Moral e Práticas Islâmicas Tratar as Esposas Gentilmente Deus instrui os homens a serem bons com suas esposas e a tratá-las bem ao máximo de suas capacidades: “...E convivei com elas em gentileza...” (Alcorão 4:19) O Mensageiro de Deus disse, ‘O mais perfeito dos crentes na crença é o melhor deles em caráter. O melhor de vocês são aqueles que tratam melhor suas mulheres.’[1] O Profeta da Misericórdia nos diz que o tratamento de um marido em relação à sua esposa reflete o bom caráter de um muçulmano, que por sua vez é um reflexo da fé do homem. Como um marido muçulmano pode ser bom para sua esposa? Ele deve sorrir, não magoá-la, remover qualquer coisa que possa prejudicá-la, tratá-la gentilmente e ser paciente com ela. Ser bom inclui boa comunicação. Um marido deve estar disposto a se abrir, e estar disposto a ouvir sua esposa. Muitas vezes um marido quer expressar suas frustrações (sobre o trabalho, por exemplo). Ele não deve se esquecer de perguntar a ela o que a incomoda (como quando as crianças não fazem seu dever de casa, por exemplo). Um marido não deve falar sobre coisas importantes com ela quando ele ou sua esposa estiverem zangados, cansados ou com fome. Comunicação, comprometimento e consideração são a pedra angular do casamento. Ser bom inclui encorajar a esposa. A admiração mais significativa vem de um coração sincero que nota o que realmente importa - o que a esposa realmente valoriza. Então um marido deve se perguntar com o que ela se sente mais insegura e descobrir o que ela valoriza. Esse é o ponto chave da esposa. Quanto mais o marido elogiar, mais a esposa o admirará, mais apurado será esse hábito saudável. Palavras gentis como, “Eu gosto da forma como você pensa,” “Você fica bonita nessas roupas,” e “Eu adoro ouvir a sua voz no telefone.” Seres humanos são imperfeitos. O Mensageiro de Deus disse, “Um crente não deve odiar uma crente. Se ele não gosta de algo no caráter dela, ele deve ficar satisfeito com alguma outra característica dela.”[2] Um homem não deve odiar sua esposa porque se ele não gosta de algo nela, ele encontrará algo que ele gosta sobre ela se ele se der essa oportunidade. Uma forma de estar alerta sobre o que ele gosta em sua esposa é o marido fazer uma lista de meia dúzia de coisas que ele aprecia sobre ela. Os especialistas em casamento recomendam que se seja tão específico quanto possível e que se foque no caráter - assim como o Profeta do Islã recomendou, não apenas no que ela faz para o marido. Por exemplo, um marido pode apreciar a forma como ela organiza a roupa limpa, mas a característica subjacente pode ser que ela é atenciosa. O marido deve considerar características admiráveis como ser piedosa, generosa, gentil, devota, criativa, elegante, honesta, carinhosa, energética, otimista, comprometida, fiel, confidente, animada, e assim por diante. Um marido deve se dar algum tempo para preparar essa lista, e revê-la nos momentos de conflito quando ele está mais propenso a sentir aversão em relação à sua esposa. Isso o ajudará a ser mais consciente dos bons atributos de sua esposa e mais propenso a elogiá-los. Um companheiro perguntou ao Profeta de Deus ‘qual é o direito da esposa sobre seu marido?’ Ele disse, “Que você a alimente quando se alimentar e que a vista quando você se vestir e que não bata em seu rosto. Não fale mal dela e não se afaste dela, exceto na casa.”[3] O conflito no casamento é virtualmente inevitável e leva à muita raiva. Embora a raiva seja uma das emoções mais difíceis de administrar, o primeiro passo para o seu controle pode ser aprender como perdoar aqueles que nos magoam. No caso de conflito, um marido não deve parar de falar com sua esposa e magoá-la, mas ele pode parar de dormir na mesma cama se isso melhorar a situação. Sob nenhuma circunstância, mesmo quando ele estiver zangado ou de alguma forma sentir que é justificável, é permitido ao marido caluniar sua esposa usando palavras prejudiciais ou causar a ela qualquer injúria. Footnotes: [1] Al-Tirmidhi [2] Saheeh Muslim. [3] Abu Daud. Tratamento Humano dos Animais Deus, o Criador dos seres humanos e dos animais, fez os animais para nos servir. Nós dependemos dos animais para o alimento que comemos e o leite que bebemos. Nós trazemos os animais para nossas casas para amor e companheirismo. Nós sobrevivemos a doenças críticas e vivemos mais por causa das pesquisas biomédicas em animais. Nós visitamos zoológicos e aquários para apreciar a diversidade espetacular da vida na terra. Nós nos beneficiamos de cães especialmente treinados para detectar drogas, guiar o cego, e ajudar o deficiente. Deus diz no Alcorão: “E os rebanhos, Ele os criou para vós. Neles tendes vestimentas quentes e outros benefícios, e deles comeis. E neles tendes beleza, quando ao anoitecer os fazeis voltar para casa e quando ao amanhecer os levais para pastar. E eles carregam vossas cargas para regiões as quais não chegaríeis senão com imensa dificuldade. Por certo vosso Senhor é Compassivo, Misericordioso. E Ele criou os cavalos e as mulas e os asnos, para os cavalgardes e para os terdes como um ornamento. E Ele cria o que não sabeis.” (Alcorão 16:5-8) A misericórdia do Islã se estende além dos seres humanos para todas as criaturas vivas de Deus. O Islã proíbe crueldade com os animais. Quatorze séculos atrás, muito antes dos movimentos sobre os direitos dos animais começar com a publicação do livro de Peter Sing, “Liberação Animal,” em 1975, o Islã exigia gentileza com os animais e que a crueldade com eles era razão suficiente para uma pessoa ser jogada no Inferno! Uma vez, o Profeta da Misericórdia falou do perdão de Deus devido ao tratamento humano dos animais. Ele contou a seus companheiros a estória de um homem que ficou com sede em sua viagem. Ele encontrou um poço, desceu até a água, e saciou a sua sede. Quando ele saiu ele viu um cão ofegante lambendo a lama de tanta sede. O homem pensou, ‘O cão está tão sedento quanto eu estava!’ O homem desceu até o poço novamente e pegou um pouco de água para o cão. Deus apreciou sua boa ação e o perdoou. Os companheiros perguntaram, ‘Ó Profeta de Deus, nós somos recompensados pelo tratamento humano dos animais?’ Ele disse, ‘Existe uma recompensa por fazer o bem a qualquer criatura viva.’[1] Em outra ocasião, o Profeta Muhammad, que Deus o exalte, descreveu a punição de Deus a uma mulher que foi enviada ao Inferno por causa de um gato. Ela o manteve preso, e nem o alimentava e nem o libertava para que ele mesmo se alimentasse.[2] Em outro exemplo ele disse, ‘Não existe um ser humano que mata um pássaro ou um grande animal sem uma razão, que Deus não questionará no Dia do Juízo.’ Perguntaram a ele, ‘Qual é essa razão, Ó Mensageiro de Deus?’ Ele respondeu, ‘Ele o abate e então o come, e não corta sua cabeça e joga fora o animal.’[3] O Islã estabelece normas de abate humanas. O Islã insiste que a maneira de abate deve ser aquela que seja menos dolorosa para o animal. O Islã exige que o instrumento de abate não seja amolado na frente do animal. O Islã também proíbe o abate de um animal na frente de outro. Nunca, antes do Islã, o mundo tinha testemunhado tamanha preocupação com os animais. O tratamento islâmico humano dos animais pode ser resumido através dos seguintes pontos: Primeiro, o Islã requer que animais de estimação ou de fazenda recebam alimento, água, e um local para viver adequados. Uma vez o Profeta passou por um camelo desnutrido pela fome e ele disse: “Tema a Deus em relação a esses animais que não podem expressar a sua vontade. Se você os cavalga, trate-os de acordo (fazendo-os fortes e adequados a isso), e se você os come, trate-os de acordo (fazendo-os gordos e saudáveis).” (Abu Dawud) Segundo, um animal não deve ser espancado ou torturado. Uma vez o Profeta da Misericórdia passou por um animal marcado a ferro em seu rosto. Ele disse, ‘Não chegou a vocês que eu amaldiçoei aquele que marca ou bate em um animal na face?’[4] O Profeta da Misericórdia avisou a sua esposa para tratar com gentileza um camelo rebelde que ela estava cavalgando.[5] Fazer os animais lutarem entre si por diversão também foi proibido pelo Profeta.[6] Terceiro, o Islã proíbe usar animais ou pássaros como alvos para prática de tiros. Quando Ibn Umar, um dos companheiros do Profeta Muhammad viu algumas pessoas praticando arco e flecha usando uma galinha como alvo, ele disse: “O Profeta amaldiçoou qualquer um que faça de alvo alguma coisa viva (para praticar).” O Profeta Muhammad também disse: “’Quem quer que mate um pássaro ou qualquer outra coisa sem uma justa razão, Deus o questionará sobre isso.’ Foi dito: ‘Ó Mensageiro de Deus! O que é uma justa razão?’ Ele disse: ‘Matá-lo por comida... e não cortar sua cabeça e jogá-la!’” (Targheeb) Atirar em pombos vivos já foi um evento olímpico e hoje atirar em pombos é permitido em muitos lugares. Quarto, separar filhotes de pássaros de suas mães não é permitido no Islã. Quinto, é proibido mutilar um animal cortando suas orelhas, rabos ou outras partes do corpo sem razão justa. Sexto, um animal doente que esteja sob os cuidados de alguém deve ser tratado adequadamente. Através dessas normas e regras legisladas em relação aos animais, os muçulmanos conquistam o respeito e a compreensão de que outras criaturas não devem ser usadas e abusadas, mas que elas, como os humanos, têm direitos que devem ser observados para assegurar que a justiça e a misericórdia do Islã seja feita a todos os habitantes dessa terra. Footnotes: [1] Saheeh Al-Bukhari [2] Saheeh Al-Bukhari [3] An-Nasai [4] Abu [5] Dawud, Saheeh Muslim Saheeh Muslim [6] Abu Dawud, Al-Tirmidhi Justiça no Islã O Significado de Justiça Na visão islâmica de mundo, a justiça denota colocar algo em seu devido lugar. Também significa dar aos outros tratamento igualitário. No Islã, a justiça também é uma virtude moral e um atributo da personalidade humana, como é na tradição ocidental. A justiça está próxima da igualdade no sentido de que ela cria um estado de equilíbrio na distribuição de direitos e deveres, mas elas não são idênticas. Às vezes, a justiça é alcançada através da desigualdade, como uma distribuição desigual de riqueza. O Profeta do Islã declarou: “Existem sete categorias de pessoas a quem Deus abrigará sob Sua sombra no Dia quando não haverá nenhuma sombra exceto Ele. [Uma é] o líder justo.” (Saheeh Muslim) Deus falou a Seu Mensageiro dessa forma: “Ó Meus servos, eu proibi a injustiça para Mim mesmo e a proíbo também para vós. Então evitem serem injustos uns com os outros.” (Saheeh Muslim) Portanto, a justiça representa retidão moral e eqüidade, uma vez que significa que as coisas devem estar no lugar a que elas pertencem. A Importância da Justiça O Alcorão, a escritura sagrada do Islã, considera a justiça como uma virtude suprema. É um objetivo básico do Islã a ponto de ser a próxima na ordem de prioridade após a crença no direito exclusivo de Deus a adoração (Tawheed) e na verdade da missão profética de Muhammad. Deus declara no Alcorão: “Deus ordena a justiça e o tratamento justo...” (Alcorão 16:90) E em outra passagem: “Ó vós que credes, sede constantes em servir a Deus, e sejam testemunhas com justiça.” (Alcorão 5:8) Sendo assim, pode-se concluir que justiça é uma obrigação do Islã e injustiça é proibido. A centralidade da justiça para o sistema corânico de valores é mostrada pelo seguinte versículo: “Nós enviamos Nossos Mensageiros com claros sinais e fizemos descer com eles o Livro e a Balança de modo a estabelecer justiça entre os homens...” (Alcorão 57:25) A frase ‘Nossos Mensageiros’ mostra que a justiça foi um objetivo de todas as revelações e escrituras enviadas à humanidade. O versículo também mostra que a justiça deve ser medida e implementada pelos padrões e orientações estabelecidos pela revelação. A abordagem do Islã para a justiça é vasta e abrangente. Qualquer caminho que leve à justiça é considerado em harmonia com a Lei Islâmica. Deus exigiu justiça e, embora Ele não tenha prescrito uma rota específica, forneceu as orientações gerais de como alcançá-la. Ele também não prescreveu meios fixos através dos quais ela pode ser obtida, nem Ele declarou inválidos quaisquer meios ou métodos em particular que possam levar à justiça. Sendo assim, todos os meios, procedimentos e métodos que facilitam, refinam e promovem a causa da justiça, e não violam a Lei Islâmica, são válidos.[1] Igualdade na Justiça Os padrões corânicos de justiça transcendem considerações de raça, religião, cor e credo, já que é ordenado aos muçulmanos que sejam justos com seus amigos e companheiros igualmente, e sejam justos em todos os níveis, como o Alcorão define: “Ó vós que credes! Sedes firmes na justiça, como testemunhas de Deus, ainda que seja contra vós mesmos, ou contra seus pais e parentes, ou que seja contra rico ou pobre...” (Alcorão 4:135) De acordo com outra passagem corânica: “E que o ódio para com um povo não vos induza a se afastardes da justiça. Sede justos, porque isso está mais próximo da virtude...” (Alcorão 5:8) Com referência às relações com não-muçulmanos, o Alcorão também declara: “Deus não vos proíbe de fazerdes o bem e serdes justos com aqueles que nem vos combateram na vossa religião nem vos fizeram sair de vossos lares...” (Alcorão 60:8) Os eruditos do Alcorão concluíram que essas normas se aplicam a todas as nações, seguidoras de todas as fés. Na verdade, a toda a humanidade. [2] Na visão do Alcorão, justiça é uma obrigação. É por isso que foi dito ao Profeta: “...Se julgas, julga entre eles com justiça...” (Alcorão 5:42) “Fizemos descer para ti (Muhammad) a escritura com a verdade, a fim de que julgues entre os homens conforme o que Deus te ensinou.” (Alcorão 4:105) Além disso, o Profeta foi enviado como um juiz entre os povos, e lhe foi dito: “...Dize: Creio na Escritura que Deus enviou e foi-me ordenado fazer justiça entre vós...” (Alcorão 42:15) O Alcorão se vê como uma escritura devotada principalmente a estabelecer os princípios de fé e justiça. O Alcorão exige que a justiça seja feita para todos, e que é um direito inerente de todos os seres humanos sob a Lei Islâmica.[3] O comprometimento eterno do Alcorão com os padrões básicos de justiça é encontrado nessa declaração: “A Palavra de teu Senhor cumpriu-se em verdade e justiça. Ninguém pode mudar Suas palavras.” (Alcorão 6:115) Prover justiça é uma custódia que Deus conferiu ao ser humano e, como todas as outras custódias, o seu cumprimento deve ser guiado pelo senso de responsabilidade, além da mera conformidade estabelecida pelas regras. Assim, o Alcorão declara: “Deus vos ordena que restituais os depósitos a seus donos e quando julgardes entre os homens, julgueis com justiça...” (Alcorão 4:58) A referência à justiça que imediatamente segue uma referência ao cumprimento de custódias indica que ela é a mais importante de todas as custódias.[4] Justiça e o Eu O conceito corânico de justiça também faz da justiça a uma virtude pessoal, e um dos padrões de excelência moral que um crente é encorajado a seguir como parte de sua consciência de Deus. Deus diz: “...Sede justos, porque isso está mais próximo da consciência de Deus...” (Alcorão 5:8) O próprio Profeta instruiu: “Sejam conscientes de Deus e sejam justos com seus filhos.”[5] O Alcorão diz aos crentes: “...Quando falardes, fazei-o com justiça, mesmo que seja contra alguém próximo a ti...” (Alcorão 6:152) Exemplos Específicos de Justiça Encorajados no Alcorão O Alcorão também se refere a situações em particular e contextos de justiça. Uma dessas situações é a exigência de tratamento justo dos órfãos. Deus diz: “E não vos aproximeis das riquezas do órfão a não ser da maneira mais justa até que ele [ou ela] atinja sua força plena. E completai a medida e pesai com justiça...” (Alcorão 6:152, ver também 89:17, 93:9, e 107:2) Negociações justas em medidas e pesos, como mencionado no versículo acima, também são mencionadas em outras passagens onde a justiça na compra, venda e, por extensão, nas transações de negócios em geral, é enfatizada. Existe um capítulo inteiro do Alcorão, Surata al-Mutaffifeen (‘Surata dos Fraudadores’, 83) onde negociantes fraudulentos são ameaçados com a ira divina. Referências à justiça também ocorrem no contexto da poligamia. O Alcorão exige tratamento eqüitativo de todas as esposas. O versículo da poligamia começa pela referência a meninas órfãs que podem ser expostas à depravação e injustiça. Quando elas alcançam a idade de casar, elas podem ser casadas, mesmo em uma relação poligâmica, especialmente quando existe uma desigualdade no número de homens e mulheres, como foi o caso após a Batalha de Uhud quando esse versículo foi revelado. Mas, como o Alcorão declara: “Se temeis ser injusto, então casai apenas uma...” (Alcorão 4:3) Concluindo, ‘promover justiça’, nas palavras de Sarkhasi, um destacado jurista muçulmano clássico, ‘se equipara aos mais nobres atos de devoção depois da crença em Deus. É o maior de todos os deveres confiados aos profetas...e é a justificativa mais forte para a gerência da terra pelo homem.’[6] Footnotes: [1] Qaradawi, Yusuf, ‘Madkhal li-Darasah al-Sharia al-Islamiyya,’ p. 177 Kamali, Mohammad, ‘Freedom, Equality, And Justice In Islam,’ (‘Liberdade, Igualdade e Justiça no Islã’) p. 111 [2] [3] Qutb, Sayyid, ‘Fi Zilal al-Quran,’ vol. 2, p. 689 Razi, Fakhr al-Din, ‘al-Tafsir al-Kabir,’ vol. 3, p. 353 [5] Riyad us-Saliheen [4] [6] Sarkhasi, Shams al-Din, ‘al-Mabsut,’ vol. 14, p. 59-60 Nascemos “para ser livres”? (parte 1 de 2): Liberdade, uma Dádiva Inestimável “O livre arbítrio é a mais difícil das dádivas de Deus para se compreender ou apreciar. A pessoa que abre mão de liberdade egoísta e concorda em ser um servo de Deus será sempre verdadeiramente livre.” A liberdade é uma das coisas mais valiosas que existe, embora muitos de nós não tenham idéia do quanto é preciosa até que ela seja perdida. É considerada um dos direitos humanos básicos, e tentar remover esse direito sem uma causa muito justa é um pecado muito sério. Todos gostamos de pensar que somos livres, e que temos o livre arbítrio quando fazemos nossas escolhas na vida – mas pensemos por um momento sobre as realidades da situação. Realmente nascemos “para ser livres”? Se sim, de que forma? O que isso significa para nós? Para começar, a quantidade de liberdade que temos de fato é muito mais limitada do que talvez percebamos. Comecemos com exemplos simples que todos podemos entender, coisas que se referem aos nossos corpos físicos. Quanta liberdade temos sobre o bocejo, espirro, suor, sangramento, respiração, digestão, ou evacuação? Quanta liberdade temos sobre o que podemos ver, ouvir, sentir, ou colocar nossos músculos ou membros para trabalhar? Eu costumava ser capaz de correr para pegar o ônibus e escalar montanhas – mas independentemente do quanto insista que sou livre para fazer isso agora, não posso mais fazê-lo. Não posso nem escolher ficar de pé; se eu digitar por um período longo minhas pernas ficam tão rígidas que simplesmente não posso fazê-lo. Não tenho nenhum controle sobre o que acontece dentro do meu corpo – não tenho idéia de como meus rins extraem matéria, ou como eles sabem o que é necessário e o que é para ser eliminado. Não tenho idéia do que faz meu coração bater, ou quando ele parará. Não posso escolher se salivo, urino, coagulo, reproduzo, deterioro ou desintegro! E considere as pessoas que são meus parentes. Não tive liberdade de escolher meus pais ou avós, ou irmãos e irmãs. Não pude escolher minha constituição genética. Tentei escolher quando meus próprios filhos nasceriam, mas não funcionou como esperava. E não tive idéia de qual seria o sexo de meus filhos, ou como eles seriam. Algumas pessoas acreditam que é apenas questão de tempo antes que sejamos capazes de mexer com a genética para produzir crianças de encomenda, mas então – claro – a pessoinha produzida não terá nenhuma liberdade sobre o que ele ou ela será fisicamente. Então, quando se considera tudo isso – não parece realmente que os seres humanos têm muita liberdade, não é? E ainda assim, a crença na liberdade do espírito humano é uma das coisas chaves que Deus revelou através dos tempos. No Islã somos ensinados que foi algo que Deus concedeu aos seres humanos e que Ele não concedeu aos anjos. Podemos não ser capazes de escolher como somos fisicamente, mas temos que escolher o que faremos em relação à atividade de nossa alma. Deus exige que assumamos o controle de nós mesmos, e façamos escolhas particulares e ajamos de determinadas maneiras – mas Ele nunca nos força. Não temos nem que acreditar Nele, e podemos escolher ignorá-Lo ou desobedecê-Lo. Milhões de pessoas o fazem. Já que isso acontece, não somos robôs programados. Não reagimos da mesma forma em determinadas situações; alguns de nós são muito mais altruístas, generosos, dispostos a perdoar e ajudar e capazes de lidar com dificuldades do que outros. Mas não temos que ser. Se virmos uma senhora na estrada com dificuldades carregando pacotes pesados, podemos escolher se a ajudamos, a derrubamos e roubamos seus pacotes, a ignoramos, ou gritamos palavras rudes e corremos. Isso leva a um pensamento interessante. Podemos nos distrair adivinhando o quê um indivíduo em particular pode fazer à senhora idosa com os pacotes. Mas todos temos um sentimento de ‘dever’; achamos que sabemos qual curso de ação a pessoa boa, a pessoa religiosa, a pessoa de consciência, deve tomar. Toda vez que dizemos que uma pessoa deve fazer algo, supomos que a pessoa é de fato livre e capaz para fazê-lo. É totalmente sem sentido dizer que alguém deve fazer algo para ajudá-la, por exemplo, se esse alguém está preso em uma cadeia, ou inconsciente, ou vivendo em um país distante. ‘Dever’ implica em ‘poder’. Agora, se Deus pode fazer qualquer coisa que queira, então seria perfeitamente possível para Ele controlar nossas mentes e nossas escolhas. É uma questão que está dentro das capacidades dos próprios seres humanos, e seria muito fácil para Deus. Entretanto, o fato Dele permitir que as pessoas escolham não acreditar Nele e não fazer o que Ele quer, demonstra conclusivamente que Deus não robotiza as mentes das pessoas. Nascemos “para ser livres”? (parte 2 de 2): O Que Deus Quer de Nós Cada um dos profetas, incluindo Abraão, Moisés, Jesus e Muhammad, ensinou que o que as pessoas escolhem com respeito à crença em Deus e obediência à Sua vontade fará uma grande diferença no resultado final de seus assuntos. Os humanos têm uma capacidade tremenda de amar e serem gentis, ou de odiar e serem destrutivos. Isso significa que embora todos tenham nascido com almas de igual valor, eles não continuam iguais. O livre arbítrio é a mais difícil das dádivas de Deus para se compreender ou apreciar. O ponto do livre arbítrio é dar significado à moralidade humana - sem ele não haveria boa ou má conduta, porque simplesmente seríamos autômatos. Se não podemos fazer escolhas realmente livres então o julgamento não nos pode ser aplicado – seria totalmente injusto. Quando as pessoas não são livres para fazer escolhas, não podem ser responsabilizadas. Aishah registrou que o Profeta, que a misericórdia e as bênçãos de Deus estejam sobre ele, deixou claro que aqueles cuja liberdade ou intelecto eram limitados – por exemplo, aqueles muito jovens ou muito ignorantes, ou cujo equilíbrio mental estivesse comprometido – não podiam ser responsáveis moralmente por suas ações, seja em um tribunal da shariah (ou um tribunal no Reino Unido, por exemplo), ou no julgamento que virá. Então, e o conceito islâmico de al-Qadr, a doutrina chave do controle final e completo de Deus sobre o cumprimento de eventos, ou Destino? Como se equilibra a idéia de Deus saber absolutamente tudo com a idéia de livre arbítrio? Se Deus sabe antecipadamente tudo que acontecerá, então certamente a vida de uma pessoa deve ser inteiramente predestinada. Além disso, se Deus não intervém para impedir que coisas em particular aconteçam, então se pode dizer que somente Ele é responsável por elas. Isso está ligado ao problema do mal. Quem é responsável pelo mal, se Deus é em última instância responsável por tudo? Um ladrão pode alegar inocência, porque certamente estava predestinado a roubar e, portanto, como poderia ser sua culpa? Muitas pessoas pensam que todos os muçulmanos são fatalistas, que acreditam que uma vez que ‘tudo está escrito’ e que Deus sabe tudo com antecedência, tudo deve estar predestinado. Nenhum cérebro humano foi de fato capaz de desvendar esse problema totalmente – certamente não o meu – mas toda a questão de Deus enviar Mensageiros com revelações certamente indica que se espera que os humanos ouçam, façam escolhas, e então ajustem suas vidas de acordo (Alcorão 6:91; 23:73). Deus de fato revelou: “Deus jamais mudará as condições que concedeu a um povo, a menos que este mude o que tem em seu íntimo.” (Alcorão 13:11) Isso parece indicar que os humanos têm o poder de mudar através de seu próprio livre arbítrio, e essas decisões alteram seus destinos. Deve ser verdade que Deus sabe tudo e toda possibilidade, mas os humanos não. Consequentemente, se um humano escolhe uma coisa em particular, haverá um resultado particular levando a uma conclusão particular. Se o humano escolhe um curso de ação diferente, então o resultado e a conclusão serão diferentes. Se escolher engolir um vidro inteiro de analgésicos, você morrerá essa tarde; mas se escolher engolir apenas dois, pode curar sua enxaqueca e viver até os cem anos. Deus sabe todos os resultados possíveis mas deixa a escolha para você. Podemos não entender, mas Deus pode – Sua ‘inteligência’ é milhões de vezes maior e totalmente diferente da nossa. A verdade reside no campo do al-Ghayb [questões que estão além da percepção humana]. Tudo que os crentes podem fazer é pedir orientação ao longo de seu caminho na vida. Podemos não ser capazes de ver o caminho da estrada de longe, mas podemos orar para que Deus nos mostre o próximo passo, um passo de cada vez. Se fosse impossível para as pessoas escolherem porque seus futuros e destinos já estavam fixados, não apenas Deus seria injusto ao invés de justo, mas haveria pouco sentido em tentarmos viver vidas boas. O fatalismo leva ao desespero e desesperança, ao derrotismo, e impede as pessoas de fazerem qualquer esforço para melhorarem suas próprias dificuldades ou as dificuldades daqueles ao seu redor. O que Deus quer de nós? Quer que alcancemos felicidade e sucesso. Ele quer que encontremos a verdadeira liberdade. Se a verdadeira liberdade traz felicidade, então parece que as coisas não são como muitas pessoas pensam. Pode ser muito feliz ser livre para ter um relacionamento com um parceiro diferente cada semana, ou para me empanturrar com comida saborosa mas que não é saudável, ou gastar uma fortuna em roupas ou jóias ou CDs de música pop, ou para fumar, ou ficar fora até tarde dando preocupação aos meus pais, ou evitar tarefas domésticas ou trabalho de casa, ou rir dos meus inimigos, ou ganhar muito dinheiro talvez de forma desonesta, ou ser famoso e admirado por muitas pessoas. São essas coisas que fazem as pessoas felizes? Como seria simples se assim fosse. É tão fácil para Satanás enganar as pessoas – o caminho que leva à destruição é tão tentador e agradável. Mas pare e pense. Muitas das pessoas mais ricas e poderosas no mundo são as mais solitárias. Pessoas que se empanturram têm todos os problemas e misérias de estarem acima do peso. Os preguiçosos e que evitam aprender em sua juventude acordam para as realidades de suas vidas fracassadas mais tarde. Fumantes que soltam fumaça alegremente por trás de discussões inúteis morrerão jovens de câncer ou infarto – para grande sofrimento daqueles que os amam. Pessoas que são promíscuas geralmente terminam com o coração partido por elas mesmas e pelos filhos que posteriormente negligenciam, abandonam (geralmente pais jovens) ou matam no aborto (as mães jovens). A verdadeira felicidade é cuidar do que Deus nos emprestou e confiou à nossa guarda por um período breve – nossos corpos, nossas famílias, nossos talentos, nossa sensibilidade em relação aos outros. Isso significa não ser livre para ceder às nossas luxúrias e desejos, as coisas que sabemos muito bem que nos prejudicarão e a outros no curso devido. Mas o estranho é que a pessoa que abre mão desse tipo de liberdade egoísta e concorda em ser um servo de Deus será sempre verdadeiramente livre. Saberão que fizeram o melhor que podiam; suas consciências estarão limpas, seus íntimos estarão confiantes e cheios de esperança, e nunca serão escravos de seus próprios eus, ou de qualquer outra pessoa ou coisa.