Módulo I Abdome Agudo Abdome Agudo 1 Roberto Valente Síndrome clínica caracterizada pelo início abrupto de dor abdominal, de forte intensidade, suficiente para necessitar assistência médica e/ou cirúrgica de emergência, à qual se associam, frequentemente, manifestações locais e sistêmicas com variados níveis de gravidade. O diagnóstico preciso da causa determinante e as repercussões locais e gerais do processo de doença são o objetivo principal da avaliação clínica do paciente com abdome agudo (AA), que deve ser feita no menor tempo possível, considerando dados de história clínica; antecedentes médicos; exame físico, incluindo, quando necessário, toque retal e avaliação ginecológica; e exames de laboratório e de bioimagem. A precisão e a rapidez do diagnóstico são importantes, porque o AA traduz, em geral, uma situação grave, muitas vezes associada a risco de morte e que exige tratamento imediato e efetivo. Dor abdominal é a principal e, frequentemente, a única manifestação de AA. Inicialmente, pode se manifestar por dor de caráter insidioso na linha média ou mal localizada tipo peso ou cólica, traduzindo envolvimento do peritônio visceral inervado por nervos autonômicos simpáticos e parassimpáticos, evoluindo posteriormente para dor bem localizada, de maior intensidade, decorrente de irritação do peritônio parietal inervado por nervos somáticos de origem espinhal. A dor é um fenômeno psíquico que requer consciência e pode estar ausente em pacientes idosos, debilitados ou imunodeprimidos. Dor abdominal pode ser manifestação de doença intra ou extra-abdominal. As principais causas de AA são agrupadas em AA inflamatório, perfurante, obstrutivo, hemorrágico e isquêmico (Tabela 1). Seu diagnóstico requer julgamento clínico criterioso e conhecimento das principais manifestações clínicas associadas às variadas causas de AA (Tabelas 2 e 3). 4 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed No AA de natureza inflamatória, a laparoscopia tem se mostrado um método diagnóstico de elevada acurácia (86%-100%), podendo ter papel terapêutico sem necessidade de conversão para cirurgia aberta. Abdome agudo Avaliação clínica Não Estabilidade hemodinâmica Sim Sinais de peritonite difusa (Rigidez abdominal) Atentar para SD de rotura de aneurisma de aorta Considerar cateter venoso central Ressuscitação volêmica SF 0,9% 1000 mL O2 sob cateter nasal 2 L/min Intervenção cirúrgica imediata Não Algoritmo de AA sem sinais de peritonite difusa Sim Coleta de HMG completo, Na, K, ureia, creatinina, amilase, lipase, RNI, VHS e glicemia Considerar betaHCG sérica em mulheres em idade fértil Rx tórax, Rx simples de abdome em duas incidências Considerar TC ou US de abdome a depender da SD Pneumoperitôneo Obstrução de intestino delgado/grosso SD de AA isquêmico Normal ou achados inespecíficos SD de AA hemorrágico Considerar antibioticoterapia Cirurgia de urgência Algoritmo de AA isquêmico Algoritmo de obstrução intestinal Considerar outras causas de AA com sinais de peritonite difusa (pancreatite aguda; peritonite bacteriana espontânea, causas extra-intestinais de AA) Considerar laparotomia Considerar videolaparoscopia diagnóstica (VLD) e tratamento SN Módulo I ■ Capítulo 1 ■ Abdome Agudo Abdome agudo sem sinais de peritonite difusa Dor mal localizada Suspeita de rotura de aneurisma de aorta Suspeita de AA Isquêmico Considerar cateter venoso central Ressuscitação volêmica SF 0,9% 1000 mL O2 sob cateter nasal 2 L/min Intervenção cirúrgica imediata Algoritmo de AA isquêmico Obs.: manejo individualizado de acordo com quadro clínico e exames laboratoriais Atentar para causas extraintestinais de dor abdominal Dor bem localizada Epigástrio Diagnóstico diferencial com isquemia miocárdica, pericardite, dispepsia, úlcera péptica, fase inicial de apendicite, pancreatite aguda Quadrante superior direito Diagnóstico diferencial com isquemia miocárdica, pericardite, dispepsia, úlcera péptica, pielonefrite, nefrolitíase, apendicite, pneumonia, pleurite, tromboembolismo pulmonar, empiema pleural, abscesso subdiafragmático, herpes zóster, fratura de costela, colecistite aguda, cólica biliar, colangite, hepatite, abscesso hepático, síndrome de Budd-Chiari, congestão passiva do fígado por ICC Quadrante superior esquerdo Diagnóstico diferencial com isquemia miocárdica, pericardite, dispepsia, úlcera péptica, pielonefrite, nefrolitíase, apendicite, pneumonia, pleurite, tromboembolismo pulmonar, empiema pleural, abscesso subdiafragmático, herpes zóster, fratura de costela, infarto esplênico, rotura esplênica, esplenomegalia, AAA, aneurisma de artéria esplênica, colite isquêmica Quadrante inferior direito Quadrante inferior esquerdo Diagnóstico diferencial com apendicite, diverticulite de Meckel ou de cólon direito, doença de Crohn, enterite e/ou adenite mesentérica, colecistite, cólica biliar Diagnóstico diferencial com hematoma de reto abdominal, herpes zóster, hérnia de disco, abscesso de psoas, pancreatite, síndrome do intestino irritável, abscesso túbulo-ovariano, torsão de ovário, gravidez ectópica, salpingite, endometriose, Mittelscherz, urolitíase, cistite, AAA, aneurisma de artéria ilíaca Diagnóstico diferencial com diverticulite, neoplasia perfurada de cólon esquerdo, obstrução intestinal, doença de Crohn, retocolite Considerar VLD diagnóstica em casos duvidosos sem esclarecimento diagnóstico, após avaliação clinicolaboratorial e radiológica 5 6 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 1: Causas de abdome agudo de acordo com sua etiologia Inflamatório: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda, diverticulite do cólon, doença inflamatória pélvica, abscessos intracavitários, peritonites primárias e secundárias, febre do Mediterrâneo Perfurante: úlcera péptica, câncer gastrintestinal, febre tifoide, amebíase, divertículos de cólons, perfuração do apêndice, perfuração da vesícula biliar Obstrutivo: obstrução pilórica, hérnia estrangulada, bridas, áscaris, corpo estranhos, cálculo biliar, volvo, intussuscepção intestinal Hemorrágico: gravidez ectópica, rotura de aneurisma abdominal, cisto hemorrágico de ovário, rotura de baço, endometriose, necrose tumoral Isquêmico: trombose da artéria mesentérica, torção do grande omento, torção do pedículo de cisto ovariano, infarto esplênico Tabela 2: Causas extraintestinais de abdome agudo Torácicas Infarto do miocárdio Pericardite aguda Pneumonia de lobo inferior Pneumotórax Infarto pulmonar Embolia pulmonar Hematológicas Crise falciforme Leucemia aguda Neurológicas Herpes zóster Tabes dorsalis Compressão de raiz nervosa Metabólicas Cetoacidose diabética Crise addisoniana Porfiria intermitente aguda Hiperlipoproteinemia Relacionadas e tóxicos Intoxicação por chumbo Abstinência de narcóticos Etiologia desconhecida Fibromialgia Picadas de cobras ou insetos Módulo I ■ Capítulo 1 ■ Abdome Agudo Tabela 3: Causas mais frequentes de abdome agudo (n = 30.000) Apendicite 28% Colecistite aguda 9,7% Obstrução de intestino delgado 4,1% Doença ginecológica 4% Pancreatite aguda 2,9% Nefrolitíase 2,9% Úlcera péptica perfurada 2,5% Diverticulite aguda 1,5% Causa não aparente 1/3 dos casos Fonte: adaptada de Bombal (1991). Referências Bibliográficas 1. Martin RF, Rossi RL. The acute abdome. An overview and algorithms. Surg Clin North Am 1997; 77(6): 1227-43. 2. Langell JT Gastrointestinal perforation and the acute abdomen. Med Clin North Am 2008; 92: 599-625. 7 Apendicite Aguda 2 Roberto Valente Inflamação da parede do apêndice secundária à obstrução por fecalitos, hiperplasia linfoide, tumores ou corpo estranho, com consequente infecção por proliferação bacteriana, podendo ser complicada por perfuração com formação de abscesso e/ou peritonite. Apendicite aguda é a principal causa de AA com prevalência cumulativa de até 6,7% para mulheres e 8,6% para homens (Tabelas 1 e 2). 10 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Apendicite aguda Suspeita de apendicite aguda Dor em FID Reação peritoneal e/ou Temperatura > 38°C Sim e/ou Leucocitose > 10.000 Mulheres em idade fértil Não Homens Reavaliação clínico-laboratorial em 6 a 12 h Exclusão de doença ginecológica Cefazolina 1 g 30 minutos antes da cirurgia Cirurgia preferencialmente laparoscópica Apendicite complicada (perfuração/abscesso/gangrena) Considerar US versus CT de abdome total (Tabelas 3 e 4) Abscesso periapendicular Solicitar/avaliar resultados de beta-HCG Considerar US pélvico Manter ampicilina/sulbactam 1,5 a 3,0 g IV de a cada 6 h por 5 a 7 dias Considerar mudança do esquema antibiótico a depender do achado intra-operatório e/ou resultados de culturas Considerar ciprofloxacino 400 mg IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg IV a cada 6 h. Ajustar conforme resultado de culturas Considerar punção percutânea se > 5 cm Considerar cirurgia imediata versus. cirurgia 6 a 8 semanas após punção Tabela 1: Quadro clínico de apendicite aguda Apresentação típica 60% Dor periumbilical, náuseas e vômitos, com localização posterior em QID Apresentação atípica 40% Módulo I ■ Capítulo 2 ■ Apendicite Aguda Tabela 2: Resultados de apendicectomia por suspeita de apendicite aguda (n = 14 estudos) Apêndice normal 6 a 33% Apendicite não complicada 37 a 86% Apendicite perfurada 14 a 36% Carcinoide 0,5% Adenocarcinoma 0,2% Tabela 3: Métodos complementares para diagnóstico de apendicite aguda em casos duvidosos Método Sensibilidade Especificidade Achados Ultrassonografia 75 a 100% 71 a 100% Apêndice não-compressível, aperistáltico, com diâmetro transverso > 6 mm Presença de líquido intraluminal Espessamento de gordura periapendicular Sinal de Mac Burney ecográfico Espessamento da parede apendicular > 2 mm Presença de fecalito apendicular TC de abdome 93 a 96% 89 a 97% Apêndice com diâmetro superior a 6 mm Espessamento da parede e da gordura periapendicular Tabela 4: Vantagens e desvantagens dos métodos complementares para diagnóstico de apendicite aguda em casos duvidosos Método Vantagens Ultrassonografia Segurança Diagnóstico diferencial com doença inflamatória pélvica e outras enfermidades ginecológicas TC de abdome Maior acurácia diagnóstica (uso de contraste oral) Melhor identificação de fleigmão e abscesso Maior valor preditivo negativo Desvantagens Custo Uso de radiação ionizante 11 12 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Referência bibliográfica 1. Dominguez EP, Sweeney JF, Choi Y. Diagnosis and management of diverticulitis and appendicitis. Gastroenterol Clin North America 2006; 35: 367-391. Colecistite Aguda 3 Roberto Valente Inflamação da vesícula biliar (VB), habitualmente secundária à obstrução do ducto cístico, por cálculos que ocorre em cerca de 1 a 3% dos indivíduos portadores de colelitíase sintomática (Tabelas 1 e 2) . A infecção bacteriana secundária ocorre em 20% dos casos. Colecistite gangrenosa, empiema de vesícula biliar e perfuração são complicações observadas em cerca de 2 a 30% dos casos. Colelitíase alitiásica corresponde por aproximadamente 5 a 14% dos casos de colecistite aguda, sendo observada usualmente em pacientes críticos. 14 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Colecistite aguda SD de colecistite aguda Coleta de hemograma, TP, plaquetas, TGO, TGP, FA, GGT, BT e F, amilase, lipase, Na, K, U, Cr, glicemia e US abdome superior US de abdome superior (atentar para preparo adequado com jejum > 4 a 6 h) Colecistite litiásica Evolução < 24 h Ausência de sinais de SRIS Colecistite alitiásica (Tabela 3) Jejum/hidratação (SF 0,9% 500 a 1000 mL em 3 a 6 h) Analgesia com hioscina + novalgina/tramadol ou meperidina SN Optar por cirurgia videolaparoscópica (CVL) precoce na ausência de comorbidade descompensada com antibioticoprofilaxia com cefazolina 2 g IV Evolução > 24 h e/ou sepse Leucocitose > 17.000 Deterioração clínica Peritonite Enfisema de parede de vesícula biliar Considerar DISIDA em casos duvidosos Hospitalização (UGH se leucocitose > 17.000 ou SRIS ou idade > 75 anos ou comorbidade significativa) Considerar ciprofloxacino 400 mg IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg a cada 6 h (diabéticos/ colecistite gangrenosa) Não Sim Colestase/icterícia persistente(s) Elevação de amilase/lipase Algoritmo de pancreatite aguda CVL precoce se evolução < 72 a 96 h CVL tardia (6 a 12 semanas) se evolução > 72 a 96 h CVL urgente: considerar colecistostomia percutânea no paciente crítico CPRM Coledocolitíase Dilatação de VVBB CPRE Antibioticoterapia direcionada por culturas. Considerar empiricamente cefepime 2 g IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg a cada 8 h. Considerar colecistostomia percutânea no paciente crítico + CVL posterior, ou a depender do estado clínico CVL precoce Módulo I ■ Capítulo 3 ■ Colecistite Aguda Tabela 1: Critérios diagnósticos ultrassonográficos para colecistite aguda Espessamento da parede da VB > 4 mm Distensão da VB Líquido perivesicular Sinal de Murphy com o transdutor Cálculos biliares/lama (sludge) biliar (colecistite litiásica) Tabela 2: Dados relevantes sobre colelitíase Frequências Colelitíase 10% Colelitíase assintomática 8% Colecistite aguda 1 a 3% dos casos sintomáticos Patogênese Obstrução do ducto cístico 90% Distensão/edema/inflamação 100% Infecção bacteriana (E coli, Klebsiella pneumoniae, S. faecalis) 20% Complicações Colecistite necrotizante 2 a 30% Perfuração 10% Fístula colecistoentérica (duodenal; na flexura hepática do cólon) Íleo biliar 15 16 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 3: Dados relevantes sobre colecistite alitiásica Frequência 5 a 14% dos casos de colecistite Mortalidade 50% Fatores de risco Trauma Diabetes Queimados Doença aterosclerótica difusa Cirurgia de grande porte (cardíaca) Vasculite Jejum prolongado IRA NPT AIDS Referência bibliográfica 1. Indar AA, Beckingham IJ. Acute cholecystitis. BMJ 2002; 325:639-43. Diverticulite Aguda 4 Roberto Valente Inflamação e/ou infecção secundária à perfuração de divertículos que ocorre em 10 a 25% dos portadores de doença diverticular dos cólons (Tabela 1). Envolve o cólon sigmoide em aproximadamente 65% dos casos. Cerca de 25% dos episódios de diverticulite aguda cursam com complicações, tais como abscesso, fístulas ou peritonite generalizada (Tabela 2). 18 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Diverticulite aguda Sd de diverticulite aguda (Tabela 2) Coleta de hemograma, TP, plaquetas, amilase, lipase, VHS, Na, K, U, Cr, glicemia TC de abdome total com contraste IV e oral (opcional na presença de quadro típico de diverticulite aguda não-complicada) (Tabelas 3 e 4) Diverticulite aguda não-complicada Critérios para tratamento ambulatorial (Tabela 5) Não Sim Dieta pobre em resíduos Analgesia com hioscina + novalgina ou tramadol Amoxicilina/clavulanato 500/125 mg a cada 8 h por 10 dias ou Reavaliação clínica em 48 a 72 h Colonoscopia após 30 dias (exclusão de neoplasia) Considerar recomendações dietéticas (Tabela 6) Avaliar opção de tratamento cirúrgico eletivo no caso de recorrência e idade inferior a 40 anos (Tabela 7) Melhora clínica Admissão hospitalar Jejum ou dieta líquida na ausência de íleo ou obstrução Analgesia com hioscina + novalgina ou tramadol ou meperidina SN Ciprofloxacin 400 mg IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg IV a cada 6 h após hemocultura Não Melhora clínica em 48 a 72 h Jejum Rever/Ajustar antibioticoterapia conforme resultados de culturas Considerar CT de abdome Avaliar indicação cirúrgica (considerar quando possível ressecção com anastomose primária) (Tabela 8) Abscesso/fístula/peritonite/ obstrução Sim Progredir dieta Ciprofloxacin 500 mg VO a cada 12 h + metronidazol 400 mg VO a cada 8 h por 10 dias Considerar esquema alternativo com ampicilina/sulbactam 375 mg a cada 12 h para aumentar aderência Algoritmo de diverticulite aguda complicada Módulo I ■ Capítulo 4 ■ Diverticulite Aguda Diverticulite aguda complicada Abscesso (Tabela 9) Hinchey I Hinchey II Lesão > 5 cm Tratamento clínico (vide algoritmo de diverticulite aguda) Ausência de melhora em 48 a 72 h Considerar drenagem percutânea guiada por TC Ausência de melhora em 48 a 72 h Abscesso multiloculado Difícil acesso para drenagem percutânea Considerar cirurgia (quando possível ressecção com anastomose primária) Fístulas Tratamento clínico Cirurgia (quando possível ressecção com anastomose primária) Peritonite Obstrução Jejum + Progressão lenta de dieta com suplemento de absorção alta Cirurgia caso não haja resolução dos sintomas em 5 a 7 dias 19 20 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 1: Dados relevantes sobre doença diverticular dos cólons Frequência 5% dos indivíduos com 40 anos 30% dos indivíduos com 60 anos 65% dos indivíduos com 80 anos Localização Envolvimento de sigmoide 95% Envolvimento restrito ao sigmoide 65% Envolvimento de todo o cólon 7% Complicações 20 a 30% Diverticulite 10 a 25% Não-complicada 75% Complicada (abscesso/fístula/perfuração) 25% Sangramento 5 a 15% Tabela 2: Apresentações clínicas e laboratoriais da diverticulite aguda Dor em hipogástrio/quadrante inferior esquerdo Alteração de ritmo intestinal (frequentemente diarreia) Dor genital ou suprapúbica Anorexia, náusea e vômitos Disúria Pneumatúria/fecalúria Obstrução de intestino grosso Obstrução de intestino delgado Leucocitose (45% dos pacientes) Tabela 3: Métodos diagnósticos para diverticulite aguda Método Sensibilidade Especificidade Ultrassonografia 84 a 98% 80 a 98% TC de abdome 69 a 95% 75 a 100% Módulo I ■ Capítulo 4 ■ Diverticulite Aguda Tabela 4: Achados tomográficos na diverticulite aguda Inflamação da gordura pericólica 98% Divertículos 84% Espessamento parietal do cólon 70% Abscesso pericólico 35% Peritonite 16% Fístula 14% Obstrução colônica 12% Trajetos fistulosos intramurais 9% Fonte: adaptada de Hulnik et al., Radiology 1984 Tabela 5: Critérios para tratamento ambulatorial para diverticulite aguda leve Ausência de sinais de SRIS Ausência de comorbidade significativa (particularmente imunosupressão) Habilidade para manter ingesta oral Alta expectativa de aderência ao tratamento Tabela 6: Recomendações dietéticas para portadores de doença diverticular dos cólons Dieta rica em frutas e fibras vegetais (aproximadamente 32 g de fibra/dia) Tabela 7: Indicações para tratamento cirúrgico eletivo (6 a 8 semanas após hospitalização) Recorrência de > 2 episódios de diverticulite aguda requerendo hospitalização * Episódio prévio de diverticulite complicada * Indicação de cirurgia mais precoce pode ser considerada no indivíduo jovem com idade inferior a 40 anos ou no indivíduo imunossuprimido 21 22 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 8: Indicações cirúrgicas na diverticulite aguda Perfuração livre com peritonite Obstrução Abscesso não-abordável por via percutânea Fístula Ausência de melhora ou deteriorização clínica com tratamento conservador Tabela 9: Classificação de diverticulite aguda de acordo com Hinchey I abscesso pericólico II abscesso a distância retroperitoneal ou pélvico III peritonite purulenta IV peritonite fecal Referências Bibliográficas 1. Dominguez EP, Sweeney JF, Choi Y. Diagnosis and management of diverticulitis and appendicitis. Gastroenterol Clin North America 2006; 35: 367-391 2. Stollman NH, Raskin JB. Practice guidelines. Diagnosis and management of diverticular diseases in adults. Am J Gastroenterol 1999; 94: 3110-3121. Pancreatite Aguda 5 Cláudio Celestino Zollinger Paulo Lisboa Bittencourt Processo inflamatório agudo da glândula pancreática, secundário à ativação de enzimas digestivas no interior das células acinares, que induzem à lesão e necrose do parênquima, responsável por complicações locais: necrose pancreática (estéril ou infectada), pseudocisto e abscesso e sistêmicos: SRIS; sepse e disfunção orgânica. As principais causas de pancreatite aguda admitidas na UGH são, em ordem de frequência: biliar (37%), alcoólica (20%), idiopática (17%), medicamentosa (6%), pós-CPRE (5%), hipertrigliceridemia (5%), obstrução por áscaris ou tumor (4%) e hipercalcemia (1%). O diagnóstico baseia-se na presença de pelo menos dois de três critérios: dor abdominal típica, elevação de amilase e lipase 3 vezes acima do valor normal e alterações compatíveis à TC. 24 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed SD de Pancreatite aguda Ressuscitação volêmica Analgesia • acetominofeno ou outra droga de ação periférica potencialmente combinada com droga antiespasmódica na dor de pequena intensidade • acetaminofeno + tramadol (ou substituto) na dor moderada • acetaminofeno + meperidina, buprenorfina ou infusão epidural de analgésicos na dor intensa ou refratária Coleta de exames: Na, K, U, Cr, HMG, glicose, DHL, cálcio e gasometria, lipase, amilase, proteína C reativa (48 h) TGO, TGP, FA, GGT, triglicérides, Rx de abdome e de tórax em PA e de perfil Coleta de lactato e hemogasometria arterial periférica e venosa central, para mensuração de saturação venosa mista de oxigênio, na suspeita clínica de pancreatite aguda grave Avaliação adicional de etiologia: US de abdome superior e história clínica com questionamento do uso de drogas, pródromos virais, status HIV, uso de álcool, CPRE ou cirurgia recente Estratificação de gravidade (Tabela 1, 2 e 3) Pancreatite aguda leve Pancreatite aguda grave Módulo I ■ Capítulo 5 ■ Pancreatite Aguda Tabela 1: Estratificação de gravidade na pancreatite aguda Pancreatite aguda grave Presença de falência orgânica com > 1 critérios PAS < 90 mmHg; PO2 < 60 mmHg; insuficiência renal (Cr > 2 mg/dl após expansão volêmica); hemorragia digestiva (> 500 mL em 24 horas) APACHE II ≥ 8 Pontuação na Classificação de Ranson ≥ 3 Presença de complicações locais: necrose, abscesso, pseudocistos Pancreatite aguda grave (critérios adicionais) Proteína C reativa > 150 mg/L nas 48 h Derrame pleural Pontuação de 7 na escala de Balthazar baseada em TC Índice de massa corpórea > 30 Idade superior a 70 anos Hematócrito > 43% para homens e 39,6% para mulheres Persistência de disfunção orgânica por > 48 h Pancreatite aguda leve Ausência de falência orgânica APACHE II < 8 Pontuação na Classificação de Ranson < 3 Pontuação inferior a 7 na escala de Balthazar baseada em TC 25 26 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Pancreatite aguda leve Analgesia Dieta oral conforme aceitação SNG aberta se houver náusea ou vômitos Colelitíase à US Ausência de evidências laboratoriais e radiológicas de coledocolitíase Programar colecistectomia após melhora clínica Ausência de melhora em 48 a 72 h Reavaliação diagnóstica Nova estratificação de gravidade TC de abdome Colelitíase com dilatação de vias biliares Coledocolitíase e/ou persistência de colestase Considerar CPRE com papilotomia e retirada de cálculos Colangite Antibioticoterapia (vide algoritmo de colangite aguda) Módulo I ■ Capítulo 5 ■ Pancreatite Aguda Pancreatite aguda grave Admissão em unidade de terapia intensiva Analgesia e SNG aberta na presença de íleo Expansão volêmica agressiva de acordo com variáveis de perfusão Considerar monitorização hemodinâmica invasiva na presença de instabilidade hemodinâmica e disfunção orgânica não reversível com Ressuscitação volêmica adequada Suporte respiratório e cardiovascular Suporte nutricional enteral precoce com sonda em posição jejunal Considerar antibioticoterapia profilática com carbapenêmico por 14 dias em paciente com disfunção orgânica não reversível em > 48 h + necrose pancreática + SRIS TC helicoidal dinâmica ou ressonância magnética se creatinina > 2 mg/dL Investigação inicial de necrose pancreática 3 a 5 dias após admissão Avaliação subsequente de PA grave em graus D e E de Balthazar de 7 e 10 dias Investigação de complicações locais na presença de deterioração clínica Pseudocistos Tratamento conservador Considerar cirurgia ou tratamento endoscópico após 6 semanas na presença de sintomas Abscesso Drenagem cirúrgica e antibioticoterapia Considerar tratamento endoscópico Necrose Punção aspirativa com agulha fina guiada por TC na suspeita de necrose infectada: 1) piora progressiva do leucograma; 2) deterioração clínica; 3) DMOS Manutenção de tratamento agressivo de suporte Considerar cirurgia na presença de síndrome de compartimento, obstrução ou sangramento Gram ou cultura - Necrose estéril Gram ou cultura + Necrose infectada Ajustar antibioticoterapia de acordo com culturas Avaliar introdução de antifúngico em pacientes que fizeram uso de antibioticoterapia profilática com carbapenêmico Cirurgia (preferencialmente entre a 2ª e a 3ª semana) optando-se pela técnica de maior experiência no serviço* Colelitíase Coledocolitíase com sinais de obstrução biliar e/ou colangite Colecistectomia após resolução do quadro no mesmo internamento CPRE de urgência dentro das primeiras 48 a 72 h * Avaliar cautelosamente opção de conduta conservadora em pacientes com boa evolução clínica sem progressão ou nova disfunção orgânica, avaliadas diariamente pelos scores de APACHE e SOFA 27 28 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 2: Classificação de Ranson Admissão Dentro de 48 h Idade > 55 anos Queda Ht > 10% Leucograma > 16.000 Aumento Ur > 15 mg/dL Glicose > 200 Ca++ < 8 DHL > 350 PO2 < 60 AST > 250 Déficit de bases > 4 meq/L Sequestração > 6 L Tabela 3: Classificação de Balthazar baseada em achados tomográficos Grau Pontos % Necrose Pontos adicionais Índice de gravidade (pontuação final) A 0 0 0 0 B 1 0 0 1 C 2 < 30% 2 4 D 3 30 a 50% 4 7 E 4 > 50% 6 10 A = pâncreas normal; B = aumento focal ou difuso do pânceas; C = inflamação pancreática e/ou peripancreática; D = coleção única peripancreática; E = > 2 coleções peripancreáticas e/ou presença de ar retroperitoneal à TC Referências Bibliográficas 1. Bittencourt PL, Zollinger C. Pacreatite aguda. In: Caldeira F, Westphal. Manual prático de medicina intensiva. 6.ed. São Paulo: Segmento Farma Editores, 2009, p. 86-88. 2. Banks PA. Practice guidelines in acute pancreatitis Am J Gastroenterol 2006; 101:23792400. 3. British Society of Gastroenterology. United Kingdom guidelines for the management of acute pancreatitis. Gut 2005; 54:1-9. 4. Frossard JL, Steer ML, Pastor CM. Acute pancreatitis. The Lancet 2008; 371:143-52. 5. Whitcomb DC. Clinical practice. Acute pancreatitis. N Engl J Med 2006; 354:2142-50. Abdome Agudo Isquêmico 6 Sylvania Campos Pinho Marcos Vinicius Borges Souza Abdome agudo isquêmico é uma síndrome clínica associada à dor abdominal de forte intensidade, geralmente desproporcional aos achados de exame físico, que acomete preponderantemente indivíduos com idade superior a 50 anos, portadores de cardiopatia e/ou doença vascular aterosclerótica. É decorrente de redução acentuada do fluxo sanguíneo mesentérico, que se torna incapaz de suprir as demandas metabólicas do intestino, levando a graus variados de lesão isquêmica, a depender da duração e da intensidade do insulto isquêmico e da presença de circulação colateral. O fluxo sanguíneo responsável pela irrigação do esôfago, estômago, duodeno proximal, fígado, vesícula biliar, pâncreas e baço é derivado de artérias provenientes do tronco celíaco. A artéria mesentérica superior (AMS) e seus ramos são responsáveis pela irrigação do duodeno distal, jejuno, íleo, cólon direito e transverso. A artéria mesentérica inferior (AMI) e suas tributárias irrigam o cólon esquerdo e a porção proximal do reto. Os principais tipos de AA isquêmico são: isquemia mesentérica arterial aguda embólica (IMAA) ou trombótica; trombose venosa mesentérica; isquemia mesentérica arterial aguda não-oclusiva e colite isquêmica. A IMAA é um evento relativamente raro, sendo responsável por 0,1% das admissões hospitalares e por cerca de 1% das admissões por AA. Apresenta mortalidade elevada, oscilando entre 59 e 93%, devido ao seu diagnóstico ser habitualmente tardio, associando-se frequentemente a necrose extensa de intestino delgado e síndrome do intestino curto, nos pacientes que sobrevivem às complicações sépticas relacionadas. A mortalidade de pacientes tratados previamente à ocorrência de necrose isquêmica é significantemente inferior, oscilando entre 25 e 31%. 30 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Abdome agudo isquêmico Presença de dor abdominal de forte intensidade com duração superior a 2 ou 3 h sem evidência de outra causa de AA Fatores de risco (Tabelas 1 e 2) SD de abdome agudo isquêmico Coleta de HMG completo, Na, K, ureia, creatinina, amilase, lipase, RNI, VHS e glicemia, ECG Considerar beta-HCG sérica em mulheres em idade fértil Rx de tórax, Rx simples de abdome em duas incidências Sinais de peritonite difusa/rigidez abdominal Laparotomia Considerar relaparotomia com 12 a 24 h a critério do cirurgião Outra causa Vide algoritmo de AA SD mantida de abdome agudo isquêmico SD de trombose venosa mesentérica (estado de hipercoagulabilidade) Não Arteriografia mesentérica (Tabela 3) (preferencialmente < 12 h de dor) Oclusão não-embólica Tronco da AMS Sim TC helicoidal Trombose de veia mesentérica Oclusão embólica ou não-embólica Ramos secundários da AMS Oclusão embólica Tronco da AMS Vasoconstrição esplâncnica nãooclusiva Ressuscitação volêmica com RL 500 a 1000 mL SNG aberta Cateter vesical Considerar antibioticoterapia (ciprofloxacino 400 mg IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg IV a cada 6 h) (continua) Módulo I ■ Capítulo 6 ■ Abdome Agudo Isquêmico (continuação) Trombose de veia mesentérica Anticoagulação com heparina não-fracionada: 80 UI/kg em bolus + 18 UI/kg/h para manter TTPA 2x VN por 7 a 10 dias Melhora Evolução com sinais de peritonite difusa Uso de ACO por 3 a 6 meses Avaliação hematológica SN Acometimento segmentar Laparotomia Acometimento extenso do intestino delgado Ressecção Síndrome do intestino curto Necrose Intestino viável Ressecção VMS não-ocluída Considerar relaparotomia com 12 a 24 h a critério do cirurgião (continua) 31 32 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed (continuação) Oclusão não-embólica Tronco da AMS Não Evolução com sinais de irritação peritoneal Evidência angiográfica de circulação colateral Não Sim Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Laparotomia com reconstrução arterial e/ou ressecção Relaparotomia com 12 a 24 h a critério do cirurgião Considerar revascularização endoluminal Sim Não Enchimento adequado da AMS Sim Impossibilidade técnica Considerar relaparotomia com 12 a 24 h a critério do cirurgião Considerar conduta expectante Considerar revascularização endoluminal Oclusão embólica ou não-embólica Ramos secundários da AMS Evolução com sinais de irritação peritoneal Sim Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Laparotomia com ressecção segmentar Não Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Considerar uso de trombolíticos intraarteriais Reavaliação com arteriografia para controle com 12 a 24 h Considerar anticoagulação com heparina não-fracionada: 80 UI/kg em bolus + 18 UI/kg/h para manter TTPA 2x VN na ausência de evidências de necrose intestinal (continua) Módulo I ■ Capítulo 6 ■ Abdome Agudo Isquêmico (continuação) Oclusão embólica Tronco da AMS Evolução com sinais de irritação peritoneal Não Sim Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Embolectomia e/ou ressecção Considerar infusão de papaverina ou considerar uso de trombolíticos Insucesso Manter infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Considerar arteriografia de controle Considerar relaparotomia a critério do cirurgião Vasoconstrição esplâncnica sem oclusão arterial Evolução com sinais de irritação peritoneal Sim Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Laparotomia com ou sem ressecção Tratar causa subjacente Não Infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Manter infusão contínua de papaverina 30 a 60 mg/h intra-arterial via cateter Considerar arteriografia de controle Considerar anticoagulação com heparina não-fracionada: 80 UI/kg em bolus + 18 UI/kg/h para manter TTPA 2x VN na ausência de evidências de necrose intestinal 33 34 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Tabela 1: Tipos de síndromes mesentéricas isquêmicas Isquemia mesentérica aguda arterial embólica 50% Isquemia mesentérica aguda arterial por trombose 15 a 20% Trombose venosa mesentérica 5 a 15% Isquemia mesentérica não-oclusiva 20 a 30% Tabela 2: Fatores de risco para isquemia mesentérica aguda 1. Presença de dor abdominal de forte intensidade com duração superior a 2 ou 3 horas sem evidência de outra causa de AA 2. Fatores de risco para oclusão embólica ou não-embólica da AMS Idade superior a 50 anos Insuficiência cardíaca congestiva Arritmias (fibrilação atrial) IAM recente Hipovolemia Hipotensão Sepse Cirurgia cardíaca Diálise Antecedente de dor pós-prandial e sitofobia 3. Fatores de risco para oclusão da trombose de veia mesentérica Evento trombótico prévio (trombose venosa profunda, embolia pulmonar ou AVC) Estados de hipercoagulabilidade (deficiência de proteína C, S, antitrombina III ou resistência a ação da proteína C ativada) Tabela 3: Relação entre duração de sintomas e lesão intestinal irreversível na IMA embólica Duração de sintomas Ausência de lesão isquêmica irreversível < 12 h 100% 12 a 24 h 56% > 24 h 18% Módulo I ■ Capítulo 6 ■ Abdome Agudo Isquêmico Referências bibliográficas 1. Brandt LJ, Boley SJ. AGA technical review on intestinal ischemia. Gastroenterology 2000; 118: 954-968 2. Brandt LJ, Boley SJ. AGA medical position statement: Guidelines on intestinal ischemia. Gastroenterology 2000; 118: 951-953 3. Martinez JP, Rogan GJ. Mesenteric Ischemia. Emerg Med Clin North America; 2004;22:909928. 4. Gore RM, et al. Imaging in intestinal ischemic disorders. Clinical Gastroenterology and Hepatology 2008; 6:849-858. 5. Herbert GS, Steele SR. Acute and chronic mesenteric ischemia. Surg Clin North Am 2007; 87:1115-34. 35 Abdome Agudo Obstrutivo 7 Fernando Filardi Alves Souza Obstrução de qualquer segmento do tubo digestivo, que impeça o trânsito adequado do conteúdo intestinal, por redução do seu lúmen, por compressão mecânica intrínseca ou extrínseca ao trato gastrintestinal. Pode manifestar-se por síndrome de obstrução pilórica, obstrução de intestino delgado ou grosso, devendo ser diferenciada da síndrome de pseudo-obstrução, de causa multifatorial, secundária a distúrbios motores do tubo digestivo. SD de abdome agudo obstrutivo Jejum Manter aporte de 100 a 150 g de glicose IV em 24 h Ringer lactato 500 a 1000 mL IV em 1 a 2 horas + expansão de acordo com variáveis de perfusão Acesso venoso central e SVD na presença de instabilidade hemodinâmica, sinais de hipoperfusão ou disfunção orgânica SNG aberta Oximetria de pulso Controle de diurese Toque retal + inspeção de hérnias e cicatrizes Analgesia com Buscopan® composto 2 a 3 mL IV e/ou tramadol 100 mg a cada 6 h SN (continua) 38 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed (continuação) SD de abdome agudo obstrutivo Coleta de Na, K, U, Cr, Mg, HMG, glicose, lipase, amilase, AMS, gasometria, DHL, PCR, VHS, lactato Rx simples de abdome em AP e ortostase Obstrução de intestino delgado (Tabela 1) Obstrução de intestino grosso (Tabela 2) Síndrome de obstrução pilórica Pseudo-obstrução intestinal (Tabela 3) Abdome agudo Tabela 1: Causas de obstrução intestinal de intestino delgado Aderências 50-70% Pós-colectomia 20% Pós-apendicectomia 20% Pós-cirurgia ginecológica 15% Intervalo de 6 anos [7 meses e 65 anos] Hérnias 25% Femoral Inguinal Umbilical Incisional Paraduodenal Obturador Retroanastomótica Pericolostomia (Evidência de estrangulação em 1/3 dos casos) Neoplasias 10% Metástases ou carcinomatose peritoneal 9% Tumores de ID 1% Módulo I ■ Capítulo 7 ■ Abdome Agudo Obstrutivo Tabela 2: Causas de obstrução intestinal de intestino grosso Neoplasias 60% Vólvulo 20% Doença diverticular 10% Outros 10% Tabela 3: Causas de pseudo-obstrução colônica Pós-cirurgia abdominal Pós-procedimentos cirúrgicos ortopédicos, ginecológicos, urológicos Trauma retroperitoneal ou medular Idade avançada Sepse Doenças neurológicas Hipotiroidismo Infecções virais: HSV, VZV Insuficiência respiratória Hipocalemia Hipocalcemia Hipomagnesemia Medicações: narcóticos, antidepressivos tricíclicos, fenotiazinas, antiparkinsonianos, anestésicos Insuficiência renal crônica Tabela 4: Causas de íleo Pós-laparotomia Hipocalemia, hiponatremia, hipomagnesemia, hipermagnesemia Drogas: fenotiazinas, opiáceos, diltiazen, verapamil, clozapina, anticolinérgicos Abdome agudo: apendicite aguda, diverticulite aguda, úlcera duodenal perfurada Hemorragia retroperitoneal Pancreatite aguda, nefrolitíase, pielonefrite Isquemia mesentérica Fraturas de costelas, pneumonias lobares, IAM Sepse 39 40 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Referências bibliográfica 1. Turnage RH, Heldmann M, Feldman PC. Intestinal obstruction and ileus. In: Sleisenger & Fordtran’s gastrointestinal and liver disease. 8.ed. Philadelphia: W.B. Saunders, 2006; p. 1115-1121. Abscesso Hepático 8 Maria Tereza Queiroz O abscesso hepático (AH) geralmente acomete o lobo direito do fígado e pode ter etiologia piogênica ou amebiana. O AH piogênico pode ser polimicrobiano em 14 a 55% dos casos. É uma complicação usualmente relacionada a infecções do trato biliar (colecistite, colangite), infecções intra-abdominais (apendicite, diverticulite, DII, peritonite) ou a procedimentos invasivos como CPRE com papilotomia e quimiembolização intra-arterial. AH amebiano é uma complicação extraintestinal observada em 3a 9% dos pacientes com colite amebiana. 42 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed SD de abscesso hepático (AH) (Tabela 1) Coleta de hemograma, TP, plaquetas, TGO, TGP, FA, GGT, BT e F, Na, K, U, Cr, glicemia US de abdome superior Considerar PPF + sorologia na SD de abscesso amebiano (hemoaglutinação indireta ou ELISA) Abscesso hepático Hemoculturas (n = 2) SD de AH pPiogênico (Tabela 2) Investigar e tratar causa subjacente Ciprofloxacino 400 mg IV a cada 12 h + metronidazol 500 mg a cada 6 h por no mínimo duas semanas e manter cipro 500 mg VO a cada 12 h + metronidazol 400 mg VO a cada 8 h por mais 6 semanas (reajustar antibioticoterapia de acordo com resultados de culturas [Tabela 4) SD de AH amebiano (Tabela 2) Metronidazol 750 mg 3x/dia por 5 a 10 dias + teclozan 15 mg/kg/dia, a cada 12 h por 3 dias Lesão única ou múltiplas com diâmetro > 5 cm Considerar drenagem percutânea guiada por TC com colocação de dreno e controle por TC com 5 a 7 dias Lesão não-abordável por radiologia intervencionista Falência de tratamento clínico e/ou drenagem percutânea (Tabela 4) Considerar Líquido achocolatado tipo pasta de anchova Drenagem cirúrgica Módulo I ■ Capítulo 8 ■ Abscesso Hepático Tabela 1: Quadro Clínico de AH Febre 70 a 80% Calafrios < 50% Dor abdominal 50% Icterícia 10 a 20% Tabela 2: Características de abscesso hepático de acordo com a etiologia Características AH piogênico AH amebiano Número de lesões Frequentemente múltiplas Geralmente únicas Localização Lobo direito e/ou esquerdo Lobo direito próximo ao diafragma Apresentação Subaguda Aguda Icterícia -/+ +/++ Diagnóstico US/TC US/TC/sorologia Tabela 3: Agentes isolados de cultura de abscesso e hemocultura de pacientes com AH Aeróbios Gram-negativos Escherichia coli; Klebsiella pneumoniae; Pseudomonas; Proteus; Citrobacter; Morganella; Enterobacter; Salmonella; Serratia marcescens; Yersinia; Burkholderia pseudomallei; Capnocytophaga canimorsus; Pasteurella multocida; Achromobacter xylosoxidans Aeróbios Gram-positivos Enterococci; Streptococcus pyogenes; Staphylococcus aureus; Streptococcus milleri; Listeria monocytogenes; Bacillus cereus Anaeróbios Bacteroides; Fusobacterium; Streptococci; Peptostreptococcus; Peptococcus; Prevotella; Clostridium; Actinomyces Tabela 4: Fatores preditivos de pior prognóstico no AH Icterícia Hipoalbuminemia inferior a 2,5 mg/dL Derrame pleural AST > 100 UI/L Lesões bilobares FA > 150 UI/L Leucocitose > 20.000 43 44 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Referências Bibliográficas 1. Salles JM, Moraes LA, Salles MC. Hepatic amebiasis. Braz J Infect Dis 2003; 7:96-110. 2. Yu SC, Ho SS, Lau WY, Yeung DT, Yuen EH, Lee PS, Metreweli C. Treatment of pyogenic liver abscess: prospective randomized comparison of catheter drainage and needle aspiration. Hepatology 2004; 39:932-8. 3. Farias AQ, Carrilho FJ, Bittencourt PL, Alves V, Gayotto L. O fígado e as infecções. In: Mattos AA, Dantas W. (orgs.). Compêndio de hepatologia. 2.ed. São Paulo: Fundação Byk, 2001, v. 1, p. 321-364. Síndrome de Compartimento Abdominal 9 Paulo Lisboa Bittencourt André Ricardo Estrella Condição decorrente do aumento da pressão intra-abdominal (PIA) associada ao desenvolvimento ou progressão de disfunção orgânica. A pressão intra-vesical é habitualmente empregada à beira do leito, como medida indireta da pressão basal da cavidade abdominal, podendo estar alterada por aumento de volume de órgãos sólidos e vísceras ocas, na presença de lesões, ocupando espaço: ascites, sangue, coleções líquidas e tumores, e nas condições que diminuem a complacência da parede abdominal, tais como queimaduras e edema de 3º espaço, secundário à ressucitação volêmica agressiva. A PIA em pacientes críticos situa-se em torno de 5 a 7 mmHg, podendo elevar-se para valores acima de 12 mmHg e evoluir para SCA em, respectivamente, 32 e 4% dos casos. As principais manifestações de disfunção orgânica associadas à SCA são secundárias à redução do retorno venoso e hipoperfusão esplâncnica e incluem: hipotensão, acidose metabólica e oliguria refratárias à ressucitação volêmica; elevação da pressão de pico; hipercarbia refratária a aumento da ventilação; hipoxemia refratária a oxigenioterapia e PEEP, e hipertensão intracraniana. A SCA é atualmente definida como elevação sustentada da PIA > 20 mmHg associada a nova disfunção ou falência orgânica, com ou sem redução da pressão de perfusão abdominal (PPA) < 60 mmHg [PPA = PAM – PIA] e recomendou o rastreamento de SCA em todo paciente com mais de dois fatores de risco para SCA, por mensuração seriada da pressão intra-vesical. A SCA é classificada como primária, quando está associada à doença ou lesão na região abdominal ou pélvica, requerendo, frequentemente, intervenção cirúrgica ou radiológica; em secundária, quando encontra-se associada a doença ou lesão a distância da região abdominal, ou pélvica (sepse/ressucitação volêmica agressiva) e terciária quando recorre após tratamento médico ou cirúrgico de SCA primária ou secundária. 46 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Rastreamento de SCA (mensuração da PIA na presença de > 2 fatores de risco) Ressucitação volêmica agressiva (> 3,5 L/24 h) Acidose Hipotermia Coagulopatia/politransfusão Falência hepática, pulmonar e renal IÍeo Cirurgia abdominal com sutura primária de fáscia Hipertensão intra-abdominal PIA > 12 mmHg HIA Tratar causa subjacente Iniciar tratamento para reduzir PIA PIA > 20 mmHg + nova disfunção orgânica Não Monitorização da PIA a cada 4 horas no paciente crítico PIA < 12 mmHg repetidamente Sim Síndrome de compartimento abdominal Resolução da HIA Descontinuar medidas de PIA e monitorar deteriorização clínica Módulo I ■ Capítulo 9 ■ Síndrome de Compartimento Abdominal Síndrome de compartimento abdominal Tratar causa subjacente Iniciar tratamento para reduzir PIA SCA primária SCA secundária ou recorrente Realizar ou revisar descompressão com fechamento abdominal provisório PIA > 25 mmHg + disfunção orgânica progressiva Continuar tratamento médico para redução de PIA Mensurar PIA/PPA a cada 4 horas no paciente crítico Evitar ressucitação volêmica excessiva Não PPA > 60 mmHg Sim PIA < 12 mmHg 47 48 Manual de Cuidados Intensivos em Gastroenterologia e Hepatologia ■ Nycomed Medidas Terapêuticas para Redução de PIA ■■ Melhora da complacência abdominal: sedação e analgesia; avaliar uso de bloqueadores neuromusculares; evitar elevação da cabeceira > 30º ■■ Eliminação de conteúdo intraluminal: descompressão nasogástrica ou retal; uso de pró-cinéticos ■■ Eliminação de coleções fluidas: paracentese; drenagem percutânea ■■ Correção de balanço hídrico positivo: diuréticos; avaliar uso de coloides e fluidos hipertônicos; hemodiálise e ultrafiltração ■■ Suporte de função de órgãos e sistemas ■■ Manter PPA > 60 mmHg com vasopressores ■■ Otimizar ventilação e recrutamento alveolar ■■ Considerar uso de índices volumétricos de pré-carga Recomendações da World Society for Acute Compartment Syndrome para Mensuração da Pressão Intra-Abdominal ■■ Mensuração em mmHg (1 mmHg = 1,36 cm H2O) ■■ Posição supina no final da expiração com estabelecimento do ponto zero na linha média axilar ■■ Administração de volume máximo de 25 mL (1 mL/kg em crianças de até 20 kg) para mensuração da PIA vesical ■■ Mensuração em 30 a 60 segundos após infusão de volume, para permitir relaxamento da musculatura detrusora da bexiga ■■ Mensuração apenas na ausência de contrações de musculatura abdominal Tabela 1: Classificação da Hipertensão intra-abdominal Graus Pressão intra-vesical I 12 a 15 mmHg II 16 a 20 mmHg III 21 a 25 mmHg IV > 25 mmHg Módulo I ■ Capítulo 9 ■ Síndrome de Compartimento Abdominal Referências Bibliográficas 1. Malbrain ML, Cheatham ML, Kirkpatrick A, Sugrue M, Parr M, De Waele J, et al. Results from the International Conference of Experts on Intra-abdominal Hypertension and Abdominal Compartment Syndrome. I. Definitions. Intensive Care Med 2006; 32(11):1722-32. 2. Malbrain ML, Chiumello D, Pelosi P, Bihari D, Innes R, Ranieri VM, et al. Incidence and prognosis of intraabdominal hypertension in a mixed population of critically ill patients: a multiple-center epidemiological study. Crit Care Med 2005; 33(2):315-22. 3. Cheatham ML, Malbrain ML, Kirkpatrick A, Sugrue M, Parr M, De Waele J, et al. Results from the International Conference of Experts on Intra-abdominal Hypertension and Abdominal Compartment Syndrome. II. Recommendations. Intensive Care Med 2007; 33(6):951-62. 49