fé e razão - Faculdade Luciano Feijão

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FÉ E RAZÃO:
DIMENSÕES ESSENCIAIS DA PESSOA HUMANA
JOSÉ RICARDO CARVALHO1
Resumo: O presente artigo trata sobre a relação entre Fé e Razão e tem como objetivo precípuo apresentar como
essas dimensões contribuem para o pleno desenvolvimento e aperfeiçoamento da pessoa humana. Utilizou-se, para
a consecução do trabalho, da pesquisa bibliográfica, tendo como fundamentação teórica a Carta Encíclica Fides et
Ratio (1998) de sua Santidade, o Papa João Paulo II; o Catecismo da Igreja Católica (1990); Cotrim (2006) e Souza
(1995). Essas duas realidades, à primeira vista, podem se apresentar como contraditórias e inconciliáveis, mas
analisando a própria natureza humana, percebe-se que há na estrutura ontológica a presença inquestionável das
dimensões da fé e da razão. Portanto, o homem, por natureza, tem a necessidade de buscar, para a compreensão de
si mesmo e das realidades que o circunda, respostas no universo da fé e no mundo da razão.
Palavras-chave: Fé. Razão. Dimensões da Natureza humana. Relação intrínseca.
FAITH AND REASON: KEY DIMENSIONS OF HUMAN BEEN
Abstract: This article discusses the relationship between Faith and Reason and has as main objective to present
how these factors contribute to the full development and improvement of the human person. It was used to achieve
the work of literature, with the theoretical basis the Encyclical Letter Fides et Ratio (1998) of his Holiness Pope
John Paul II, the Catechism of the Catholic Church (1990), Cotrim (2006) and Souza (1995). These two realities
at first glance, may appear as contradictory and irreconcilable. But, analyzing human nature, it is clear that there
is the ontological structure of the unquestionable presence of the dimensions of faith and reason. Therefore man,
by nature, has the need to search for the understanding of self and the realities surrounding it, answers the world
of faith and the world of reason.
Key-words: Faith. Reason. Dimensions of Human Nature. Intrinsic relationship.
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Docente. Graduado em Filosofia, Teologia, Pedagogia e Direito. Especialista em Docência do Ensino Superior,
em Metodologia do Ensino e em Direito e Processo Constitucionais. Orientador de Trabalhos de Conclusão de
Curso. E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
O presente artigo trata sobre a Fé e a Razão e tem como objetivo precípuo apresentá-los
como elementos constitutivos da pessoa humana, a partir de uma perspectiva relacional
intrínseca.
Para tanto, faz-se necessário levantar algumas indagações: a fé e a razão são dimensões
da pessoa humana? Elas se complementam? Qual o campo de ação de cada uma delas? Qual a
importância delas na vida humana? São conciliáveis? Quais seus limites?
Tratar do tema da Fé e da Razão em pleno século XXI é de fundamental importância,
haja vista, a necessidade crescente de se dar respostas às questões que, há um tempo, eram
obtidas somente à luz da ciência e de seus métodos.
Após a passagem do entusiasmo do positivismo, do cientificismo, a fé retoma seu lugar,
também, no pensamento e na reflexão de muitos pensadores e estudiosos.
Percebeu-se que a ciência, motivada e sustentada pela razão, não esgotava e não
abarcava todas as indagações, inquietudes e necessidades da alma humana em suas questões,
necessidades, aspirações e ações.
A razão, por si só, não satisfazia o espírito curioso, instigador, contemplativo e ativo do
homem. Era, pois, necessário ir além do empírico, das aparências, e mergulhar na essência
mesma da pessoa humana, em sua dimensão espiritual e material.
Nesse sentido, o Papa João Paulo II (1998) expressa de forma magistral a importância
da relação harmoniosa e estável entre a fé e a razão, quando afirma que:
A fé e a razão (fides et ratio) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito
humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração
do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de O conhecer a Ele,
para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena sobre si
próprio (cf. Ex 33, 18; Sal 2726, 8-9; 6362, 2-3; Jo 14, 8; 1 Jo 3, 2).
Com essas palavras, inicia-se uma análise sobre a relação intrínseca entre a fé e a razão
humana, relação essa, muitas vezes conflitiva, opositiva e até mesmo contraditória.
Há uma mentalidade de que quem crer não pode ser cientista. Ou que todo cientista é
ateu ou agnóstico. De onde provem tal mentalidade? Esse tipo de preconceito realmente
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corresponde à realidade? A fé e a razão são incompatíveis? Inconciliáveis? Opostas? Dar
respostas a essas indagações é o objetivo principal desse artigo científico.
Para tanto, fez-se necessário realizar uma pesquisa bibliografia e tomar como referencial
teórico a magnífica Carta Encíclica Fides et Ratio (1998) de sua Santidade, o Papa João Paulo
II (in memorian), Cotrim (2006), Souza (1995), e o Catecismo da Igreja Católica (1993).
A BUSCA DA VERDADE
Para analisar as realidades da fé e da razão, faz-se necessário, antes de tudo,
compreender a incessante busca que o homem empreende para conhecer a origem e o destino
de si e das realidades que o circunda.
Essa busca incessante está na origem mesma do homem, em sua natureza racional, que
tenta compreender e chegar ao conhecimento da verdade real das coisas.
Do Oriente ao Ocidente e em todos os tempos e lugares, a humanidade tem procurado
conhecer a verdade das coisas. João Paulo II (1998, p.5) afirma que “Tanto no Oriente como
no Ocidente, é possível entrever um caminho que, ao longo dos séculos, levou a humanidade a
encontrar-se progressivamente com a verdade e a confrontar-se com ela”.
Essa inquietude pela busca da verdade motivou os primeiros filósofos pré-socráticos a
buscarem a arché, o princípio originário e substancial de todas as coisas, identificando-o com
elementos da natureza e existentes em todas as coisas (COTRIM, 2006).
A busca da verdade deixa de ser uma busca por algo fora de si, e passa a ser uma
experiência de autoconhecimento. Posto que ao se conhecer, o homem pode compreender as
coisas que o circunda e o envolve como disse o filósofo sofista Protágoras: “O homem é a
medida de todas as coisas; daquelas que são, enquanto são; e daquelas que não são, enquanto
não são” (COTRIM, 2006, p.84).
Essa compreensão da verdade como algo intrínseco, também foi confirmada por Jesus
Cristo, quando afirmou que “Se permanecerdes na minha Palavra, verdadeiramente sereis meus
discípulos. E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (JOÃO 8, 31-32).
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Portanto, a verdade é a realidade última da reflexão sobre a fé e a razão. Compreendêla é perscrutar como se dá a relação entre elas. Entender sua dinâmica é possibilitar as respostas
mais adequadas às questões da vida humana. Pois tanto a fé quanto a razão buscam conhecer a
verdade seja das coisas divinas, seja das realidades materiais e humanas.
Todos os homens desejam saber, e o objeto próprio desse desejo é a verdade. A própria
vida cotidiana demonstra o interesse que tem cada um em descobrir, para além do que
ouve, a realidade das coisas. Em toda a criação visível, o homem é o único ser que é
capaz não só de saber, mas também de saber que sabe, e por isso se interessa pela
verdade real daquilo que vê. Ninguém pode sinceramente ficar indiferente quanto à
verdade do seu saber. Se descobre que é falso, rejeita-o; se, pelo contrário, consegue
certificar-se da sua verdade, sente-se satisfeito (JOÃO PAULO II, 1998, p. 38-39).
Mas o que é a verdade? Em grego, a verdade (aletheia) significa aquilo que não está
oculto, o não escondido, manifestando-se aos olhos e ao espírito, tal como é, ficando evidente
à razão.
Em latim, a verdade (veritas) é aquilo que pode ser demonstrado com precisão,
referindo-se ao rigor e a exatidão. Assim, a verdade depende da veracidade, da memória e dos
detalhes.
Em hebraico, a verdade (emunah) significa confiança. É a esperança de que aquilo que
é será revelado ou irá aparecer por intervenção divina. Em outras palavras, a verdade é
convencionada pelo grupo que possui crenças em comum.
Há, também, diversas formas de verdade. Aquelas que se encontram e se apoiam em
evidências imediatas e na experiência sensível (verdade científica). Outras verdades
se assentam na capacidade especulativa do intelecto (verdade filosófica) e, por fim, as
que se apresentam por meio das respostas que as diversas religiões oferecem às
questões humanas (JOÃO PAULO II, 1998).
Japiassú e Marcondes (2001, p.187-188.) afirmam que a “verdade (lat. veritas) 1.
Classicamente, [...] se define como adequação do *intelecto ao *real. Pode-se dizer, portanto,
que a verdade é uma propriedade dos *juízos, [...]”.
Quando os filósofos tentaram explicar o mundo, a natureza e o próprio homem, foram
levados a fazer distinções. Ao realizarem essas distinções constataram que há coisas que são
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materiais, que vemos e tocamos. Depois, outras realidades que não vemos e não podemos tocar,
nem medir, como as nossas ideias (POLITZER, 2001).
O pensamento é a ideia ou abstração que fazemos das coisas concretas; algumas dessas
ideias vêm-nos ordinariamente por meio das nossas sensações e correspondem a objetos
materiais captados pelos nossos sentidos.
As outras, como a ideia de Deus, filosofia, infinito vêm do próprio pensamento e não
correspondem a objetos materiais (TÓPICOS DE FILOSOFIA, p.10).
OS CONCEITOS DE FÉ E RAZÃO
Para perceber a relação intrínseca entra a fé e a razão, faz-se mister conceituar ambas.
Por fé se entende:
[...] primeiramente uma adesão pessoal do homem a Deus; é ao mesmo tempo, e
inseparavelmente, o assentimento livre a toda a verdade que Deus revelou. Enquanto
adesão pessoal a Deus e assentamento à verdade que ele revelou, a fé cristã é diferente
da fé em uma pessoa humana [...] Seria vão e falso colocar tal fé em uma criatura
(CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 1993, p. 48).
A fé, também, é um dom de Deus, “[...] uma virtude sobrenatural infundida por Ele.
Para crer de maneira sobrenatural, o homem precisa da ‘graça prévia e adjuvante de Deus e os
auxílios internos do Espírito Santo, que movem o coração e o convertem a Deus’ [...]. Além da
dimensão sobrenatural, a fé possui uma dimensão humana”.
Neste sentido, pode-se afirmar que a fé é um ato verdadeiramente humano. “[...] crer é
um ato autenticamente humano. Não contraria nem à liberdade nem à inteligência do homem
confiar em Deus” (CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 1993, p.49).
Nas relações humanas, a fé é essencial para o convívio entre os seres humanos. Sem a
fé nas relações interpessoais seria impossível estabelecer qualquer tipo de vínculo afetivo,
cognitivo e social entre as pessoas. “[...] No campo das relações humanas não é contrário à
nossa própria dignidade crer o que outras pessoas nos dizem sobre si mesmas e sobre as suas
intenções, e confiar nas promessas delas” (CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 1993,
p.49).
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AS DIMENSÕES DA FÉ: DIVINA E HUMANA
A fé se encontra em dupla dimensão, divina e humana. Ela ao mesmo tempo é um dom
de Deus e também, uma faculdade humana. “Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se
esperam, e a prova das coisas que se não veem”. (Hebreus 11:1.3)
A fé, que se fundamenta no testemunho de Deus e conta com a ajuda sobrenatural da
graça, pertence efetivamente a uma ordem de conhecimento diversa da do
conhecimento filosófico. De facto, este assenta sobre a percepção dos sentidos, sobre
a experiência, e move-se apenas com a luz do intelecto. A filosofia e as ciências
situam-se na ordem da razão natural, enquanto a fé, iluminada e guiada pelo Espírito,
reconhece na mensagem da salvação [...] (JOÃO PAULO II,1998, p.17).
Percebe-se que tanto a fé quanto a razão pertencem a um patrimônio comum às
capacidades cognitivas humanas. Sendo assim, elas estão conexas, interligadas, autônomas e
colaborativas.
O homem que crê ou que tem fé não pode ser dissociado do homem que pensa, reflete,
raciocina, usa a razão. A fé é um modo de conhecer as coisas, assim como a razão.
“Na fé, a inteligência e a fé humanas cooperam com a graça divina: [...] Crer é um ato
da inteligência que assente à verdade divina a mando da vontade movida por Deus através da
graça” (CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, 1993, p. 49).
A fé se vale não somente dos elementos materiais ou físicos, mas vai além deles, já a
razão está diretamente ligada à percepção sensitiva, fundamento de todo o conteúdo abstrato,
imaterial, ideal e lógico.
Todo patrimônio de fé que o homem cristão possui, seja enquanto dom, seja enquanto
virtude, tem seu fundamento na Revelação Divina. Foi Deus que, em sua bondade, quis que o
homem participasse do seu plano de salvação, dando-lhe, por natureza, a capacidade, a
faculdade e a virtude de acreditar em si mesmo e Nele.
Esta economia da Revelação realiza-se por meio de ações e palavras intimamente
relacionadas entre si, de tal maneira que as obras, realizadas por Deus na história da
salvação, manifestam e confirmam a doutrina e as realidades significadas pelas
palavras; e as palavras, por sua vez, declaram as obras e esclarecem o mistério nelas
contido. Porém, a verdade profunda tanto a respeito de Deus como a respeito da
salvação dos homens manifesta-se-nos, por esta Revelação, em Cristo, que é
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simultaneamente o mediador e a plenitude de toda a revelação (JOÃO PAULO II,
1998, p.17-18).
A fé não decepciona. Por não depender somente dos sentidos, ela se torna mais
autônoma. Contudo, ao afirmar que a fé não depende exclusivamente dos sentidos, não quer
dizer que ela não precise deles, pois o homem, como ser material e espiritual, está condicionado
ao tempo e ao espaço.
A fé é certa, mais certa do que qualquer conhecimento humano, porque se funda na
própria Palavra de Deus que não pode mentir. Sem dúvida, as verdades reveladas
podem parecer obscuras à razão e à experiência humanas, mas “a certeza dada pela
luz divina é maior do que a que é dada pela luz da razão natural” (CATECISMO DA
IGREJA CATÓLICA, 1993, p. 50).
O ato de fé tem duas dimensões, a humana e a divina. A fé enquanto conhecimento do
homem sobre questões de sua existência terrena e supraterrena, tem-se a dimensão humana.
Sendo reflexão, adesão e confiança incondicional à Palavra de Deus, aos Sacramentos
e à oração, é um dom de Deus e uma resposta pessoal e eclesial à Revelação Divina, através da
Palavra e da Tradição viva da Igreja, tem-se a dimensão divina.
A fé não depende exclusivamente do que os sentidos imediatamente apontam, pois
muitas das convicções de fé se contrapõem a qualquer dado empírico ou constatação imediata
ou mediada percebida de maneira sensorial. Apenas se crê e isso basta, afirmaria o crente,
enquanto que para o não crente ou o agnóstico, a certeza deveria ser acompanhada de uma
experiência sensorial.
[...] a fé nos faz crer em coisas que nem sempre entendemos pela razão: creio tudo o
que entendo, mas nem tudo que creio também entendo. Tudo o que compreendo
conheço, mas nem tudo que creio conheço. (SANTO AGOSTINHO, De Magistro,
p.319 apud COTRIM, 2006, p.112).
A razão, sua posse e uso, caracterizam a pessoa humana e a diferenciam dos outros seres.
Através dela, o homem é capaz de discernir, refletir, pensar, julgar e agir de forma a modificar
a natureza através de suas criações e conquistas técnico-científicas (SOUZA, 1995).
A razão, entendida como capacidade ou faculdade intelectiva do homem, está
diretamente ligada às vivências e experiências sensoriais e tem como fundamento os sentidos
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para sua elaboração mental, abstrata e conceitual. Isto é, sem os sentidos, ela careceria de
substrato, haja vista, não poder elaborar a partir do nada. Portanto, “a razão [...] seria a
elaboração de representações mentais abstratas, conceitos, discursos, relações lógicas e teorias
interpretativas sobre a realidade” (FONTE, 2008 apud TÓPICOS DE FILOSOFIA, p.9).
Nesse sentido, a razão não só possibilita ao homem conhecer as coisas e os seres, mas
também o capacita a conhecer e compreender a si mesmo. E ao refletir sobre si mesmo é capaz
de questionar sua própria existência: por que e para que vive? Ou seja, ele reflete sobre os
valores morais, sociais, políticos e culturais em que está inserido (SOUZA, 1995).
Assim pode-se afirmar que o homem é um ser religioso e espiritual: adora, cultua e
reverencia forças e divindades consideradas entidades superiores e transcendentais
[...] ele reza, arrepende-se, pede perdão pelos erros cometidos e invoca proteção e
segurança a um Deus que condensa as ideias de infinitude, perfeição e completude
(SOUZA, 1995, p.28).
Sobre a razão, pode-se perceber sua importância fundamental no ato de crer. Como o
homem acreditaria na Revelação Divina se não fosse possível conhecê-la de forma intelectiva,
abstrata e conceitual?
[...] ainda que a fé esteja acima da razão, não poderá jamais haver verdadeira
desarmonia entre uma e outra, porquanto o mesmo Deus que revela os mistérios e
infunde a fé dotou o espírito humano da luz da razão; e Deus não poderia negar-se a
si mesmo, nem a verdade jamais contradizer a verdade (CATECISMO DA IGREJA
CATÓLICA, 1993, p.50).
Tudo que foi revelado fora feito por meio de palavras e ações intimamente relacionadas
entre si, de sorte, que seu conteúdo e suas manifestações puderam ser apreendidas,
compreendidas e internalizadas pelo homem através do uso natural da razão.
Confirma-se assim, uma vez mais, a harmonia fundamental entre o conhecimento
filosófico e o conhecimento da fé: a fé requer que seu objeto seja compreendido com
a ajuda da razão; por sua vez a razão, no apogeu de sua indagação, admite como
necessário aquilo que a fé apresenta (JOÃO PAULO II, 1998, p. 60).
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A RELAÇÃO INTRÍNSECA ENTRE FÉ E RAZÃO
Apresentadas a fé e a razão, em suas dimensões e expressões, resta expor a importância
da relação entre elas, para o aperfeiçoamento da pessoa humana em sua inteireza.
Segundo as palavras do Papa João Paulo II, a fé e a razão são como que duas asas de um
mesmo pássaro. Ambas são fundamentais para que esse pássaro possa voar e expressar de forma
plena sua natureza.
Faltando-lhe uma delas, gera-se a impossibilidade do voo, e consequentemente, a morte
do ser. Pois quem foi feito para voar, não se contenta com o rastejar.
Como é importante perceber a relação íntima entre fé e razão para que o homem alcance
seu aperfeiçoamento e, ao mesmo tempo, se realize enquanto pessoa.
O homem que crer precisa também pensar e, para pensar, ele precisa crer, por que os
sentidos, também, podem o enganar. “Não há motivo para existir concorrência entre a razão e
a fé: uma implica a outra, e cada qual tem seu espaço próprio de realização” (JOÃO PAULO
II, 1998, p. 29).
[...] a prioridade da fé não faz concorrência à investigação própria da razão. De fato,
esta não é chamada a exprimir um juízo sobre os conteúdos da fé; seria incapaz disso,
porque não é idônea. A sua tarefa é, antes, saber encontrar sentido, descobrir razões
que a todos permitam alcançar algum entendimento dos conteúdos da fé (JOÃO
PAULO II, 1988, p. 58-59).
Percebe-se, portanto, a íntima relação entre fé e razão, quando se é analisada a própria
natureza do homem, crente e pensante, pois não pode haver no mesmo ser, duas estruturas
cognitivas antagônicas e opostas. O homem que crê é o mesmo que pensa, pensando crê, crendo
pensa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Fé e a Razão, dimensões verdadeiramente humanas, estão intimamente relacionadas
entre si. Observando a própria natureza do homem, percebe-se que há uma inter-relação entre
o ato de crer e o ato de pensar.
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A fé compreende e a razão busca acreditar. Ambas buscam a verdade das coisas.
Procuram mergulhar na busca pela compreensão mais nítida e mais certa das realidades.
Não há entre a fé e a razão dicotomia, contradição ou exclusão. Mesmo sendo
autônomas, distintas em seu conteúdo e em seu objeto de reflexão possuem uma
interdependência antropológica, mas ambas têm a mesma origem e a mesma finalidade: Deus
e a verdade das coisas criadas.
No que se refere à fé, seu conteúdo é a revelação divina, expressa em palavras e ações.
A razão, por sua vez, tem como conteúdo as realidades materiais, coletadas através da
experiência sensorial.
No que se refere ao objeto, a fé tenta compreender as verdades reveladas por Deus e a
razão tenta compreender a dinâmica dos seres e das coisas visíveis, sua origem, causa-efeito,
leis e propriedades.
Em suma, tanto a Fé quanto a Razão são dimensões intrínsecas à pessoa humana, que
precisa compreender as realidades espirituais e materiais, através das lentes do crer (fé) e do
pensar (razão).
REFERÊNCIAS
Catecismo da Igreja Católica. 4.ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1993.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 16.ed. reform. e ampl. São Paulo:
Saraiva, 2006.
JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 3.ed. edição revista e ampliada. Rio
de
Janeiro:
2001.
Digitalizado
por
TupyKurumin.
Disponível
em
<http://dutracarlito.com/dicionario_de_filosofia_japiassu.pdf> Acesso em 16.03.2016.
JOÃO PAULO II. Carta Encíclica. Fides et Ratio. São Paulo: Paulinas, 1998.
POLITZER, Georges. Princípios elementares de filosofia. Trad. Sílvio Donizete Chagas. São Paulo: Centauro,
2001. 199 p.
SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar. São Paulo: FTD, 1995.
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TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I, 16, 2, C. Idem. Questões Disputadas Sobre a Verdade. I, 1, C. In:
LAUAND, Luiz Jean; SPROVIERO, Mario Bruno. Verdade e Conhecimento. Trad. Luiz Jean Lauand e Mario
Bruno Sproviero. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 149.
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES. Tópicos de Filosofia. Material Didático. Impressão e EditoraçãoPROMINAS-UCAM.
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