Circulação Extracorpórea - HU-UFMA

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Circulação Extracorpórea
Introdução
Em 06 de maio de 1953, John H. Gibbon, Jr,
MD, da universidade médica de Jefferson Center,
realizou com sucesso a primeira operação de coração
aberto com circulação extracorpórea. O tempo total de
CEC foi de 26 minutos, a paciente era uma mulher de
18 anos na qual foi realizado o fechamento de um
grande defeito do septo. Ela fez uma rápida
recuperação e recebeu alta 13 dias após a cirurgia.
Desde então, houve uma grande evolução nas
técnicas e no equipamento da circulação extracorpórea
tornando-os excepcionalmente seguros. Hoje em dia
praticamente não há riscos associados ao
procedimento adequadamente realizado. Este capítulo
apresenta nossas técnicas básicas para proceder ao
bypass cardiopulmonar o funcionamento e a razão
fundamental da escolha dessas técnicas.
Definição e Funcionamento da CEC
A circulação extracorpórea (CEC) assume a
função do coração e dos pulmões temporariamente
durante a cirurgia, mantendo a circulação do sangue e
do conteúdo de oxigênio do corpo.
Há uma indução de hipotermia no corporal,
um estado no qual o corpo pode ser mantido por até 45
minutos sem perfusão. O sistema consiste numa
máquina coração-pulmão artificial para manter a
perfusão de outros órgãos e tecidos, enquanto o
cirurgião trabalha em um campo cirúrgico sem sangue.
O cirurgião coloca uma cânula no átrio direito, veia
cava ou veia femoral para retirar o sangue do corpo. A
cânula é conectada ao tubo preenchido com solução
cristalóide isotônica. A amostra de sangue que é
retirada do corpo pela cânula é filtrada, resfriada ou
aquecida, oxigenada, e depois retorna para o corpo. A
cânula utilizada para o retorno do sangue oxigenado é
normalmente inserida na aorta ascendente, mas pode
ser inserida na artéria femoral. Administra-se heparina
ao paciente para evitar coagulação e, em seguida,
sulfato de protamina para reverter os efeitos da
heparina. Durante o procedimento, a hipotermia é
mantida, a temperatura corporal é normalmente
mantida a 28 º C a 32 º C (82,4-89,6 º F). O sangue é
resfriado durante a CEC e retornado para o corpo. A
hipotermia retarda a taxa metabólica basal do
organismo, diminuindo a demanda por oxigênio. O
sangue resfriado, em geral, tem uma viscosidade mais
elevada, mas a solução cristalóide utilizada para injetar
o desvio tubulação dilui o sangue.
Componentes da CEC
A CEC é constituída por duas unidades
funcionais principais (Figura 1): o oxigenador, que
remove sangue pouco oxigenado e substituem com
sangue rico em oxigênio e a bomba que impulsiona o
sangue através de uma série de mangueiras. Existem
ainda as cânulas que são introduzidas em uma
variedade de locais, dependendo da cirurgia.
Canulação
CANULAÇÃO ARTERIAL
A cânula arterial normalmente é colocada na
aorta ascendente. A canulação femoral é utilizada para
alguns pacientes que estejam sendo re-operados e
para ressecção de aorta ascendente sempre que a
canulação da aorta não seja possível.
A face superior da aorta nem sempre se
encontra livre sendo necessário realizar a dissecção
em torno do vaso. Alguns acidentes comuns durante a
dissecção são a lesão da aorta ou lesão da artéria
pulmonar direita. Após a dissecção, uma sutura em
bolsa é colocada na aorta ascendente e uma incisão
pequena é feita. A cânula aórtica é, então, introduzida
atraumaticamente na abertura. As extremidades das
suturas em bolsa, que passaram através de um
torniquete longo e estreito de borracha ou plástico são
apertadas. O torniquete é, então, amarado à cânula
aórtica e se desejável, ulteriormente preso à borda da
abertura da pele. A cânula aórtica é enchida
retrogradamente com sangue, sendo, então, conectado
ao tubo arterial.
Abertura do pericárdio e da aorta
CANULAÇÃO VENOSA
A canulação do átrio direito com uma cânula
única de dois estágios é usada para pacientes que se
submeterão a bypass coronarianos e a procedimentos
na válvula aórtica. Ambas as cavas são canuladas nos
pacientes que se submeterão a procedimentos na
válvula mitral e ao reparo da maioria dos defeitos
cardíacos congênitos.
A canulação atrial direita ou a cânula da veia cava
inferior podem ser colocadas através da auriculeta
direita inferior. Esta cânula é introduzida através de
uma sutura em bolsa no apêndice do átrio direito de tal
modo que a ponta se localize na veia cava inferior e os
seus furos laterais no átrio direito. Já procedimentos
que acarretam exposição do interior do coração direito,
como a correção de um defeito do septo atrial, septo
ventricular, transposição dos grandes vasos e outros,
requerem canulação bicaval. Isto é realizado
introduzindo-se cânulas cavais através de suturas em
bolsa na auriculeta direita e, inferiormente, na parede
atrial direita
Introdução da cânula na aorta
Canulação completada
Realização da CEC - Bypass Padrão
A circulação extracorpórea padrão é usada
para todas as cirurgias em adultos e crianças e para
maioria dos lactantes com mais de 10 Kg.
Normalmente consiste de fluxos entre 1,8 e 2,4 l/min/m
de área de superfície corporal, de hipotermia moderada
entre 26 e 30̊C e de hemodiluição moderada com
hematócrito entre 20 e 30.
O PRIMING DO OXIGENADOR E O
PREPARO DO CIRCUITO
Elevação da aorta para pinçamento
Canulação atrial com cânula única
Cânulação bicaval
Nosso oxigenador padrão é de membrana de
fibra oca. O volume e a composição da solução prime
usada para adultos são pré-definidos, havendo
alterações na solução quando há anemia ou
insuficiência renal. O volume e a composição da
solução prime para lactentes e crianças são diferentes..
Nossos tubos de circulação extracorpórea são
feitos de cloreto de polivinil de uso médico. Os tubos
padrões para adultos medem 3/8 de polegada para o
arterial, ½ para o venoso e ¼ para o de aspiração; para
crianças medem 3/8 de polegada tanto para o arterial
quanto para o venoso; e para lactentes, todos medem
¼ de polegada.
O sistema consiste de 5 bombas de rolete:
uma para a linha arterial,outra para a linha de
cardioplegia, a terceira para ventilação e duas linhas de
aspiração. O oxigenador é retirado de seu pacote
estéril e colocado sobre um suporte com a entrada
venosa aproximadamente 18 polegadas abaixo do
coração, de modo a otimizar a drenagem venosa. Os
tubos são conectados ao oxigenador e às entradas das
bombas. A entrada da bomba arterial é ajustada de
modo a evitar trauma às hemácias e à hemólise. Um
circuito não oclusivo é obtido bombeando-se a solução
prime pela linha arterial até uma altura de 12 polegadas
acima da entrada da bomba, que é então ajustada para
permitir uma queda de fluido de uma polegada por
minuto.
O circuito é lavado com dióxido de carbono a
100% antes da solução prime ser adicionada. Circulase então essa solução pelo circuito enquanto o ar é
removido do filtro e das linhas arteriais. A solução
prime é circulada por 3 ou 4 minutos para garantir sua
oxigenação e aquecimento. Ela é aquecida a 30-34̊ C
nesse momento. A infusão de solução hipotérmica no
início do bypass pode causar dilatação cardíaca ou
fibrilação.
Um reservatório de cardiotomia é usado para
a coleta do sangue que retorna do pericárdio. Esse
sangue é filtrado através de um filtro de microporos de
15 micra. A filtração do retorno do aspirador da
cardiotomia é importante na remoção de pequenas
partículas.
Uso de Heparina e de Protamina
A dose inicial de heparina é de 300Ul/Kg. A
dose deve ser exposta claramente e estar à vista de
toda equipe cirúrgica na sala. O cirurgião injeta a
heparina diretamente dentro do átrio direito ou o
anestesiologista a injeta em um acesso venoso central
antes da canulação. O tempo de coagulação ativado
(TCa) é determinado 5 minutos antes de se iniciar o
bypass. Tempos de coagulação ativados são
determinados em intervalos regulares de 20 minutos
durante a circulação extracorpórea e mais heparina é
administrada para manter o TCa acima de 400
segundos.
A
protamina
é
administrada
pelo
anestesiologista. A dose é 1 a 1,5 vez a dose de
heparina inicialmente administrada. Se mais heparina
for administrada no decorrer do bypass, às vezes mais
protamina é administrada. A protamina pode causar
vasodilatação e hipotensão, que podem ser corrigidas
com volume. Eventualmente, a protamina pode causar
forte reação alérgica, usualmente em pacientes que
tiveram uma exposição prévia, tais como pacientes que
usam insulina que contenha protamina.
Parâmetros de um Bypass adequado
1. FLUXO
O peso e a altura do paciente são usados para
calcular sua área de superfície corporal. Os fluxos das
bombas estão normalmente entre 1,5 l/min/m2 (fluxo
baixo) e 2,5 l/min/m2 (fluxo alto). As taxas de fluxo em
crianças frequentemente são aumentadas para 3,5
l/min/m2 durante a normotermia, uma vez que crianças
têm uma taxa metabólica mais alta . O fluxo não
pulsátil. Um fluxo alto normalmente é mantido durante
a normotermia e com o esfriamento e o reaquecimento.
O fluxo baixo é satisfatório durante a hipotermia, uma
vez que o consumo metabólico de oxigênio a 30̊C é
metade daquele a 37̊C. O fluxo baixo também diminui o
fluxo brônquico e o fluxo colateral não coronariano, e
deste modo pode facilitar as cirurgias.
A determinação da perfusão satisfatória
requer a avaliação da pressão arterial, da gasometria
arterial, do equilíbrio ácido-básico, da Po2 do sangue
venoso ou da saturação de oxigênio, da resistência
vascular sistêmica e do débito urinário. A monitorização
da tensão de oxigênio do sangue venoso também pode
ser útil. A pressão arterial média usualmente é mantida
entre 50 e 80 mmHg. A hipertensão normalmente é
tratada com nitroprussiato de sódio e a hipotensão,
com neossinefrina. A perfusão satisfatória é possível
com pressão arterial média, que é mais baixa que o
normal. A auto-regulação cerebral mantém um fluxo
adequado ao cérebro na presença de fluxo e pressão
bastante variáveis, mesmo em pacientes com doença
cérebro-vascular. Nós geralmente mantemos a pressão
arterial normal ou levemente elevada naqueles
pacientes que sabidamente têm doença renal ou
cerebrovascular.
2. GASOMETRIA ARTERIAL E EQUILÍBRIO
ÁCIDO-BÁSICO
Para equilíbrio ácido-básicos durante o bypass
cardiopulmonar, o pH é mantido em 7,4 e a pCO2 em
40 mmHg quando medida a 37̊C. Com níveis mais
profundos de hipotermia, o meio torna-se mais alcalino.
A
gasometria
arterial
é
medida
aproximadamente 15 minutos após o início do bypass.
Nós utilizamos um monitor de gasometria na própria
linha arterial. Esse monitor é checado com a
gasometria arterial inicial para determinar sua
correlação. Gasometrias arteriais são então medidas a
cada hora ou mais se necessário. O oxigenador de
membrana é ventilado com O2 a 100% e ar
comprimido, os quais passam por um misturador de
modo que a pO2 e a p CO2 do paciente possam ser
controladas independentemente. Nós mantemos a Po2
entre 100 e 200 mmHg e a p CO2 entre 35 e 40 mmHg
durante todo o tempo de bypass . Qualquer queda
importante no pH do paciente é ajustada com NaHCO3
ou por um aumento no fluxo de perfusão, uma vez que
acidose metabólica é um sinal de perfusão deficiente.
3. HEMATÓCRITO
O hematócrito é medido ao mesmo tempo que
a gasometria arterial. Acrescenta-se sangue ao circuito,
se o hematócrito cair abaixo de 20. A adião de
cristalóides ao circuito deve ser monitorizada de modo
a evitar uma hemodiluição severa. Qualquer queda
acentuada do hematócrito deve levantar uma suspeita
de perda sanguínea tal como em uma incisão do
membro inferior ou nas cavidades pleurais.
4. POTÁSSIO
O potássio sérico é medido ao mesmo tempo
que a gasometria arterial e o hematócrito. O potássio
tem de ser acrescentado ao circuito com freqüência
para manutenção de um nível sérico normal. Não é
incomum que se adicione 20 mEq à solução prime e
que se administre 40 mEq ou mais durante um tempo
de circulação extracorpórea padrão em um adulto.
Aumentos do potássio sérico normalmente podem ser
controlados com diuréticos.
5. DÉBITO URINÁRIO
O débito urinário reflete bem a perfusão
sistêmica e durante o bypass equivalente a 3ml/Kg/h
ou mais. Se cair para menos de 1 ml/Kg/h, a taxa de
fluxo ou a pressão arterial devem ser aumentadas. Se
isto não resultar em uma melhora do débito urinário,
furosemida, manitol ou dopamina em dose renal (2-3
µg/Kg/min) devem ser administrados.
Término do Bypass
Ao se terminar o procedimento operatório
aberto, tomam-se os passos necessários para remover
o ar da aorta e das câmaras cardíacas. O ar é
removido da aorta com uma seringa a medida que o
clampe é retirado. Essa agulha pode ser conectada à
sucção. O ar é removido do ventrículo esquerdo
através de uma agulha no ápice. O coração é
desfibrilado, se necessário, embora isso raramente
seja preciso com os atuais métodos de cardioplegia.
Uma corrente de 10 joules normalmente é suficiente
para a desfribilização. Deve-se evitar correntes altas,
exceto se absolutamente necessárias, uma vez que
podem lesar o miocárdio. A temperatura sistêmica é
verificada para confirmar se o reaquecimento está
completo. A ventilação dos pulmões é iniciada.
O bypass é descontinuado gradativamente por
meio do retardo progressivo da drenagem venosa
pelo perfusionista ou pelo cirurgião. Se as cânulas das
cavas são grandes, podem ser deslizadas para dentro
do átrio para evitar a obstrução da cava. Os fluxos do
bypass são alentecidos à medida que o coração se
enche e a pressão sistêmica sobe. A função cardíaca é
determinada medindo-se a pressão encunhada e o
débito cardíaco por termodiluição. Se mais
severamente comprometida, deve ser tratada
farmacológica ou mecanicamente.
Após a interrupção do bypass , a cânula atrial ou a
cânula das cavas são removidas. O sulfato de
protamina é administrado. O sangue do oxigenador é
infundido através da cânula arterial, a qual é removido
no final da administração da protamina. Depois que a
protamina. Depois que a protamina é administrada, o
tempo de coagulação ativado é determinado para se
confirmar a reversão do efeito da heparina. Se o TCa
não tiver voltado ao normal e se o sangramento
continuar pode-se administrar mais protamina.
Bypass Cardiopulmonar em Crianças e
Lactentes
A técnica de hipotermia profunda e da parada
circulatória foi primeiramente relatada em 1967 e
subsequentemente popularizada por Brrett-Boyes e
outros. Ela representou um grande avanço no
tratamento cirúrgico de cardiopatias congênitas. Essa
técnica resultou em melhores resultados em lactentes
quando comparada ao bypass cardiopulmonar padrão
com hipotermia moderada. A hipotermia profunda e a
parada circulatória tornaram-se amplamente difundidas
na década de 70.
Contudo começaram a aparecer relatos que
documentavam seqüelas neurológicas com o uso
dessas técnicas, inclusive convulsões no pósoperatório e coreoatetose. Além disso, estudos em
animais documentaram a lesão neurológica que
poderia ocorrer. Por esses motivos, no início dos anos
80, nós adotamos o uso de hipotermia profunda (18̊C)
e fluxos muito baixos (0,25-0,5 l/min/ m2) para quase
todos os neonatos. Nós utilizamos a parada circulatória
apenas por curtos períodos de tempo ̊necessário. A
maior parte das correções de cardiopatias congênitas
pode ser realizada sem o uso de qualquer tempo de
parada circulatória.
A solução prime para lactentes é compostA tal
modo que o hematócrito seja cerca de 24 a 28% . É
circulado e oxigenado, e a gasometria arterial é
verificada para assegurar um equilíbrio ácido-básico
correto. Em muitas crianças com peso superior a 12
Kg, a cirurgia pode ser feita sem o uso de sangue
adicional. Se este não for adicionado ao prime ,
adicionam-se 20 mEq de NaHCO3 á solução.
O resfriamento da superfície corpórea não é
utilizado. A temperatura nasofaringiana e retal é
monitorizada. O resfriamento na circulação
extracorpórea é obtido com fluxos de cerca de
2,4l/min/m2 usando um oxigenador de membrana de
fibra oca. O paciente é resfriado a uma temperatura
nasofaringiana de 18 a 20̊C (Sacramento) ou a 1 a 1,2
l/ min/m2 (Portland).
Estudos experimentais mostram que esses
baixos fluxos perfundem todas as áreas do cérebro
adequadamente em temperaturas profundamente
baixas. O reaquecimento é iniciado no final da correção
cirúrgica e completado depois que o clampe aórtico é
solto, aumentando o fluxo para 2,4 l/min/m2. Ao final do
procedimento, a remoção de ar é completada e o
desmame do bypass é feito como previamente
descrito.
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