Avanços da Engenharia Genética em Odontologia Urubatan Medeiros Doutor (USP); professor titular UERJ/UFRJ. A Engenharia Genética é um conjunto de técnicas que envolvem a manipulação de genes de um determinado organismo, geralmente de forma artificial. Essa manipulação abrange duplicação, transferência e isolamento de genes, com o objetivo de produzir organismos geneticamente melhorados para desempenhar melhor suas funções e produzir substâncias úteis ao ser humano. Os primeiros experimentos referem-se à manipulação do material genético em animais e plantas com a transferência para microrganismos, tais como leveduras e bactérias, que crescem facilmente em grande quantidade. Produtos que primariamente eram obtidos em pequenas quantidades, originados de animais e plantas, hoje podem ser produzidos em grande escala por meio desses organismos recombinantes. Na Odontologia, o DNA recombinante é o componente da vacina contra Hepatite B. A Engenharia Genética passou, a partir do final da década de 1990, a ser estudada com finalidade de aplicação à Odontologia, principalmente para auxílio na predição de diagnósticos, para a modificação de microrganismos causadores de cárie dentária e para a criação de elementos dentários a partir de células-tronco, para a substituição aos perdidos, entre outras aplicações. Algumas aplicações da Biologia Molecular já podem ser sentidas na Odontologia. O seu uso proporciona o diagnóstico precoce da cárie dental, da doença periodontal e do câncer bucal. Além disso, estudos exaustivos sobre a saliva humana mostram sua capacidade de ser utilizada no diagnóstico de doenças bucais e sistêmicas. Também os marcadores genéticos podem ser aplicados na identificação de neoplasias presentes no complexo maxilofacial. Só a doença periodontal apresenta mais de 300 diferentes espécies de bactérias e muitos métodos são empregados para a detecção da variação fenotípica e genotípica desses patógenos. Por meio das técnicas de Engenharia Genética, esses patógenos podem ser identificados antes que a doença esteja em estado avançado. A técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR) é uma das mais utilizadas na identificação de patógenos associados à placa bacteriana, à cárie dental e à doença periodontal. Em experimentos específicos, visando à prevenção da cárie dentária, foram desenvolvidas cepas geneticamente modificadas de Streptococcus mutans. Trata-se de uma aplicação da Engenharia Genética à Odontologia, que consiste em uma alteração engenhosa do genoma do microrganismo, que é o mais frequente da flora microbiana bucal e o mais nocivo para os dentes. Essa cepa foi denominada de BCS3-L1 e é incapaz de produzir ácido lático, subproduto bacteriano responsável pela dissolução dos prismas de esmalte, que resultaria em cavitação do elemento dentário. Essa cepa substitui agressivamente a flora nativa da cavidade bucal, e os novos habitantes são incapazes de produzir a doença. A tecnologia de DNA recombinante foi utilizada para suprimir o lactato de hidrogenase da codificação do gene, que o faz inteiramente deficiente na produção do ácido. Laboratorialmente, cobaias que receberam BCS3-L1 apresentaram proteção contra as cáries. A Engenharia Genética avançou muito nos últimos anos e com isso surgiu a possibilidade da criação de órgãos a partir de células-tronco. A reprodução de dentes constitui um alvo atraente para bioengenheiros pelo fato de não serem órgãos vitais e, consequentemente, se não houvesse o desenvolvimento de maneira correta, poderiam ser removidos e um novo processo seria iniciado. Os estudiosos do assunto acreditam na viabilidade da reprodução de dentes, mas alertam para o fato de que, por ser composto por vários tipos de tecidos, as dificuldades serão muitas e dependem de estudos adicionais. A descoberta da identificação de uma população de células-tronco adultas na polpa dental, com capacidade de se diferenciar em fibroblastos, componentes do tecido conjuntivo, e dos odontoblastos, envolvidos na formação de dentina, corrobora a ideia de que é possível reproduzir dentes a partir das células-tronco. Após a colocação das células-tronco em um modelo para desenvolvimento, a estrutura decorrente, geneticamente desenvolvida, pode ser implantada no local desejado. A partir desse estágio, o órgão dentário pode desenvolver-se como um elemento jovem até a sua erupção no sítio desejado. Assim, ele seria implantado na forma de um germe dentário, que contenha todos os tecidos que compõem o dente e que desenvolva igualmente os ligamentos periodontais, da mesma forma que o elemento dentário natural. Como vemos, cada vez mais a pesquisa científica leva a Odontologia a alcançar resultados de ponta em termos de avanços tecnológicos. Entretanto, continuamos carentes da aplicação de políticas públicas eficazes que possam ofertar soluções mais simples e elevar o nível de saúde bucal de nossa população.