ENSINO DE FILOSOFIA NA ESCOLA: (IM) POSSIBILIDADES ANTE

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Ensino de Filosofia na Escola: (im) possibilidades
ante a crise da modernidade
Teaching philosophy at school: (im)possibilities in face of the crisis
of modernity
Resumo Neste artigo, pretende-se pensar as (im)possibilidades do
ensino de filosofia e, principalmente, da experiência filosófica na escola desde a perspectiva foucaultiana. Nesse sentido, esta temática
desenvolve-se a partir de duas questões, a saber: (a) de que modo
o ensino e a prática docente em filosofia na escola têm funcionado e acontecido? (b) quais são as alternativas para que esse ensino venha a funcionar e acontecer de outras maneiras? Na primeira
questão, discute-se a situação desse ensino na escola ante a crise
da modernidade. Assim, em um primeiro momento, procurar-se-á
pensar o processo de subjetivação no ensino de filosofia em relação ao processo de produção do sujeito moderno normalizado. Em
seguida, analisar-se-á as (im)possibilidades de o ensino de filosofia
constituir-se como experiência filosófica ante a crise dos padrões de
experiência da modernidade. Na segunda questão, referenciando-se na produção filosófica do chamado “terceiro Foucault”, procurar-se-á visualizar uma alternativa para o ensino de filosofia que, a
partir de uma ética e de uma estética imanente do cuidado de si,
possibilite pensar outras formas de produção de subjetividade.
Palavras-chave ensino; filosofia; crise; modernidade;
Foucault; cuidado de si.
Abstract This paper is intended to reflect on the (im)possibilities
of teaching Philosophy and, especially, the philosophical experience in schools from a Foucaultian perspective. In this sense, I will
develop this topic based on two main issues: (a) how are the teaching and the practice in Philosophy working and happening nowadays? (b) what are the alternatives in order for it to work and to
occur differently? In the first question, we discuss the condition of
Philosophy teaching in the school due to the crisis of modernity.
Thus, in the very first moment, we will reflect on the subjectivity
process in the teaching of Philosophy in relation to the process of
the modern standard subject. Then, we will analyze the (im)possibilities of teaching Philosophy as a philosophical experience in face
of the crisis of the modern experience patterns. In the second question, based on the philosophical production of the so-called “third
Foucault”, we will seek an alternative view to the teaching of Philosophy that, from an ethics and an immanent aesthetics of self-care,
allows thinking other forms of subjectivity production.
Keywords teaching; Philosophy; crisis; modernity; Foucault;
Self-care.
Saulo Eduardo Ribeiro
Universidade Federal de santa
Maria (UFSM – RS)
[email protected]
Introdução
U
ma das principais questões, se não a
questão primeira, sobre a presença da
filosofia no ensino médio diz respeito
às condições de possibilidade do seu ensino
constituir-se como experiência filosófica, e
não apenas como transmissão de informações sobre sua história.
Essa questão, ou antes, esse problema,
adquire maior “materialidade” e importância
a partir da aprovação da obrigatoriedade da
disciplina1. Apesar de atualmente haver consenso em torno dessa questão, no que diz
respeito ao objetivo geral da disciplina, isto é,
que ela deve promover uma atitude filosófica
no aluno, discute-se agora como fazê-la possível no nosso contexto educacional. Assim,
se inicialmente o debate sobre a presença da
filosofia no ensino médio resumia-se a questão: “ensinar filosofia ou ensinar a filosofar?”,
a opção pelo “ensinar a filosofar” se coloca,
necessariamente, e a partir de então, como
problema filosófico que precisa ser pensado,
nesse caso, em relação às suas (im)possibilidades no contexto do ensino médio.
A opção por uma prática centrada estritamente em uma abordagem histórica – ou
uma abordagem sincrônica baseada em uma
história das ideias, segundo a qual o sentido
do texto encontra-se no texto2, priorizando
a transmissão das informações sobre o que
os filósofos pensaram e disseram sobre determinados temas/problemas – começou a
ser questionada como insuficiente para a introdução da prática filosófica em sala de aula
no ensino médio. A partir disso têm surgido
propostas, que transitam basicamente entre
uma abordagem temática, que se constitui de
temas filosóficos presentes no nosso cotidiano, e outra cujo ponto de partida são os pro Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) e,
especialmente, com a aprovação da Lei nº 11.684/2008,
que torna obrigatório o ensino da disciplina de
filosofia no currículo da educação básica, esse debate
abre novas perspectivas, as quais serão levadas em
conta neste trabalho.
2
Para uma discussão crítica sobre métodos e abordagens
no ensino de filosofia, ver PIMENTA, 2008.
1
74
blemas, mas ambas ainda sendo pensadas em
articulação com a história da filosofia3.
Entretanto, isso por si só não assegura o
desenvolvimento de uma prática e/ou cultura
filosófica na sala de aula ou na escola. Mesmo
que atualmente tenha se procurado abordar a
questão do ensino de filosofia como um problema filosófico, e de já haver certa literatura
a respeito do tema, as discussões e práticas
de quem tem se ocupado do ensino da filosofia nas escolas tem, em certa medida, se resumido a um “pedagogismo”4 acerca do conhecimento filosófico e, por conseguinte, a busca
ou elaboração de métodos para transmiti-lo.
Essa inclinação ou ambição comeniana, de
querer “ensinar tudo a todos” e de que todos
aprendam tudo, tem levado a uma excessiva
preocupação e à adoção confusa e indiscriminada de teorias pedagógicas5, sem uma
conceitualização e/ou definição sobre o estatuto desses saberes pedagógicos, bem como
a orientação filosófica das metodologias
que são elaboradas a partir dessas teorias.
Além disso, também é preciso levar em conta os limites dessas propostas, pois mesmo o
“tudo” e o “todos” de Comenius referiam-se
a “poucos” conteúdos e a “alguns” alunos do
século XVII.
Assim, neste artigo não se pretende
fazer uma análise das diversas abordagens
metodológicas do ensino de filosofia, tampouco propor uma metodologia que funcionará em todos os “mundos possíveis”.
Neste artigo, pretende-se analisar o ensino
de filosofia não enquanto um problema me Uma discussão mais detalhada sobre a questão da
história da filosofia no plano do ensino de filosofia
pode ser encontrada em SILVA, 1986.
4
“Pedagogismo” aqui é compreendido como
“tecnocracia pedagógica”, “cujo postulado básico é
o pressuposto de uma autonomia ou auto-suficiência
da instância pedagógica” ante às especificidades da
disciplina de filosofia (VICENTE, 1992, p. 330).
5
Isso é, à utilização dessas teorias sem a devida
“análise de seus enunciados a fim de se ‘aferir suas
qualidades lógicas e de adequação ao contexto, de
modo a favorecer ações mais eficazes’” (MAZZOTTI
apud ALBUQUERQUE, 2003, p. 4). Para um esboço das
teorias pedagógicas modernas e contemporâneas,
ver LIBÂNEO; SANTOS, 2005.
3
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todológico (problema do “ensinar filosofia”),
mas enquanto problema filosófico, visto que
o desafio do professor de filosofia é “fazer o
estudante aceder a uma competência discursivo-filosófica”6. Pensar o ensino de filosofia
só em termos de “como” ensinar e “o que”
ensinar não implica, necessariamente, uma
compreensão e/ou preocupação filosófica
com este “como” e “o que” ensinar.
Quais são as concepções filosófico-pedagógicas7 que estão sendo levadas em consideração (geralmente de maneira implícita)
na formulação dessas metodologias ou abordagens, bem como na formulação dos conteúdos curriculares para o ensino de filosofia?
Essa é uma questão que ainda tem sido pouco
pensada e discutida. Ensinar a filosofar implica não separar a prática de ensino da prática
filosófica, estando ciente sobre a concepção
de filosofia adotada, bem como sobre a concepção pedagógica a partir da qual, em consonância com a concepção de filosofia, pensamos e concebemos as práticas, o currículo e o
processo educativo em geral.
Desse modo, este artigo se propõem a
pensar as (im)possibilidades do ensino de filosofia e, principalmente, da experiência filosófica na escola desde a perspectiva foucaultiana. Nesse sentido, a temática deste artigo
será desenvolvida a partir das seguintes questões: (a) de que modo o ensino e a prática docente em filosofia na escola têm funcionado e
acontecido? (b) quais são as alternativas para
que o mesmo venha a funcionar e acontecer
de outras maneiras? Na primeira questão,
será discutida a situação do ensino de filosofia na escola diante da crise da modernidade.
Assim, em um primeiro momento, buscar-se-á
pensar o processo de subjetivação no ensino
de filosofia na sua relação com o processo de
BRASIL/MEC, 2006, p. 30
Volta-se novamente à questão do pedagogismo, visto
que “a questão do ensino de filosofia é uma questão
filosófica e não meramente pedagógica e deve,
portanto, ser enfrentada como tal [pois sendo que a]
atividade filosófica é em si mesma educativa, não faz
sentido falar em ensino de filosofia no contexto de
didática apenas instrumental” (GALLO; KOHAN, 2000,
p. 190-191).
6
7
produção do sujeito moderno normalizado.
Em seguida, analisar-se-á as (im) possibilidades do ensino de filosofia constituir-se como
experiência filosófica em face à crise dos padrões de experiência da modernidade. Na
segunda questão, referenciando-se na produção filosófica do chamado “terceiro Foucault”, busca-se pensar uma alternativa para
o ensino de filosofia, que possibilite pensar
outras formas de produção de subjetividade a
partir de uma ética e de uma estética imanente do cuidado de si.
A atualidade da prática de ensino
em filosofia na escola média
Ao pensar a atualidade da prática de
ensino em filosofia na escola, isto é, ao pensar as circunstâncias nas quais essa prática
tem se apresentado até o momento, é preciso levar em conta que a filosofia, enquanto
disciplina curricular, já possuía uma história
nas instituições educativas. Assim, podemos
compreender a questão de como o ensino e a
prática docente em filosofia têm funcionado
e acontecido, a partir da perspectiva histórica
das disciplinas e das instituições educativas.
Ao perspectivar historicamente o ensino de
filosofia, não se pretende traçar um paralelo
com o desenvolvimento de cada disciplina em
particular, mas de relacioná-lo ao contexto
histórico em que as disciplinas e as instituições estão inseridas. Isso possibilitará pensar
as (im)possibilidades e dificuldades da prática
de ensino em filosofia tanto no que ela tem de
específico e particular quanto no que ela tem
de comum com outras disciplinas e/ou saberes escolarizados. Tal análise permite ampliar
o campo de visão sobre a temática do ensino
de filosofia e compreender por que, a partir
de uma determinada concepção de filosofia,
parece impossível a prática de ensino em filosofia constituir-se como experiência filosófica, tematizada como uma “forma de governo
vivida em relação a determinados jogos de
verdade, através dos quais os sujeitos humanos se dão seu ser próprio a pensar”8.
8
FREITAS, 2010, p. 171.
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Para Freitas, há um esgotamento da experiência formativa no projeto da modernidade, visto que, no projeto social e epistemológico da modernidade, a formação e a prática
educativa têm desempenhado um papel instrucional. Conforme Freitas, referenciando-se
em Gadamer, se a educação se dá por ajustamento às normas, aos valores e símbolos de
uma sociedade, a formação, ao contrário, não
se dá por meio da atividade de ensino-aprendizagem convencional, mas, sim, como autodesenvolvimento, objetivando a correção das
pressões derivadas da educação. Dessa forma, a formação (Bildung) carregava os sentidos de “saber viver” e “domínio de si”, que
implicavam em uma formação de si, pelo cultivo de “bens seculares”, tais como a liberdade,
autonomia e responsabilidade. Com o advento da modernidade, a educação passa a ser
concebida como “arte liberal de governar”,
não mais preocupação com a formação, mas
com a instrução pública. Esta passa a abarcar
a esfera política, e convertendo e subsumindo
a Bildung em prática educativa instrucional, o
projeto formativo da modernidade passa a
preocupar-se com a “garantia de uma sociedade civilizada, privilegiando a transmissão
do saber científico”9.
Nesse sentido, como a prática pedagógico-filosófica tem sido tradicionalmente
concebida desde os jesuítas, estritamente
pela lógica do ensino, limitando-se à utilização de manuais, compêndios e textos clássicos, é difícil pensar uma alternativa que não
a referenciada na transmissão de conteúdos.
Esse tipo de prática de ensino se explica porque, segundo Freitas, na filosofia moderna a
relação entre verdade e subjetividade não se
dá mais de acordo com uma exigência ética,
mas privilegiando as regras de formação do
método e a estrutura do objeto a ser conhecido. Na filosofia antiga, de modo diverso, a
relação entre verdade e subjetividade estava
“ordenada pelo ideal de produzir no eu uma
relação de retidão entre ações e pensamentos [...] na medida em que o sujeito precisa
9
Ibid, p. 174.
76
medir seus progressos na constituição do eu
da ação ética”10.
Assim, essa concepção de ensino está
relacionada a uma compreensão da educação
entendida como instrução pública, voltada
para a transmissão do saber científico, em que
a verdade é um princípio de sujeição ao conhecimento que prescinde de uma exigência ética,
isto é, essa prática de ensino não concebe a
verdade como um princípio de ação que equaliza escolha de vida e razão teórica, constituindo, assim, o eu da ação ética. Ao contrário, em
uma concepção de ensino como transmissão,
o educando abre mão de suas escolhas de vida,
devendo apenas submeter-se ao conhecimento fornecido pelo professor. O educando não
se constitui como o eu da ação ética, mas como
o eu sobre o qual é exercida uma ação de submissão ou assujeitamento.
A partir dessa lógica de ensino/transmissão, costuma-se julgar que é impossível o
ensino de filosofia constituir-se como prática
ou experiência filosófica, pois os alunos de
ensino médio ainda não possuem capacidade
para compreender as teorias filosóficas11. Mas
será que essa concepção, que se costuma julgar impossível de ser realizada, por si só tem
algo a ver com o filosofar? Por que é tão difícil
Ibid, p. 178.
Esse tipo de julgamento vem geralmente acompanhado
de outro, a saber, de que a filosofia no ensino médio só
serve para doutrinamento ideológico de esquerda. Um
exemplo disso pode ser encontrado em reportagens
e artigos divulgados pela revista Veja. Dois exemplos.
Na Edição de número 2158, de 31 de março de 2010,
onde consta que “Agora obrigatórias no ensino médio
brasileiro, as aulas de sociologia e filosofia abusam
de conceitos rasos e tom panfletário. Matemática
que é bom...”; e outro exemplo vem de edição mais
recente, de número 2236, do dia 28/09/2011, que diz:
“Em vez de empreender um esforço para melhorar o
quadro lastimável da educação brasileira, o governo
se empenha em tornar obrigatórias disciplinas que, na
prática, só vão servir de vetor para aumentar a pregação
ideológica de esquerda, que já beira a calamidade nas
escolas” (p. 93). Atrelada a essa compreensão, que
busca justificar o afastamento da filosofia em relação
à escola, está a compreensão, defendida por Tarcísio
M. Padilha, de que esse afastamento se justificaria
em função da pouca seriedade com que professores
e alunos tratam os conteúdos filosóficos (CARMINATI,
2004, p. 5-6).
10
11
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conceber a possibilidade do filosofar na escola, na relação entre professor e aluno, entre
um adulto e um jovem, quando, na antiga
Grécia, Sócrates interpelava constantemente
a juventude, enredando-a nas tramas de sua
filosofia, sendo até condenado à morte por
isso? Está também a filosofia no ensino médio
condenada à morte?
A centralidade que se busca dar aos textos filosóficos e à história da filosofia, como
condição sine qua non do filosofar, tem contribuído para embotar ou fortalecer a presença da filosofia e da prática filosófica na
escola? Desse ponto de vista, e a partir dessa
abordagem, é possível o ensino de filosofia
constituir-se como experiência filosófica para
alunos do ensino médio? Se não, por quê? Por
que os alunos/jovens ainda são imaturos, ignorantes ou mesmo “burros”? Mas afinal, o
que fazia Sócrates ao interpelar seus concidadãos? O que falta a um jovem do ensino médio
brasileiro que a um jovem escravo analfabeto
do fim do século V a.C. – que é levado por Sócrates a descobrir uma proposição da geometria – não faltava? Como era possível a Sócrates filosofar com seus concidadãos sem todo
o cabedal teórico do qual dispomos na atualidade? E como, apesar de todo esse cabedal,
não conseguimos conceber a possibilidade do
filosofar com a juventude atual? O que aconteceu, entre o tempo de Sócrates e o nosso,
para que fosse desacreditada a possibilidade
do filosofar com a juventude?
Visto a amplitude dessa última questão, e em função da brevidade deste artigo,
abordar-se-á duas hipóteses. A primeira diz
respeito à preocupação da filosofia em relação ao acesso a verdade. Entre Sócrates e
nosso tempo houve uma mudança de foco
na preocupação da filosofia com a verdade.
Essa mudança diz respeito a dois princípios
interdependentes na Antiguidade e que, já
a partir de Platão, mas principalmente com
o advento da ciência moderna, são tomados
como distintos: o princípio do cuidado de si
e o do conhecimento de si. Assim, conforme
Foucault, a prática filosófica na Antiguidade
sempre esteve relacionada à questão da es-
piritualidade, isto é, a questão filosófica do
acesso à verdade sempre esteve relacionada
à questão espiritual sobre as transformações
necessárias no ser do sujeito, para que este
venha a ter acesso a essa verdade. Esse aspecto espiritual da filosofia se constituía por
intermédio de certas práticas. Nesse sentido,
segundo Foucault,
Essas práticas diziam respeito àquilo
que se chamava frequentemente,
em grego, epimeleïa heautou; em
latim, cura sui. Esse princípio de ‘ocupar-se de si’, de ‘cuidar de si mesmo’,
é, sem dúvida, a nosso ver, obscurecido pelo brilho do gnôthi seauton.
Mas é preciso lembrar que a regra
de ter de se conhecer a si mesmo
foi regularmente associada ao tema
do cuidado de si. Na cultura antiga
como um todo, é fácil encontrar
testemunhos da importância dada
ao ‘cuidado de si’ e de sua conexão
com o tema do conhecimento de si12.
É por meio da prática do cuidado de si,
do ocupar-se consigo mesmo, que percorremos o caminho que nos permitirá ter acesso
à verdade. No entanto, esta não é a verdade
revelada das religiões, nem a verdade descoberta das ciências, a verdade do conhecimento científico. Essa verdade não diz “respeito
àquilo que somos, a não ser na nossa relação
com o mundo, no nosso lugar na ordem da
natureza, na nossa dependência ou independência em relação aos acontecimentos que
se produzem”13. Ou seja, para Foucault, essa
“verdade só é dada ao sujeito a um preço que
põe em jogo o ser mesmo do sujeito [...] não
pode haver verdade sem uma conversão ou
sem uma transformação do sujeito”14. Nesse
sentido, não existe uma verdade em si mesma, mas apenas no movimento de sua apropriação e internalização, isto é, a verdade se
coloca na relação entre minhas ações e meus
FOUCAULT, 1997, p. 119.
Ibid, p. 127.
14
Idem, 2010, p. 16.
12
13
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pensamentos. Na filosofia moderna, a verdade já não transforma mais o sujeito, pois este
já é em si mesmo capaz de verdade. Por isso,
de acordo com Gros,
[...] [no] modo moderno de subjetivação, a constituição de si como sujeito
é função de uma tentativa indefinida
de conhecimento de si, que não se
empenha mais do que em reduzir a
distância entre o que sou verdadeiramente e o que creio ser; o que faço, os
atos que realizo só têm valor enquanto me ajudam a melhor me conhecer.
Logo, a tese de Foucault pode ser
assim formulada: o sujeito da ação
reta, na Antiguidade, foi substituído,
no Ocidente moderno, pelo sujeito do
conhecimento verdadeiro15.
Apesar disso, como já foi lembrado, a ênfase no conhecimento em detrimento do cuidado de si já começa em Platão, para o qual,
segundo Foucault, a relação entre verdade e
subjetividade se dá no movimento que a alma
realiza sobre si mesma para reencontrar sua
verdadeira natureza16.
Portanto, influenciado pela perspectiva
filosófica moderna, o ensino de filosofia tem
funcionado e acontecido como transmissão
de um conhecimento sobre a experiência de
pensamento de filósofos da tradição, “[...] colocando mais para fora possível a preocupação com os problemas que afetam seu pensamento e com a possibilidade de se fazer uma
experiência desses problemas”17. Tendo em
vista o esgotamento da experiência formativa no projeto da modernidade, essa hipótese
explicativa relaciona-se à segunda hipótese, a
saber, a da crise dos padrões de experiência e
dos modos de existência modernos. Como se
pode ver, esse esgotamento se deve, conforme Dany-Robert Dufour (2005), a extinção rápida das formas filosóficas modernas do sujeito que serviam de referência e nos permitiam,
até então, pensar nosso estar no mundo.
GROS, 2010, p. 473.
FOUCAULT, 1997.
17
GELAMO, 2009, p.117.
15
16
78
O ensino de filosofia na escola
ante a crise da modernidade
A segunda hipótese para a questão sobre o porquê é tão difícil conceber a prática
filosófica no ensino médio na relação entre
mestre e discípulo, professor e aluno, adulto e
jovem, diz respeito, segundo Dufour (2005), à
transformação da condição subjetiva que está
se completando. Se pensarmos a prática filosófica que era realizada na Antiguidade, poderíamos definir os sujeitos implicados nessa
prática, os jovens interpelados por Sócrates,
como sujeitos pré-modernos. A prática filosófica daquela época é diversa da praticada
na modernidade. Ela estava em sintonia com
o modo de existência, isto é, com as formas
de vida e os padrões de existência da época.
Da mesma maneira, a prática de ensino em filosofia, ou melhor, a prática filosófica na modernidade, está de acordo com os padrões de
existência fornecidos por suas instituições,
entre elas, a escola. Assim, se as formas de
constituição do sujeito antigo se davam segundo procedimentos de uma ética apoiada
na reflexão sobre si, a constituição do sujeito
moderno se dá por meio da prescrição de códigos, interditos e mecanismos disciplinares.
Isso explicaria o porquê, até então, de
o ensino de filosofia enquanto disciplina não
se apresentar como um problema no Brasil,
visto que desde o seu surgimento, em 1553,
com a fundação do colégio da ordem dos jesuítas, esse ensino tem se caracterizado por
ser um saber disciplinar de caráter livresco,
conteudista, cuja prática de ensino resume-se à repetição do que vem de fora18. Apesar
A repetição constituía-se como um dos principais
instrumentos de aprendizagem preconizados pela Ratio
Studiorum, sendo esta o primeiro plano pedagógico
da Companhia de Jesus, cuja primeira edição data de
1599. “Repetir o ensinado, em todos os cursos da Ratio,
era além de um exercício do raciocínio de fixação; o
repetir a verdade, a vida, estabelecida como o modo
de iniciar a memorização e guarda da verdade cristã. O
aluno nada criava de novidade, ele guardava e repetia,
levando à frente algo que já estava dado” (CORRER,
2006, p. 62). Em relação aos conteúdos “Entre as
delimitações do ensino de Filosofia no primeiro ano,
os estudos das autoridades de Aristóteles e Santo
Tomás e os compêndios Conimbricenses, poder-se-ia
estabelecer, basicamente, os conteúdos das regras
propostas” (Ibid, p. 71).
18
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disso, esse tipo de prática estava de acordo
com a cultura da época, uma vez que os jovens identificavam-se com os referenciais
fornecidos por essas instituições, isto é, as
escolas da Companhia de Jesus. Porém, o que
tem acontecido e o que tem sido feito desde
o momento em que os jovens começaram a
perder essas referências?
Para Dufour, “educação é sempre o
que foi institucionalmente instalado ao tipo
de submissão a ser induzida para produzir
sujeitos”19. Nesse sentido, sobre o mecanismo por meio do qual a escola submete e produz esses sujeitos, Foucault afirma que “[...]
o controle minucioso de operações do corpo,
que realizam a sujeição constante de suas
forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as
‘disciplinas’”20. A “[...] disciplina fabrica assim
corpos ‘dóceis’ [...] [aumentando] as forças
do corpo (em termos econômicos de utilidade) e [diminuindo] essas mesmas forças (em
termos políticos de obediência)”21.
Assim, as constantes reclamações dos
professores sobre a indisciplina dos alunos estariam relacionadas à crise dessas instituições.
A atual dificuldade da prática de ensino, não
só em filosofia, mas em geral, deve-se ao fato
de que a escola já não é mais a única instância
da sociedade que opera na produção de subjetividades22. Desse modo, a prática de ensino na
escola tem funcionado segundo a lógica disciplinar dos padrões de experiência que ela tem
fornecido. A partir do momento em que os sujeitos dessa educação passam a ter seu padrão
de experiência formado por outras instâncias,
por exemplo, a televisão e, mais recentemente, a Internet, há um choque com o padrão
disciplinar da instituição escolar, gerando os
problemas relacionados à indisciplina.
Ao diagnosticar essa crise, Dufour a
caracteriza como processo de dessimbolização, perda de referência e desaparecimento
das grandes narrativas ou grandes sujeitos
21
22
19
20
DUFOUR, 2005, p. 39.
FOUCAULT, 1977, p. 126.
Ibid, loc. cit.
VEIGA-NETO, 2008, p. 147.
(grande Outro). Esse desaparecimento ou
apagamento da figura do grande Outro tem
implicado no enfraquecimento da autoridade do professor enquanto o outro da relação
professor-aluno. Ao se perguntar sobre “que
Outros ou que figuras do Outro o homem
construiu a fim de a elas se submeter para se
apresentar como sujeito desses Outros?”23,
Dufour responde que
Se o ‘sujeito’ é o subjectus, o que é
submetido, então poderíamos dizer
que a história aparece como uma seqüência de assujeitamentos a grandes figuras instaladas no centro de
configurações simbólicas cuja lista
podemos bastante facilmente fazer: o sujeito foi submetido às forças da Physis no mundo grego, ao
Cosmos ou aos Espíritos em outros
mundos, ao Deus nos monoteísmos, ao Rei na monarquia, ao Povo
na República, à Raça no nazismo e
algumas outras ideologias raciais, à
Nação nos nacionalismos, ao Proletariado no comunismo24.
Segundo reflexão de Dufour (2005), se
até o presente momento a produção de subjetividades tem sido marcada pela submissão
ao ser, ao Um, ao grande Sujeito, agora passamos a viver sob uma nova disposição, a de um
sujeito instado a fazer-se a si mesmo. Para o
filósofo, a pós-modernidade representa o declínio do grande sujeito, e o novo sujeito não
está mais sujeito ao grande Sujeito, mas é sujeito dele mesmo. Sendo que ele já não é mais
hetero-referente, mas autorreferente, o que
fazemos ou temos feito de nós mesmos a partir do momento em que nos é dada a tarefa
de nos autofundarmos? Para Dufour (2005),
tal empreitada, se não impossível, é de difícil
realização, visto que exige de cada indivíduo
um imenso esforço de autoformação.
DUFOUR, 2005, p. 38.
Ibid, p. 39.
23
24
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Desse modo, se o sujeito é instado a fazer-se a si mesmo, então qual é o lugar do professor na prática de ensino e aprendizagem,
enquanto o “outro” da relação pedagógica
professor-saber-aluno? Se, a partir de agora,
a cada um é dada a tarefa de se autofundar/
formar, o que faz o professor quando seu papel, historicamente, tem sido formar sujeitos a
partir dos grandes referenciais da humanidade
(aquilo que chamamos de “herança cultural”)?
Nesse contexto, a própria lógica do “ensinar”
parece perder sentido, afinal, diante disso, “o
que faz o filósofo quando o seu ofício é ser professor de filosofia”25 no ensino médio? Em função das limitações da escola, enquanto instituição moderna, dadas também as dificuldades
do contexto apresentado por Dufour (2005),
em que sentido é possível trabalhar com a disciplina de filosofia na escola?
Por uma outra experiência
formativa: a prática de ensino
em filosofia como prática
estética do cuidado de si
A esse respeito, recorro ao pensamento
de Foucault, que passa a entender a questão
da subjetivação não mais como processo de
assujeitamento e/ou adequação do pensamento aos significantes representacionais de
determinada tradição – não mais como sujeição ao grande sujeito –, mas como processo
de produção de novos modos de existência
a partir de uma ética e de uma prática filosófica imanente, e não transcendente. Esse
processo de produção refere-se a “práticas
refletidas e voluntárias através das quais os
homens não somente fixam regras de conduta, como também procuram se transformar,
modificar-se em seu ser singular e fazer dessa
vida uma obra que seja portadora de certos
valores estéticos e responda a certos critérios
de estilo”26. Portanto, conforme Foucault,
[...] [a] constituição de si mesmo
enquanto ‘sujeito moral’, na qual o
indivíduo circunscreve a parte dele
GELAMO, 2009.
26
FOUCAULT, 2007, p. 15.
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mesmo que constitui o objeto dessa prática moral, define sua posição
em relação ao preceito que respeita,
estabelece para si um certo modo
de ser que valerá como realização
moral dele mesmo; e, para tal, age
sobre si mesmo, procura conhecer-se, controla-se, põe-se à prova,
aperfeiçoa-se, transforma-se27.
Desse modo, a prática docente passa a
ser entendida como uma operação artística a
partir do momento em que não há mais sujeito, mas produção de subjetividade, visto que
o pensamento não se dá mais por adequação,
mas experimentação, isto é, “pensar é sempre experimentar, não interpretar, mas experimentar, e a experimentação é sempre o
atual, o nascente, o novo, o que está em vias
de se fazer”28. Assim, mesmo que a prática docente em filosofia esteja condicionada a uma
escola nos moldes da tradição moderna, Foucault nos oferece a possibilidade “de avaliar
até que ponto é possível entrever um novo
campo de invenções que permita fazer ver,
hoje, margens, em que o sujeito se constitua
como sujeito ético de ação, pela experimentação no pensamento”29.
Se Dufour (2005) vê dificuldades em conceber a possibilidade de o sujeito constituir-se
a si mesmo a partir de uma operação artística, Foucault, ao contrário, ao fazer o resgate
histórico da prática socrática do cuidado de
si, pretende desnaturalizar essa relação (pedagógica) de sujeição a um grande sujeito.
Nesse resgate, ele mostra que a relação mestre-discípulo, na antiguidade, não se dava em
uma relação de sujeição do discípulo ao mestre e àquilo que este tinha a transmitir àquele.
Nesse sentido, a relação com o outro na relação pedagógica não é de sujeição, o outro
como aquele que domina, mas como aquele
que cuida. Assim, o mestre é aquele que cuida
de si e do outro, o discípulo, e vice-versa. Com
esse resgate, não se pretende fazer valer um
Ibid, p. 28.
DELEUZE, 2000, p. 132.
29
PORTOCARRERO, s.d., p.55.
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tipo de prática corrente há muito tempo, visto que vivemos em outro contexto histórico;
tampouco, pretende-se idealizar uma prática,
dizer como deveria ser o ensino de filosofia.
O que se pretende é pensar as possibilidades
de o ensino de filosofia constituir-se de outras maneiras, visto que, dadas as limitações
contextuais apresentadas anteriormente, o
ensino de filosofia (e de outras disciplinas)
tem encontrado dificuldades em continuar
funcionando segundo a “lógica do ensino” e
da transmissão/sujeição.
Para Dufour, essa lógica de subjetivação,
a qual chama de pós-moderna, é impossível
de ser realizada. Por isso, o autor pergunta,
“como se apoiar no que não é ainda (si mesmo) para dar início à ação em cujo final se
deve se produzir como si? [E responde que...]
não se pode se apoiar em si para se tornar si,
muito simplesmente porque o primeiro apoio
falta”30. Ou seja, não se pode sair de uma relação de sujeição sem antes ter sido sujeitado.
Não há um estado de liberdade absoluto, visto
que esse estado só passa a existir em relação a
um outro, de não ou menor liberdade. Dufour
(2005) parece não conceber a relação entre o
eu e o outro que não de sujeição, a qual, para
ele, é necessária em um primeiro momento de
nossa vida. Dessa maneira, não há como o sujeito pós-moderno formar-se a partir de uma
prática de si, visto que lhe falta esse apoio primeiro que é o outro. Mas a relação de mestria
implica, necessariamente, uma relação de sujeição? Segundo Foucault, a prática da formação ética do cuidado de si não exclui o outro
da relação, visto que o eu não forma a si por si
mesmo, mas sempre em relação a um outro.
Assim, “um princípio geralmente admitido é o
de que não se pode ocupar-se de si sem a ajuda
de um outro. Sêneca dizia que ninguém nunca
é tão forte para sair, por si mesmo, do estado
de stultitia em que está: ‘é preciso estender-lhe
a mão e puxá-lo’”31.
DUFOUR, 2005, p. 95.
FOUCAULT, 1997, p. 125.
Portanto, o contexto histórico de crise e
de transição de uma sociedade disciplinar moderna, de referências sólidas e produtora do
sujeito dócil, para uma sociedade de controle
pós-moderna, de referências líquidas, efêmeras e transitórias, que produz o sujeito flexível, impossibilita que o ensino de filosofia se
constitua como experiência filosófica desde
uma perspectiva formativa estritamente moderna. Desse modo, é preciso pensar alternativas para que esse ensino venha a funcionar
e acontecer de outras maneiras.
Considerações finais
Se diante desse contexto entendermos
a crise de modo positivo, como um “momento de decisão cujo objetivo é a execução de
uma mudança súbita no curso de um acontecimento, de uma ação”32, talvez seja hora de
(re)pensarmos essas práticas. É nessa visão
de mundo moderno, em que os saberes escolares se cristalizam em um currículo organizado de maneira estanque, no qual as práticas de ensino reproduzem mecanicamente
as informações acerca de uma determinada
disciplina, fazendo do ensinar e do aprender
objetos de uma ciência técnica que valoriza
o memorizar em detrimento do pensar, que
tornam impossível o filosofar em sala de aula.
A prática educativa referenciada nessa
visão de mundo instaura um tipo de subjetividade que, sendo imposta pela tradição, sujeita o aluno ao conhecimento do que está dado
e valorizado pelo currículo escolar. Essa prática não possibilita o experimentar e o pensar
por parte do aluno, mas apenas o memorizar
por intermédio da adequação do seu pensamento àquilo que é dado e convencionado
como necessariamente verdadeiro e independente de sua experiência.
Dadas as impossibilidades desse tipo de
prática de ensino constituir-se como experiência filosófica, faz-se necessário pensar outras
possibilidades de concebê-la. Assim, a partir
dos estudos de Foucault, é possível pensar a
prática docente em filosofia como obra de arte,
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VEIGA-NETO, 2008, p. 143.
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voltada para um processo de subjetivação em
que tanto o aluno como o professor trabalhe
e pense sobre si mesmo por meio de técnicas
de si33, configurando, assim, um processo de
produção de novos modos de existência. Por-
tanto, a subjetivação em Foucault, ao contrário da tradição que o antecede, não representa
um retorno ao sujeito, mas a busca prática de
um novo estilo de vida ou, como diz Deleuze34,
de outro modo de vida e, por conseguinte, de
outro modo de fazer filosofia.
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“O cuidado de si se coloca mais especialmente nas
técnicas de si e nas diversas formas como essas
técnicas vão produzindo uma atualidade da ética.
Ética do presente” (EIZIRIK, 2005, p.120). Essas
técnicas relacionam-se a atividades, tais como: o
exame de consciência, a leitura, a escrita, a meditação,
o cuidado com o corpo, o dizer, a verdade, etc.
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Dados do autor:
Saulo Eduardo Ribeiro
Graduado em Filosofia – Licenciatura Plena (UFSM/RS).
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação pela UFSM - RS.
Recebido: 14-10-2011
Aprovado: 03-02-2012
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