Teólogo e filósofo por formação, ALMIRO SCHULZ é professor

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Teólogo e filósofo por formação, Almiro Schulz é professor adjunto da
Universidade Federal de Goiás, UFG, desde 2009 e possui ampla experiência
na área da Educação Superior. Em contato com o ensino acadêmico há
mais de trinta anos, Almiro Schulz lecionou teologia por vinte anos no
Seminário Teológico Batista Independente de Campinas, STBI, trabalhou
por quatro anos na Universidade Paulista, UNIP, e por nove anos no
Centro Universitário do Triângulo, UNITRI. Interrogado sobre o “ensino
de filosofia” pelos alunos Danillo Adornelas Barbosa Pimental, Ícaro San
Carlo Máximo Sampaio e Morgana Almeida Ferreira, todos da licenciatura
da UFG, o professor alerta que não ensina filosofia, “mas didática aplicada
ao ensino de filosofia” e, assim, tece comentários sobre os modos dos
professores abordarem a filosofia, sobre os recursos das novas tecnologias
para o ensino, sobre a formação curricular e sobre a importância de criar
diálogos entre a filosofia e outros saberes de forma operacional no âmbito
escolar. Por possuir mestrado em filosofia pela Pontifícia Universidade
Católica de Campinas, PUC–Campinas, e doutorado em educação pela
Universidade Metodista de Piracicaba, UNIMEP, o professor realiza,
atualmente, importantes pesquisas que envolvem não só a filosofia no
contexto do ensino superior, mas a formação ética e intelectual dos
professores de filosofia do ensino médio.
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O
Dossiê: a filosofia e o seu ensino
ensino da filosofia exige que o professor utilize uma didática
específica?
Qual pedagogia você utiliza em suas aulas?
O uso de uma didática específica para o ensino da Filosofia não
é propriamente uma exigência, mas uma adequação entre ensino e seu
objeto. Os teóricos que tratam especificamente sobre o ensino da Filosofia
entendem que se deve usar uma didática “mínima” e específica, mas
isso depende do que o professor compreende por Filosofia e, também,
quais das três principais abordagens que ele adota: abordagem histórica,
abordagem temática ou abordagem problematizadora. A tradição,
sobretudo na graduação, é a abordagem histórica, de influência francesa.
Grande parte dos livros didáticos, sobretudo os mais antigos, seguem essa
abordagem.
No meu caso, especificamente, não ensino Filosofia, mas Didática
aplicada ao ensino de Filosofia, o que já é diferente. Caso ensinasse, para
ser coerente, pois julgo que é importante um alinhamento entre concepção
de Filosofia, abordagem e metodologia, iria adequar a metodologia à
abordagem que adotaria, que possivelmente seria por meio de problemas
constituídos, um modelo usado mais no Uruguai para o ensino de Filosofia,
um meio termo entre abordagem temática e problematização.
As matérias “abertas”, como tópicos e seminários de filosofia, ou
seja, aquelas nas quais os professores escolhem o que lecionar,
como o senhor as vê? Essa possibilidade de escolher o que se vai
trabalhar pode atrapalhar ou ajudar?
Bem, essa questão depende de uma série de coisas, primeiro, qual
o objetivo curricular com esses seminários? Considero que não devem
estar no currículo sem uma intencionalidade, é preciso saber qual é. Em
segundo lugar, a flexibilização não é um mal em si, sobretudo no ensino
de Filosofia, mas, ao mesmo tempo, pode dar margem para que o docente
faça disso um motivo para lecionar o que seja predominantemente de seu
interesse particular, dele e não do aluno, o que não é o melhor.
Inquietude, Goiânia, vol. 1, n° 2, ago/dez - 2010.
Entrevista com o prof. Almiro Schulz
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Quanto ao atrapalhar ou ajudar, eu diria que sim e não. No meu
entender, um dentre vários fatores que poderá condicionar isso, para o
bem ou para o mal, é a carga horária disponibilizada, em um curso, para
esse tipo de conteúdo “aberto”.
Novas
técnicas, tais como cinema, literatura, música, data-show
e internet, podem ajudar em uma didática filosófica?
experiência na utilização desses recursos?
obtido em relação aos alunos?
Qual
Qual
a sua
foi o resultado
O senhor notou alguma diferença
no interesse ou na aprendizagem?
Responder essas questões implica em dados de pesquisa e, pelo
que sei, esta ainda não foi feita especificamente em relação ao ensino de
Filosofia. Portanto, os que são contra ou os que são favoráveis não se
baseiam em dados objetivos e de pesquisa que, naturalmente, em relação
a outras áreas, já existem. Contudo, as técnicas em si não são um mal,
elas são um meio ou um recurso, tudo vai depender do seu uso, da sua
aplicação, cada uma com suas possibilidades de contribuições e com seus
limites.
Vivemos em uma época em que a cultura da imagem e do
movimento está em fase ascendente, há uma nova linguagem em circulação.
Os sociólogos e os filósofos fazem suas críticas e é bom que as façam,
mas, ademais, convém lembrar que a invenção da imprensa no século XV
também foi alvo de críticas.
Confesso que particularmente não fiz nenhuma avaliação específica
em relação ao resultado do uso desses diferentes recursos, até porque
seriam várias, cada técnica e método teria de ser avaliada em particular.
Contudo, acho que não usar, lógico, de forma adequada, é tentar negar o
que já está posto e ficar para trás. O problema é que muitos de nós não
sabemos como usar.
Como
o senhor vê o livro didático no ensino de filosofia?
É
possível que o professor dê boas aulas recorrendo apenas aos
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Dossiê: a filosofia e o seu ensino
manuais ou seriam necessários outros meios?
Quais?
Depende do livro didático e da forma como o professor faz
uso dele. Hoje existe mais de vinte diferentes textos didáticos, parte
deles estruturada de acordo com a abordagem histórica, mas atualmente
também já existem textos didáticos publicados e estruturados segundo a
perspectiva temática ou histórico-temática.
Uma das questões que se tem colocado é se o texto didático é
uma forma introdutória à Filosofia e se a partir deles se vai aos textos
filosóficos. Ainda, se eles são recursos complementares. Acho que as
boas aulas não dependem propriamente disso, mas sim da formação e da
competência do professor. Com isso não estou dizendo que eles não têm
o seu lugar, uma vez que, inclusive, alguns estados têm proposto o seu
livro didático, como é o caso do Paraná. O risco é de um engessamento.
Por que e para que ensinar filosofia para alunos do ensino médio?
O ensino de filosofia deve estar voltado à formação para a
cidadania?
Para essas questões não há uma única resposta e depende também
de qual a visão que se tem sobre a função da Filosofia e o que seja Filosofia.
Nietzsche fez a crítica ao modelo de ensino da Filosofia nos colégios e
nas universidades da Alemanha na sua época, achando melhor que não
tivesse. Platão considerou que só seria possível aprender Filosofia a partir
dos 30 anos de idade. Aqui no Brasil, como se sabe, a luta para a inclusão
da Filosofia como disciplina no Ensino Médio ocorreu durante longos
anos, e agora? Entendo que a questão principal no momento é a questão
curricular, pois parece que esta não está suficientemente resolvida pelos
parâmetros de 1999, nem pelos PCN+ de 2002 e nem pelas orientações
curriculares nacionais posteriores.
A questão da formação para a cidadania. De acordo com as
políticas públicas educacionais, como se sabe, não há clareza do que vem a
ser essa formação. Portanto, dependendo do que se entende por cidadania,
Inquietude, Goiânia, vol. 1, n° 2, ago/dez - 2010.
Entrevista com o prof. Almiro Schulz
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não é função única da Filosofia; a Sociologia e outras disciplinas também
contribuem nesse processo.
Como o senhor vê a relação da filosofia com as outras disciplinas?
Seria possível estabelecer uma relação (interdisciplinaridade)
entre a filosofia e as outras áreas do conhecimento no nível
médio?
De que modo fazer isso?
Em primeiro lugar, não acho que existe um saber exclusivo e
nem que se constrói o conhecimento sem interdisciplinaridade, ou, se
preferirem, sem diálogo, ou ainda, sem a transdisciplinaridade. Há, sim,
áreas de saberes específicos, conforme conhecemos sua classificação.
Contudo, é uma questão que já se vem discutindo há um bom tempo.
Como alguns têm dito: a Filosofia, enquanto mãe no passado,
gerou as filhas (várias ciências) e envelheceu, perdeu sua função ou está
isolada. Hoje talvez não se possa mais pensar em uma mãe das ciências,
cada uma tem seu estatuto próprio, porém, não entendo, por isso, que
elas constituem uma forma estanque; todas as áreas devem dialogar e, em
especial, a Filosofia.
A questão é como fazer isso de uma forma operacional no âmbito
do ensino escolar. Essa é uma questão também de âmbito curricular e, mais
especificamente, do âmbito do Projeto Político Pedagógico, mas nessa
fase do ensino da Filosofia é, também, uma questão de concepção dos
próprios docentes da Filosofia, pois eles é que terão de dialogar e fazer a
mediação. Contudo, a interdisciplinaridade ou transdisciplinaridade pode
ser estabelecida a partir do objeto de estudo, da sua correlação, bem como
a partir do âmbito de uma metodologia.
O professor de filosofia deve ter domínio somente do seu autor
favorito, objeto de estudo favorito, ou deve ser um intelectual?
Ele deve ter uma formação cultural mais ampla para ensinar a
filosofia ou basta que ele domine alguns filósofos e algum campo
do estudo de filosofia?
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Dossiê: a filosofia e o seu ensino
Não acho que alguém teve e/ou tem a visão e o domínio do todo e
nem que olhar o mudo por uma única ótica é o melhor, é até uma questão
de concepção do real, se é unívoco ou múltiplo, bem como uma questão
epistemológica. Considerando especificamente a pergunta em torno
do professor, de um lado trata-se do aprofundamento e do domínio de
especificidades, mas há um risco nisso, pois pode ocorrer de o professor
apenas ver e analisar a realidade a partir de um único olhar; por outro lado,
pode ver por meio de vários olhares, mas de uma forma superficial.
Entrevista com o prof. Almiro Schulz
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O que fazer? Uma das formas indicadas é a sensibilização, o aluno
precisa ver um sentido em estudar Filosofia, não temos domínio sobre a
sua motivação, mas podemos proporcionar situações para que possa se
interessar. Porém, muitas vezes nem mesmo os professores sabem para
quê estudar ou ensinar Filosofia, ou, ao menos, não estão convencidos
disso, o que esperar, então, do aluno?
Acho que o aluno da graduação deve ter uma formação mais
generalista e depois se especializar. Já os professores, cada um deve se
aprofundar em uma área, desde que não se alienem, pois ver tudo por
meio de um único autor ou única problemática de estudo pode causar
uma “cegueira”, uma limitação.
Segundo
o filósofo
entusiasmo.
Adorno,
o que caracteriza a juventude é o
O senhor acha que os jovens têm entusiasmo pela
Qual a tarefa do professor para mobilizar nos jovens
esse entusiasmo? O que se pode fazer quanto a isso?
filosofia?
Outra vez questões que demandam respostas que não são simples
e até são do campo da psicologia, pois tem relação com as fases etárias
do desenvolvimento. No caso específico da Filosofia, faltam dados
de pesquisa para saber sobre o entusiasmo dos alunos. O que se sabe,
resultado de pesquisa, é que o jovem tem um comportamento e uma
conduta relativa à sua fase, que é questionadora, aberta para o novo, mas
ele é mais inconstante, etc.
Agora, seu entusiasmo em relação à Filosofia, pela experiência,
sem levar em conta dados de pesquisa, não me parece grande, muito
pelo contrário, em geral é pouco, mas naturalmente existem exceções.
Contudo, parece que isso também ocorre com as outras disciplinas, não
é exclusivo da Filosofia. A razão disso? Quais fatores condicionantes? Só
posso supor, mas não afirmar.
Inquietude, Goiânia, vol. 1, n° 2, ago/dez - 2010.
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