12 ARTIGO ORIGINAL Luis Fernando Bouzas1 Mirna Calazans2 Tumores sólidos e hematológicos na infância e na adolescência – Parte 2 INTRODUÇÃO O câncer na infância e na adolescência tem fornecido oportunidades únicas para o avanço na compreensão da causa e no sucesso terapêutico das neoplasias como um todo. O diagnóstico de neoplasia maligna em crianças é raro, correspondendo a apenas 3% de todos os cânceres, em diferentes faixas etárias. Na maioria dos casos, a neoplasia maligna se origina de tecidos germinativos, ao contrário do que ocorre em adultos, quando deriva mais freqüentemente de tecidos epiteliais. Nas crianças, essa origem mais comum determina altas taxas de sobrevida de longo prazo e de cura, uma vez que os tumores apresentam alta sensibilidade à quimioterapia e à radioterapia. Os excelentes resultados atingidos na população pediátrica são resultado do tratamento multidisciplinar efetivo e da detecção precoce. As participações do pediatra e do cirurgião pediátrico são de fundamental importância para que o diagnóstico e as intervenções de urgência pertinentes sejam realizados o mais precocemente possível, o que influencia positivamente o resultado. Em complementação ao que foi descrito na parte 1 deste artigo, quando abordamos principalmente aspectos de leucemias e linfomas, serão descritos os principais achados clínicos e laboratoriais relacionados às neoplasias da infância e da adolescência, no intuito de facilitar o reconhecimento dessas patologias pelo profissional que realizará o primeiro atendimento médico dos pacientes. Médico pediatra; membro do Comitê de Onco-Hematologia da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro (SOPERJ); presidente da Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (SBTMO); mestre em Hematologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); diretor do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional de Câncer (INCa). 2 Médica hematologista do Centro de Transplante de Medula Óssea do INCa. 1 volume 4 nº 2 abril 2007 EPIDEMIOLOGIA As neoplasias malignas estão entre as principais causas de morte em crianças entre 1 e 14 anos de idade. Elas são a terceira causa de morte em crianças de 1 a 4 anos e a segunda entre as de 5 a Tabela 1 TIPOS DE MALIGNIDADE MAIS COMUNS EM CRIANÇAS COM O PICO DE IDADE AO DIAGNÓSTICO E INCIDÊNCIA NOS EUA Malignidade Pico de idade (anos) Taxa de incidência (milhão/ano) 2-5 24,7 Constante 5 Não-Hodgkin 6-16 9,3 Hodgkin > 10 7,5 Constante 13,4 Meduloblastomas 5-10 4.9 Ependimoma <5 2,1 Neuroblastoma <3 8 Tumor de Wilms <5 6,9 Retinoblastoma <3 3 2-6 e 14-18 3,7 Sarcoma de Ewing/PNET 10-18 2,1 Osteossarcoma 10-18 3,1 <2 1,6 < 2 e > 14 0,4 Leucemia Linfocítica aguda Não-linfocítica aguda Linfomas Tumores de SNC Gliomas Tumores sólidos Rabdomiossarcoma Hepatoblastoma Tumores de células germinativas Fonte: Surgical Clinics of North América. SNC = sistema nervoso central; PNET = primitive neuroectodermal tumor. Adolescência & Saúde Bouzas & Calazans TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 14 anos. As doenças neoplásicas mais comumente diagnosticadas são leucemia aguda, linfoma nãoHodgkin, doença de Hodgkin e tumores primários do sistema nervoso central (SNC). Entre os tumores sólidos pediátricos mais comuns estão neuroblastoma, tumor de Wilms, rabdomiossarcoma e retinoblastoma(13) (Tabela 1). TUMOR DE WILMS Neoplasia renal primária mais comum nas crianças, é discretamente menos comum em meninos do que em meninas. Os tumores unilaterais são tipicamente diagnosticados no quarto ano de vida, enquanto os bilaterais são geralmente encontrados em idades mais precoces. As crianças com essa patologia apresentam outros achados ao exame físico que chamam a atenção do pediatra: aniridia, hemihipertrofia, criptorquidia e hipospadia(8). A maioria das crianças com tumor de Wilms é levada ao pediatra devido ao aumento da circunferência ou à presença de massa abdominal, o que geralmente é observado pelos pais no momento do banho ou de vestir. Outras queixas comuns incluem dor abdominal, hematúria maciça e febre. Ao exame físico, 25% dos pacientes apresentam hipertensão arterial sistêmica (HAS) devido ao aumento da atividade da renina(3). Pode ocorrer varicocele secundária a obstrução da veia espermática por trombo na veia renal ou cava inferior. Exames laboratoriais importantes no diagnóstico incluem hemograma completo com contagem de plaquetas, testes de função hepática e renal, cálcio sérico (que pode estar elevado nos tumores rabdóides do rim e em nefroma mesoblástico congênito) e elementos anormais e sedimentoscopia (EAS). Os exames de imagem a serem solicitados inicialmente devem ser os necessários para identificar uma lesão intra-renal, o que geralmente é obtido com o exame ultra-sonográfico das lojas renais. NEUROBLASTOMA É o tumor maligno intra-abdominal mais comum em crianças. É mais freqüente em meAdolescência & Saúde 13 ninos do que em meninas, sendo a idade média ao diagnóstico de 2 anos para ambos os sexos(3). Aproximadamente 70% dos pacientes apresentam doença metastática ao diagnóstico, sendo os ossos, o fígado, a medula óssea e a pele mais freqüentemente envolvidos. O neuroblastoma pode originar-se de qualquer tecido do sistema nervoso simpático do organismo, sendo que os sítios mais acometidos são os intra-abdominais. A glândula supra-renal é o sítio primário em 38% dos casos. Outros sítios intra-abdominais freqüentemente acometidos incluem gânglios simpáticos paravertebrais, celíaco, mesentéricos superior e inferior. Quando não são acometidos os sítios intra-abdominais, a doença geralmente se apresenta nas regiões cervical e torácica. Comumente as crianças são levadas ao pediatra devido ao aumento da circunferência ou massa abdominal. Os tumores paravertebrais geralmente levam a sintomatologia referente ao SNC. Os pacientes com metástases hematogênicas podem queixar-se de dor óssea ou apresentar edema periorbital e equimoses. A febre está presente em 23% dos casos ao diagnóstico. Apresentações clínicas incomuns incluem hidropisia fetal e diarréia crônica devido à secreção tumoral de polipeptídios vasoativos intestinais(12). Os tecidos nervosos simpáticos normalmente secretam epinefrina e norepinefrina. A maioria dos pacientes com neuroblastoma apresenta aumento da secreção urinária de ácido vanilmandélico, ácido homovanílico, diidroxifenilalanina, dopamina e norepinefrina. O diagnóstico de neuroblastoma se inicia com a obtenção de uma história clínica detalhada, com questões referentes a alguns sinais e sintomas comuns na doença, como a presença de diarréia e ataxia. O exame físico deve incluir a observação meticulosa da pele para que possíveis metástases subcutâneas possam ser reconhecidas, as quais geralmente apresentam-se como lesões vermelho-violáceas e elevadas, podendo ser solitárias. As equimoses periorbitárias são comuns em crianças com doença disseminada e comprometimento orbitário. Um exame neurológico detalhado deve ser realizado. Os exames laboratoriais que auxiliam no diagnóstico incluem volume 4 nº 2 abril 2007 14 TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 hemograma completo, EAS, testes de função hepática e renal, velocidade de hemossedimentação (VHS), ferritina sérica e quantificação da excreção urinária de ácido vanilmandélico e catecolaminas totais. Inicialmente, os exames de imagem em pacientes com massa abdominal devem incluir uma radiografia simples de abdome em posição supina, a qual poderá demonstrar uma massa, possivelmente com calcificação. A ultra-sonografia de abdome pode demonstrar uma massa sólida, podendo conter áreas císticas. Os pacientes com neuroblastoma torácico geralmente apresentam uma massa em mediastino posterior, menos freqüentemente calcificada do que nos casos de doença intra-abdominal e que pode ser demonstrada em radiografia simples de tórax. RETINOBLASTOMA É o tumor oftalmológico maligno mais comum na população pediátrica. A sobrevida excede 90%, sendo, assim, uma das neoplasias da infância com a maior taxa de cura. Setenta a 75% dos casos são unilaterais, com uma freqüência ligeiramente maior em meninos, especialmente naqueles com doença bilateral. Os casos de doença unilateral são geralmente diagnosticados aos 2 anos de idade nos meninos e 1 ano nas meninas. Nos pacientes com comprometimento bilateral, geralmente o diagnóstico é realizado em menores de 12 meses de idade(3). A maioria dos casos é esporádica, no entanto alguns são hereditários, seguindo um padrão de penetrância alto, como um traço autossômico dominante(7). Assim, os pais e irmãos dos pacientes com retinoblastoma devem ser submetidos a exame oftalmológico cuidadoso, uma vez que a doença pode sofrer regressão espontânea, deixando alterações características na retina(11). Geralmente as crianças são levadas ao pediatra devido a leucocoria, estrabismo, eritema conjuntival ou diminuição da acuidade visual. O exame físico revela um reflexo pupilar esbranquiçado e o oftalmoscópico pode demonstrar tumores que se localizam próximo à mácula. A necrose volume 4 nº 2 abril 2007 Bouzas & Calazans de tumores localizados na retina ou a presença de glaucoma podem levar ao surgimento de uveíte, com dor e eritema local. O diagnóstico da doença se baseia em história clínica detalhada, incluindo a familiar. Os pacientes com suspeita de retinoblastoma devem ser encaminhados a um oftalmologista pediátrico com experiência no tratamento dessa patologia, uma vez que o exame de ambos os olhos deve ser realizado sob anestesia geral. RABDOMIOSSARCOMA É a neoplasia de partes moles mais freqüente na infância. É discretamente mais comum em meninos, com a idade média ao diagnóstico de 4 anos, sendo que as meninas são ligeiramente mais velhas do que os meninos à apresentação(3). O rabdomiossarcoma pode surgir em qualquer sítio do organismo, mas 35% dos casos ocorrem nas regiões de cabeça e pescoço, sendo a órbita o sítio primário mais comum. O restante dos casos que acometem a cabeça e o pescoço divide-se em tumores parameníngeos (nasofaringe, seios paranasais, ouvido médio, mastóides, fossas pterigopalatina e infratemporal) e não-parameníngeos. Outras regiões que podem ser acometidas por esse tumor incluem abdome, trato geniturinário, próstata, bexiga, vagina, útero, ductos biliares(3), tórax, tronco, coxas e região inguinal. Os casos com comprometimento das extremidades são mais comuns na segunda década de vida e geralmente mais agressivos. Aproximadamente 25% das crianças apresentam doença metastática ao diagnóstico, e os principais locais de acometimento são pulmões, medula óssea, ossos e linfonodos. A Tabela 2 mostra as apresentações clínicas mais comuns desse tumor, de acordo com o sítio primário de acometimento(6). Como o rabdomiossarcoma pode acometer qualquer estrutura do corpo, o estudo radiológico deve ser individualizado. O diagnóstico requer interpretação radiológica precisa, avaliação patológica da amostra obtida por cirurgia e o conhecimento do padrão de disseminação metastática. Adolescência & Saúde Bouzas & Calazans TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 15 Tabela 2 APRESENTAÇÃO CLÍNICA DO RABDOMIOSSARCOMA Sítio Sintomas clínicos mais comuns Cabeça e pescoço Massa assintomática, podendo simular uma linfonodomegalia Órbita Proptose, quemose, paralisia ocular e massa palpebral Nasofaringe Rinorréia, voz anasalada, epistaxe, dor local e disfagia Seios paranasais Edema, dor, sinusite, obstrução, epistaxe e paralisia dos nervos cranianos Ouvido médio Otite média crônica, secreção hemorrágica, massas polipóides Laringe Rouquidão e tosse Tronco Massa assintomática Trato biliar Hepatomegalia e icterícia Retroperitônio Massa assintomática, ascite, obstrução dos tratos gastrointestinal ou geniturinário, compressão medular Bexiga e próstata Hematúria, retenção urinária, massa abdominal e constipação Genitália feminina Pólipos vaginais, nódulo vulvar Genitália masculina Massa escrotal Extremidades Massa indolor com comprometimento de linfonodos SARCOMA DE EWING E TUMORES NEUROECTODÉRMICOS PRIMITIVOS PERIFÉRICOS Esses tumores, se não idênticos, são altamente relacionados. Eles podem apresentar-se como malignidades do tecido mole ou de tecidos ósseos. O sarcoma de Ewing é o segundo tumor ósseo primário mais comum na população pediátrica, representando aproximadamente 4% das neoplasias, sendo que a grande maioria surge na segunda década de vida. Vinte a 25% dos casos apresentam acometimento primário do fêmur e 20% acometem primariamente a pelve. Outras áreas que podem ser atingidas incluem tíbia, fíbula, ossos dos pés, úmero, vértebras, costelas, clavícula, mandíbula e calota craniana. O principal sintoma que leva os pacientes ao pediatra é a dor, inicialmente intermitente, evoluindo para constante, podendo acordar a criança durante o sono. O edema local pode ser notado pelo paciente ou por seus pais, principalmente quando o tumor acomete uma das extremidades. Outros sinais e sintomas podem ocorrer, dependendo da localização da doença, como, por exemplo, claudicação, dor Adolescência & Saúde que se acentua com a respiração ou com características radiculares e paraplegia devida a tumor que atinge a vértebra. A apresentação clínica pode simular a de pacientes com osteomielite(1). A febre pode estar presente em 28% dos casos à apresentação(3). Em 26% das crianças acometidas ocorrem metástases já ao diagnóstico, sendo que os pulmões e sítios ósseos são os locais metastáticos mais freqüentes. A avaliação inicial do paciente com suspeita de sarcoma de Ewing inclui radiografias dos sítios primários do tumor, documentação de possíveis sítios metastáticos e avaliação laboratorial para excluir outros diagnósticos. Geralmente as lesões dos ósseos longos comprometem a diáfise, com extensão para a metáfase e com características líticas ou mistas (lítico-escleróticas). Os tumores pélvicos freqüentemente apresentam-se, aos raios X simples, como lesões mistas, com componentes líticos e blásticos. TUMORES HEPÁTICOS PRIMÁRIOS Aproximadamente 60% a 70% de todos os tumores hepáticos primários em crianças são mavolume 4 nº 2 abril 2007 16 TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 lignos, sendo que os mais comuns são o hepatoblastoma e o carcinoma hepatocelular. As lesões benignas mais comuns são o hemangioma e os hamartomas. O hepatoblastoma é mais freqüente do que o carcinoma hepatocelular, sendo que o primeiro afeta mais as crianças mais jovens, com a idade média ao diagnóstico de 1 ano. Ao contrário, o carcinoma hepatocelular atinge tipicamente as crianças mais velhas, com idade média ao diagnóstico de 12 anos. Ambos os tumores ocorrem mais em meninos(4). Geralmente as crianças com hepatoblastoma apresentam outras anormalidades associadas, incluindo hemi-hipertofia, divertículo de Meckel, agenesia renal e de glândula supra-renal, além de hérnia umbilical(10). Crianças prematuras ou com peso muito baixo ao nascimento parecem apresentar um risco maior de desenvolver o hepatoblastoma(5). O carcinoma hepatocelular está fortemente associado ao vírus da hepatite B, que pode ser adquirido por via vertical, através de mães soropositivas ou por exposição a produtos sangüíneos contaminados. Pacientes com várias outras doenças de base têm apresentado o diagnóstico adicional de carcinoma hepatocelular, como, por exemplo, crianças com tirosinemia, galactosemia, atresia biliar, cirrose colestática familiar progressiva, anemia de Fanconi, neurofibromatose, entre outros(3). Geralmente as crianças com tumores hepáticos são levadas ao pediatra devido a uma massa ou distensão abdominal, além de perda de peso, anorexia e febre. A icterícia é rara. A história clínica deve ressaltar ocorrência prévia de icterícia ou hepatite, uso pré-natal de hormônios esteróides pela mãe, exposição prévia a agentes hepatotóxicos e presença de casos de doenças hepáticas ou biliares nos pais ou irmãos do paciente. A avaliação laboratorial inclui hemograma completo e testes de função hepática e renal. O nível sérico de alfafetoproteína está aumentado em ambos os tumores. Os exames de imagem incluem tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) do abdome. Raramente os tumores hepáticos malignos são calcificados. A ultra-sonografia abdominal pode demonstrar a presença e a extensão de uma massa sólida, volume 4 nº 2 abril 2007 Bouzas & Calazans além de avaliar as lojas renais e a veia cava inferior, o que é útil no diagnóstico diferencial e na avaliação pré-cirúrgica. TUMORES GERMINATIVOS Três por cento de todos as malignidades pediátricas são causados por tumores de células germinativas originadas das gônadas ou de sítios extragonadais. Em crianças, quase dois terços dos tumores germinativos são extragonadais, sendo que a região mais acometida é a sacrococcígea. As regiões menos afetadas incluem o mediastino, o retroperitônio, a vagina e a loja pineal. O comportamento biológico desses tumores varia da forma benigna do teratoma maduro ao carcinoma embrionário e o coriocarcinoma, ambos altamente malignos. No entanto esses tumores de comportamento agressivo apresentam importante quimiossensibilidade, sendo que, após a introdução dos regimes quimioterápicos baseados em derivados da platina, há grande melhora na sobrevida dessas crianças. Apenas 2% dos teratomas pré-sacrais e sacrococcígeos diagnosticados antes dos 6 meses de vida são malignos, enquanto o são 65% daqueles diagnosticados após essa idade. Acometem mais freqüentemente as meninas. Geralmente o diagnóstico é feito ao nascimento ou durante os primeiros meses de vida, e com freqüência existem anomalias congênitas das vértebras, do trato geniturinário ou anorretais associadas. Lesões malignas podem surgir em sítios de onde um tumor benigno foi previamente retirado. Os pacientes com teratomas pélvicos malignos se apresentam com uma massa abdominal ou na região das nádegas, ou com sinais de obstrução urinária ou fecal. O toque retal revela uma massa entre o reto e o sacro. Dez por cento de todas as neoplasias de células germinativas pediátricas se apresentam como tumores testiculares, sendo 80% malignos e 90% localizados. A distribuição etária é bimodal, acometendo crianças muito jovens e adolescentes. A maioria das crianças com tumores testiculares Adolescência & Saúde Bouzas & Calazans TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 primários apresenta aumento indolor do testículo acometido. Ascite, adenomegalia inguinal ou dor abdominal aguda podem ocorrer nos raros casos de doença metastática. O acometimento testicular bilateral ao diagnóstico acontece em menos de 1% dos casos(3). Os tumores ovarianos representam aproximadamente 25% de todos os tumores germinativos pediátricos, sendo que a maioria deles ocorre no final da infância, com pico de incidência aos 10 anos de idade. Os mais comuns são os disgerminomas e os tumores do seio endodérmico. Os teratomas imaturos representam cerca de 10% das massas ovarianas(2, 9). Essas pacientes geralmente são levadas ao pediatra devido a dor, que pode ser intensa pela torção do pedículo, ou surgimento de massa abdominal. Pode ocorrer febre ao diagnóstico. A avaliação radiológica inicial deve incluir raios X simples de abdome, que podem mostrar calcificação do tumor. A ultra-sonografia abdominal demonstra se a massa tem natureza cística, e a TC mostra com maior precisão o sítio de origem do tumor. Os tumores germinativos que acometem primariamente o tórax em geral se apresentam como massas no mediastino anterior em meninos adolescentes. A maior parte desses tumores é composta de teratomas benignos, mas também podem ser encontrados coriocarcinoma e tumores do saco hialino nessa localização. A apresentação clínica está relacionada à compressão traqueobrônquica, incluindo tosse, dispnéia e dor torácica. A radiografia simples de tórax demonstra massa mediastinal anterior, e o diagnóstico é definido através da biópsia do tumor primário ou de um linfonodo supraclavicular comprometido. A alfafetoproteína e a subunidade beta da gonadotrofina coriônica humana (β-HCG) apresentam nível sérico elevado em alguns tumores germinativos, contribuindo para o diagnóstico da doença. Níveis séricos de alfafetoproteína podem se elevar em tumores de seio endodérmico, independentemente da localização. Pacientes com carcinoma embrionário, coriocarcinoma e disgerminoma podem apresentar níveis elevados de β-HCG, o que auxilia no diagnóstico dessas doenças. Adolescência & Saúde 17 CONCLUSÃO O prognóstico da doença maligna na infância depende primariamente do tipo do tumor, da extensão da doença ao diagnóstico e da rápida resposta ao tratamento. Como a maioria dos tumores é passível de cura, o diagnóstico precoce é de especial importância. Além disso, geralmente nas doenças em estágios iniciais o tratamento indicado, apesar de curativo, é menos agressivo do que os utilizados em estágios mais avançados da mesma patologia. Nas crianças esse aspecto assume grande relevância por se tratar de uma população cuja sobrevida é longa e o objetivo é evitar, sempre dentro do possível, mutilações ou patologias secundárias ao tratamento indicado. O diagnóstico precoce das neoplasias malignas nas crianças é de suma importância, uma vez que aproximadamente 70% dos tumores são potencialmente curáveis. Portanto os profissionais que lidam com essa população de pacientes devem ter alto índice de suspeição diante de um caso sugestivo. O diagnóstico e o tratamento da criança com câncer devem ser cuidadosamente orientados e explicados aos pais e, se a criança possuir idade para tal, a ela também. Sempre que possível a criança e seus familiares devem ser acompanhados por uma equipe multidisciplinar, envolvendo profissionais como assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras pediátricos e professores capacitados para lidar com crianças e adolescentes com diagnóstico de câncer. A mensagem deste artigo (partes 1 e 2) é clara e pode ser simplificada. O diagnóstico precoce das neoplasias da infância e da adolescência está diretamente relacionado à adequada investigação clínica realizada por pediatras, clínicos e cirurgiões, partindo do conhecimento epidemiológico, realizando anamnese, exame físico minucioso e solicitando exames complementares básicos. Diante da suspeita ou do diagnóstico já confirmado, o especialista deve ser imediatamente acionado, proporcionando intervenção imediata, o que contribui para resultados positivos no controle da doença. volume 4 nº 2 abril 2007 18 TUMORES SÓLIDOS E HEMATOLÓGICOS NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA – PARTE 2 Bouzas & Calazans REFERÊNCIAS 1. Durbin M, Randal RL, James M, et al. Ewing’s sarcoma masquerading as osteomyelitis. Clin Orthop. 1998; 357: 176. 2. Göbel V, Calaminus G, Engert J, et al. Teratomas of infancy and childhood. Med Pediatr Oncol. 1998; 31: 8. 3. Green DM. Diagnosis and management of solid tumors in infants and children. Boston: Martinus Nijhoff. 1985. 4. Greenberg H, Filler RM. Hepatic tumors. In: Pizzo PA, Poplack DG, eds. Principles and practice of pediatric oncology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott-Raven. 1997. 5. Ideda H, Matsuyama S, Tauimura M. Association between hepatoblastoma and very low birth weigth: a trend or a chance? J Pediatr. 1997; 130: 557. 6. Macdowell HP. 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