Mitigação e Adaptação aos Efeitos Adversos das Mudanças Climáticas - Estado da Arte da Discussão Internacional O amplo consenso entre os cientistas do clima de que as temperaturas globais continuarão a aumentar tem levado nações, estados, empresas e cidadãos a implementar ações para tentar reduzir o aquecimento global ou ajustar-se a ele. Os permanentes estudos e o grande número de ações civis poderão um dia resultar em uma mudança cultural e meios economicamente viáveis de enfrentar de forma eficaz ações antrópicas que emitem gases-estufa. Muitos grupos ambientais encorajam ações individuais contra o aquecimento global, frequentemente por parte dos consumidores, mas também através de organizações comunitárias e regionais. Outros têm proposto o estabelecimento de um limite máximo para a produção de combustíveis fósseis, com base na relação direta entre a produção de combustíveis fósseis e as emissões de CO2. Também têm sido feito esforços no aumento da eficiência energética e uso de fontes alternativas. Uma importante inovação tem sido o desenvolvimento de um comércio de emissões dos gases do efeito estufa através do qual empresas, em conjunto com os governos, concordam em limitar suas emissões ou comprar créditos daqueles que emitiram menos do que as suas quotas. O aumento das descobertas científicas sobre o aquecimento global tem resultado em intermináveis debates políticos e econômicos sobre os benefícios em limitar as emissões industriais de gases do efeito estufa para reduzir os impactos no clima versus os efeitos que isso causaria na atividade econômica. Há também discussões em diversos países sobre o custo de adotar fontes de energia alternativas e mais limpas para reduzir as emissões. Embora a polêmica ainda persista, já foi ultrapassada pelos estudos recentes mais qualificados, os quais deixaram claro que a mudança para um modelo sustentável não é mais uma questão de escolha, é questão de sobrevivência. Além disso, é mais lucrativa no longo prazo do que a persistência no modelo atual, coisa que também não parece ter sido ainda bem compreendida pelos legisladores, políticos e grandes empresários. Outro problema levantado diz respeito aos efeitos da mitigação do aquecimento global serem tão nefastos para algumas populações indígenas como o próprio aquecimento global. Segundo algumas organizações de defesa de direitos indígenas, como a Survival International e a Amazon Watch, estas populações, que são já as mais afetadas pelas consequências dos efeitos do aquecimento global, enfrentam efeitos devastadores face a programas classificados como "verdes" como a indústria hidroeléctrica e os biocombustíveis. O principal acordo mundial para combater o aquecimento global é o Protocolo de Quioto, uma emenda à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, negociado em 1997. O protocolo abrange mais de 160 países e mais de 55% das emissões de gases do efeito estufa. Este tratado expirou em 2012, e debates internacionais iniciaram-se em maio de 2007 sobre um novo tratado para suceder ao vigente. Regiões pobres, em particular a África, têm grandes chances de sofrerem a maior parte dos efeitos do aquecimento global, enquanto suas emissões são desprezíveis em relação às emissões dos países desenvolvidos, fazendo-as pagar injustamente por problemas que não provocaram, uma vez que os impactos do aquecimento ignoram fronteiras políticas e se abatem sobre todos. Ao mesmo tempo, o debate passa também pela questão de saber em que medida é que países recém-industrializados, como China e Índia, deverão ter o privilégio de poder aumentar suas emissões industriais, especialmente a China, a fim de que seu crescimento não seja prejudicado. O líder chinês Wen Jiabao exortou a nação a redobrar os seus esforços no combate à poluição e ao aquecimento global. Isenções de países em desenvolvimento de algumas cláusulas do Protocolo de Quioto têm sido criticadas pelos Estados Unidos e estão sendo usadas como sua justificativa para não ratificar o protocolo. Apenas os Estados Unidos, historicamente o maior emissor de gases estufa do mundo, e o Cazaquistão, recusaram-se a ratificar o tratado. A China e a Índia, dois outros grandes emissores, ratificaram o tratado, mas como países em desenvolvimento, estão isentos de algumas cláusulas. No ocidente, a ideia da influência humana no clima e os esforços para combatê-lo ganharam maior aceitação na Europa que nos Estados Unidos. A União Europeia pretende, até 2050, reduzir entre 60% e 80% as emissões de gases estufa, aumentar em 30% a eficiência energética, e aumentar para 60% a percentagem de energias renováveis, face ao consumo energético total da UE. O IPCC oferece em seus relatórios uma multiplicidade de alternativas para o combate e adaptação ao aquecimento global, sumarizadas abaixo: Melhorar o rendimento dos sistemas de captação, distribuição e consumo de água, incluindo uso agropecuário, industrial e doméstico. Melhorar as técnicas de manejo da terra, incluindo a pecuária, a agricultura, a silvicultura e o extrativismo, protegendo o solo contra a erosão, degradação e poluição. Definir planos de contenção da subida do mar como fixação de dunas, reflorestamento costeiro, construção de represas e outras estruturas. Modificar hábitos de produção e consumo de bens e serviços e de descarte de resíduos para um modelo sustentável. Aumentar os incentivos financeiros para projetos de crescimento sustentável. Dar educação qualificada para a população, incluindo, decisivamente, a educação ambiental, fomentando a formação de lideranças multiplicadoras. Redesenhar as políticas públicas com maior atenção aos fatos científicos e às necessidades reais, prevendo ações integradas em perspectivas de longo prazo. Incrementar a cooperação internacional, a pesquisa e a divulgação livre do conhecimento. Criar uma política transnacional efetiva sobre o aquecimento. Aproveitar conhecimentos de comunidades indígenas e tradicionais. Organizar o manejo do provável crescimento de doenças infecciosas e epidemias; melhorar o atendimento médico e as infraestruturas sanitárias urbanas. Organizar planos de assistência social e defesa civil em emergências coletivas e desastres ambientais. Diversificar o turismo. Adaptar os sistemas de transporte a temperaturas mais elevadas e à possibilidade de inundações mais frequentes. Reforçar as infraestruturas de produção e distribuição de energia e de telecomunicações, usar preferencialmente energias renováveis e diversificadas. O IPCC recomenda que o consumo e a lucratividade dos combustíveis fósseis como o carvão mineral e o petróleo sejam positivamente desestimulados pelos criadores das políticas. Entre as várias alternativas que estão sendo buscadas, o último relatório publicado na íntegra (2007) desencorajou o uso da energia nuclear, devido aos seus altos riscos e a efeitos negativos potencialmente catastróficos em casos de acidentes. Os biocombustíveis, em geral considerados melhores opções para os fósseis, devem ser avaliados com mais cuidado, pois podem ter efeitos colaterais indesejáveis, podendo provocar, por exemplo, a elevação nos preços dos alimentos por induzir a uma redução nos investimentos e na área de produção agrícola alimentar. As evidências disponíveis indicam que os biocombustíveis são opções fracas e incertas na melhoria da qualidade de vida das populações, embora alguns sejam muito econômicos no que diz respeito a emissões de gases. O etanol, que dá uma redução de 8 para 1, é a melhor opção até agora em termos de emissões, mas, por exemplo, se todo o combustível brasileiro em 2007 fosse etanol, metade da área agricultável do país teria de ser convertida ao cultivo da cana, de onde se extrai o etanol. O IPCC indica que no Brasil o etanol gerou muita renda e emprego, mas não corrigiu as desigualdades estruturais no setor. O biodiesel, por sua vez, é pouco vantajoso para a redução das emissões, com uma redução máxima de 3 para 1. Globalmente, os biocombustíveis têm gerado crescente incerteza para o setor da segurança alimentar num cenário de população em crescimento rápido, e têm mostrado significativa capacidade de induzir conflitos sociais e produzir danos diretos e indiretos à biodiversidade e outros recursos naturais como a água. As opções mais promissoras atualmente no setor energético são os projetos de aproveitamento da energia do sol, do vento e da água. Também pode ser uma boa opção, em algumas regiões, a energia geotérmica. A atenção principal das nações tem sido dada ao setor energético, mas a mitigação e a adaptação abrangem a totalidade da sociedade, especialmente setores que são grandes emissores de gases, como o mau uso da terra, a indústria, a agricultura, o desperdício de alimentos, os transportes, a construção civil e a urbanização das cidades, além dos hábitos culturais e modos de vida em si que produzem ou sustentam um modelo insustentável de desenvolvimento. Os outros aspectos devem ser igualmente valorizados, pois geram causas de aquecimento igualmente influentes, e as questões éticas são tão importantes quanto as outras. A migração compulsória da economia para um modelo sustentável, se pode trazer alguns problemas imediatos de adaptação, abre muitos outros campos para investimento que tendem a gerar lucro, emprego e melhor qualidade de vida. O fenômeno da urbanização acelerada da população humana deve receber grande atenção, pois as cidades usam de 67 a 76% da energia disponível e nelas são gerados de 71 a 76% das emissões de CO2 relacionadas à energia. Além disso, há uma previsão de que, em meados de 2050, de 64 a 69% da população mundial deve viver em cidades, zonas especialmente vulneráveis aos efeitos do aquecimento global. Muitos dos sistemas mais vitais das cidades, como o abastecimento de energia, alimentos e água, as redes de esgoto e transporte, assistência médica, segurança pública e comunicações, facilmente podem entrar em colapso diante de catástrofes naturais como os tufões e inundações, deixando imensas populações ao desamparo em um único evento. Estudos recentes têm enfatizado uma elevação desproporcional na vulnerabilidade das populações urbanas diante de eventos climáticos intensificados pelo aquecimento, pois o aumento populacional (exposição) aumenta o risco mesmo em eventos normais; dessa forma, o aumento da exposição combinado ao aumento na intensidade multiplica os efeitos. Além disso, o colapso de sistemas urbanos durante catástrofes climáticas gera falhas sistêmicas em cadeia que afetam toda uma grande região suburbana e rural em torno, podendo afetar ainda regiões muito distantes. Assim como as cidades são grandes receptoras e consumidoras de bens e serviços, são grandes produtoras e distribuidoras. O modelo de urbanismo em geral adotado nas grandes cidades não está preparado para enfrentar as mudanças climáticas com sucesso e deve ser adaptado rapidamente. Grande parte da população mundial vive em cidades e zonas litorâneas, e ali as medidas de adaptação devem levar em conta com grande cuidado e realismo a questão da elevação do nível dos oceanos. Mesmo os países ricos, embora em geral mais bem preparados para a adaptação litorânea, também têm muitas áreas importantes de alto risco. Em certas regiões as populações litorâneas devem considerar prioritariamente a retirada, e não o combate ao avanço das águas, por ser a opção mais viável no longo prazo. Uma retirada bem sucedida exige muito tempo para planejamento e execução. Os modelos mais otimistas preveem uma elevação inevitável de pelo menos 40 cm no nível do mar até 2100. Os modelos mais pessimistas preveem até 7 metros ou mais, e embora pouco prováveis, não estão descartados. Mesmo o cenário mais otimista vai exigir inevitavelmente muitas ações de adaptação. Algumas regiões do mundo enfrentarão o problema intensificado: as ilhas baixas e as regiões que estão naturalmente afundando, como o sul das ilhas Britânicas e parte da costa leste dos Estados Unidos e Canadá. O IPCC, no seu 5º Relatório, a ser publicado na íntegra até o final de 2014, enfatizou que as metas de redução das emissões não vão ser atingidas se cada região ou país pensar em resolver o seu problema isoladamente e o esforço global for descoordenado. O fenômeno tem implicações globais e suas causas produzem efeitos além das fronteiras políticas dentro das quais elas se originaram. Ao mesmo tempo, o relatório apontou que as medidas de mitigação e adaptação têm se revelado ineficientes em comunidades e nações com problemas crônicos de governança. Políticas climáticas mal informadas, descoordenadas ou realizadas com dados maquiados e atenuados artificialmente podem produzir efeitos colaterais imprevistos tão indesejáveis quanto os que a inação produziria. Também afirmou que as metas estabelecidas em Cancún sobre os níveis de emissão de gases em 2020 estão desatualizadas, devendo produzir provavelmente um cenário de 3ºC de elevação na temperatura, e devem ser revistas com urgência. A Conferência do Clima de 2013 das Nações Unidas, realizada com grande tumulto em Varsóvia (COP 19), fez alguns avanços, conseguindo chegar a um acordo formal sobre o programa REED+, depois de muitos anos de debates. O programa prevê incentivos econômicos e outras medidas para a redução de emissões. Já estava em aplicação experimental desde anos, e se espera que agora sejam estabelecidas políticas locais mais eficientes. O documento produzido deu ênfase às medidas de prevenção do aquecimento e aos países pobres, os mais afetados e os menos capazes de lidar com o problema, e contemplou também, entre outras, ações nas áreas de financiamento, envolvimento institucional, monitoramento de florestas, agilização administrativa, padronização de procedimentos técnicos e manejo de impactos. O Observatório do Clima considerou o texto bastante tímido na maioria das áreas, frustrante em muitas outras, mas destacou como positiva a definição dos parâmetros do REED+. Muitos ecologistas, porém, viram-no como o acordo ambiental mais fraco da história, provocando vários retrocessos, como a revogação da obrigatoriedade no cumprimento das metas, que passam a ser contribuições voluntárias, e criando para as políticas de mitigação uma indesejável dependência do sistema de financiamento, o chamado Fundo Verde do Clima, o qual, por sua vez, ainda não tem mecanismos reguladores em funcionamento. Também já se torna cada vez mais claro que a humanidade terá em breve de encontrar formas de controlar seu crescimento populacional. Os recursos do mundo são limitados, e um aumento infinito da população é obviamente impossível. O aquecimento e todos os outros problemas ambientais de hoje em última análise se devem, de fato, à explosão demográfica e ao acelerado consumo de recursos naturais que ela desencadeou, cujos efeitos de longo alcance modificaram todo o equilíbrio da biosfera. Porém, o tema do controle populacional é espinhoso e não se prevê solução fácil, cercado como é de controvérsias éticas e científicas, e entretecido a tradições culturais, sociais e religiosas arraigadas. Reforçando esse cenário, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento publicou em 2013 seu Relatório de Desenvolvimento Humano prevendo cerca de 3 bilhões de pessoas vivendo na pobreza extrema em 2050 em função do aquecimento global não mitigado e outros problemas ambientais, um terço da população mundial estimada para aquela data. O último relatório do IPCC (2014) e outros documentos recentes vêm deixando bastante clara a importância e a realidade da sua mensagem e seu caráter de urgência, ressaltando que as opções de mitigação e adaptação são maiores do que foram no passado, e muitas delas vêm tendo seus custos de implantação significativamente reduzidos em anos recentes, cabendo aos governos e à sociedade fazer bom uso das oportunidades e dos avanços tecnológicos e científicos que se colocam à disposição. Caso contrário, dificuldades em larga escala seguramente se concretizarão e só tenderão a crescer, com impactos mais prováveis sobre a saúde, a produção de alimentos, o acesso à água e à habitação, a segurança contra desastres naturais e a estabilidade social, política e econômica de todas as nações, impactos que seguramente recairão mais dolorosamente sobre os mais pobres, os menos capazes de manejá-los. Outra conclusão importante foi o reforço do consenso que já se formara antes de que as decisões tomadas nas próximas duas décadas terão efeitos decisivos e de longo prazo, diversos deles potencialmente catastróficos e irreversíveis, sendo então ainda mais recomendadas as medidas preventivas urgentes. Ainda há uma significativa janela de oportunidade para evitar o pior previsto nos modelos matemáticos, mas em algum momento, que não está muito distante, ela vai se fechar. O último relatório do IPCC considerou, em suma, que o mundo agora tem apenas 50% de chance de conseguir manter a elevação da temperatura abaixo dos 2ºC, considerada em consenso como o máximo tolerável. Se a sociedade optar por deixar para a última hora tudo o que precisa ser feito, será tarde demais, pois muito ainda precisa ser feito e o tempo corre contra. O processo de mudança social em tal escala levará necessariamente muitos anos, requererá muito esforço, conhecimento, honestidade e boa vontade, não se justificando mais, portanto, a demora. (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Aquecimento_global)