Ricardo Monteiro A Música Popular Brasileira dos anos JK ao AI-5 Périodo de 1958-1968 O período entre os anos de 1956 e 1961 ficou conhecido, na História do Brasil, como “Os Anos JK”. Tal época teve por particularidade bem mais do que a concomitância com o mandato do presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976). (Ricardo Monteiro) A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 1 A nova bossa da música brasileira mais repertório Contextualização sócio-histórica e estética O período entre os anos de 1956 e 1961 ficou conhecido, na História do Brasil, como “Os Anos JK”. Tal época teve por particularidade bem mais do que a concomitância com o mandato do presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976). Foram, segundo o historiador Boris Fausto, “anos de otimismo, embalados por altos índices de crescimento econômico, pelo sonho realizado da construção de Brasília” (Fausto, 2004, p.422). O projeto de se crescer “50 anos em 5” do desenvolvimentismo de Juscelino levou a indústria nacional a crescer à espantosa taxa de 10% ao ano, embora o comprometimento da dívida pública para que isso viesse a ocorrer também não fosse desprezível. Seresteiro, dono de uma bela voz, pé-de-valsa, galanteador, comprometido com um projeto democrático nacional e com uma visão geopolítica avançada que inspiraria Kennedy a idealizar sua “Aliança para o Progresso”, Juscelino, de certa forma, representava a chegada ao poder do que havia de melhor na boemia intelectual e em seus mais dourados sonhos de construção de um Brasil belo e feliz. O presidente Juscelino Kubitscheck (19021976), que chegou a ter discos gravados como cantor e seresteiro, foi a figura de fundo de uma breve fase áurea da história cultural, econômica e política do país – fase essa na qual floresceu a Bossa-Nova. A expressão “bossa” designava um certo charme, uma maneira pessoal e engenhosa de se fazer as coisas. Juscelino, em sua época, foi apelidado de “Presidente Bossa-Nova”. Mas não só por sua maneira incomum, no Brasil, de se conduzir a coisa pública: com democracia, com competência, com visão administrativa, com um estofo cultural que lhe facultava livre trânsito dentro da elite social, intelectual e artística do país, ao mesmo tempo em que a alma de seresteiro lhe garantia a empatia com as classes populares. Também pelo fato de, durante seu governo, ter surgido, no país, um dos movimentos musicais mais importantes em âmbito mundial do século XX: a Bossa-Nova. A Bossa-Nova representava a expressão de uma geração que não se identificava em absoluto com a profunda tristeza da chamada música de fossa, o samba-canção. Uma geração que, embora também boêmia, contrapunha-se à anterior como o ambiente sombrio dos bares e night-clubs da alta madrugada se contrapunha à fulgurante luminosidade do sol de Ipanema. Pensando, pois, em oposições, samba-canção e Bossa opõem-se como as trevas à luz, como a cultura à natureza; a cultura de um existencialismo sombrio e sem saída, contraposta a uma natureza benfazeja, tropical e praiana, de horizontes amplos, onde o barquinho de Ronaldo Bôscoli (1928-1994) assiste tranqüilamente ao cair da tarde enquanto os pássaros de Tom Jobim (1927-1994) anunciam uma noite que nunca chega mas, se chegar, será estrelada e prenhe de amores. Ao invés da angústia diante de uma vida vazia, uma alegria serena, com uma incansável disponibilidade para a paixão, confiante de que a cada despedida se seguirá de um novo encontro, fazendo da vida uma infindável mas prazerosa dança de dores e amores. 2 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Características musicais mais repertório Musicalmente, a Bossa empreende aquela que foi a maior transformação que um movimento estético imprimiu à linguagem musical em toda a história da música popular brasileira. Tal transformação operou-se de maneira radical na instância harmônica, bastante sensível na instância melódica (até por conseqüência da evolução harmônica) e moderada na instância rítmica – justo nela em que, curiosamente, uma parte considerável e influente da classe intelectual e artística do país vê sua maior contribuição, com a decantada “batida” da Bossa-Nova. A evolução harmônica que teve lugar no tempo da Bossa, é preciso frisar, já pairava nos anos finais da era da fossa. Isso se torna especialmente visível nas introduções e codas instrumentais de certas gravações de samba-canção, notadamente aquelas protagonizadas por Dolores Duran. Assim, a Bossa não representou uma ruptura com relação à maneira anterior de se trabalhar a harmonia na música popular, mas a radicalização de uma de suas tendências. A linha de frente da Bossa-Nova: reunidos na casa de Vinícius, os compositores Tom Jobim (1927-1994), Vinícius de Moraes (1913-1980), Ronaldo Bôscoli (19281994), Roberto Menescal (1937-) e Carlinhos Lyra (1939-). Em poucos movimentos da cultura brasileira, as afinidades intelectuais e converteram-se tanto em relações de duradoura amizade como na BossaNova. Tal constatação problematiza sobremaneira a tese de vários críticos que insistem em afirmar que a complexificação harmônica da Bossa teria sido influenciada pelo estilo jazzístico conhecido como Bebop. Trata-se de uma afirmação muito difícil de ser sustentada, provando-se no mínimo inconsistente ante a uma análise estilística mais detalhada. O Bebop marca o momento na história do jazz em que aquela música deixou de ser dançada por um grande público para ser cuidadosamente escutada por uma platéia seleta e reverente. Capitaneado pelo virtuosismo do saxofonista Charlie Parker (1920-1955) e pelo gênio de Dizzie Gillespie (1917-1993), o Bebop caracterizava-se pelo virtuosismo técnico de seus intérpretes, pelos andamentos rápidos e por certos tipos de sofisticação harmônica, principalmente no que tange ao uso de certos modos ou escalas (como o lídio com sétimo grau rebaixado, ou o jônio com o acréscimo de um segundo quinto grau aumentado etc). Nenhuma dessas características aparece no alvorecer da Bossa-Nova – embora várias delas venham a aparecer a partir de um segundo momento do movimento, em que o mercado internacional se firma e o nacional míngua, diante da ascensão do iê-iê-iê, da música de protesto e de outros estilos majoritários. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 3 Quanto à fase seguinte da história do jazz, o chamado Cool Jazz, o questionamento da influência continua, mas por caminhos bem diferentes. Isso porque, se o pianista Bill Evans de fato influenciou sobremaneira a Bossa com sua linguagem concisa e com sua maior ênfase nos matizes de cinza que no contraste preto-branco, um outro grande nome do movimento, o saxofonista Stan Getz (19271991), foi uma das grandes e inquestionáveis conexões entre a Bossa e o Jazz – todavia, não como alguém que a influencia, mas como alguém que é influenciado por ela e, com seu talento e renome, torna-se uma figura primordial de sua difusão em escala mundial. Assim, se o Cool Jazz influenciou a Bossa, a Bossa também influenciou o Cool Jazz. A relação foi de troca, de reciprocidade, e não de pura assimilação. No que tange à estrutura melódica, a Bossa da primeira fase incorporou definitivamente à música brasileira os acordes de sétima, nona, décima-primeira e décimaterceira, bem com suas alterações mais comuns. Com isso, as possibilidades de uso de notas de repouso melódico ampliaram-se enormemente, até que, em casos como o da canção Luiza, (1981) de Tom Jobim, encontramos a canção se iniciando na décima-primeira de um acorde menor – algo impensável na década de 1940. Mas esse avanço ulterior não deve perder de vista que já em Desafinado (1958), quando se ouve: mais repertório O genial Bill Evans (1929-1980) foi um dos músicos de jazz que, de fato, influenciaram a Bossa-Nova – principalmente seus pianistas. Se você disser Que eu desafino, amor a palavra amor incide sobre a décima-primeira aumentada de um acorde, gerando o estranhamento que sugere a pretensa “desafinação” do enunciador da canção. Em todo o caso, o que há de mais importante a se aferir é que a Bossa representou, por meio da expansão harmônica que protagonizou, uma ampliação definitiva de recursos melódicos para a música popular brasileira em geral, e não só para a fase em que está inserida. Assim, quando já na década de 1980, em plena era do Brock (ou simplesmente “rock nacional”), canções como Índios (1986), de Renato Russo (1960-1996), ou Faz Parte do Meu Show (1988), de Cazuza (1958-1990) e Ladeira, iniciam-se melodicamente na sétima de um acorde menor, vemos ressoando aí os ecos distantes da velha Bossa-Nova. 4 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Vale aqui ressaltar que nem a prática do “scat” – técnica de improvisação melódica vocalizada com sílabas, e não com mais repertório palavras inteligíveis, popularizada por Louis Armstrong (1901-1971) – e nem o procedimento de variação da linha melódica do tema, tão caro ao jazz de Sarah Vaughan (19241990), Ella Fitzgerald (1917-1996) ou Charlie Parker, consolidaram-se na Bossa-Nova, e muito menos na música popular brasileira, tendo sido seu uso sistemático adotado por poucas cantoras, como Elis Regina (19451982) e Alcione (1947-) – e mesmo assim, com bastante parcimônia se comparado a sua práxis na música norteamericana. Se, por um lado, há pouca ou nenhuma dúvida a respeito da origem norte-americana do “scat” utilizado por essas duas cantoras brasileiras, por outro lado não cabe, de forma alguma, considerar esse procedimento como essencialmente constitutivo da Bossa-Nova. Quanto à instância rítmica, há uma discussão interessante que se pode desenvolver. Ainda que seja engenhosa a rítmica padrão da Bossa-Nova, seu desenho, até por ser essencialmente derivado do ralentamento de uma figura bastante comum na linha do tamborim de uma roda de samba, não representa por si grande novidade: mais repertório Elis Regina (1945-1982), uma das maiores cantoras da história da música brasileira, teve um papel fundamental na cena musical da segunda metade da década de 1960, principalmente depois de assumir o comando do programa “O Fino da Bossa”, na TV Record (1965). Tal desenho, em um país com a variedade rítmica como o Brasil, não pode com justeza ser qualificado como inovador. Transições como aquela que conduziu do maxixe ao samba, da marchinha ao frevo, ou, mais recentemente, o advento do olodum e do samba-reaggae representariam fatos tão ou mais espetaculares do que a desaceleração de um desenho rítmico já conhecido. Um padrão rítmico como esse pode, de fato, ser inovador se considerado dentro do contexto do jazz, ou seja: a partir do olhar do norte-americano ou do europeu; mas decerto não dentro da música brasileira. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 5 Por outro lado, uma genuína e fundamental inovação rítmica, capitaneada, sobretudo, por João Gilberto (1931), foi o chamado “violão gago”. Por “violão gago” entendese o recurso ou de defasar as acentuações rítmicas do violão e da voz, ao invés de seguir a tradição de fazê-las coincidir, ou de deslocar ambas paralelamente com relação ao tempo forte, criando-se o efeito de uma grande síncope. Tais recursos enriqueceram sobremaneira o gingado – ou o swing, para os jazzófilos – não só da BossaNova como de toda a música brasileira, podendo-se contar entre os intérpretes seguidores da tradição iniciada por João Gilberto nomes como João Bosco (1946-), Joyce (1948-), Rosa Passos e Caetano Veloso (1942-), entre muitos outros – valendo acrescentar à lista a cantora Ivete Sangalo, que, sobretudo a partir de 2003, começou a utilizar tal recurso, ainda que com bastante economia, na interpretação de algumas baladas da axé music. Assim, no balanço da Bossa – para brincar com a expressão que inspirou o título do livro homônimo de Augusto de Campos1 – observa-se que, ainda que a Bossa tenha sofrido influências do jazz e mesmo da música erudita, ela representa, sobretudo, a continuidade de um processo de complexificação que tivera no samba-canção uma importante etapa anterior. No que tange ao aporte da música erudita, destaca-se a referência de Villa-Lobos, merecendo menção especial também Chopin – cujo Prelúdio em Mi menor, mais do que o Prelúdio da Bachiana n.o 4 de Villa, parece ter inspirado o célebre Samba em Prelúdio (1962) de Vinícius de Moraes (1913-1980) e Baden Powell (1937-2000). No que tange ao jazz, se Bill Evans (1929-1980) representa uma referência clara, a presença do Bebop, conforme apresentado, é, no mínimo, discutível. No que tange aos cancionistas norteamericanos, não há um autor a destacar. Não se pode, por exemplo, declarar categoricamente que Cole Porter (18911964) ou George Gershwin (1898-1937) tenham deixado um legado indiscutível na Bossa-Nova; contudo, o repertório dos “standards” de jazz do século XX era conhecido e profundamente apreciado pela maioria dos principais personagens do movimento, principalmente aqueles que atuavam como músicos na noite tinham aquele repertório todo debaixo dos dedos. Assim, a influência pode ter se dado, mas a partir de referências já “digeridas” pelos músicos, resultando em um hibridismo bastante orgânico e equilibrado, bastante dentro da tradição antropofágica da cultura brasileira. Não se pode, pois, falar, nesse caso, de uma súbita ruptura decorrente da invasão de um estilo estrangeiro, reproduzido sem maiores alterações, algo mimeticamente, por nossos músicos. 1 6 mais repertório A brilhante cantora Rosa Passos, uma das muitas herdeiras do “violão gago” de João Gilberto. João Gilberto (1931-) ao violão, Tom Jobim (19271994) ao piano e Stan Getz no sax, durante a gravação do LP “Getz/Gilberto” (1965). Considerado um dos maiores saxofonistas (tenor) de todos os tempos, Stan Getz foi uma figura fundamental para a difusão da Bossa no universo jazzístico. O disco venceu dois prêmios Grammy em 1965, tendo tido vital importância na divulgação mundial da música brasileira. Obra citada na bibliografia deste capítulo. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Mas, no caso da Jovem Guarda e seu iê-iê-iê, pode-se. A Jovem Guarda Origens O termo “Jovem Guarda” nasceu do título de um programa da TV Record comandado por Roberto Carlos (1941-), Erasmo Carlos (1941-) e Wanderléa (1946-). Mas o movimento não nascera propriamente ali. Ou talvez “movimento” não seja o termo mais apropriado para nos referirmos à Jovem Guarda. É preciso discutir essa questão, que não é tão simples quanto talvez pareça. Roberto (1941-) e Erasmo Carlos (1941-) foram os dois mais influentes compositores da Jovem Guarda, e formaram a mais duradoura parceria da história da música popular brasileira. Recuando um pouco mais no tempo, encontramos Roberto Carlos, em 1957, freqüentando a “turma da Rua do Matoso”, grupo de admiradores e praticantes do rock que se encontrava na Tijuca, Zona Norte do Rio. A partir desse grupo, Roberto, Sebastião Maia – que mais tarde entraria na história da música brasileira simplesmente como Tim Maia (1942-1998) – Erasmo e outros amigos formaram o conjunto “The Sputnicks”. Esse grupo participou do programa “Clube do Rock”, de Carlos Imperial (1936-1992). Em maio de 1958, Roberto participava de um show do Clube do Rock que abria a apresentação, no Maracanãzinho, do show do grande astro da primeira geração do rock norte-americano Bill Halley (1925-1981). Em outubro do mesmo ano, o lançamento de “Chega de Saudade” impressiona Roberto profundamente, que passa a seguir os passos estilísticos de João Gilberto. Apresentando-se como crooner de boate e fazendo alguns shows dentro da linha da Bossa, Roberto, contudo, não conseguiu resultados que viabilizassem sua carreira. Foi de um desentendimento de Sérgio Murilo (1941-), o “Rei do Rock”, com a Columbia, em 1962, que surgiu uma nova oportunidade para Roberto voltar a cantar rock. O rock de Sérgio Murilo e seus antecessores, como os irmãos Tony (1936-) e Celly Campello (1942-2003), era basicamente uma música produzida no final da década de 1950 à base de versões e de covers de bandas originais norte-americanas. Nora Ney, por exemplo, fez uma célebre versão, em 1956, do Rock Around the Clock, de Bill Halley, chamada Ronda das Horas. No ano seguinte, Cauby Peixoto gravaria Rock and Roll em Copacabana, de Miguel Gustavo, considerada por muitos o primeiro rock de fato brasileiro. Mas tratava-se ainda de uma exceção. Tal situação só foi mudar, de fato, a partir da Jovem Guarda. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 7 Embora ambos tenham partido, inicialmente, de versões, a dupla Roberto e Erasmo Carlos, juntos desde 1963, na mais duradoura parceria da história da música popular brasileira, rapidamente começou a gerar uma produção estável e consistente de rock brasileiro. Em pouco tempo, estariam lançando grandes sucessos que se converteriam em clássicos, como É Proibido Fumar (1964), Quero que Vá Tudo pro Inferno (1965), Festa de Arromba (1965), Minha Fama de Mau (1965), Gatinha Manhosa (1966), Se Você Pensa (1968). Várias dessas canções, permanentemente desdenhadas por boa parte da crítica especializada, foram, todavia, capazes de voltar ao topo das paradas de sucesso quando relançadas vinte ou mesmo quarenta anos mais tarde. Trata-se de uma formidável inconsistência, que aponta para uma flagrante falta de adequação de critérios ou por parte do público, ou por parte da crítica. Levando-se em conta, portanto, a solidez da produção estética da Jovem Guarda, tenha ou não tal estética méritos unicamente mercadológicos, sua grande longevidade e o mérito de se tratar de uma geração que, pela primeira vez, consolidava-se compondo rock nacional, e não reproduzindo ou traduzindo o repertório internacional, a única coisa que faltaria para a Jovem Guarda merecer de fato figurar como um movimento da história da música nacional seria uma proposta estética e estilística diferenciada. Como a adoção do rock já é por si mesma uma proposta estilística, avaliemos por fim a questão estética. Assumindo-se que toda grande corrente estética corresponde a um jogo de forças sociais que a particulariza, antes de examinarmos os predicados artísticos do iê-iê-iê, consideremos alguns aspectos sociais a ele relacionados. Em linhas gerais, podemos afirmar que o rock, assim como o jazz, é um estilo cujas raízes se encontram junto à comunidade afro-americana do Sul dos Estados Unidos. Assimilando alguns elementos do folk e do country, convergindo a seguir para o Rhythm ‘n Blues, o rock destacava-se, inicialmente, não só por ser mais uma corrente da música negra a alcançar um sucesso estrondoso junto à população branca, mas também por serem suas letras carregadas de duplo sentido ou de franco erotismo. Essa característica, também encontrável em nossos lundus e marchinhas, mesmo diante do radicalismo dos setores mais conservadores da sociedade norte-americana, não chegava por si só a representar uma grande novidade. As novidades eram outras. A primeira delas era ser uma música jovem, ou melhor, para jovens. Note-se que a novidade aí não estava, como pode parecer, em uma análise mais superficial, na música em si. A novidade estava no “jovem”. A invenção da juventude Muitos jovens de hoje desconhecem por completo que nosso conceito de adolescência seja uma construção cultural extremamente recente. A maioria das pessoas que nasceu até cerca da metade da década de 1920, como em todas as gerações anteriores, saltava da infância diretamente para as responsabilidades da vida adulta, assumidas plenamente entre os 15 e os 20 anos para ambos os sexos – com a única e absolutamente minoritária exceção do ínfimo segmento da elite masculina que podia se dar ao luxo de prolongar seus estudos regulares, ingressando nas Universidades. Com o vertiginoso avanço científico e tecnológico tornando patente a necessidade da instrução e com sua gradual viabilização nas sociedades do pós-guerra, tal segmento minoritário tendeu a crescer exponencialmente. 8 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Além disso, um contexto financeiro e social bastante favorável permitiu não só que a geração do pós-guerra, incentivada pelos próprios pais, ambicionasse uma educação melhor do que a da geração anterior como também propiciou as condições materiais para que tal ocorresse, com a criação de fundos de assistência e ajudas de custo por parte de entidades governamentais e particulares. Com isso, surgiu um novo segmento de consumo: em uma faixa etária em que, na geração anterior, a maioria das pessoas já tinha encargos financeiros próprios da vida adulta, via-se agora uma geração sustentada pelos pais ou amparada pelos fundos de assistência, com tempo ocioso e poder de compra. O extraordinário Little Richard (1932-) foi um nome fundamental na transição entre o Rhythm&Blues e o rock. Excelente compositor, pianista e performer, assistiu, entretanto,ao discutível processo pelo qual o rock deixou de ser uma música eminentemente afro-americana para se tornar um estilo internacional em que os negros são uma pequena minoria. Se esse fator já é de evidente relevância, há, todavia, mais elementos a se considerar. O primeiro deles é a aparição, no mercado, de um novo produto, que aceleraria algumas radicais mudanças comportamentais já em curso desde o início do século XX: a pílula anticoncepcional. Surgindo no início da década de 1950 e popularizando-se a partir do início da década de 1960, a pílula representou uma importantíssima conquista da mulher em seu gradual processo de emancipação e ruptura para com as estruturas patriarcais, afetando radicalmente a viciada balança de (des)equilíbrio entre os gêneros. Com o advento desse método de contracepção, a sexualidade pôde passar a ser vivenciada sem maiores conseqüências nem para o homem – que antes responderia unicamente nos planos moral e social por uma eventual gravidez – nem para a mulher – que até então respondia não só com um anátema moral e social muito mais pesado que o de seu parceiro como ainda arcava biologicamente com o processo de gravidez, em uma situação, portanto, de absoluta desigualdade entre os gêneros. O sexo por prazer, desvinculado da função de reprodução ou do ônus da gravidez, representou um passo particularmente importante na reestruturação dos papéis sociais do homem e da mulher que, havia muito, estava em curso, acelerando de tal maneira o processo a ponto de provocar uma inflexão social e comportamental conhecida como “revolução sexual”. Essa “revolução” cuja arma era a pílula foi pautada por drásticas mudanças de comportamento com relação à geração anterior. A principal delas foi com relação à liberalidade nas relações sexuais, passando-se a adotar, como naturais, padrões anteriormente estigmatizados como promíscuos. Todavia, há que se considerar um outro poderoso elemento da nova realidade cultural: a televisão. Uma característica histórica importante da alvorada do rock é que ela coincide também com a ascensão da TV à supremacia entre os meios de comunicação de massa. O resultado de tal associação é que o rock, pela primeira vez, abre espaço, na indústria de massa, para um estilo musical em que os elementos visuais tornam-se tão importantes quanto os sonoros. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 9 Uma conseqüência desse contrapeso visual para com as questões puramente musicais foi o gradual afastamento do rock com relação a suas origens afroamericanas. Nascido no seio da comunidade negra a partir de um ramo do Rhythm&Blues e encontrando nela boa parte de seus geniais pioneiros, como Fats Domino (1928-), Chuck Berry (1926-) e Little Richard (1932-), o preconceito e as coerções do mercado redirecionaram o rock Bill Halley (o terceiro da esquerda para a direita) foi o de forma a torná-lo uma música primeiro grande astro branco do rock, alcançando aceitável para o mercado sucesso mundial com seu Rock Around the Clock. majoritariamente branco e Embora tenha absorvido as influências do conservador dos Estados Rhythm&Blues, Halley trouxe para o rock também Unidos. Devido a essa distorção, muito de sua forte herança country, que adquiriu em a história do rock foi, por certo grupos como o “4 Aces of Western Swing” (foto tempo, reescrita, enfatizando-se, acima). exageradamente, o papel de Bill Halley (1925-1981) e daquele que foi o primeiro ídolo do Rock a fazer sucesso em escala mundial: o também branco Elvis Presley (1935-1977). Entre as razões para o sucesso de Elvis, uma das poucas, jamais questionada, é justamente um elemento visual: sua movimentação cênica, e, sobretudo, seu legendário jogo de quadril – herdado, por sinal, de uma movimentação já havia muito consagrada junto às comunidades afro-americanas em que o rock surgiu. Tratava-se, pois, de um elemento idiomático da linguagem corporal utilizada pelo negro americano nos palcos do Rhythm&Blues e do nascente Rock ‘n Roll – executada, porém, por um jovem branco, fiel aos padrões de beleza da elite anglosaxã e talentoso o suficiente para absorver a linguagem musical e cênica de seus antecessores. Assim, parafraseando um dito popular entre seus fãs, Elvis deve seu sucesso tanto a sua voz quanto a sua pélvis. A imagem, antes monopolizada pelo cinema, podia agora invadir as dezenas de milhões de lares norte-americanos que possuíam televisão no princípio da década de 1960. 10 Elvis Presley (1935-1977), com seu talento, competência e carisma, transformou o rock de música regional do baixo Mississipi para a condição de arquétipo da música pop internacional das últimas décadas do século XX. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 A jovem cultura do jovem floresceu trajando os signos de seu tempo que lhe davam identidade. E uma parte razoável dessa identidade vinha de signos visuais, tal como a TV deles se valia para ocupar o lugar que antes fora do rádio como veículo de comunicação de massa voltado ao entretenimento familiar. Assim, uma identidade visual diferenciada demarcou a fronteira entre o domínio simbólico do jovem e da geração que o antecedera. Roupas coloridas contrastavam com a sisudez dos ternos cinza e dos vestidos de cores neutras; os cabelos longos aproximavam a identidade dos sexos, como que metaforizando uma nova situação de equilíbrio; os cabelos e roupas mal cuidados rejeitavam a ordem e a hierarquia imbricados nos modos militares dos heróis da geração que viveu a II Grande Guerra; o descaso com a higiene negava a cultura por uma metafórica – ou não raro literal – aproximação com a natureza; as roupas industrializadas, principalmente o jeans e a camiseta, simbolizavam a modernidade e a negação dos códigos de formalidade da geração predecessora. Por trás do rock, a tecnologia de amplificação dos instrumentos produzindo um grito, um som alto – e agressivo – demais para os ouvidos mais velhos, acostumados a valorizar as sutilezas. A sexualidade pós-pílula instaurou-se como campo por excelência em que se vivenciava a inadequação dos códigos morais dos pais, forjados por Um dos fatos mais marcantes da história preocupações que já não faziam sentido da contracultura foi o Festival de Woodstock para os mais jovens. As drogas ofereciam (1969). Além da apoteose do slogan “Sexo, um olhar sobre o universo que não aquele Drogas e Rock’n Roll”, a luta pelos direitos forjado pela consciência e pelo civis, pela igualdade entre os gêneros e as doutrinamento de um mundo obsoleto que raças, a rejeição ao materialismo e ao insiste em querer se repetir. A apoteose militarismo marcaram a visão de mundo do dos sentidos inaugurou-se como remédio rock do final dos anos 1960. contra o crepúsculo do racionalismo. O rock era, assim, a expressão genuína de uma geração em um certo momento da história norte-americana. Encontraria no Brasil tal forma de expressão condições históricas e sociais igualmente propícias a seu florescimento? Pelo que vimos, no início desse capítulo, certamente não – ao menos durante o período em que floresceu a Bossa-Nova. Ao mesmo tempo, a Bossa-Nova também era “Nova”, ou seja: também se opunha à geração anterior, e também era composta predominantemente por jovens. Por sinal, jovens que tinham basicamente a mesma idade dos precursores do rock. Eram contemporâneos, portanto, na idade, no desconforto para com a visão de mundo que lhes foi apresentada pela geração anterior, na ânsia por expressar os anseios de seu tempo e assim preencher uma lacuna na arte de seu país. Entretanto, esses países, suas realidades sócio-históricas, e, conseqüentemente, suas grandes questões, eram radicalmente diferentes. Também o que tinham a dizer era muito diferente. À agressividade do rock, a Bossa-Nova opõe a sedução; à rebeldia, o hedonismo; à simplicidade rústica, a sofisticação, formal e intelectual; ao grito, o sussurro; à guitarra, o violão. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 11 Porém, uma outra oposição, de importância chave para entendermos o que se passou a seguir com a música brasileira, precisa ser aqui explicitado: ao rádio da Bossa-Nova, o rock respondia com a TV. Como cremos ter deixado claro, a Bossa-Nova foi, na maior parte dos aspectos aqui estudados, um movimento que, essencialmente, dá continuidade à tradição da música brasileira difundida pelo rádio. A bossa é uma música para ser ouvida, e não, vista. As horas infindáveis de Tom diante de seu piano à procura do acorde que melhor coubesse em uma dada passagem refletia o profundo cuidado dos bossanovistas com uma arte e com uma atitude que era expressa por meio de sons – e não de gestos, penteados ou roupas. Claro que o rock nunca se resumiu a isso. Mas, ao mesmo tempo, isso fazia parte do rock, e uma parte importante. Na bossa, isso não tinha, nem de longe, o mesmo peso. Os fãs mais ardorosos dos Beatles sabem dizer exatamente quando eles abandonaram o terno – e quando o fizeram, foi em caráter definitivo. Quanto à Bossa, provavelmente nem o próprio João Gilberto – ou Tom, ou Vinícius – saberia dizer quando ele subiu pela primeira vez em um palco sem o terno – e nem quando ele o retomou, ou deixou de retomar. Isso não tem absolutamente importância alguma dentro do movimento. No entanto, a televisão veio para tomar definitivamente o lugar do rádio na primazia dos meios de comunicação de massa. A Bossa representou, técnica, estética e historicamente, o apogeu da sofisticação e do aprimoramento de uma música feita para deleitar os ouvidos. No entanto, os ouvidos passaram a não bastar mais. A relação com o público passou a ser mediada também pelos olhos. Era preciso criar uma música para se ouvir também com os olhos. A Jovem Guarda, aproveitando-se da beleza e carisma de um Roberto Carlos e uma Wanderléa no auge de sua juventude, soube atender a essa nova demanda. No entanto, outras forças sociais e históricas fizeram-se sentir, exercendo uma poderosa pressão, que provocou o surgimento de uma outra Bossa-Nova e um outro Iê-iê-iê. E, em uma suprema inversão de papéis, enquanto a nova Bossa-Nova buscava formas de maior simplicidade e se tornava rebelde, a nova Jovem-Guarda intelectualizava-se e pedia menos radicalismo. Procuremos analisar esse fenômeno. 12 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Um grito parado no ar mais repertório O título desse tópico é uma alusão à peça homônima de Gianfrancesco Guarnieri, de 1973. Em 1959, o segundo ano da era da Bossa-Nova, um fato internacional acabaria por inspirar uma radical mudança estética na arte cancional de todo o continente americano: a Revolução Cubana. Após décadas no poder, o ditador cubano Fulgêncio Batista já dera provas suficientes à comunidade internacional da total corrupção de seu governo. Após ver novamente frustradas as eleições prometidas para 1952, um grupo, liderado pelo jovem Fidel Castro (1926-), resolveu desafiar o regime. Preso, mas anistiado, meses depois, Fidel terminou se refugiando com um grupo de revolucionários em Sierra Maestra, à espera de uma revolta popular que jamais houve. Após uma histórica entrevista, Fidel passou a atrair a atenção e a simpatia da comunidade internacional, enquanto a imagem de Fulgêncio se desgastava. Quando, em 1958, os Estados Unidos resolveram promover um embargo de forma a impedir a entrada de armas para o exército do ditador, a situação se alterou drasticamente. Antevendo a possibilidade de uma revolta de seu desprestigiado e corrupto exército – o qual não se animava a lutar por acreditar que o ditador poderia fugir no meio da luta - , Fulgêncio, sem qualquer preocupação maior com a situação de seu país, fugiu, fazendo com que o poder fosse parar nas mãos de Fidel – o qual até o momento não demonstrara nenhum perfil ideológico definido. Barricada militar durante o golpe militar de 1964. Após a Revolução Cubana, a Guerra Fria acirrou os ânimos na polarização entre direita e esquerda na América Latina, com a fragorosa derrota desta última e a conversão das democracias latinoamericanas em ditaduras militares de direita. A opressão política, a permanente injustiça social e a perda da liberdade de expressão provocaram uma forte reação da classe artística em todo o continente, transformando, radicalmente, todas as formas de expressão até ali vigentes – inclusive o rock. Diante da situação alarmante de seu país, Fidel, pouco depois de tomado o poder, foi pedir ajuda ao governo dos Estados Unidos. No calor da Guerra Fria, a suspeita de infiltrações comunistas na revolução fez com que seu pedido fosse negado. Ao voltar a Cuba, Fidel decretou uma grande reforma agrária – a qual afetava diretamente os enormes latifúndios de algumas grandes empresas norteamericanas. O gesto de Fidel alimentou as suspeitas americanas de infiltração comunista. Os desentendimentos começaram a se suceder e a se acentuar em gravidade. Cuba pediu auxílio à União Soviética, que atendeu ao pedido, e Havana terminou passando para a órbita de influência de Moscou. Em 1960, Fidel acusa Eisenhower de estar planejando uma invasão a Cuba. Em resposta, os Estados Unidos rompem relações. Em 1961, os Estados Unidos apoiaram a iniciativa dos exilados cubanos de invadirem Cuba pela Baía dos Porcos. Os invasores foram fragorosamente derrotados. Para triunfo de Fidel, sua acusação foi confirmada pelos fatos, e as verdadeiras intenções norte-americanas foram desmascaradas. Assim, as trapalhadas de Washington conseguiram transformar Fidel de um rebelde sem ideologia definida em um dos maiores ícones mundiais de resistência ao imperialismo. E, no final de 1961, Fidel aderia definitivamente ao marxismo. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 13 A política agressiva de Washington na América Central das primeiras décadas do século XX, promovendo invasões e golpes em países como Nicarágua, Guatemala, Panamá, Cuba, Haiti e República Dominicana, entre outros, gerou um ressentimento no continente, que foi, aos poucos, transformando-se em um sentimento de anti-americanismo. Esse sentimento veio à tona, por exemplo, quando Richard Nixon, na qualidade de vice-presidente americano, esteve em Caracas, em 1958, e recebeu uma histórica vaia do povo venezuelano, devido ao apoio que Washington dera durante anos ao ditador recém deposto Pérez Jiménez. Mas, como vimos, não eram só os latino-americanos que estavam descontentes com o establishment. Os próprios jovens americanos, como vimos anteriormente, sentiam um incômodo crescente diante das velhas formas de pensamento que imperavam na política e economia. Eram os tempos da Guerra Fria, e alguns do governo americano geraram uma imensa antipatia por parte da comunidade internacional. A 5 de maio de 1960, a poucos dias de uma importante reunião de desarmamento com o líder soviético Nikita Krutschev, o governo americano foi surpreendido com a notícia de que um avião americano fora abatido em território soviético. Washington respondeu que se tratava apenas de um aparelho de inspeção meteorológica que havia se perdido. Moscou respondeu que o piloto, Gary mais repertório Powers, fora capturado e teria confessado tratar-se de uma missão de espionagem. Washington acabou admitindo a lele verdade. Novamente, a máscara caíra, e a reação internacional foi tão forte que, devido ao calor das manifestações populares, o governo japonês teve de retirar o convite que fizera a Eisenhower para visitar o país. O sentimento anti-imperialista cristalizou-se de tal forma na América Latina que, como seria de se esperar, ganhou forma musical. Essa forma ganharia, no final dos anos 1960 e início dos 1970, o nome de Nueva Canción. Mas ela já existia, firme e forte, na metade da década de 1960 – e não só na América de língua espanhola, mas também no Brasil e até mesmo nos Estados Unidos. Nascia a chamada Canção de Protesto. A Canção de Protesto A cantora, folclorista, artista plástica e compositora chilena Violeta Parra (19171967), considerada a primeira artista a assumir sua música como uma arma contra a opressão política e a injustiça social da década de 1960. No início da década de 1960, os meios de comunicação de massa tendiam a oferecer uma forma cada vez mais culturalmente homogeneizadora de entretenimento, tão alienado quanto possível com relação aos problemas e às grandes questões que “aborreciam” o dia-a-dia do grande público, e apoiado pelos melhores recursos que a aceleração do desenvolvimento tecnológico pudesse oferecer à plasticidade dos produtos da indústria cultural. Naquela época, os grandes empresários da mídia (excetuando a jornalística) acreditavam que mexer em questões delicadas como injustiça social e política, fome, miséria, desrespeito aos direitos humanos, tudo isso fosse, na expressão herdada dos remotos tempos em que o teatro era o centro da vida cultural das grandes cidades, um verdadeiro “veneno de bilheteria”. 14 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 No entanto, logo nos primeiros anos, alguns artistas como que leram a cartilha acima e resolveram, de pirraça, fazer tudo ao contrário. Nada de homogeneidade: vamos resgatar, a partir do folclore, o que houver de mais autenticamente local na expressão artística de cada povo. Afinal, quem sabe o grande dramaturgo russo Checkov não estaria certo ao dar seu célebre conselho: “se um autor quiser ser universal, então que fale de sua aldeia”. Distanciar-se de questões espinhosas? Nada disso. A ordem passa a ser: mexer nas feridas da sociedade – de preferência, dando a elas um cunho tão pessoal quanto possível, para dar-lhes carne, substância e garantir-lhes a empatia que uma discussão intelectual ou ideológica jamais provocaria. Tecnologia? Apenas para registrar e transmitir ao grande público uma estética quase primitivista, por sua busca de fidelidade às raízes da cultura popular, com a utilização de instrumentos tão rústicos quanto possível. Do explosivo casamento entre a canção folclórica atemporal, a atualidade da canção urbana e a expressão das mais candentes questões políticas e sociais que uma sociedade estivesse apresentando no momento nasce a Canção de Protesto, uma das mais importantes formas de expressão musical das décadas de 1960 e 1970. mais repertório le A cantora argentina Mercedes Sosa (1935-), uma das mais importantes e conhecidas intérpretes da Canção de Protesto, influenciou a música de todo o continente americano, gravando com um leque de artistas que passa desde o brasileiro Milton Nascimento (1942-) até a americana Joan Baez (1941). O ponto de partida da Canção de Protesto é atribuída à canção La Carta, da maravilhosa compositora chilena Violeta Parra (1917-1967). O marco é discutível na obra de Violeta, que já havia composto canções como Hace falta um guerrillero e Porque los pobres no tienen. Talvez a causa de adotar essa canção tenha sido o fato de ela responder não a um problema crônico ao qual as pessoas já estavam conformadas, mas a uma situação específica e urgente, criada e difundida no calor da hora. Violeta Parra, apresentando-se em Paris, em 1962, recebe uma carta que lhe comunica que seu irmão havia sido preso. Violeta pega a caneta e escreve: Me mandaron uma carta Por el correo temprano En esa carta me dicen Que cayó preso mi hermano Y sin compasión, con grillos Por las calles lo arrastraron, sí A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 15 No Brasil, a problemática social já havia chegado ao cinema em 1955, com “Rio 40 Graus”, de Nelson Pereira dos Santos (1928-), e no teatro em 1958, com a montagem de “Eles Não Usam Black-Tie”, de Gianfrancesco Guarnieri (1934-), pelo Teatro de Arena em 1958. A criação dos Centros Populares de Cultura (CPCs), em 1960, abriu um espaço que cativou jovens compositores também envolvidos com a Bossa Nova, como Carlinhos Lyra (1939-) e Geraldo Vandré (1931-). Do CPC, Carlinhos Lyra entrou em contato com o Teatro de Arena, núcleo cultural que, durante alguns anos, conseguiu restaurar a posição do teatro como centro nevrálgico da vida cultural nacional, reunindo, em sua proposta de conscientização social e política, jovens que se tornariam alguns dos maiores expoentes da cultura nacional, como o próprio Lyra, Guarnieri, os diretores e dramaturgos Augusto Boal, Chico de Assis, Isaías Almada (que mais tarde se envolveria com a guerrilha) e José Renato Peccora, os atores Lima Duarte, Dina Sfat e Antônio Fagundes, os músicos Edu Lobo, Marília Medalha, Chico Buarque, Caetano Veloso, Tom Zé, Maria Betânia e outros tantos que a falta de espaço, jamais de importância, não permite aqui mencionar. Em 1961, Lyra musicou a peça Um Americano em Brasília, de Chico de Assis (1933-) e Nelson Lins e Barros. Entre as canções que escreveu, destaca-se a hilariante Canção do Subdesenvolvido (em parceria com Chico de Assis), em que os autores, com muito bom humor,fazem uma crítica ferina ao atraso social do país e à submissão da elite brasileira à dominação cultural e econômica das grandes potências. Tal canção poderia ficar marcada como a primeira Canção de Protesto no país, não fosse uma questão estilística de vital importância: a ausência do elemento folclórico. mais repertório le O compositor Carlinhos Lyra (1939-), além de grande expoente da BossaNova, atuou também junto aos Centros Populares de Cultura (CPCs), produzindo uma música que, muitas vezes lançando mão até do humor e da paródia, visava à conscientização pelas massas das grandes questões políticas e sociais de seu tempo. De fato, um traço fundamental da Canção de Protesto como gênero é sua adesão a parâmetros estilísticos da cultura popular, até como signo do estrato social cujos interesses procurava representar. Tal compromisso foi bem explícito entre os cantores da América hispânica, entre os quais se destaca aquela cujo trabalho alcançou maior projeção em escala mundial: a extraordinária artista argentina Mercedes Sosa (1935-). Mercedes, de etnia indígena, sempre fez questão de se apresentar usando as vestes e os instrumentos característicos de seu povo. 16 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Seguindo essa lógica, ou seja, a composição engajada produzida no calor da hora e o compromisso estético e social com a música da tradição da cultura popular, apontaremos, pois, na posição de grande pioneiro da Canção de Protesto no Brasil, o sambista carioca Zé Kéti (1921-). Zé Kéti, digase de passagem, é um dos nomes chave de um importante movimento dos anos 1960 que não está discutido neste capítulo: aquilo que poderíamos chamar de “Renascença do Samba”. Trata-se do ressurgimento, inicialmente em volta do restaurante Zicartola (de propriedade de Dona Zica, esposa de Cartola), de uma constelação de extraordinários sambistas, pertencentes a uma primeira geração de grandes compositores injustamente esquecidos, como Cartola (1908-1980) e Nelson Cavaquinho (1910-1986), e a uma nova geração que incluía nomes como Paulinho da Viola (1942-) e Elton Medeiros (1930-). A essa gloriosa retomada do samba juntou-se a musa da Bossa-Nova, Nara Leão (1942-1989), ao participa,r ao lado de Zé Kéti e João do Vale (1934-1996), do antológico espetáculo Opinião, dirigido por Augusto Boal (1931-) – na época atuando intensamente tanto no Teatro de Arena quanto nos CPCs. Opinião reunia Zé Kéti, um negro representante do proletariado urbano, João do Vale, caboclo representando a miséria rural nordestina, e Nara Leão, uma branca representando a elite intelectual urbana inconformada com as injustiças sociais do país. Opinião é também o nome da canção de Zé Kéti que, já desde o final de 1964, figura como o marco inicial da Canção de Protesto no Brasil: mais repertório le O grande sambista Zé Kéti foi o pioneiro da Canção de Protesto no Brasil, com o clássico Opinião, que se tornou o título de um musical homônimo de Augusto Boal (1931-). Podem me prender, Podem me bater, Podem até deixar-me sem comer Que eu não mudo de opinião A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 17 A ousadia de Zé Kéti abre espaço para outros compositores que, em pouco tempo, engrossam e enriquecem as colunas da Canção de Protesto no país. Dentre eles, destaca-se absoluta a figura de um dos mais reverenciados compositores brasileiros de todos os tempos: Chico Buarque de Holanda (1944-). Em verdade, a obra de Chico é tão vasta e abrangente que rotulá-lo como sambista ou como compositor de canções de protesto – dois qualificativos válidos para sua obra – parecerá a muitos uma categorização por demais reducionista. Em todo o caso, um marco para a entrada de Chico no universo da Canção de Protesto é seu disco de estréia em 1965, contendo o clássico Pedro pedreiro mais repertório lele Pedro pedreiro fica assim pensando Assim pensando o tempo passa E a gente vai ficando pra trás Esperando, esperando, esperando, Esperando o sol Esperando o trem Esperando o aumento Desde o ano passado Para o mês que vem Apesar da engenhosidade de Chico, seu grande prestígio e a engenhosidade de suas célebres letras de duplo sentido, seria a simplicidade, clareza e univocidade de sentido dos clássicos de Geraldo Vandré que, no calor da hora, mobilizariam multidões e se transformariam em verdadeiros hinos que, como no episódio bíblico das muralhas de Jericó, seriam cantados com garra e obstinação até o dia em que, finalmente, veriam ruir a lúgubre fortaleza da ditadura militar. Vandré já escrevera seu nome na história da Canção de Protesto com sua Disparada (1966), em parceria com Théo de Barros, que contava a história de um boiadeiro, o qual se conscientizara da opressão a que estava submetida a gente do campo, e de seu próprio papel naquela cruel engrenagem: Então não pude seguir O compositor Edu Lobo (1943-), a atriz Ítala Nandi (1942-) e o compositor Chico Buarque (1944-), na célebre “Passeata dos Cem Mil”, meses antes que o AI-5 radicalizasse definitivamente a ditadura militar no Brasil. Embora qualificar Chico Buarque como compositor de Canções de Protesto seja uma intolerável redução de sua vasta obra como compositor, não há, todavia, como questionar que se devem a ele algumas das mais belas e engenhosas Canções de Protesto da história da música popular brasileira. Valente lugar tenente E o dono de gado e gente Porque gado a gente marca Tange, ferra, engorda e mata Mas com gente é diferente 18 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 O ano de 1968 foi marcado, em todo o planeta, pelo signo da radicalização. A Primavera de Praga desafiando a União Soviética, as revoltas estudantis em Paris desafiando De Gaulle, o ataque vietnamita à embaixada americana em Saigon, as manifestações anti-racistas na Carolina do Sul, do Norte e no Winsconsin, o assassinato de Martin Luther King, o início das atividades do grupo terrorista alemão Baader-Meinhoff, a estréia na Broadway do musical Hair, que enaltecia os valores da contracultura e condenava a Guerra do Vietnã, o assassinato de Robert Kennedy, a saudação do Black Power proferida do alto do pódio pelo atleta negro Tommie Smith ao receber sua medalha de ouro nas Olimpíadas – e, na sexta-feira 13 do mês de dezembro, a ditadura militar no Brasil institui o AI-5, marco do embrutecimento definitivo do regime militar brasileiro. Nesse ano turbulento, Vandré mostraria ao público do III Festival Internacional da Canção a singela obra-prima da Canção de Protesto no Brasil: Pra Não Dizer que Não Falei de Flores: Há soldados armados Amados ou não mais repertório le O compositor Geraldo Vandré (1931-), autor do maior clássico da Canção de Protesto na história da música brasileira, Pra Não Dizer que Não Falei de Flores (Caminhando). Quase todos perdidos De armas na mão Nos quartéis lhes ensinam Antigas lições De morrer pela pátria E viver sem razões Mas, quando o AI-5 mostrou a cara do terror de Estado, não foram apenas os engajados compositores da Canção de Protesto que foram perseguidos. A 27 de dezembro daquele ano, a prisão de Caetano Veloso (1942-) e Gilberto Gil (1942-) era o marco do fim do aparentemente efêmero movimento conhecido como Tropicália – movimento esse que, em sua ilusória brevidade, teve desdobramentos que o mantiveram extremamente presentes nas quatro décadas que se seguiriam a seu “fim”. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 19 O Crepúsculo dos Deuses: A Tropicália mais repertório saiba mais lele A alusão ao título da última parte da obra-prima O Anel dos Nibelungos, de Richard Wagner, remete ao calvário pelo qual a elite da cultura brasileira estava prestes a passar durante os anos de chumbo da ditadura militar. Tudo é “Divino, maravilhoso”, anunciavam os deuses tropicalistas da MPB na canção homônima em 1968. Se houver uma palavra única que possa definir Tropicália, tal palavra deverá ser “sínteses” – assim mesmo, no plural. Plural pela diversidade de formas de expressão presentes no movimento, como decorrência natural de seus pressupostos estéticos. E “síntese” na acepção do termo dentro da dialética, ou seja, o resultado do diálogo entre uma tese e sua antítese. Trata-se, pois, de uma estética dinâmica, extremamente arredia a tentativas de definição, tal qual tão bem expressariam mais tarde os versos da canção de Caetano O Quereres, de 1984: Onde queres família, sou maluco E onde queres romântico, burguês Onde queres Leblon, sou Pernambuco, E onde queres eunuco, garanhão E onde queres o sim e o não, talvez Onde vês eu não vislumbro razão Onde queres o lobo eu sou o irmão, E onde queres cowboy, eu sou chinês 20 Foto da capa do LP “Tropicália ou Panis et Circensis” (1968). Nela, vê-se a linha de frente do movimento tropicalista. No alto, da esquerda para a direita: Arnaldo Baptista (baixista e compositor dos Mutantes), o compositor e mentor intelectual da Tropicália Caetano Veloso (segurando a foto da cantora Nara Leão), a cantora e compositora Rita Lee (vocalista dos Mutantes), Sérgio Dias (guitarrista dos Mutantes) e o compositor Tom Zé. Sentados no banco: o arranjador Rogério Duprat, a cantora Gal Costa e o compositor Torquato Neto. Sentado no chão, o compositor Gilberto Gil. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Uma das mais instigantes sínteses propostas pela Tropicália foi aquela entre a modernidade descompromissada do pop – tanto o nacional, da Jovem Guarda aos Mutantes, quanto o internacional, dos Beatles aos Beat Boys argentinos – com algumas correntes de vanguarda, quer da música, quer das artes visuais e audiovisuais. O próprio nome Tropicália advém da obra homônima do artista plástico Hélio Oiticica (19371980). Assim, a Tropicália cativaria os poetas neoconcretos Augusto (1931-) e Haroldo de Campos (1929-1999), bem como músicos da área erudita como Gilberto Mendes (1922), Júlio Medalha (1938) e Rogério Duprat. Discípulo de Hans Joachim Koellreutter (1915-) e de Walter Smetak (1913-1984), Tom Zé (1936-) seria, de todos os tropicalistas, aquele que mais manteria a solidez de suas raízes – as populares de sua Irará natal e as vanguardistas de sua formação -, mas sua obra só ganharia o espaço merecido no início da década de 2000. Por detrás de algumas ousadias e experimentações da Tropicália, ouvem-se, ainda, os ecos do histórico e legendário LP Sgt. Pepper‘s Lonely Hearts Club Band, lançado pelos Beatles, em 1967. Há, também, a admiração profunda de Caetano pelo mestre da Nouvelle Vague, o cineasta francês Jean-Luc Godard, admiração essa que o levará, em 1986, a se aventurar como autor de cinema, com seu filme Cinema Falado. A afinidade de Caetano com a vanguarda resultou no LP Araçá Azul, de 1973, cujo experimentalismo não foi bem recebido pelo público – ao menos em termos de vendagem. Pode-se tomar, como marco inicial da Tropicália, a canção Alegria, Alegria, com que Caetano conquistou o quarto lugar no II Festival de MPB da TV Record, em 1967: Eu tomo uma coca-cola E ela pensa em casamento mais repertório lele Hans Joachim Koellreutter (1915-), compositor e professor alemão radicado no Brasil desde 1937, deixou uma profunda marca na música brasileira, quer por ter introduzido o dodecafonismo em nossa música erudita, quer por ter enriquecido nossa música popular ao transmitir o melhor de seu conhecimento musical a alunos como Tom Jobim (1927-1994) e Tom Zé (1936-). Uma canção me consola Eu vou Por entre fotos e nomes Sem livros e sem fuzil Sem fome, sem telefone No coração do Brasil A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 21 Em meio a uma época em que a gradual brutalização do regime militar foi levando a sociedade a se mobilizar em passeatas, manifestações e na era da Canção de Protesto, propor-se a “tomar uma coca-cola” parecia, a alguns, render-se metaforicamente à dominação imperialista das multinacionais. A adoção das guitarras elétricas – as quais viriam para ficar na música popular brasileira – também soava da mesma forma como uma capitulação ao imperialismo cultural do rock. O gesto de andar “sem livros e sem fuzil” podia também ser interpretado como uma crítica à juventude politizada que abraçava a inglória luta contra a ditadura. Assim, enquanto a bela canção de Caetano despertava paixão em uma parte do público, na outra despertava absoluta indignação. Da mesma maneira, Domingo no Parque, de Gilberto Gil, que alcançou o segundo lugar no mesmo festival, apresentava, ainda que de maneira muito mais sutil que Caetano, uma possível crítica à politização de sua geração, por meio da história do feirante José e do pedreiro João: O sorvete é morango - é vermelho oi, girando, e a rosa - é vermelha oi, girando, girando - é vermelha oi, girando, girando - olha a faca! Olha o sangue na mão - ê, José Juliana no chão - ê, José outro corpo caído - ê, José seu amigo João mais repertório le Policiais recorrem à cavalaria para reprimir estudantes paulistas em 1968. A ditadura não conseguiria calar, senão temporariamente, a elite intelectual e artística brasileira. No que tange à sociedade, contudo, a castração, infelizmente, seria mais eficaz. Os anos de chumbo fizeram com que as grandes manifestações populares urbanas de caráter político praticamente desaparecessem da vida nacional após 1968, excetuando-se apenas as gigantescas mobilizações relacionadas à campanha das “Diretas Já” em 1984 e ao Impeachment de Fernando Collor em 1992. Ao engajamento da década de 1960, seguiu-se uma era de crescente alienação, na música como na sociedade, em um processo que ainda persiste na década de 2000. - ê, José 22 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 Ao final do giro vertiginoso da roda-gigante da história, o “rei da confusão”, o proletário João, estava morto, coberto de sangue - vermelho como a cor da bandeira que, com a foice e o martelo, simbolizava o comunismo a que aderia a juventude mais engajada. Também Juliana, por quem ambos os adversários se defrontavam, termina prostrada ao chão, coberta de sangue – como o Brasil, que seria arrasado pela brutalidade e incompetência dos governos militares. Vivo, apenas o pequeno comerciante José, sobrevivente de uma paisagem em ruínas – como os próprios tropicalistas sobreviveriam a uma paisagem cultural dilacerada. Domingo no Parque, lida através dessas metáforas, prenuncia, de maneira apocalíptica, o seu próprio fim – o fim da Tropicália –, bem como o fim ainda mais radical das bandeiras hasteadas por aqueles que impediriam Caetano de cantar É Proibido Proibir no ano seguinte,1968. Assim, prematuramente, aos dez anos do alvorecer da BossaNova, terminaria a década de 1960 – provavelmente, a década mais rica da história da música popular. A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 23 bibliografia ALBIN, Ricardo Cravo. O livro de ouro da mpb. São Paulo: Ediouro, 2003. ALMADA, Izaías. 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Buenos Aires: Ediciones Libertador, 2004. 24 A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 bibliografia HOBSBAWM, Eric. História social do jazz. São Paulo: Paz e Terra, 2004. JOBIM, Helena. Antônio Carlos Jobim – um homem iluminado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. MELANDRI, Pierre. História dos Estados Unidos desde 1865. Lisboa: Edições 70, 2000. MOTTA, Nelson. Noites tropicais. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. PRADO, Décio de Almeida. História concisa do teatro brasileiro. São Paulo: EDUSP, 1999. . O melhor teatro de Gianfrancesco Guarnieri. São Paulo: Global, 1986. SANTOS, Alcino et al. Discografia brasileira em 78 rpm: 1902 – 1964. 5 vols. Rio de Janeiro: Funarte, 1982. SEVERIANO, Jairo ; HOMEM DE MELLO, Zuza. A canção no tempo. São Paulo: Editora 34, 2002. TINHORÃO, José Ramos. História social da música popular brasileira. São Paulo: Editora 34, 2004. . Música popular: teatro e cinema. Petrópolis: Vozes, 1972. VELOSO, Caetano. 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A Música Popular Brasileira na época de ouro | Da era Vargas aos anos JK - Período de 1930-1956 25 Anotações: _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 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