Unidade 6 - Obstetrícia Infecção do Trato Urinário CAPÍTULO 18 InFECÇÃO DO TRATO URInáRIO 1. IMpORTâNCIA A infecção do trato urinário (ITU) é uma das afecções mais comuns na gestação, podendo ter evolução desfavorável, com complicações sérias para a mãe e o concepto, apesar de terapia antimicrobiana adequada. 2. ETIOLOGIA » » » » » » » » Escherichia coli (85 - 90% dos casos) Klebsiella, enterobacter Enterococcus Streptococcus do grupo B Staphylococus coagulase negativa Proteus Pseudomonas Citrobacter 3. fATORES pREDISpONENTES » Aumento da progesterona: Relaxamento da musculatura lisa ureteral, diminuição do tônus e do peristaltismo ureteral facilitando a ascensão bacteriana » Aumento do volume urinário pelo aumento da taxa de iltração glomerular » Compressão do trato urinário pelo aumento uterino » Outros fatores não relacionados com a gestação: valvas ou estenose congênita de uretra e ureter, cálculos, rins policísticos, distúrbios funcionais da bexiga, obstrução do colo vesical, diabetes, etc. 633 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand 4. DIAGNóSTICO » » » » » Clínico: Avaliar fatores de risco e alterações do trato urinário Laboratorial: Sumário de Urina / Urinocultura SU e Urinocultura normais: Repetir a cada trimestre Leucócitos > 10/campo sem outras alterações: Solicitar urinocultura Leucócitos > 10/campo e nitrito (+) e/ou presença de lora bacteriana homogênea: Iniciar tratamento e solicitar urinocultura » Sumário de urina sugestivo de infecção do trato urinário e urinocultura negativa: Suspeitar de infecção por Gonococo e/ou Clamídia 5. fORMAS CLÍNICAS 1. BACTERIÚRIA ASSInTOMÁTICA » Deinição: Urinocultura positiva (>100.000 colônias/ml de uma única » » » » » » » » » » » 634 bactéria) em gestante assintomática Incide em 2 a 11% das gestantes, dependendo da população estudada Mais frequente em multíparas A gravidez não aumenta o risco de bacteriúria assintomática Aumenta o risco de parto prematuro, baixo peso ao nascer e morte perinatal, se não tratada A gravidez aumenta em 30% a 40% o risco de progressão para pielonefrite devido às alterações isiológicas da gestação. Após tratamento adequado a incidência de pielonefrite cai para 3%, com um terço de recorrência Aproximadamente dois terços dos casos de pielonefrite ocorrem em gestantes que apresentaram bacteriúria assintomática previamente A presença de bactérias na urina, normalmente considerada estéril, pode ser por infecção verdadeira (colonização bacteriana) ou contaminação, por exemplo, com o meio vaginal Para distinguir entre infecção verdadeira e contaminação: Solicitar urinocultura. Baixo índice de cura espontânea (ao contrário das não gestantes) Pode ser persistente em um terço dos casos O tratamento de curta duração pode ser utilizado, principalmente pelo aumento da adesão da gestante Unidade 6 - Obstetrícia Infecção do Trato Urinário Tratamento » Nitrofurantoína 100mg, oral, 6/6 horas, por três dias (Evitar uso na gestação a termo) » Cefalexina 500mg, oral, 6/6 horas, por três dias » Amoxicilina 500mg, oral, 8/8 horas, por três dias » Fosfomicina 3g, oral, dose única Sulfametoxazol-Trimetropima: Pode ser usado, mas a resistência dos uropatógenos é elevada. Não oferece vantagem em relação aos outros antimicrobianos. Não deve ser usado no 3o trimestre. Frequentemente utilizadas em não grávidas, as quinolonas devem ser evitadas na gestação. » Repetir urinocultura 15 dias após tratamento » Se urinocultura positiva: Tratar novamente de acordo com antibiograma » Se urinocultura negativa: Repetir o exame a cada um ou dois meses até inal da gestação » Bacteriúria persistente após dois cursos de tratamento: Manter Nitrofurantoína, 100mg, oral, ao deitar, até a gestação atingir o termo. Esvaziar a bexiga antes de deitar. » Pacientes com infecção do trato urinário de repetição, relacionadas com relações sexuais, devem fazer proilaxia com Nitrofurantoína (100mg, oral) ou Cefalexina (500mg, oral) após o coito. 2. CISTITE » Bacteriúria signiicativa associada com sintomas do trato urinário baixo: » » » » Disúria, desconforto suprapúbico, frequência e urgência urinárias. Ausência de manifestações sistêmicas Incidência na gestação: 1% a 2% Sem envolvimento renal em 94% dos casos Raramente evolui para pielonefrite Taxa de recorrência: 17% 635 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand Diagnóstico » Associação de sintomatologia típica com urinocultura positiva » Número de colônias necessárias para diagnóstico pode ser menor (1000 colônias/ml de uma única bactéria) Tratamento » Podem ser usados os mesmos esquemas terapêuticos da bacteriúria assintomática » Não pode haver sintoma sugestivo de pielonefrite » Os mesmos critérios de controle de cura e de proilaxia para recidiva de infecções urinárias, preconizados para a bacteriúria assintomática, devem ser obedecidos 3. PIELOnEFRITE AGUDA » Incidência na gestação: 1% a 2% » Principal agente infectante: Escherichia coli » Dois terços dos casos ocorrem após bacteriúria assintomática não tratada ou tratada de forma inadequada » A maioria dos casos ocorre nos dois primeiros trimestres da gestação, especialmente no segundo » Risco parece ser levemente maior em nulíparas » 20% a 25% das gestantes evoluem com alterações de múltiplos órgãos Manifestações clínicas » Sintomas sistêmicos: Febre, calafrios, lombalgia, náuseas, vômitos, mal estar geral » Sintomas do trato urinário baixo podem ou não estar presentes » Alterações hematológicas, especialmente anemia » Disfunção renal, incluindo insuiciência renal aguda » Alterações pulmonares (insuiciência respiratória – síndrome da angústia respiratória do adulto) » Choque séptico Efeitos adversos na gestação » Restrição do crescimento fetal 636 Unidade 6 - Obstetrícia Infecção do Trato Urinário » Baixo peso ao nascer » Prematuridade Diagnóstico » Clínico » Sumário de urina » Urinocultura com antibiograma » Tratamento Internamento Hidratação com Ringer Lactato 2000 a 2500 ml Iniciar antibioticoterapia após colher urinocultura com antibiograma Utilizar Cefalotina 1g, EV, 4/4h, até que a gestante esteja afebril e melhor sintomatologicamente por 24-48h » Continuar com medicação oral, de acordo com antibiograma: Cefalexina 500mg, 6/6h; Nitrofurantoína 100mg, 6/6h; Amoxicilina 500mg, 8/8h;Ampicilina 500mg, 6/6h » Duração do tratamento: 10 a 14 dias. A escolha da terapia deve basearse na sensibilidade do germe e no custo do medicamento » Ausência de resposta clínica após 48-72h: Trocar o antibiótico de acordo com a sensibilidade (antibiograma) » Caso o antibiograma não esteja disponível: Substituir empiricamente por cefalosporina de 3ª geração » Utilizar Ceftriaxona 1 a 2g/dia. Pode-se associar aminoglicosideo (Gentamicina 1,5mg/kg, não excedendo 240mg/dia). Manter por 5 dias após resposta terapêutica » Pesquisar fatores predisponentes (cálculos, patologia obstrutiva, anomalia estrutural, etc.) » Monitorar sinais vitais e diurese » Hemograma completo e creatinina sérica » Outros exames de acordo com a gravidade do caso » » » » Seguimento » Urinocultura 7 a 15 dias após conclusão da terapia » Se negativa: Proilaxia com terapia de supressão antimicrobiana, até o 637 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas » » » » » Maternidade Escola Assis Chateaubriand termo da gestação Se positiva, com mesmo patógeno: Recidiva Se positiva, com patógeno diferente: Reinfecção Nos dois casos: Excluir anomalia estrutural do aparelho urinário, cálculos ou doença obstrutiva. Tratar novamente a paciente conforme antibiograma Repetir urinocultura mensalmente até o parto Realizar proilaxia de supressão antimicrobiana até o inal da gestação com Nitrofurantoina 100mg/dia ou Cefalexina 250 a 500mg/dia RECIDIVA: Geralmente ocorre em menos de cinco dias após o tratamento (até duas semanas) e isola-se o mesmo germe. Deve-se a fracasso no tratamento por terapias inadequadas ou sugere anomalia do trato urinário ou envolvimento renal na infecção inicial. O tratamento deve ser prolongado (2 a 3 semanas) com antimicrobiano adequado REINFECÇÃO: Geralmente ocorre mais de três semanas após o tratamento inicial, por organismos diferentes, sendo normalmente limitada à bexiga. Identiica pacientes com maior risco de desenvolver episódios repetidos de bacteriúria. 638