibility of finding answers. Among philosophers this situation has then been called aporia, the Greek word of puzzlement, meaning the cognitive perplexity posed by statements in opposition. This natural outcome eventually brought out by interrogations seems furthermore to be at the heart of the practical problems of present-days top sport. Coubertin himself became “aporetic” when he began to criticize the misconduct of sports practice shortly before his death in 1937. In this instance, the ethical questioning of Olympism should not be about choices, as usually stated, but about how to reconcile opposing attitudes. In other words, the supposed opposition will become real if Olympism decides to treat its difficulties in the context of a crisis, a choice similar to that of Socrates at his judgment. Conversely, however, assuming that sports conflicts are a natural risk, the Olympic Movement will be dealing with aporias, implying a constant exchange of arguments and solutions, as the early Socratic basic thinking suggested for those seeking a virtuous life in the polis. On the basis of these facts and speculations, it is possible to contend that sport, in seeking aretê (excellence), is naturally aporetic. Paraphrasing Alasdair MacIntyre when he discusses excellence, sport involves rules as well as achievements so far we cannot reach the latter without accepting the former. Although this interplay justifies competition - de justus est disputandum -, individual’s achievements in sport usually put aside external authority. In short, according to MacIntyre, this apparent contradiction has to be understood historically because “the sequences of development find their point and purpose in a progress towards and beyond a variety of types and modes of excellence”(2). Then, skeptics of former times as well as many sports scientists and philosophers of the present day apart, historical experience should be ahead of knowledge production, favoring an attitude which perceives sport in terms of its contradictions. Indeed, alongside proposals for education, self-realization and cooperation based on modern Olympic ideals unresolved conflicts have emerged persistently over the years since the first Olympiad of modern times in 1896. Experience is therefore likely to reveal that Olympic ethics lags behind the ongoing process of cultural, economic and political change in many societies. Of course, spectacle, professionalism, nationalism and sectarianism are factors which have played a historical role in the weakening of the humanistic values of sport, but when facts are compared with updated interpretations of Olympism, an element of incompatibility still remains. On the other hand, the reactions of sports institutions and leaders have been characteristically reductionist and contingent, expressing the inside view of sport. For this ethicist, a dependable ethics for top sport should be related to contextual factors so as to fit in with the plurality of values on which today’s sports practice is based. In short, the gap in sports ethics is primarily due to the mistaken isolation of top sports organizations - with the inclusion of IOC – from the external social environment. This solipsism is often criticized by philosophers because it represents an attempt to avoid refutations, a rationale of many religions and movements supported by ethical codes or principles. Such isolation was envisaged by Coubertin, as reported by Juergen Moltmann in a past IOA session, where he defined Olympism as a modern religion (religio athletae is an expression commonly found in the writings of Pierre de Coubertin but in the sense of conscious and full dedication to sport) (3). Now, if Olympism is to be seen in the context of broad cultural relations its radical reliance on ethical principles simply does not make sense, given the socalled “moral crisis” of nowadays which levels down all social conventions in any country or region. This argument is in itself sufficient to confirm the applicability of the notion of aporia as a prima facie interpretation of top sport in general and of the Olympic Movement in particular, alongside their historical and philosophical foundational approaches. Moreover, a comparison of sports with culture can shed light on the aporetic meaning of sport both on the competition ground and in its management. As continually emphasized by analysts of current trends, the fragmentation of social relations, the prevalence of individualism and commercial attitudes, the increasing domination of the mass media and even the breakdown of values have given rise to insurmountable conflicts in cultural production of many kinds. Much of this new trend generates questions without answers, both in sports and in various other spheres of culture. Again, rather than simply arguing “for” or “against” supposed distortions of sport, debates concerning the development of Olympism should take the reconciliation of opposites as an introductory step, adopting an aporetic line of reasoning. This choice is valid either in addressing social or cultural interrogations of present times. For that, the old Greek philosophy is still helpful since the Aristotelian tradition attempted to solve aporias by introducing them initially into a higher totality as a means of reducing their problematic content. References (1) Coubertin, P., Les assises philosophiques de l’ Olympism moderne. Le Sport Suisse, 7 août 1935, p.1. In Mueller, N. (ed), Pierre de Coubertin - Textes Choisis, Tome II, Weidemann, Zurich, 1986, p. 439; (2) MacIntyre, A., After Virtue. University of Notre Dame Press, 1984, 189 – 190 (3) Moltmann, J., Olympism and Religion. International Olympic Academy, 20th Session Report, Ancient Olympia, 1980, pp. 81- 88. DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S DO ESPORTE NO BRASIL. RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006 18. 91