Ler um trecho - Editora Hagnos

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CAPÍTULO 1
AS ESCRITURAS SAGRADAS
A PALAVRA CÂNON
Quando falamos do cânon das Escrituras, a palavra “cânon” tem um significado simples: é a lista de livros contidos nas Escrituras, os livros reconhecidos
como dignos de serem incluídos entre os escritos sagrados de uma comunidade de adoradores. Num contexto cristão, poderíamos definir a palavra como
“a lista dos escritos reconhecidos pela Igreja como documentos de revelação
divina”.1 Neste sentido a palavra parece ter sido usada pela primeira vez por
Atanásio, bispo de Alexandria, numa carta que circulou em a.D. 367.2
A palavra “cânon” entrou em nossa língua (via Latim) vinda da palavra
grega kanw`n (kanwn).3 Em grego isso significava uma vara, especialmente
uma vara reta, usada como régua. Desse uso veio o outro sentido que a
palavra normalmente tem em português – “regra” ou “padrão”. Podemos
assim falar de cânones ou regras eclesiásticas. Mas uma vara reta usada
como régua pode ser marcada com unidades de comprimento (como uma
régua moderna marcada em centímetros ou polegadas). Desta prática a palavra grega kanwn veio a ser usada da série de tais marcas, e assim ser usada
no sentido geral de “série” ou “lista”. É esse último sentido que subjaz ao
termo “cânon das Escrituras”.
Antes de vir a ser usada no sentido de “lista”, a palavra “cânon” foi usada
em outro sentido pela igreja – na expressão “a regra da fé” ou a “regra da
verdade”.4 Nos primeiros séculos do cristianismo tratava-se de um resumo
do ensino cristão, que se cria reproduzir o próprio ensino dos apóstolos, e
pelo qual qualquer sistema de doutrina oferecido para aceitação entre os
crentes, ou qualquer interpretação de escritos bíblicos deveria ser avaliado.
Porém, quando os limites das Sagradas Escrituras vieram a ser objeto de
1
R. P. C. Hanson, Origen’s Doctrine of Tradition (Londres, 1954), pp. 93, 133: cf. seu livro Tradition in the
Early Church (Londres, 1962), p. 247.
2
Ver pp. __, __, __, ___s.
3
A palavra grega provavelmente foi tomada de empréstimo da palavra semítica que aparece no hebraico
como hn}q* (q*n@h), “cana”, “vara”. Da mesma origem veio o termo latino canna.
4
Ver pp. ___, ____.
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concordância universal, as próprias Escrituras passaram a ser consideradas
a regra de fé. Tomás de Aquino (c. 1225-1274), por exemplo, diz que “a
escritura canônica, e somente ela, é a regra de fé”. De uma outra perspectiva teológica, a Confissão de Fé de Westminster (1647), depois de alistar os
sessenta e seis livros do Antigo e do Novo Testamentos, acrescenta: “Todos
o quais foram dados por inspiração de Deus, para serem a regra de fé e
vida”.5 Essas palavras afirmam o status das Escrituras Sagradas como o
“cânon” ou “padrão” pelo qual o ensino e a ação cristãs devem ser regulados. Ainda que o “cânon” das Escrituras signifique a lista de livros aceitos
como Escritura Sagrada, o outro sentido de “cânon” – regra ou padrão –
deixou sua marca neste, de modo que o “cânon” das Escrituras é entendido
como a lista de livros que são reconhecidos, num sentido peculiar, como a
regra de fé e prática.
A questão a ser examinada nas páginas seguintes é: como foi que certos
documentos, e apenas eles, vieram a receber tal reconhecimento? Quem, se
houve alguém, decidiu que estes, e nenhum outro, deveriam ser admitidos
à lista de Escrituras Sagradas e quais foram os critérios que influenciaram
tal decisão?
POVOS DO LIVRO
Muitas religiões têm livros sagrados associados às suas tradições ou ao
seu culto. Houve certa vez uma série famosa de livros intitulada Os Livros
Sagrados do Oriente.6 Judeus, cristãos e muçulmanos, no entanto, vieram
a ser conhecidos como “povos do livro” num sentido especial. Essa é uma
designação frequente a judeus e cristãos no Corão. Entre os “povos do livro”,
o “livro” tem uma função reguladora: a conformidade ao que o livro prescreve
é um teste principal de lealdade a sua fé e prática religiosa.
Para os judeus, o “livro” é a Bíblia Hebraica, que compreende a Lei, os
Profetas e os Escritos (com base nas iniciais dessas três divisões na língua
hebraica, os judeus frequentemente se referem a ela como TeNaKh).7 Para
os cristãos, o livro contém a Bíblia Hebraica, que eles chamam de Antigo
Testamento (ligeiramente amplificada em certas tradições cristãs)8 e o Novo
Testamento. Os muçulmanos reconhecem a Bíblia Hebraica, a tawrat (o equivalente árabe do hebraico tôrâ, “lei”) e o Novo Testamento cristão, o injil
(do grego euangelion, “evangelho”), como revelações anteriores de Deus,
5
Tomás de Aquino, Sobre o Evangelho de João, Lição 6 sobre João 21 (sola canonica scriptura est regula
fidei, talvez “. . . uma regra de fé”); Confissão de Fé de Westminster, 1 § 2.
6
Os 55 volumes, editados originalmente por Friedrich Max Muller, apareceram entre 1879 e 1924 (Oxford:
Clarendon Press).
7
Esta palavra é um acrônimo, formado pelas letras iniciais de Tôrâ (“lei”, “direção”), N=b’a’m (“profetas”)
e K=tWb’m (“escritos”), nomes dados às três divisões (ver p. ___).
8
Ver pp. ___ss.
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mas afirmam que ambos encontram sua completude na revelação dada por
intermédio do Profeta, o Corão (Qur’an, literalmente “récita” ou “leitura”), o
livro “por excelência”.
OS DOIS TESTAMENTOS
O objeto de nossa preocupação aqui é a Bíblia cristã, que compreende o Antigo
e o Novo Testamentos. A palavra “testamento” em português normalmente
significa os últimos desejos (a “última vontade e testamento” de alguém),
mas este não é o sentido com que a palavra é usada no que diz respeito às
duas partes da Bíblia cristã. Nossa palavra “testamento” vem do latim testamentum, que significa o mesmo que o termo legal em português, mas que
neste contexto particular é usado como tradução da palavra grega diaqhvkh
(diaqhkh). Esta palavra pode de fato significar “testamento”,9 mas é usada
mais amplamente para descrever vários tipos de acordo ou trato, não tanto do
tipo que se faz entre iguais, em que uma das partes é superior em poder ou
dignidade e concede certos privilégios à outra parte que é inferior, ao passo
que a parte inferior assume certas obrigações para com a parte superior. O
termo é usado repetidamente tanto no Antigo quanto no Novo Testamento,
tanto na tradução grega da Bíblia hebraica quanto no original grego do Novo
Testamento. Geralmente é traduzida pela nossa palavra “aliança”, e seu uso
mais marcante diz respeito a uma acordo entre Deus e seres humanos. Nesse
caso, obviamente, não se pode aventar a hipótese de um acordo entre iguais.
Nos primeiros livros do Antigo Testamento Deus faz uma aliança com
Noé e seus descendentes (Gn 9.8-17), e uma vez mais com Abraão e seus
descendentes (Gn 15.18; 17.1-4). O sinal externo da aliança com Noé foi o
arco íris. O sinal externo da aliança com Abraão foi o rito da circuncisão.
Mais tarde, quando os descendentes de Abraão (ou pelo menos uma parte
importante deles) migraram para o Egito e foram obrigados a trabalhar como
escravos, Deus lembrou de Sua aliança com Abraão e operou sua libertação.
Ao deixarem o Egito sob a liderança de Moisés, foram constituídos como
nação no deserto do Sinai. Sua constituição nacional assumiu a forma de uma
aliança feita com eles pelo Deus de seus antepassados, que Se dera a conhecer
a eles pelo seu nome pessoal, Javé.10 Os termos dessa aliança eram, simplesmente: “Eu serei o vosso Deus e vós sereis o Meu povo”. Javé tomou sobre Si
a responsabilidade de lhes fazer vários tipos de provisões Eles assumiram a
responsabilidade de adorar exclusivamente a Ele e obedecer aos Seus mandamentos. Essas responsabilidades foram registradas num documento chamado
“o livro da aliança”. De acordo com a narrativa de Êxodo 24.4-8,
9
Ver p. ___.
Ver Ex 3.7-15,
10
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Moisés escreveu todas as palavras do Senhor e, tendo-se levantado
pela manhã de madrugada, erigiu um altar ao pé do monte e doze
colunas, segundo as doze tribos de Israel. E enviou alguns jovens
dos filhos de Israel, os quais ofereceram ao Senhor holocaustos e
sacrifícios pacíficos de novilhos. Moisés tomou metade do sangue
e o pôs em bacias; e a outra metade aspergiu sobre o altar. E tomou
o livro da aliança e o leu ao povo; e eles disseram: “Tudo o que
falou o Senhor faremos e obedeceremos”. Então, tomou Moisés
aquele sangue, e o aspergiu sobre o povo e disse: “Eis aqui o
sangue da aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas
estas palavras”.
Esta narrativa é resumida no Novo Testamento, em Hebreus 9.18-20,
onde a aliança assim ratificada é qualificada como “a primeira aliança”.
Essa nomenclatura se deve ao fato do escritor de Hebreus a contrastar com
a “nova aliança” prometida em Jeremias 31.31-34. Mais de seiscentos anos
depois da ratificação da aliança do tempo de Moisés ao pé do monte Sinai, o
profeta Jeremias anunciou que, em dias ainda por vir, o Deus de Israel estabeleceria uma nova aliança com Seu povo e que ela substituiria a aliança
que fizera com a geração do Êxodo, quando os tomou “pela mão para os
tirar da terra do Egito” (Jr 31.31-34). A antiga aliança deixara bem claro
para eles qual era a vontade de Deus, mas não lhe concedera o poder de
cumpri-la. Por lhes faltar esse poder, eles quebraram a aliança. Sob a nova
aliança, no entanto, seria comunicado ao Seu povo não apenas o desejo,
mas também o poder de cumprir a vontade de Deus: Sua lei seria colocada
dentro deles e gravada em seus corações. “Quando Ele diz Nova [aliança]”,
escreve o autor de Hebreus, “torna antiquada a primeira” (Hb 8.13). E ele
não deixa aos seus leitores qualquer dúvida de que a nova aliança já tenha
sido estabelecida, ratificada não pelo sangue da animais sacrificados, mas
pelo sangue de Cristo, um sacrifício que efetua não apenas a purificação
externa da contaminação ritual, mas a purificação interior da culpa em
nossa consciência.
Esta interpretação da promessa da nova aliança alinha-se perfeitamente
com as palavras do próprio Jesus. Durante a noite que antecedeu a Sua
morte, em volta da mesa com Seus discípulos, Ele lhes deu pão e vinho
como memoriais de Si mesmo. Ao lhes dar o vinho, segundo o registro de
Marcos, Ele disse: “Isto é o meu sangue, o sangue da nova aliança, derramado em favor de muitos” (Mc 14.24). É praticamente impossível não ouvir
o eco das palavras de Moisés, “Eis aqui o sangue da aliança . . .”. Fica implícito que a aliança associada ao sangue de Jesus (Sua oferta voluntária de Si
mesmo a Deus) é a nova aliança prometida em Jeremias. Essa implicação
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é explicitada nas palavras de Paulo: “Este cálice é a nova aliança no meu
sangue” (1Co 11.25).11
Cada uma dessas alianças – a antiga no Sinai e a nova aliança inaugurada
por Jesus – lançou uma grande movimento espiritual. Cada um desses movimentos gerou uma coleção especial de literatura e essas coleções literárias
vieram a ser conhecidas na igreja cristã como “os livros da antiga aliança” e
“os livros da nova aliança”. A primeira coleção surgiu ao longo de um período de mil anos ou mais. A segunda coleção tem um caráter mais inaugural.
Suas várias partes foram escritas no século que se seguiu ao estabelecimento
da nova aliança. Não foi senão no fim do segundo século de nossa era que
as duas coleções começaram a ser descritas brevemente como a Antiga
Aliança (ou Antigo Testamento) e a Nova Aliança (ou Novo Testamento).
Esses dois títulos são atestados em grego e em latim quase simultaneamente
– em grego, nas obras de Clemente de Alexandria;12 em latim, nas obras de
Tertuliano de Cartago.13
Já foi sugerido que a expressão “A Nova Aliança (ou Novo Testamento)”
foi usada pela primeira vez para designar uma coleção de livros em a.D.
192, em uma obra antimontanista escrita em grego, dirigida ao bispo frígio
Avircius14 Marcellinus, da qual Eusébio cita algumas porções. Esta obra fala
da “palavra da nova aliança do evangelho, à qual nada se pode acrescentar por
qualquer pessoa que tenha escolhido viver segundo o próprio evangelho e da
qual nada se pode excluir.”15 Todavia, é pouco provável que se trate de uma
referência ao Novo Testamento em nosso sentido do termo.16 O autor anônimo
se mostrou um pouco perturbado com a possibilidade de que sua própria obra
pudesse ser vista como uma adição à “palavra da nova aliança do evangelho”.
UM CÂNON FECHADO
As palavras “à qual nada se pode acrescentar . . . e da qual nada se pode
excluir”, sejam quais forem os seus significados em seu contexto original,
parecem certamente implicar o princípio de um cânon fechado. Há alguns
11
O registro de Paulo é o mais antigo de que dispomos (a.D. 55): ele preserva as palavras da instituição
da Ceia do Senhor tal como ele as aprendeu logo depois de sua conversão. O registro de Marcos (talvez
colocado em forma escrita por volta de a.D. 65) reproduz as palavras conforme foram transmitidas por outra
linha de tradição oral.
12
Ver p. ___.
13
Ver p. ___.
14
Também grafado Abercius (grego jAbevrkio~, Aberkios)
15
Hist.Ecl. 5.16.3.
16
A certa altura W. C. van Unnik pensou que esta poderia ser a ocorrência documentada mais antiga da
expressão “Nova Aliança” ou “Novo Testamento” (grego kainh; diaqhvkh [kainh diaqhkh]) para denotar
uma coleção de escritos (“De la règle mhte prosqeinai mhte afelein dans l’histoire du canon”,
Vigiliae Christianae 3 [1949], pp. 1-36). Mais tarde, porém, expressou incerteza quanto à ideia (“Jh kainh
diaqhkh – a Problem in the Early History of the Canon”, Studia Patristica = TU 79 [1961], pp. 212-227,
especialmente p. 218).
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eruditos que sustentam a ideia de que a palavra cânon só deveria ser usada
onde a lista de livros especialmente autorizados estivesse fechada e muito
pode ser dito em favor desse uso restritivo da palavra (uma palavra mais flexível poderia ser usada para a coleção em processo de formação), embora seja
pedante insistir invariavelmente nele.
Essa linguagem sobre nem adicionar nem excluir é usada em relação a
componentes individuais de ambos os testamentos. À lei de Deuteronômio,
por exemplo, se acrescenta a advertência: “Nada acrescentareis à palavra que
vos mando, nem diminuireis dela” (Dt 4.2; cf. 12.32). Uma advertência mais
completa se encontra no Apocalipse, no Novo Testamento: “Eu, a todo aquele
que ouve as palavras da profecia deste livro, testifico: Se alguém lhes fizer
qualquer acréscimo, Deus lhe acrescentará os flagelos escritos neste livro. E se
alguém tirar qualquer coisa das palavras do livro desta profecia, Deus tirará a
sua parte da árvore da vida, da cidade santa e das coisas que se acham escritas
neste livro” (Ap 22.18-19).17
O autor do Didaquê (um antigo manual de instruções eclesiásticas) ecoa
a advertência de Deuteronômio ao dizer: “Não esquecerás os mandamentos do Senhor, mas guardarás as coisas que recebeste, ‘sem adicionar, nem
subtrair’”.18 Por volta da mesma época (fim do primeiro século a.D.) Josefo
usa linguagem semelhante sobre as Escrituras hebraicas: “Embora tantas
eras já se tenham passado, ninguém jamais ousou acrescentar-lhes qualquer
coisa, ou delas tirar qualquer coisa, ou nelas modificar coisa alguma”.19 Esse
tipo de linguagem não pode significar qualquer outra coisa a não ser um
cânon fechado.20
RECONHECIMENTO LITÚRGICO
O status das Escrituras é simbolicamente reconhecido em várias tradições de
culto público. Veneração especial é demonstrada para com os rolos da lei no
culto da sinagoga quando são carregados da arca santa, onde são guardados,
até a bimah onde são lidos para a congregação. Na liturgia da Igreja Ortodoxa,
o livro do evangelho é carregado em procissão e sua leitura é precedida pela
17
Para nosso presente propósito é imaterial se esta advertência provém do vidente de Patmos ou de um
editor de sua obra.
18
Didaquê 4.13.
19
Contra Apion, 1.42.
20
Ver p. ___. Linguagem semelhante sobre não adicionar ou subtrair ocorre na Carta de Aristeas, 311
(ver p. ___) onde, depois da tradução do Pentateuco para o grego uma maldição foi pronunciada, “conforme o costume, sobre qualquer um que fizesse qualquer alteração, quer por acrescentar algo ou por
mudar de alguma forma o que fora escrito, ou por omitir qualquer coisa”; também duas vezes em Irineu
(Contra as Heresias, 4.33.8; 5.30.1) – na última das quais há uma advertência contra os que diminuem
em 50 o número da besta (Ap 13.18), lendo 616 (talvez o primeiro, mas certamente não o último, uso
errado da advertência de Ap 22.15ss. numa tentativa de inibir o exercício adequado da critica textual).
Ver também Atanásio (p. ___).
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convocação: “Sabedoria! Que todos se levantem! Ouçamos o santo evangelho!” Assim, a veneração demonstrada não se dirige ao material que ele é
feito ou à tinta com a qual foi escrito, mas à Santa Sabedoria que encontra
sua expressão nas palavras a serem lidas. Na liturgia católica o evangelho
é tratado com veneração comparável e sua leitura é precedida e seguida por
orações especiais. No culto da Igreja Anglicana o povo se põe de pé para a
leitura do Evangelho, e quando esta é anunciada é comum dizerem: “Glória
a Cristo, nosso Salvador”, ao passo que à sua conclusão, quando o leitor diz:
“Este é o evangelho de Cristo”, a congregação responde: “Glória a Cristo,
nosso Senhor”.
Em igrejas da ordem reformada (como a Igreja da Escócia e outras igrejas
presbiterianas ao redor do mundo) a primeira ação formal de um culto público
de adoração ocorre quando a Bíblia é trazida do vestíbulo e colocada sobre
o pedestal de leitura. Alguém deve trazê-la, naturalmente, seja um ministro
auxiliar ou oficial da igreja), mas a pessoa que o faz não tem significância
litúrgica (mesmo que, em tempos idos, se pensasse ser necessário “dignificar
seu ofício”). É a Bíblia que tem significância litúrgica. A Bíblia é seguida a
uma distancia respeitosa pelo ministro. E por que? Porque ele é o ministro –
ou seja, no sentido original do termo, o “servo” da Palavra. Nenhuma outra
sigla indicando realização acadêmica ou honraria pública pode se igualar em
dignidade às letras V.D.M., colocadas após o nome do pastor em algumas igrejas reformadas – Verbi Divini Minister, “servo da Palavra de Deus”. No culto,
quando chega no a hora da leitura pública da Bíblia, essa lição é destacada
pela exortação introdutória: “Ouçamos a Palavra de Deus!”
É do conteúdo, da mensagem, do livro que se deriva o seu valor, quer pensemos no evangelho em particular ou na Bíblia como um todo. É importante,
por isso, que conheçamos o seu conteúdo e como vieram a ser destacados
dentre outros escritos – como escritos santos e inspirados. Essa é a razão de
estudarmos o crescimento do cânon das Escrituras Sagradas.
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