102 Avaliação do crescimento e do teor de óleo essencial em plantas de Ocimum gratissimum L. cultivadas sob malhas coloridas 1* 2 3 4 5 MARTINS, J.R. ; ALVARENGA, A.A. ; CASTRO, E.M. ; PINTO, J.E.B.P. ; SILVA, A.P.O. 1 Biólogo, doutorando em Agronomia/Fisiologia Vegetal, Universidade Federal de Lavras/UFLA Cx. P. 3037 37.2002 000 Lavras, MG, cep 37200-000; * [email protected]. Autor para correspondência Professor do Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras/UFLA Cx. P. 3037 37.200-000 Lavras, MG, cep 3 37200-000. [email protected] Professor do Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras/ 4 UFLA Cx. P. 3037 37.200-000 Lavras, MG, cep 37200-000. [email protected] Professor do Departamento de Agricultura da Universidade Federal de Lavras/UFLA. Cx. P. 3037 37.200-000 Lavras, MG, cep 37200-000. 5 [email protected] Bióloga, colaboradora no Laboratório de crescimento e desenvolvimento de plantas da Universidade Federal de Lavras/UFLA Cx. P. 3037 37.200-000 Lavras, MG, cep 37200-000. [email protected]. RESUMO: Ocimum gratissimum L. é um subarbusto aromático pertencente à família Lamiaceae, produtor de óleo essencial e largamente utilizado na medicina popular. O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito do controle do espectro da luz, utilizando malhas coloridas, sobre o desenvolvimento e teor de óleo essencial em O. gratissimum L. As plantas foram cultivadas por quatro meses sob malhas de 50% de sombreamento nas cores preta, vermelha, azul, e a pleno sol (0%). O óleo essencial foi extraído das folhas secas por hidrodestilação em aparelho de Clevenger modificado. Os resultados permitiram concluir que as plantas crescidas a pleno sol alocaram mais matéria seca para as raízes, enquanto as plantas sob malha azul apresentaram maior alocação de matéria seca para o caule e tiveram maior crescimento em altura. A menor quantidade de matéria seca foliar foi verificada nas plantas crescidas sob malha preta. O teor de óleo essencial das plantas crescidas sob malha azul foi de 1,19%, o que correspondeu a um acréscimo de 142% em relação ao teor verificado nas plantas crescidas a pleno sol. Tais resultados evidenciam que a luz pode ser modulada durante o cultivo a fim de se obter características morfológicas desejáveis e maximizar a produção de princípios ativos nessa espécie. Palavras-chave: Ocimum gratissimum, malhas coloridas, intensidade de luz, qualidade de luz, óleos essenciais ABSTRACT: Vegetative development and essential oil content in plants of Ocimum gratissimum L. under colored nets. Ocimum gratissimum L. is an aromatic subshrub belonging to the Lamiaceae family. This specie is an essential oil producer and widely utilized in folk medicine. The objective of this work was to evaluate the effect of light spectrum control, using colored shade nets, on development and essential oil content in O. gratissimum L. The plants were cultivated by four months under black, red and blue nets with 50% of shade, and full sun (0%). The essential oil was extracted of dry leaves by water distillation in Clevenger apparatus. The results allowed to conclude that the plants grown in full sun allocated more dry matter for the roots, while the plants grown under blue net showed greater allocation of dry matter for stem and it had greater height growth. The smaller amount of dry matter of leaves has been found in plants grown under black net. The essential oil content of plants grown under blue net was 1.19%, which corresponded to an addition of 142% in relation to the yield verified in the plants grown to the full sun. Such results evidence that the light can be modulated during growing in order to get desirable morphologic characteristics and to maximize the production of active principles in this species. Key words: Ocimum gratissimum, colored nets, light intensity, light quality, essential oils Recebido para publicação em 09/11/2007 Aceito para publicação em 30/01/2008 Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.102-107, 2008. 103 INTRODUÇÃO A espécie Ocimum gratissimum L., conhecida como alfavaca, alfavaca-cravo ou alfavacão, é um subarbusto aromático com até 1 m de altura, originário da Ásia e África e, segundo Lorenzi & Matos (2000), é comum sua ocorrência em todo território brasileiro. Nas práticas de medicina caseira, suas folhas são usadas na preparação de banhos antigripais, no tratamento de casos de nervosismo e paralisia e, em chás, como carminativas, diuréticas e antiblenorrágicas (Lorenzi & Matos, 2000). O óleo essencial desta espécie é rico em eugenol, um fenilpropanóide, e apresenta ação analgésica e antisséptica local contra alguns fungos e bactérias (Okiemy-Andissa et al., 2004; Matos, 1998). Estudos recentes têm verificado a bioatividade do óleo essencial de O. gratissimum L. sobre organismos de elevada patogenicidade, como Staphylococcus aureus, Bacillus spp, Pseudomonas aeruginosae , Klebisiella pneumoniae, Proteus mirabilis (Matasyoh et al., 2007), Leishmania amazonensis (Ueda-Nakamura et al., 2006) e Cryptococcus neoformans (Lemos et al., 2005). A síntese e acúmulo de óleo essencial são influenciados de forma significativa e complexa pela luz, uma vez que esta afeta direta ou indiretamente as vias biossintéticas dos metabólitos secundários (Taiz & Zeiger, 2004). Morini & Muleo (2003) afirmam que as plantas desenvolveram uma série de fotorreceptores que regulam seu desenvolvimento em relação às variações da radiação luminosa incidente com o objetivo de aperfeiçoar a captação da energia luminosa para a fotossíntese. As respostas morfofisiológicas das plantas não dependem apenas da presença, atenuação ou ausência da luz, mas também da qualidade espectral da radiação (Taiz & Zeiger, 2004). Neste contexto, o cultivo de plantas utilizando malhas coloridas representa um novo conceito agrotecnológico, que objetiva combinar a proteção física à filtragem diferencial da radiação solar, para promover respostas fisiológicas desejáveis reguladas pela luz (Shahak et al., 2004). A importância de estudos sobre o comportamento fisiológico da flora medicinal brasileira consiste em gerar conhecimentos que possibilitem determinar condições ideais de cultivo a fim de alcançar maiores índices de produção de matéria seca e princípios ativos de interesse econômico e farmacológico. No presente estudo objetivou-se avaliar o efeito do controle do espectro de luz sobre o desenvolvimento e teor de óleo essencial em plantas de Ocimum gratissimum L. MATERIAL E MÉTODO O experimento foi conduzido no Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras (UFLA), no período de janeiro a junho de 2006, sob condições de viveiro. Segundo a classificação de Köppen, o clima regional é do tipo Cwa, mas apresenta características de Cwb com duas estações bem definidas, uma fria e seca, de abril a setembro, e outra quente e úmida, de outubro a março (Brasil, 1992). As mudas de O. gratissimum L. utilizadas no experimento foram formadas a partir de sementes provenientes de plantas adultas do município de Lavras (21o14’S e 45o00’W GRW), cuja altitude é de 918m. A exsicata identificada pelo botânico Eduardo Van der Berg está depositada no Herbário ESAL com o registro 20.0037. As sementes foram semeadas em tubetes plásticos com substrato Plantmax® e mantidas em viveiro sob 50% de sombreamento, por 60 dias. As mudas com aproximadamente 6 cm de altura, foram transplantadas para vasos de 6 litros com substrato à base de terra de subsolo e areia na proporção de 2:1, ao qual foi incorporado superfosfato simples (300 g m-3), cloreto de potássio (300 g m-3) e agrosilício (1000 g m-3), este último contendo 40% de CaO e 11% de MgO. As mudas foram divididas em quatro grupos de 50 unidades cada e submetidas, por 120 dias, aos tratamentos de sombreamento: sob malhas ChromatiNet vermelha (50%), azul (50%) e preta (50%) e a pleno sol (0%). Segundo Oren-Shamir et al. (2001), as malhas coloridas diferem nos espectros de transmitância da radiação fotossinteticamente ativa: o espectro da malha azul apresenta um pico principal de transmitância na região do azul-verde (400-540 nm), enquanto a malha vermelha possui maior transmitância para comprimentos de ondas superiores a 590 nm. Ao final do experimento, foram avaliadas as seguintes características de crescimento: altura do ramo principal, diâmetro do caule, área foliar, matéria seca das folhas, caules e raízes, em 5 plantas de cada tratamento, tomadas ao acaso. A altura foi medida com régua a partir do colo ao ápice da planta (gema terminal) e o diâmetro do caule foi medido a 1 cm do solo, com o auxílio de paquímetro com precisão de 0,01 mm. A área foliar total por planta foi medida utilizando-se um integrador de área foliar MODEL LI3100 Area Meter - LICOR. As plantas foram separadas em folhas, caules e raízes e todo o material foi seco em estufa com circulação forçada de ar a 70 ± 2ºC, até biomassa constante, utilizando-se de uma balança analítica com precisão de 10-4g. A razão área foliar (RAF), razão peso foliar (RPF) e área foliar específica (AFE) foram determinadas de acordo com Benicasa (1988). O experimento foi conduzido seguindo delineamento inteiramente casualizado. Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.102-107, 2008. 104 utilizando-se o programa estatístico SISVAR 4.3 (Ferreira, 1999) e as médias entre os tratamentos foram comparadas pelo teste de Tukey, a 5% significância. Para a obtenção do óleo essencial, folhas de 40 plantas de cada tratamento foram coletadas às 12 horas e acondicionadas em sacos de papel Kraft para secagem em estufa com circulação forçada de ar, a 35ºC, até biomassa constante. A extração do óleo essencial foi realizada a partir de 4 amostras de 15 g de folhas secas por tratamento através de hidrodestilação em aparelho de Clevenger modificado por Wasicky & Akisue (1969), durante 90 minutos. Em cada repetição utilizou-se 500 mL de água destilada. O hidrolato obtido foi submetido à partição líquido-líquido em funil de separação, com três porções de 25 mL de diclorometano, por 20 minutos cada. As frações orgânicas de cada repetição foram reunidas e secas com uma porção em excesso de sulfato de magnésio anidro. O sal foi removido por filtração simples e o solvente, evaporado à temperatura ambiente em capela de exaustão até alcançar peso constante, obtendo, assim o óleo essencial purificado. Os resultados dos teores do óleo essencial foram expressos em porcentagem de óleo essencial (%) em relação à matéria seca. RESULTADO E DISCUSSÃO As plantas de Ocimum gratissimum L. apresentaram alterações no desenvolvimento e teor de óleo essencial em função do controle do espectro de luz durante o cultivo. Plantas crescidas sob malha azul apresentaram maior crescimento em altura (Tabela 1). De acordo com Oren-Shamir et al. (2001), a malha azul permite maior transmissão para os comprimentos de onda na faixa do azul e vermelhodistante e, segundo Morgan & Smith (1979), quanto maior o conteúdo de radiação vermelho-distante, maior é a taxa de alongamento do caule nas heliófitas. Este resultado reforça a afirmação de Fiallo et al. (1996) de que O. gratissimum L. pode ser considerada uma espécie heliófita. O alongamento do caule caracteriza uma resposta de evitação à sombra em heliófitas para maior captação da energia luminosa, indicando o envolvimento do fitocromo na percepção da sombra (Taiz & Zeiger, 2004). As plantas crescidas a pleno sol apresentaram maior diâmetro do colo que as plantas crescidas sob malha preta, evidenciando que a redução da intensidade de luz, sem a alteração da qualidade espectral, proporciona plantas de caule mais delgado. O cultivo de O. gratissimum L sob malhas coloridas, vermelha e azul, proporcionou maiores áreas foliares que o cultivo a pleno sol; no entanto, o acúmulo de matéria seca não diferiu entre esses tratamentos. As plantas crescidas sob malha preta foram as que acumularam a menor quantidade de matéria seca nas folhas. A qualidade espectral da radiação transmitida pela malha azul ocasionou acréscimo de matéria seca no caule das plantas sombreadas. As plantas a pleno sol obtiveram maiores ganhos de massa seca da raiz e massa seca total que as plantas crescidas sob malha preta. Segundo Larcher (2004), as plantas TABELA 1. Altura, Diâmetro do colo, Matéria Seca (MS) de folhas, caules, raízes e total e razão Raiz/Parte aérea de plantas de O. gratissimum L., submetidas a diferentes condições de sombreamento. * Médias seguidas pela mesma letra na linha não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.102-107, 2008. 105 heliófitas utilizam com eficiência altas intensidades de radiação graças à elevada capacidade do sistema de transporte de elétrons e, desta forma, conseguem maiores ganhos fotossintéticos. Dentre os tratamentos sombreados, as malhas coloridas proporcionaram às plantas maior eficiência na aquisição de biomassa. A razão raiz/parte aérea foi maior a pleno sol, indicando uma alocação preferencial de matéria seca para o sistema radicular. A proporção de biomassa alocada para a raiz não diferiu estatisticamente entre os tratamentos sob malhas (Tabela 1). Isto evidencia que a alocação de matéria seca para as raízes ocorre preferencialmente em função da intensidade luminosa. Walters et al. (1993) afirmam que plantas sombreadas distribuem menos matéria seca para raízes, indicando uma resposta adaptativa que proporciona maiores ganhos de carbono, como um aumento na razão de área foliar, ou que reflita numa estratégia em busca de luminosidade. A pleno sol, as plantas apresentaram menor valor de AFE (Figura 2) e estatisticamente diferente das plantas crescidas sob malha azul. Este resultado demonstra a plasticidade morfológica de O. gratissimum L. em resposta não somente à intensidade luminosa, mas também à qualidade espectral da luz. A AFE relaciona a superfície e o peso da folha, representando sua espessura. Larcher (2004) afirma que as plantas que crescem sob forte radiação desenvolvem folhas espessas e apresentam um metabolismo mais ativo, o que proporciona maior produção de matéria seca com maior conteúdo energético. FIGURA 1. Valores da Área Foliar Específica (AFE), Razão de Área Foliar (RAF) e Razão Peso Foliar (RPF) em plantas de O. gratissimum L. submetidas a diferentes malhas coloridas. As médias seguidas da mesma letra não diferem significamente entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. Os valores de RAF das plantas cultivadas sob malhas coloridas não diferiram estatisticamente, porém, foram superiores ao das plantas crescidas a pleno sol. Os aumentos na RAF constituem uma adaptação da planta à baixa luminosidade, representando maior proporção de tecido fotossinteticamente ativo na forma de área foliar. A baixa RAF no tratamento em pleno sol pode ser considerada como benéfica, uma vez que menos material vegetal é exposto a eventuais danos causados pela alta intensidade de luz. Os menores valores de RPF verificado nas plantas crescidas sob pleno sol e sob malha azul indicam que houve menor alocação de fotoassimilados para as folhas em relação à biomassa total produzida, nesses ambientes, ou seja, O. gratissimum L. investiu menor quantidade de biomassa em folhas. Os teores de óleo essencial foram significantemente afetados pelas condições de cultivo sob malhas coloridas (Figura 2). Plantas crescidas a pleno sol obtiveram o menor teor de óleo essencial dentre os tratamentos, provavelmente, como conseqüência da menor área foliar e alocação preferencial de biomassa para o sistema radicular, devido à elevada radiação. Tal resultado permite inferir que o sombreamento de 50% favorece a produção de óleo essencial em O. gratissimum L. e que as respostas fisiológicas são variáveis em função das Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.4, p.102-107, 2008. 106 FIGURA 2. Teor de óleo essencial de folhas de Ocimum gratissimum L. crescidas sob diferentes condições de sombreamento. As médias seguidas da mesma letra não diferem significamente entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. espécies, uma vez que, em plantas de Ocimum selloi, o sombreamento parcial de 50% não causou variações com a redução da intensidade luminosa (Gonçalves et al., 2003). A radiação transmitida pela malha azul proporcionou aumento correspondente a 142% do teor verificado nas plantas jovens a pleno sol. Por isso, pode-se inferir que o sombreamento com malha azul alterou o metabolismo secundário em O. gratissimum L. Dentre as diversas enzimas importantes na biossíntese de moléculas presentes no óleo essencial, a fenilalanina amonialiase tem sido considerada como reguladora na formação de fenilpropanóides, como o eugenol, e sua atividade pode ser alterada pela luz azul (Taiz & Zeiger, 2004). O presente estudo demonstrou que a qualidade espectral da radiação solar pode ser modulada durante o cultivo a fim de se obter características morfológicas desejáveis e maximizar a produção de princípios ativos nessa espécie. AGRADECIMENTO À FAPEMIG, pelo suporte financeiro. REFERÊNCIA BENINCASA, M.M.P. Análise de crescimento de plantas (noções básicas). Jaboticabal: FCAV-UNESP, 1988. 41p. BRASIL. Ministério da Agricultura e Reforma Agrária. Normas climatológicas de 1961- 1990. Brasília,1992. 84p. FERREIRA, D.F. SISVAR 4. 3-Sistema de analises estatísticas. Lavras: UFLA, 1999. FIALLO, V.R.F.; MEDINA, N.N.R.; FERRADÁ, C.R. Acerca de la propagacion de Ocimum gratissimum L. 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