SERVIÇO MEDICAMENTOS MEDICAMENTOS em plena atividade, é preciso controlar o ambiente para que não haja um surto de infecção hospitalar”, completou o infectologista. PANZICA ORIGEM Cuidado com a superbactéria A resistência microbiana vem ocorrendo com mais freqüência nas últimas duas décadas. O problema coloca em risco a saúde de pacientes e serve de alerta contra o uso indiscriminado de antibióticos 30 B actérias mutantes, capazes de resistir aos antibióticos mais poderosos. Pacientes internados por muito tempo em hospitais, principalmente nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI). Grandes áreas hospitalares vulneráveis. A combinação desses três elementos pode causar a temida infecção hospitalar (IH), que pode se manifestar durante ou após a internação do paciente. A questão vem se tornando mais e mais preocupante nos últimos anos, por conta do surgimento de bactérias super-resistentes, que aumentam os riscos de infecção e dificultam o tratamento das pessoas contaminadas. “Porém, é importante frisar que, antes disso, as infecções surgem por falta de condições higiênicas específicas”, lembrou o infectologista Eduardo Alexandrino Medeiros, da Comissão de Epidemiologia Hospitalar da Universidade Revista do Idec | Agosto 2007 Federal de São Paulo (Unifesp). O uso de material contaminado, a má assepsia das mãos, a falta de hábitos de higiene da equipe médica, mas também dos pacientes e de suas visitas, são algumas das origens das infecções. Idosos, crianças prematuras e com baixo peso, obesos, diabéticos e portadores de câncer são os principais grupos suscetíveis a elas. O tempo de permanência num leito de hospital também influencia a probabibilidade de contágio. Ao mesmo tempo, a própria ação de uma bactéria resistente pode prolongar o tempo de internação em até 50%. Conseqüentemente, segundo especialistas, também pode aumentar seus custos em até 70%. Recentemente, foi detectada em pacientes do Hospital das Clínicas de Campinas uma variante resistente da bactéria Enterococcus faecium, que pode provocar infecção em rins, pulmões, pele e sangue. Para conter a contaminação, o hospital precisou reduzir a ocupação de leitos, assim como a realização de consultas e cirurgias. Até o fechamento desta reportagem, a contaminação havia sido detectada em 31 pessoas, e outras dezenas aguardavam o resultado de exames sobre a existência da superbactéria em seus intestinos. Mas como surgiu a variedade resistente da E. faecium? Essa bactéria, que já existe no intestino das pessoas, sofreu uma mudança por conta do uso prolongado de um antibiótico, a Vancomicina. Naturalmente, a bactéria acionou seguidamente um mecanismo de defesa próprio para reagir ao remédio que tentou exterminá-la. E é justamente o uso desnecessário e abusivo de antibióticos a grande causa do aumento da resistência das bactérias. “O antibiótico não é um míssil teleguiado, que vai agir diretamente na bactéria causadora da doença. Existe toda uma flora intestinal que também é atacada pelo antibiótico e que reage a ele. É um mecanismo de seleção natural”, explicou Alexandrino Medeiros, que aprovou as medidas tomadas pela Comissão de Controle de Infecções Hospitalares (CCIH) do HC de Campinas. “Uma vez detectada a existência de colônias da bactéria nos pacientes, o que não significa que as bactérias estivessem O primeiro antibiótico, a penicilina, foi descoberto de forma acidental em 1928, durante uma pesquisa do bacteriologista Alexander Fleming. Mas foi somente em 1941 que a droga foi usada para tratar os soldados feridos na Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, ela passou a ser produzida em larga escala para fins terapêuticos e comerciais. Na década de 1950, quando se acreditava que os problemas de infecção estariam resolvidos, médicos detectaram as primeiras bactérias resistentes. Surgiram, então, novos antibióticos para as infecções difíceis de se tratar com a penicilina. Já na década de 1980, com o desenvolvimento de antimicrobianos ainda mais potentes e com a evolução dos cuidados hospitalares, verificou-se um maior uso desses remédios e o conseqüente aumento da resistência bacteriana. Atualmente, os antibióticos utilizados durante as internações, geralmente em UTIs, são de amplo espectro e agem em diferentes frentes para aumentar a probabilidade de vida do paciente. O uso contínuo e prolongado de determinado antibiótico num hospital é que Campanha para informar Por causa da falta de dados sobre taxas de IHs, o Idec lançou em novembro do ano passado a campanha Exija Informação sobre o Controle de Infecções Hospitalares. Estudos indicam que um programa de controle de IH bem executado pode reduzir em até 30% a taxa de infecção do local. Para participar, enviando mensagens aos órgãos responsáveis a fim de cobrar a divulgação das informações, o consumidor pode acessar o site da campanha. Já denúncias sobre problemas com a qualidade dos serviços de saúde podem ser feitas diretamente na CCIH da própria instituição hospitalar, nas vigilâncias sanitárias municipais, estaduais, ou na Anvisa – pessoalmente, por email, carta, fax ou telefone. "Além de controlar o uso de antibióticos e reduzir o tempo dos tratamentos, é preciso investir na capacitação. Infelizmente, [a qualidade da] formação do médico e de outros profissionais da saúde vem caindo muito", alertou o infectologista Eduardo Alexandrino Medeiros. Questionado sobre a pressão da indústria farmacêutica para a utilização de remédios novos e mais caros, o médico concordou em parte. "Existe pressão dos laboratórios para os novos e para os antigos medicamentos", disse. "Mas a formação do profissional é que vai determinar o seu comportamento ético." Revista do Idec | Agosto 2007 31 FAZENDO JUSTIÇA MEDICAMENTOS Eduardo Alexandrino Medeiros, da Unifesp IMPORTÂNCIA DA INFORMAÇÃO As taxas de IH deveriam ser divulgadas pelas Comissões de Controle de Infecções Hospitalares (CCIH), criadas para elaborar, implementar, manter e avaliar o Programa de Controle de Infecção Hospitalar do Ministério da Saúde, surgido em 1998. Cada unidade de saúde, pública ou privada, deve ter uma CCIH formada por especialistas e deve adequar o programa a suas características e necessidades. Em 2004, a Anvisa lançou o Sistema Nacional de Informação para o Controle de 32 Revista do Idec | Agosto 2007 Infecções em Serviços de Saúde (Sinais), uma ferramenta para os hospitais e gestores de saúde aprimorarem a prevenção e o controle das IHs. O sistema permitiria conhecer a atuação das CCIHs e também as taxas de infecções de cada hospital. Para que desse certo, seria necessária a colaboração voluntária dos estabelecimentos de saúde, que teriam de enviar as informações. Porém, uma pesquisa realizada pelo Idec em 2006, intitulada O Controle de Infecção Hospitalar no Brasil e os Consumidores, levantou que, dos 6.895 hospitais do país, apenas 50, localizados em 17 estados, enviavam informações para o Sinais em 2005. E, até hoje, o sistema fica restrito a hospitais e instituições gestoras de saúde. Ou seja, o consumidor continua não tendo acesso às informações. Resta-lhe, então, entrar em contato direto com a CCIH da unidade de saúde ou com a vigilância sanitária municipal ou estadual, para solicitar os índices. Se é que ele vai conseguir obtê-los, embora o Código de Defesa do Consumidor (artigo 6o, III) determine “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços”, “com especificação correta sobre os riscos que apresentem”. O levantamento do Idec, enviado à Anvisa e a todas as comissões estaduais e vigilâncias sanitárias do país, não recebeu respostas da grande maioria dos estados (23). Mesmo São Paulo, apesar de ter respondido e de possuir uma das vigilâncias de IHs mais bem estruturadas, ainda está aquém do esperado. Dos seus 896 hospitais declarados, apenas 471 notificaram trimestralmente seus casos de infecção, em 2004. E até hoje o estado nunca divulgou informações sobre suas taxas de IH. Mas no próximo dia 15 de agosto, o Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) de São Paulo pretende apresentar dados do Sistema de Vigilância das IHs. Saiba mais ● Conheça a campanha Exija Informação sobre o Controle de Infecções Hospitalares: http://www.idec. org.br/cyberativismo/infeccaohospitalar/default.aspx ● Para saber endereços, telefones e sites de secretarias estaduais e municipais de saúde e de centros de vigilância sanitária, acesse www.anvisa.gov.br/institucional/ snvs/index.htm Quem promete, tem que cumprir O Juizado Especial Cível de Osasco maio de 2007, o juiz da causa condenou a (SP) tomou uma importante deci- empresa a devolver a diferença de preço, são: condenou a rede de supermer- mas reputou a causa como “mero aborrecados Wal-Mart a cumprir a promessa de cimento” não indenizável. Foi considerado cobrir uma oferta de seu concorrente. como cerne da questão o fato de a propaUm consumidor entrou com ação após ganda prometer cobrir as ofertas feitas tentar pedir a diferença do produto, um pela concorrência “na hora, no caixa, sem pneu de carro, anunciado pelo concor- burocracia”. A sentença também afirma rente com um preço mais que a concorrente não baixo, na boca do caixa. podia ser considerada O cliente levou uma foto atacadista, já que venque comprovava a oferdia o produto por unita do concorrente, mas a dade, prática compatíConsumidor ganha rede impôs diversas resvel com o varejo. Além ação contra rede trições que não estavam disso, o julgador achou disponíveis aos consumiexcessivas as restrições de supermercados dores. impostas pelo estabeleWal-Mart, que O supermercado decimento, que praticafendeu-se alegando que não cumpriu a mente “liquidavam” a a empresa concorrente promoção. promessa de cobrir era atacadista e não vareAnúncios como esjista, e que se tratava de oferta do concorrente se vêm se multiplicanuma propaganda feita do nos panfletos publidentro da loja, que exicitários de supermerbia diversas restrições à cados e, conseqüentepromoção. Além disso, mente, nos tribunais. havia a exigência de que o concorrente Embora atinja apenas as partes do procesdeveria estar localizado a uma distância so (o consumidor e a rede de supermercade 10 minutos, de carro, da loja. “A qual dos), tal decisão demonstra que o consumomento do dia o Wal-Mart está se refe- midor está amparado pelo Código de Derindo? A distância de 10 minutos é uma fesa do Consumidor (CDC). às 10 horas da manhã e outra às 6 horas O artigo 30 do CDC, que aborda a da tarde”, pondera Luiz Fernando Mon- questão da publicidade dentro das práticau, advogado do Idec. cas comerciais, determina que as ofertas O consumidor pediu na Justiça uma in- feitas ao público devem fazer parte de um denização pelo tempo de espera na fila do contrato que eventualmente venha a ser estabelecimento, já que este não devolveu estabelecido entre consumidor e fornecea diferença entre o preço efetivamente co- dor. O juiz que proferiu a sentença inbrado pelo Wal-Mart e o oferecido pela centivou os órgãos de defesa de consurede concorrente para cobrir a oferta. midores e o Ministério Público a enfrenNa sentença, proferida no dia 18 de tarem falsas promessas como essa. PHOTOS.COM GILBERTO MARQUES causa o surgimento de uma variação de bactéria resistente, que passa a se multiplicar e a infectar o ambiente hospitalar. Por isso, cada hospital e cada região hospedam superbactérias diferentes. No Brasil, uma das principais variações de bactérias resistentes é a Pseudomonas aeruginosa, que também aparece em infecções hospitalares em outras partes do mundo. A versão resistente dessa bactéria surgiu em função do uso prolongado de um tipo de antibiótico (as cefalosporinas) que também deu origem a variações de outras bactérias, como a Acinetobacter baumannii e a Klebsiella pneumoniae, ambas importantes causadoras de infecções hospitalares. Outra bactéria importante, a Staphylococcus aureus, desenvolveu resistência à oxacilina. Segundo um levantamento realizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) entre julho de 2006 e março de 2007, a taxa de sensibilidade do Staphylococcus foi de 38%. Isso significa que, de cada 100 casos de infecção pela espécie notificados na pesquisa, apenas 38 foram sensíveis ao antimicrobiano. A pesquisa foi realizada em parceria com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e a Coordenação Geral de Laboratórios de Saúde Pública do Ministério da Saúde (CGLAB/MS). A análise foi baseada nas 1.076 notificações enviadas nesse período por 64 hospitais de 21 estados sobre “ocorrências de infecções primárias na corrente sanguínea”. Revista do Idec | Agosto 2007 33