Por que razão foi assassinado Efialtes? 1 ÍNDICE: Introdução ……………………………………………..………………………… Página 3 Por que razão foi assassinado Efialtes?...…………….………..……...…… Páginas 3 a 7 Fontes e bibliografia ..……….…………….……….………..…………………. Página 8 2 INTRODUÇÃO: Apesar do papel importante que desempenhou na construção da democracia ateniense, Efialtes é uma personagem acerca da qual pouco conhecemos. Relativamente às suas origens, apenas sabemos que era filho de Sofónides. Aristóteles, referindo-se à sua personalidade, sublinha, na Constituição dos Atenienses, a sua incorruptibilidade e o seu respeito pela constituição. Quanto à sua carreira política, sabemos, através de Plutarco, que liderou, conjuntamente com Péricles, a facção democrática em Atenas no final da primeira metade do século V a.C. Ainda segundo Aristóteles, sabemos que foi o responsável pela reforma do Areópago, órgão controlado pela aristocracia e tendencialmente conservador, limitando o seu poder ao julgamento de casos de homicídio e crimes religiosos. Esta reforma terá ocorrido em 462 a.C. e não terá sido bem recebida entre a aristocracia, tendo, inclusivamente, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, levado a que, em 461 a.C., Efialtes fosse morto à traição por Aristódico de Tanagra. No entanto, relativamente à questão da identidade do seu assassino, convém salientar que Aristóteles viveu no século IV a.C. e que durante o século V a.C. nunca se conseguiu descobrir quem teria levado a cabo o assassinato em questão. Feita a apresentação de Efialtes, importa agora definir o objectivo principal deste trabalho, que é tentar responder à seguinte questão: Por que razão foi assassinado Efialtes? Para atingir o objectivo deste trabalho, importa, antes de mais, compreender de que forma é que a democracia ateniense se foi construindo e, não menos importante, tentar perceber qual foi o impacto que a reforma de Efialtes teve na Atenas da sua época. Escolho este caminho por ser da opinião que a reforma levada a cabo por Efialtes foi um produto da história de Atenas e que só através da compreensão do referido processo de construção da democracia, bem como do impacto que a reforma em questão teve, é que poderemos lançar alguma luz sobre as razões que poderão ter estado por trás deste assassinato. 3 POR QUE RAZÃO FOI ASSASSINADO EFIALTES? Atenas sempre foi uma polis em conflito, marcada pela luta entre classes, sobretudo entre as famílias aristocráticas, que se gladiavam entre si pelo poder na cidade. Esta será uma característica desta polis ao longo dos tempos e que se manterá ainda na Atenas do século V a.C., onde Efialtes viveu. É na sequência destes conflitos internos que no século VII a.C. é chamado o legislador Drácon, responsável pelas primeiras leis em Atenas, que, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, não terão resolvido os problemas existentes. Acerca destas leis pouco se conhece, mas, não obstante o facto de não terem solucionado os referidos conflitos, a sua existência é de suma importância, porque, por um lado, reconhecem a necessidade de existirem leis para solucionar os conflitos existentes e, por outro lado, representam um momento de institucionalização da polis. Tal como é referido no parágrafo anterior, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, as leis de Drácon não tiveram o impacto pretendido e não conseguiram resolver os conflitos na polis. Atenas continuava a ser uma cidade em constante conflito interno, regida por uma constituição oligárquica, onde, por um lado, os conflitos entre as facções aristocráticas se mantinha e, por outro lado, onde muitos haviam sido feitos escravos e em alguns casos vendidos na sequência dessa condição, devido ao não pagamento de empréstimos contraídos junto dos Eupátridas, cujo penhor era a liberdade do próprio endividado e da sua família. É neste cenário que no começo do século VI a.C. é chamado o legislador Sólon, descrito por Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, como “o primeiro campeão do povo”. Embora as fontes sejam contraditórias em relação às suas reformas, Sólon terá: abolido a escravidão de 1 2 cidadãos atenienses por motivo de dívidas, criado duas novas instituições – a Boulê e a 3 Helieia e dividido a população em quatro classes censitárias, sujeitando o assento nos cargos ao rendimento dos cidadão, ao contrário do que acontecia até então, onde o assento nos 4 referidos cargos estava sujeito ao nascimento nobre . No entanto, as reformas de Sólon não surtiram o efeito esperado e Atenas continua a ser uma polis em conflito constante. Menos de dez anos volvidos, as lutas entre facções 1 Em Atenas já existiam o Areópago (Conselho composto pelos ex-Arcontes [que eram aristocratas], cujas funções seriam, entre outras, controlar as leis [verificar se não iam contra a polis] e julgar crimes de sangue) e a Ecclesia (Assembleia dos Cidadãos, cuja função principal, entre outras, seria aprovar as leis da polis). Relativamente ao Areópago, convém salientar que, segundo alguns autores, terá sido com Sólon que esta instituição passou a ser constituída pelos ex-Arcontes. 2 Boulê – Conselho composto por quatrocentos cidadãos atenienses, cuja eleição seria anual, e que teria, entre outras, a função de preparar as leis que seriam posteriormente submetidas a aprovação na Ecclesia. 3 Helieia – Tribunal de jurados, para o qual seriam eleitos anualmente cerca de seis mil cidadãos, de entre aqueles com mais de trinta anos de idade. 4 Assim, o exercício do cargo de Arconte e o assento no Areópago ficava aberto às duas primeiras classes censitárias, com rendimentos mais elevados. O acesso ao serviço militar como Hoplita, bem como o assento na Boulê, ficava aberto às três primeiras classes censitárias, enquanto o acesso à marinha de guerra ficava reservado aos membros da quarta classe censitária, que seria a com menores rendimentos. Na Ecclesia e na Helieia teriam assento os cidadãos das quatro classes censitárias. 4 tinham-se acentuado novamente, sendo neste contexto que Pisístrato aproveita para instaurar a tirania, regime que, após uma primeira tentativa falhada em 561 a.C., impõe definitivamente em 546 a.C. e que se mantém até 510 a.C. No entanto, esta tirania acaba por ser um passo em frente na construção da democracia ateniense, porque, ao manter as leis e instituições criadas por Sólon, contribui para um período de maior estabilidade, permitindo aos atenienses uma melhor adaptação às referidas leis, bem como ao funcionamento das instituições. Após a queda da tirania em 510 a.C., retornam os conflitos entre as facções aristocráticas, tendo como protagonistas Iságoras e Clístenes. Em 508 a.C. Iságoras acaba por conseguir ser eleito Arconte e, aproveitando a amizade que tem com o rei espartano Cleómenes, consegue expulsar Clístenes da cidade, com o intuito de estabelecer em Atenas um regime oligárquico. No entanto, Iságoras depara-se com a resistência do dêmos, que se opõe à sua tentativa, e com a retirada dos espartanos. Entretanto, Clístenes é chamado de volta e em 508/507 a.C. assume o poder, procedendo de seguida a uma série de reformas que serão fundamentais para o processo de construção da democracia ateniense. Assim, Clístenes irá procurar, por um lado, reorganizar o corpo cívico da cidade e, por outro lado, modificar as instituições políticas existentes. Nesse sentido, com o objectivo de diluir as solidariedades locais em torno das três principais famílias aristocráticas em Atenas (Alcmeónidas, Filaidas e Pisistrátidas) e evitar que estas tivessem garantida a eleição para o Arcontado, resolve proceder a uma série de reformas, de entre as quais são de destacar: o alargamento do corpo de cidadãos, através da concessão de cidadania a não atenienses, aumentando desta forma o número de cidadãos; a criação do demo como nova divisão administrativa do território; a divisão da Ática em três zonas – a urbana ou cidade e arredores, a costeira e a interior – e procede à repartição do demo em trinta grupos (as trítias), dez por cada uma das três zonas referidas. Com essas trítias, agrupando uma de cada zona, procede à criação de dez tribos, passando cada tribo a eleger cinquenta representantes para a Boulê, que passa assim de quatrocentos para quinhentos membros, e seiscentos representantes para a Helieia. Com estas medidas, embora mantendo as reformas de Sólon, Clístenes ganha grande popularidade, porque, por um lado, com o alargamento do corpo de cidadãos, consegue criar condições para uma maior participação do dêmos na polis e, por outro lado, com a divisão da população em dez tribos compostas por pessoas de três regiões diferentes da Ática, consegue, em certa medida, diluir as solidariedades locais em torno das principais famílias aristocráticas. Chegado a este ponto, importa agora, antes de avançar mais, compreender algumas ideias que considero importantes para o entendimento do impacto da reforma levada acabo por Efialtes, bem como dos motivos que poderão ter levado ao seu assassinato. Como podemos ver através do que até agora foi dito, Atenas é uma polis em conflito constante, onde existe uma grande luta entre as famílias aristocráticas pelo poder na cidade. É na sequência dessas lutas que vão surgindo as reformas políticas em Atenas e que o dêmos vai ganhando cada vez 5 mais poder. Assim, é neste contexto que irá surgir a reforma de Efialtes, que, em minha opinião, não obstante o seu impacto, foi uma consequência lógica da evolução histórica da democracia ateniense. Não obstante as reformas de Clístenes, ultrapassada a ameaça persa em 490 a.C. e, posteriormente, em 480 a.C., Atenas continua a ser uma polis em constante conflito interno, onde as facções aristocráticas continuam a lutar pelo poder. É neste cenário que emergem figuras como Címon, Efialtes e Péricles. Címon, filho do vencedor de Maratona, Mílciades, consegue o apoio popular graças a um conjunto de vitórias e à propaganda gerada em torno do episódio dos restos mortais de Teseu, fundador mítico de Atenas, que teriam sido trazidos por si para a cidade, bem como do mito gerado à volta de Maratona. Era, segundo as fontes, um conservador a quem desagradava o caminho que tomava a democracia ateniense, tendo tentado travar, senão mesmo fazer regredir, a tendência evolutiva que a caracterizava. Apercebendo-se da importância que os tetas, membros da classe censitária com menos rendimentos, haviam adquirido na democracia ateniense, graças ao prestígio acumulado nas Guerras Pérsicas e em consequência de constituírem peças chave na frota que era fundamental à defesa da cidade e à manutenção do seu império, resultante do papel de líder que Atenas ocupava na Liga de Delos, irá procurar desviá-los da vida política, afastando-os de Atenas através da criação de cleruquias (colónias dependentes da metrópole), onde lhes distribuía terras. Desta forma, por um lado, afastava os tetas da cidade, enquanto que, por outro lado, através da distribuição das referidas terras, conseguia ir de encontro às suas reivindicações. No entanto, esta actuação acabou por sofrer duros golpes com o massacre, em 465/464 a.C., dos colonos de uma cleruquia em Trabescos e com a revolta de Tasos em 465 a.C., que Címon só consegue reconquistar dois anos após o cerco (reveses que são aproveitados pelos seus adversários, entre os quais se destacam Efialtes, eleito Estratego em 465/464 a.C., e Péricles, que no seu regresso de Tasos o acusam de traição). Em 462 a.C., apesar da oposição da facção democratica, encabeçada por Efialtes, Címon parte com um contigente de quatro mil hoplitas para auxiliar Esparta, que se encontrava a braços com uma revolta de hilotas. Segundo Plutarco (Címon 16.9), Efialtes, na Assembleia que discutiu o envio de apoio militar para Esparta, justifica a sua oposição alegando que os atenienses não deveriam ajudar uma cidade que era sua rival e que, pelo contrário, deveriam deixar afundar o orgulho espartano. Ao chegar a Esparta, a força ateniense é acolhida com desconfiança e, consequentemente, devolvida à procedência sem ter sido utilizada. Este facto é usado pela facção democrática, nomeadamente pelo seu líder Efialtes, para demonstrar junto da Ecclesia que Címon não havia tido razão ao tentar apoiar militarmente Esparta e que esta, ao mandar regressar os quatro mil hoplitas atenienses, havia desrespeitado Atenas. Na sequência deste episódio, Címon perde a sua influência e credibilidade. 6 Ainda em 462 a.C., Efialtes, aproveitando a ausência de Címon, lidera um movimento que preconizava significativas reformas internas, conseguindo a aprovação de uma lei que retirava ao Areópago, orgão controlado pela aristocracia e tendencialmente conservador, a maioria dos seus poderes. Efialtes e os seus partidários consideravam que Atenas se encontrava nas mãos da aristocracia e que o dêmos não tinha possibilidades para participar no governo da polis. Assim, tendo constatado que o bastião dessas famílias aristocráticas se encontrava no Areópago, orgão que sobrevivera às reformas Clístenes e que detinha poderes extensos, capazes de inviabilizar as medidas populares (deteria, entre outros, o poder de fiscalizar as leis aprovadas pela Ecclesia, o poder de controlo das magistraturas e poderes judiciários extensos), irá propor uma série de medidas com vista a diminuir os poderes deste orgão. Para Efialtes e Péricles era contra o espírito democrático o facto de tão importantes poderes estarem nas mãos do Areópago, órgão aristocrático e constituído por membros vitalícios, pelo que procuram demonstrar que os poderes por ele detidos eram o resultado de uma usurpação, já que não era possível argumentar que antes de Sólon o Areópago possuísse determinados poderes. Com o objectivo de desacreditar aquele órgão, Efialtes e Péricles começam por intentar processos individuais contra alguns dos seus membros, acusando-os de corrupção. Em seguida, Efialtes apresenta à aprovação da Ecclesia uma série de medidas que reduzem drasticamente os poderes do Areópago, privando-o das funções legislativas e judiciais que possuía, deixando-lhe apenas o direito de julgar casos de homicídio e crimes religiosos. Todos os outros poderes são transferidos para a Ecclesia, para a Boulê e para a Helieia, que se caracterizam por serem órgãos democráticos por excelência. Mais importante do que esta transferência de competências é o facto de esta reforma, ao enfraquecer uma autoridade que tinha o poder de inviabilizar medidas mais populares na polis, abrir caminho para futuras reformas. Ao regressar de Esparta, Címon tenta ainda opor-se à reforma em questão, mas sem qualquer êxito. O revés acabado de sofrer, tal como se refere anteriormente, foi bem aproveitado pelos seus adversários e em 461 a.C. Címon é alvo de um processo de ostracismo e condenado a dez anos de exílio. A reforma levada a cabo por Efialtes e pelos seus pares estava consolidada. Com esta reforma, Efialtes tinha desafiado as classes dirigentes e, apesar de ter o dêmos a seu favor, levantou violentas hostilidades em Atenas, que conduzirão ao seu assassinato em 461 a.C. Conforme refiro anteriormente, Atenas é uma polis em conflito constante, onde existe uma grande luta entre as famílias aristocráticas pelo poder na cidade, sendo na sequência dessas lutas que vão surgindo as reformas políticas em Atenas e que o dêmos vai ganhando cada vez mais poder. É neste contexto que surge a reforma de Efialtes, que, tal como também já referi, é, em minha opinião, uma consequência lógica da evolução histórica da democracia ateniense. Efialtes tinha desafiado as classes dirigentes e, apesar de ter o dêmos a seu favor, levantou violentas hostilidades em Atenas, que culminaram com o seu assassinato em 461 a.C., às mãos de, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, Aristódico de Tanagra. 7 No entanto, embora Aristóteles, que viveu no século IV a.C., nos forneça o nome do assassino de Efialtes, o facto é que na altura do sucedido, e ao longo do século V a.C., o responsável nunca foi identificado, o que revela a possível e, em minha opinião, quase certa maquinação de um grupo de conspiradores que terão conseguido ocultar a identificação do assassino em questão. O assassinato acabou por ser a opção escolhida, porque Efialtes gozava de um forte apoio popular em Atenas, facto que inviabilizaria qualquer tentativa de ostracismo, uma vez que implicaria a aprovação por parte da Ecclesia. 8 FONTES E BIBLIOGRAFIA: • The Oxford Classical Dictionary, Ed. by Simon HORNBLOWER and Anthony SPAWFORTH. 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