Artigo Thalita Rocha 07.01.13

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TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR: UMA REVISÃO SOBRE ASPECTOS
FISIOPATOLÓGICOS
CIDNÉIA BRASILEIRO1, DARDIANY THAISLA DE ABREU CUNHA1, ELAINE LIMA
DE ARAÚJO1, LÍVIA MARIA SANTOS PEREIRA1, THALITA SOUZA ROCHA1,
GLEISY KELLY NEVES GONÇALVES2
1
Graduandas do Curso de Enfermagem, Centro de Educação Superior de Guanambi/Faculdade
Guanambi (CESG/FG), Guanambi – BA.
2
Enfermeira / Mestre em Ciências Fisiológicas / Professora do Centro de Educação Superior de
Guanambi/Faculdade Guanambi (CESG/FG), Guanambi – BA.
RESUMO: Existe uma lacuna considerável no que diz respeito ao entendimento dos
mecanismos fisiopatológicos de alguns transtornos mentais, bem como é o caso do
Transtorno Afetivo Bipolar. O trabalho da enfermagem sempre esteve ligado ao sofrimento
das pessoas doentes. O enfermeiro tem posição ímpar nos serviços de saúde, portanto, ele
é o primeiro a ter contato com o indivíduo e a família que busca a atenção nesses serviços,
devendo assim, apoderar-se de conhecimentos para melhor traçar o plano de assistência de
enfermagem a pessoa com transtorno mental e sua família. Este trabalho trata-se de uma
revisão da literatura incluindo os achados sobre a causalidade do Transtorno Afetivo Bipolar.
Para isso, inicialmente foi realizada uma revisão de trabalhos publicados em periódicos
selecionados utilizando-se os unitermos: transtorno bipolar, distúrbio bipolar, transtorno de
humor e, atenção da enfermagem ao portador do distúrbio bipolar. A partir dos achados,
pôde-se concluir que embora poucos estudos tentaram desvendar a causa específica da
patologia, a complexidade dessa definição se acentua na medida em que são diversos os
fatores que podem desencadeá-la. Por isso, faz-se necessária, além de uma observação
rígida dos sintomas que se intercalam dificultando o diagnóstico, o despertar para as
pesquisas na área, pois, só assim os profissionais de saúde poderão ter suporte objetivo
para direcionar suas ações seja no tratamento farmacológico ou psicológico. Além disso, a
assistência de enfermagem tem emergido, alternada e direcionada, de acordo com as
necessidades de respostas aos problemas de saúde das populações, pois está diretamente
ligada ao sistema de saúde e centrada nos cuidados gerais. Por isso mesmo, nem sempre
tem atendido as especificidades das pessoas com esta patologia.
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Palavras-chave: Enfermagem. Fisiopatologia. Transtorno Afetivo Bipolar.
BIPOLAR AFFECTIVE DISORDER: A REVIEW ON PATHOPHYSIOLOGICAL ASPECTS
ABSTRACT: There is a considerable gap in relation to the understanding of the
pathophysiological mechanisms of some mental disorders, as in the case of bipolar affective
disorder. The nursing was always on the suffering of sick people. Nurses have a unique
position in health services, so it is the first to have contact with the individual and family
seeking attention these services and should thus seize knowledge to better delineate the
nursing care plan bearer mental disorders and their families. This work it is a literature review
including the findings on causation of bipolar affective disorder. For this, first we conducted a
review of studies published in selected journals using the following key words: bipolar
disorder, bipolar disorder, mood disorder and attention of nursing bearer of bipolar disorder.
From the findings, it was concluded that although few studies have attempted to unravel the
specific cause of the condition, the complexity of this definition is enhanced to the extent that
there are several factors that can unleash it. Therefore, it is necessary, in addition to a strict
observation of the symptoms that are interspersed complicating diagnosis, awakening to the
research in the area because, just so health professionals can be supported goal is to guide
their actions in pharmacological treatment or psychological. In addition, nursing care has
emerged, alternating and directed according to the needs answers to the health problems of
populations, because it is directly linked to the health system and focused on general care.
Therefore, has not always served the specifics of individuals with this disease.
Key words: Bipolar Affective Disorder. Nursing. Physiopathology.
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INTRODUÇÃO
A Reforma Psiquiátrica surgiu em decurso do intenso debate que se difundiu
no país com início nos anos 70, frente aos movimentos de redemocratização, de luta
pelos direitos sociais, civis e humanos da população, de procura por melhores
condições de vida, mediante a queda da censura e do governo militar, fase em que
se deu a elaboração de políticas mais justas. Assim, com esse movimento, houve
um grande avanço na busca de alternativas para superação dos manicômios,
contribuindo assim a uma assistência humanizada para as pessoas que lidam com
transtorno mental. Paradoxalmente, há uma lacuna considerável no que diz respeito
ao entendimento dos mecanismos fisiopatológicos de alguns transtornos mentais,
como é o caso do Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) o qual se constitui objeto de
investigação do referido trabalho.
O TAB é uma patologia crônica que afeta cerca de 1,6% da população e é
considerado um dos principais causadores de limitações e até incapacitações, a
depender do estilo de vida de cada individuo (KAPLAN & SADOCK, 1999). Apesar
dos avanços tecnológicos e pesquisas realizadas sobre os mecanismos de ação dos
estabilizadores de humor a fisiopatologia do TAB ainda é inconclusa.
O trabalho da enfermagem sempre esteve ligado ao sofrimento das pessoas
doentes. Sendo o enfermeiro um componente de posição ímpar nos serviços de
saúde, ele está entre os primeiros a ter contato com o indivíduo e a família que
busca a atenção nesses serviços, devendo assim, apoderar-se de conhecimentos
para melhor traçar o plano de assistência de enfermagem a pessoa com transtorno
mental e sua família. Este trabalho visa descrever e discutir sobre os achados na
literatura referente aos conhecimentos sobre a causa do TAB a fim de com isso,
facilitar e respaldar as ações do enfermeiro nas condutas necessárias para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas que apresentam o TAB e seu entorno
familiar. Busca ainda, identificar fatores associados ao tratamento e funções
executivas; discutir alguns aspectos relacionados a fisiopatologia do TAB e por fim,
relacionar as características comportamentais do TAB com um plano terapêutico
mais afetivo para este.
Trata-se, portanto, de um estudo bibliográfico incluindo os achados sobre a
causalidade do TAB. Assim sendo, inicialmente foi realizada uma revisão de
trabalhos publicados nos seguintes periódicos: Scielo, Pubmed e Lilacs. Como
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descritores da pesquisa foram utilizados os unitermos: transtorno bipolar, distúrbio
bipolar, transtorno de humor e, atenção da enfermagem a pessoas com distúrbio
bipolar. A partir dos achados na busca, foram selecionados trabalhos que coadunam
com os objetivos deste artigo. Para discussão dos achados, obras conceituadas na
psiquiatria e saúde mental que não estão nas bases de dados citadas acima
também foram consultadas.
Espera-se com os resultados desse estudo, além da facilitação e
empoderamento do trabalho da enfermagem, a procura de novas alternativas que
propiciem um melhor cuidado para as pessoas com TAB considerando uma
assistência humanizada no campo da saúde mental, bem como um plano
terapêutico específico.
FISIOPATOLOGIA DO TAB
Segundo os critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais (DSM IV) o Transtorno Bipolar pode ser classificado em I e II. O Transtorno
Bipolar I é caracterizado por eventos de alteração do humor de difícil controle –
depressão ou mania, e o Transtorno Bipolar II se caracteriza por episódios de
depressão e hipomania. O diagnóstico inclui a observação da história de um ou mais
episódios maníacos, com um quadro anterior de depressão maior, sendo assim, o
indivíduo poderá ser diagnosticado com o quadro clínico de TAB. Esse transtorno é
uma síndrome que consiste de um grupo de sinais e sintomas mantidos por um
período que se estende de semanas a meses. Apesar de existirem várias hipóteses
para explicar a causa dessa patologia, seus mecanismos fisiopatológicos ainda são
pouco conhecidos (REZIN et al., 2008).
Existem inúmeros fatores que podem desencadear o TAB como a interação
de fatores genéticos, psicossociais e biológicos. Um fator importante é a
predisposição hereditária, pois a herança poligênica pode levar ao desenvolvimento
do transtorno bipolar. Isso é confirmado por trabalhos que mostram uma maior
prevalência do transtorno em famílias onde um dos componentes já a possui. A
predisposição familiar pode levar a doença, pois, pais que apresentam transtorno
bipolar acabam proporcionando aos filhos um ambiente cheio de conflito, que vai
possibilitar o início precoce da doença; bem como a presença de episódios severos,
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levando a maior probabilidade de suicídio. Indivíduos que crescem nesse ambiente
também acabam desenvolvendo uma característica temperamental que leva ao
surgimento de atritos interpessoais, estimulação emocional e perda de sono,
originando, assim, os estressores responsáveis pela desordem bipolar (KAPLAN e
SADOCK, 1999).
Esse transtorno pode se iniciar mais especificamente após situações de
estresse que possam afetar o paciente e seu entorno, por exemplo, a falta de apoio
interpessoal, habilidades sociais deficientes e a morte de pessoas próximas
(KAPLAN & SADOCK, 1999). Ainda, a própria existência de uma pessoa com
transtorno mental na família, provoca mudanças em suas rotinas e modificações na
aceitação de seu familiar.
Segundo Oliveira et al., (2008) o diagnóstico do TAB leva uma situação
diferente para o paciente, na qual há a necessidade de adaptação para redução de
danos, envolve capacidade de saber lidar com o estigma social que naturalmente
aparece bem como há uma tendência para a sobrecarga e conflitos envolvendo a
família. Esta por sua vez, sendo um sistema interpessoal constituído por pessoas
que interagem por diversos motivos, influencia no interior de cada história de vida,
ainda sem habitar o mesmo espaço físico (PORTELA, 2006). Portanto, compartilha
de uma relação social dinâmica que se modifica constantemente em seu
desenvolvimento com o objetivo de vencer obstáculos concernentes as crenças,
valores e normas.
Como recursos adaptativos e de valorização do ambiente familiar visto como
de valor terapêutico, os tratamentos psicossociais vêm com o objetivo de diminuir a
negação da doença; aumentar a aderência ao tratamento; diminuir a frequência das
crises; melhorar o relacionamento com familiares; restabelecer o funcionamento
ocupacional e social e diminuir o trauma emocional caracterizado por rejeição e
estigma (KEILA, 1999). Ainda segundo Keila (1999), o meio para se atingir tais
objetivos perpassa por caminhos individuais ou coletivos e independentemente da
escolha, o principal enfoque é a melhoria da qualidade de vida do paciente incluindo
sua interlocução social e com o meio familiar.
Quanto aos fatores biológicos, a serotonina modula atividades neuronais,
regulando a fisiologia e os processos funcionais, como o controle de impulsos, a
agressividade e a tendência suicida. Logo, uma deficiência desse neurotransmissor
pode levar a estados tanto maníacos quanto depressivos, uma vez que a diminuição
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na liberação e atividade da serotonina pode levar à ideação suicida, bem como à
tentativa e, muitas vezes, ao próprio suicídio. (KAPCZINSKI et al., 2004)
A dopamina, que é outro neurotransmissor, também está envolvida com a
neurobiologia da desordem bipolar. A grande atividade dopaminérgica induzida pelo
aumento da liberação de dopamina, a redução da capacidade da vesícula sináptica
ou a elevada sensibilidade do receptor dopaminérgico estão associados aos
sintomas maníacos, e a redução na atividade dopaminérgica está relacionada com a
depressão. Quanto a noradrenalina, estudos mostram que uma menor sensibilidade
dos receptores noradrenérgicos ocasiona o estado de depressão. Porém, o aumento
na atividade noradrenérgica pode resultar em um estado de mania (KAPCZINSKI et
al., 2004).
Fatores neurobiológicos envolvidos na fisiopatologia do TAB incluem
alterações em sistemas de neurotransmissão, vias de transcrição de sinal e
regulação na expressão gênica. Ainda que haja uma grande quantidade e
diversidade de estudos que avaliaram a biologia da doença, pouco se sabe sobre a
real associação entre os fatores neurobiológicos do TAB e as alterações
comportamentais e neurovegetativas observadas nos pacientes. Estudos têm
demonstrado alterações na regulação dos sistemas noradrenérgico, serotoninérgico
e dopaminérgico. Tais aminas biogênicas são amplamente distribuídas no sistema
límbico, envolvendo-se na modulação do sono-vigília, do apetite, de funções
endócrinas e de estados comportamentais como irritabilidade e o medo. Um outro
neurotransmissor que esta relacionado a biologia do TAB é o ácido gamaaminobutírico (GABA) (VIEIRA et al., 2005).
Dados clínicos indicam que um decréscimo na função gabaérgica acompanha
os estados maníacos e depressivos, visto que, em pacientes bipolares, os níveis de
GABA estão diminuídos. O GABA modula a atividade de vários neurotransmissores,
incluindo serotonina, dopamina e noradrenalina. O sistema glutamatérgico possui
uma participação na etiologia do TAB, onde têm sido constatada por meio da ação
dos
estabilizadores
do
humor
sobre
a
neurotransmissão
glutamatérgica
(KAPCZINSKI et al., 2004).
Em relação ao sexo, as mulheres têm uma tendência maior para o
desenvolvimento do transtorno de humor, pois possuem níveis mais elevados de
monoaminoxidase cerebral (enzima que bloqueia os transmissores monoamínicos),
têm uma condição tireoidiana inferior, o que predispõe a fase de depressão, vivem
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precipitações pós-parto, possuem um afeto disfórico pré-menstrual e são vulneráveis
ao efeito depressivo dos anticoncepcionais esteróides (KAPLAN & SADOCK, 1999).
No episódio maníaco, ocorre uma elevação do humor deixando o paciente
agitado, expansivo e irritável, apresentando uma auto-estima grandiosa, pouca
necessidade de sono, pressão para falar, fuga de idéias, agitação psicomotora,
energia abundante e facilidade em se distrair (FREY et al., 2006).
Para que seja considerada característica de um episódio maníaco, essa
perturbação do humor deve causar prejuízo no funcionamento social ou ocupacional
ou, ainda, levar o indivíduo à hospitalização. No entanto, esse quadro precisa ser
diagnosticado, pois episódios maníacos severos não tratados geram condições
perigosas para o paciente e para as pessoas que o cercam além de propiciar maior
risco para o suicídio (KAPCZINSKI et al., 2000).
O episódio depressivo leva o paciente a apresentar humor deprimido, com
perda do interesse e do sentimento de prazer no desenvolvimento de atividades
(KAPLAN e SADOCK, 1999). A mania e a depressão não são estados opostos de
humor, mas patológicos. A agitação e o excesso de atividades podem ocorrer na
depressão, bem como a irritabilidade e a sensação de frustração na mania. É
comum um paciente passar por uma fase depressiva, antes de tornar-se maníaco, e
novamente entrar em depressão após a mania, antes de chegar a um estado de
humor normal (SIMS, 2001).
Segundo Nunes e colaboradores (2000) não restam dúvidas de que a
presença de agentes estressores permanentes no cotidiano do indivíduo precipita e
influencia o curso de transtornos do humor, interfere com sua expressão
sintomatológica e pode interferir com a recuperação, independentemente do tipo de
abordagem terapêutica empregada. Portanto, uma das principais condições a ser
considerada para o tratamento destes pacientes é o ambiente que estão inseridos e
a presença de agentes potencialmente estressores.
Segundo Keila (1999), é importante ressaltar que quando se faz o diagnóstico
do TAB, além dos sintomas do curso e da história da doença, devem ser levados em
conta o mundo interno, o grau de sofrimento do paciente e a interpretação subjetiva
que ele dá ao problema. Nesse sentido, é que durante o atendimento ao paciente
temos que valorizar a escuta e a compreensão do sentido que ele atribui ao seu
sofrimento e à sua doença, dando ênfase à sua experiência subjetiva. Essas
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considerações fazem da assistência a esse paciente mais condizente e
aperfeiçoada.
O tratamento do TAB é dividido em três fases: aguda, continuação e
manutenção. Os objetivos do tratamento da fase aguda são: tratar mania sem
causar depressão e/ou consistentemente melhorar depressão sem causar mania. A
fase de continuação tem como meta: estabilizar os benefícios, reduzir os efeitos
colaterais, tratar até a remissão, reduzir a possibilidade de recaída e aumentar o
funcionamento global. Finalmente, os objetivos do tratamento de manutenção são:
prevenir mania e/ou depressão e maximizar recuperação funcional, ou seja, que o
paciente continue em remissão (SANTIN, 2005).
Os estabilizadores do humor se caracterizam por atuarem regulando tanto os
sintomas das fases agudas maníacas (euforia/irritação) como das fases depressivas
(tristeza), o chamado tratamento agudo. O Lítio é considerado como um fármaco de
propriedades terapêuticas de antimaníaco e antidepressivo, altamente eficaz usado
na prevenção do TAB. Além dos estabilizadores do humor, podem ser utilizadas
outras medicações dependendo do momento da doença, como antidepressivos,
antipsicóticos ditos como atípicos como a olanzepina, os ansiolíticos como
benzodiazepínicos, entre outros tipos de medicações (MICHELON, 2005).
Stahl (2006) sugere que o lítio, desenvolvido como o primeiro tratamento para
o TAB definitivamente, modificou o resultado em longo prazo da doença, porque não
apenas trata de episódios agudos de mania, mas é a primeira droga psicotrópica
com efeito profilático comprovado na prevenção de futuros episódios da doença.
Outros estabilizadores estão surgindo do grupo de drogas que inicialmente foram
desenvolvidas como anticonvulsivantes e que encontraram um espaço importante no
TAB. A estabilização do TAB, antipsicóticos atípicos e antidepressivos é cada vez
mais importante, não somente no retorno dos pacientes ao bem-estar, mas evitando
resultados desfavoráveis em longo prazo.
Apesar de avanços terapêuticos poderem ser comprovados, sua eficácia foi
observada somente com base em estudos empíricos de tratamento e observação da
melhora ou piora dos sintomas por parte dos pacientes. Sendo assim, não existem
conhecimentos fisiopatológicos que dêem suporte a utilização destes como terapia,
funcionando assim como medidas paliativas, enquanto no âmbito de descobertas
causais do TAB deixam lacunas.
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O CUIDADO DA ENFERMAGEM NA ASSISTÊNCIA AO PORTADOR DO TAB
Na década de 70, já era reconhecido pela enfermagem psiquiátrica que a
saúde mental é um componente essencial da saúde, um direito humano, o que vem
reforçar a idéia de que é um dever do enfermeiro promover a saúde mental das
pessoas. Já se reconhecia que assistência na prática de enfermagem, centralizada
na doença e no doente hospitalizado, deveria concentrar-se na pessoa com seus
comportamentos específicos, os quais significam um grito, um alerta, para sua
necessidade de ajuda (CANDIDO, 2005).
Revisando a literatura, constatamos que muitos enfermeiros têm realizado
estudos que buscam refletir sobre o seu trabalho nos serviços de saúde mental nos
últimos anos (OLIVEIRA, 2003). Consideramos que o momento atual do trabalho de
enfermagem em saúde mental caracteriza-se pela transição entre uma prática de
cuidado hospitalar que visava a contenção do comportamento dos “doentes mentais”
e a incorporação de princípios novos e desconhecidos, que busca adequar-se a uma
prática interdisciplinar, aberta às contingências dos sujeitos envolvidos em cada
momento e em cada contexto, superando a perspectiva disciplinar de suas ações. É,
portanto período crítico para a profissão e favorável para o conhecimento e análise
do processo de trabalho nessa área (OLIVEIRA, 2003).
Os caminhos utilizados pelos enfermeiros na prática da enfermagem, como
parte complementar de seus desempenhos, por formação na sua maioria, são para
os pacientes que tem patologias que não são psíquicas (RUTH, 2009). Deste modo,
a atenção aos pacientes com algum tipo de transtorno mental acontece por vezes de
maneira precária e se intensifica com a experiência adquirida ao longo do tempo,
verificando-se a falta de atenção e de preparo dos profissionais de saúde para as
pessoas com algum distúrbio mental, principalmente da rede básica.
Os usuários dos serviços de saúde mental apresentam características
variadas: ora necessitam de muita atenção, ora se recusam ao contato, apresentam
comportamentos contrários comparando uns com os outros. É importante saber que
as pessoas não escolhem, conscientemente, apresentar essa ou aquela
característica. Portanto, não se deve indagar porque elas agem daquela maneira, ou
argumentar procurando convencê-las de que seu medo, seu ritual, sua hostilidade
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“não tem motivo”. Existem motivos para tais comportamentos, mas, geralmente o
cliente não os identifica, pois são inconscientes (RUTH, 2009).
Segundo Teixeira (1993), durante a fase depressiva do TAB, a assistência de
enfermagem consiste em assumir responsabilidades pela segurança do paciente,
dado o risco de suicídio e para isto, o enfermeiro deve estimulá-lo a falar, para que
possa verbalizar seus sentimentos e idéias de autodepreciação, ruína e inutilidade e
assim, avaliar seu nível de perspectiva e de esperança. O enfermeiro deve estar
atento ao autocuidado com a higiene e aparência do paciente, verificando seu grau
de dependência; verificar e estimular alimentação, hidratação, eliminações; observar
sono e verificar problemas somáticos.
A assistência de enfermagem ao paciente que apresenta a fase maníaca
deve ser coerente entre todos os membros da equipe. Deve-se ter uma observação
constante e relato das manifestações de comportamento do paciente, tendo sempre
em mente de que é um suicida em potencial; o maníaco deve permanecer em local
com poucos pacientes e o ambiente deve ser o mais tranqüilo possível, com o
mínimo de estímulos e, de preferência, separá-los dos pacientes deprimidos
(MARTINS, 1999).
Portanto, os prejuízos na vida de pessoas com TAB, muitas vezes são
enormes, pois eles tomam atitudes impensadas, suas reações interpessoais são
precárias, podendo prejudicar suas atividades e em algumas vezes se faz
necessário a internação hospitalar para controlar os sintomas. A humanização
nesses casos é um processo amplo que leva tempo, é complexo e oferece
resistência, pois abarga mudança de comportamento que sempre provoca
insegurança visto que os padrões populares parecem mais seguros e por isso, cada
profissional, cada equipe, cada instituição terá seu processo singular de
humanização (OLIVEIRA, 2006).
Nos últimos anos, pesquisadores têm realizado estudos avaliando a eficácia
de diversos tratamentos psicossociais associados à farmacoterapia para pacientes
com TAB. Várias razões para o uso adicional de tratamento psicossocial têm sido
demonstradas, tais como a elevada taxa de não-aderência e recaídas pelo uso
somente de medicação. A característica principal das abordagens psicossociais é a
interação técnica e empática entre o paciente, família e a equipe multidisciplinar,
auxiliando na recuperação funcional global do paciente. A abordagem psicossocial
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diminui o estresse vital, monitora para identificação de sintomas precoces e melhora
a aderência medicamentosa (MACHADO, 2003).
Um problema comum no tratamento do TAB é o uso irregular dos
medicamentos. Esse aspecto é relevante para os profissionais de saúde, tendo em
vista que a não adesão pode aumentar a recorrência de mania, a frequência de
episódios depressivos, hospitalizações e suicídios, comprometendo a qualidade de
vida dos pacientes e familiares e aumentando os custos para o sistema de saúde
(MIASSO, 2012).
Sendo assim, é de grande importância uma equipe multidisciplinar, onde, o
modelo de suporte social para paciente com TAB relaciona-se com a diversidade de
opções e facilidade de acesso aos serviços de saúde para o tratamento desta
doença. Deve-se oferecer ao paciente e sua família uma ampla gama de opções
terapêuticas como hospitais-dia, grupoterapia, acompanhamento individual e acesso
facilitado ao sistema de saúde, incluindo referências e contrarreferências.
Sobretudo, a presença de equipe multidisciplinar no tratamento dos pacientes com
TAB e o fácil acesso à medicação, de forma sistemática e continuada, podem
melhorar o prognóstico desta doença (MACHADO, 2003).
Apesar da proposta de um novo modelo assistencial na área da saúde
mental, o enfermeiro mudou pouco sua prática, apenas tendo acrescentado algumas
abordagens. As suas principais atribuições continuam sendo a administração da
unidade sob sua responsabilidade e supervisão da equipe de enfermagem (INAIÁ,
2008. p.18). Contudo, não há um modelo a seguir para a idealização de cuidados da
enfermagem na área da saúde mental. A assistência muitas vezes tem emergido,
alternada e direcionada, de acordo com as necessidades de respostas aos
problemas de saúde das populações, pois está diretamente ligada ao sistema de
saúde e centrada nos cuidados gerais. Por isso mesmo, nem sempre tem atendido
as especificidades das pessoas com TAB. Nesse aspecto em especial, salienta-se a
dificuldade de pautar suas ações em conhecimentos teóricos deste transtorno, por
falta de subsídios na literatura. Novos estudos e pesquisas são necessários para
que o indivíduo que está em sofrimento psíquico e sua família encontrem nesses
profissionais a orientação para adaptações necessárias durante as crises e todo o
curso da doença.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Aprender um pouco mais sobre enfermagem psiquiátrica e tentar contribuir
com este ramo do saber do enfermeiro frente a esta problemática, a fisiopatologia do
TAB e a análise da assistência prestada, foi a pretensão deste trabalho. Esta
preocupação perpassava pela inquietação frente à situação que se criou pela falta
de preparo destes profissionais para o tratamento do indivíduo em sofrimento
psíquico. Neste trabalho, concluímos que as pessoas que sofrem de TAB são
pessoas que necessitam de ajuda do profissional, familiares e sociedade para
conviver e entender este transtorno. Embora poucos estudos tentam desvendar a
causa específica da patologia, a complexidade dessa definição se acentua na
medida em que são diversos os fatores que podem desencadeá-la. Por isso, faz-se
necessária, além de uma observação rígida dos sintomas que se intercalam
dificultando o diagnóstico, o despertar para as pesquisas na área, pois, só assim os
profissionais de saúde poderão ter suporte objetivo para direcionar suas ações seja
no tratamento farmacológico ou psicológico.
Sabe-se que a superação não é fruto da vontade individual, mas
principalmente coletivo e em parcerias com os gestores, as universidades e a
própria sociedade em busca de um efeito positivo na atenção aos indivíduos sob
seus cuidados. Contudo, as reflexões realizadas neste artigo são importantes para
entender que as limitações existem e devem ser superadas, servindo assim como
referencial para posteriores análises e reflexões que ajudem a modificar
pensamentos e práticas da assistência de enfermagem. Espera-se que as políticas
públicas voltadas para os pacientes comprometidos com a saúde mental, sejam
mais eficazes que possam proporcionar ao profissional de enfermagem condições e
competências para oferecer um atendimento mais especializado, humano e solidário
no que se refere às especificidades de cada paciente.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo dom da vida. Aos nossos familiares, pelo apoio incondicional; ao
coordenador do curso Gildenor Fagundes pelo apoio constante; à orientadora Gleisy
Kelly por ter acreditado em nossa capacidade e nos conduziu até este dia.
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