PRECISÃO GRAMATICAL E PROFICIÊNCIA ORAL EM LÍNGUA

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Revista Contexturas, n° 24, p. 50 - 71, 2015. ISSN: 0104-7485
PRECISÃO GRAMATICAL E PROFICIÊNCIA ORAL EM LÍNGUA
INGLESA: UM ESTUDO DE CASO
Douglas Altamiro CONSOLO1
Isabella DALLACQUA2
Aline Mara FERNANDES3
UNESP, São José do Rio Preto, SP
RESUMO
Neste trabalho apresentamos resultados de uma investigação que objetiva descrever a
precisão gramatical, em língua inglesa, nas falas de alunos-formandos em Letras
produzidas em apresentações orais de seminários em sala de aula, com o intuito de
categorizar os desvios gramaticais, visando a colaborar para uma descrição da
proficiência oral em inglês desses alunos.
Palavras-chave: Avaliação; Precisão gramatical; Proficiência oral.
ABSTRACT
In this paper we present results from an investigation that aimed at describing
grammatical accuracy in spoken English, in utterances of students graduating from a
Letters course, produced in oral presentations in class, with the goal of categorizing
the grammatical deviations, and of helping towards a description of the students’ oral
proficiency.
Keywords: Assessment; Grammatical accuracy; Oral proficiency.
1
E-mail de contato: [email protected]
E-mail de contato: [email protected]
3
E-mail de contato: [email protected]
2
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Introdução
Quando pensamos nos fatores que influenciam o ensino de uma língua
estrangeira (LE), um dos aspectos importantes para se considerar consiste no
nível de proficiência na língua-alvo do professor, para o exercício da
docência. E sabemos que a realidade de uma formação acadêmica de
professores de LE, no que se refere a cursos e certificações para o ensino, nem
sempre garante que esses professores recém-formados terão um nível de
proficiência linguística desejado para a profissão (CONSOLO, 2011;
FERNANDES, 2011).
Uma discussão atual e relevante na área de formação de professores
de línguas estrangeiras abrange a questão da proficiência linguística
necessária para que tais professores possam, e se apropriado para os contextos
nos quais lecionam, ministrar suas aulas na língua estrangeira (LE) que
ensinam, em vez de conduzirem suas aulas em língua materna. E, para
constatarmos os níveis de proficiência dos professores, em formação e
formados, contamos com os conhecimentos e procedimentos da área da
avaliação de proficiência em línguas.
No âmbito da Linguística Aplicada, vários estudos, hoje, se
preocupam com a questão da avaliação. O projeto “Avaliação da proficiência
linguístico-comunicativa-pedagógica
do
professor
de
línguas:
operacionalização de construto no Exame de Proficiência para Professores de
Língua Estrangeira”, por exemplo (CONSOLO, 2011), constitui uma proposta
com intuito de definir critérios mais específicos para a avaliação da
proficiência dos profissionais recém-formados em cursos de Licenciatura em
Letras. O referido projeto almeja, principalmente, a implementação do EPPLE
(Exame de Proficiência para Professores de Línguas Estrangeiras) no Brasil,
um exame que considera não somente a competência linguística do professor
em termos de sua proficiência para usos diversos e gerais da LE, mas também
sua habilidade para lidar com a metalinguagem em sala de aula.4
A pesquisa relatada neste artigo, conduzida em caráter de iniciação
científica (IC), objetivou colaborar com o projeto maior de elaboração do
EPPLE, considerando a teoria em avaliação e uma coleta de dados de natureza
oral e, por meio da discussão envolvendo esses aspectos, chegar a resultados
que poderão ser usados para uma posterior comparação com resultados de
4
Sobre a proposta do EPPLE, vide Consolo e Teixeira da Silva, 2014, e Consolo et
alii, 2009.
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futuras versões e aplicações do EPPLE, já que todos os alunos em questão
neste estudo são possíveis candidatos ao referido exame. Os dados foram
coletados em uma universidade pública, no interior do estado de São Paulo,
com alunos-formandos (cursando o último ano) de um curso de Licenciatura
em Letras Inglês-Português.
Almejamos, com o relato de pesquisa e a discussão apresentados neste
artigo, contribuir também para a divulgação, a professores de língua inglesa e
outros profissionais, de algumas bases teóricas sobre precisão gramatical na
oralidade e dos resultados de nosso estudo, motivando outros estudos
semelhantes que possam ampliar nossos conhecimentos sobre avaliação de
proficiência em línguas estrangeiras.
Objetivos da investigação
Objetivos Gerais
O objetivo do trabalho de IC aqui apresentado foi realizar uma análise
de dados sobre a proficiência oral de futuros professores de inglês como
língua estrangeira, por meio (a) da transcrição de apresentações orais, em
inglês, feitas por alunos do último ano do curso de Licenciatura em Letras,
que constituem dados do projeto “Avaliação da proficiência linguísticocomunicativa-pedagógica do professor de línguas: operacionalização de
construto no Exame de Proficiência para Professores de Língua Estrangeira
(EPPLE)”,5 iniciado em 2011 (CONSOLO, 2011), para dar continuidade às
metas propostas para elaboração e implementação do exame, e para o
estabelecimento de sua validade; e (b) da investigação de características
linguísticas presentes nas transcrições das falas dos alunos.
Buscou-se, à luz dos subsídios teóricos que embasam a investigação
das características e da qualidade da fala, em inglês, de alunos-professores em
formação, analisarem-se aspectos linguísticos dessas falas e, especificamente
neste projeto, a qualidade da precisão gramatical na produção oral, em língua
inglesa, dos licenciandos. Foi feita uma análise dos tipos de desvios
gramaticais nas falas dos alunos e da frequência da ocorrência desses desvios,
tendo como referência uma unidade de análise denominada AS-unit (Unidade
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de Análise de Fala), critério este sugerido por Foster et al. (2000) e utilizado
anteriormente por Busnardi (2012). Salienta-se que, no caso deste projeto, não
são tratados propriamente os dados do EPPLE, e sim dados de produção oral
de alunos candidatos ao EPPLE, em uma situação autêntica e real de uso da
língua inglesa, a saber, as apresentações de seminários temáticos em sala de
aula.
As atividades desenvolvidas nesta investigação, além de contribuir
para a elaboração e implementação do referido exame de proficiência
proposto para (futuros) professores de línguas estrangeiras no contexto
brasileiro, salientando possíveis características gramaticais do desempenho
linguístico desses (futuros) professores em contexto de ensino/aprendizagem
da língua estrangeira, fornecem subsídios para futuros trabalhos de pesquisa
na área de ensino/aprendizagem de línguas, especialmente nos estudos sobre
avaliação.
Objetivos Específicos
1) Transcrever 13 (treze) gravações de apresentações orais de
seminários, realizadas por alunos do último ano do curso de
Licenciatura em Letras com habilitação em inglês e português, de
uma universidade pública do estado de São Paulo. As apresentações
orais, em inglês, foram gravadas em áudio e em vídeo.
2) Uma vez produzidas as transcrições, objetivou-se categorizá-las com
base no conceito de AS-unit (Unidade de Análise de Fala), e elencar
uma tipologia de desvios gramaticais presentes nos dados, utilizandose também procedimentos de quantificação (frequência de desvios),
para avaliação da precisão gramatical na produção oral dos
participantes do projeto.
Conceitos Teóricos
Proficiência Oral
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A caracterização da proficiência oral (PO) do professor de inglês
como língua estrangeira faz-se necessária devido a um nível mínimo exigido
para que o formando em um curso de Licenciatura em Letras com habilitação
em língua inglesa possa atuar como profissional nessa área, utilizando a
linguagem oral especificamente para esse fim.
Neste trabalho, focou-se na competência e na proficiência dos alunosformandos em Letras, observando as manifestações linguístico-comunicativas
da língua. De acordo com Llurda (2000), a habilidade de comunicação pela
linguagem (communicative language ability), divide-se em proficiência
linguística e proficiência comunicativa. Nesse caso, o profissional tem que se
preocupar tanto com aspectos do código linguístico, como a gramática, e com
a habilidade de se comunicar efetivamente na língua, ou seja, “passar a
mensagem”. Para Edmonson (1981, apud LLURDA, 2000: 88) competência
linguística significa codificação, decodificação e sequenciamento de atos
comunicativos, o que também inclui o conhecimento dos códigos linguísticos
da língua.
Como já mencionado, um aspecto importante a ser levado em
consideração na avaliação da proficiência linguística é a gramática, uma vez
que ela é um dos fatores essenciais na produção e estruturação da fala. No
entanto, ao observamos a precisão gramatical do aluno, faz-se necessário levar
em consideração o fato de que a fala é marcada pela imprevisibilidade, sendo,
neste e em outros aspectos, diferente da escrita. No presente trabalho, em que
são avaliados seminários em contextos reais da fala em sala de aula, os
aspectos característicos da fala devem ser levados em conta, e, por isso,
situações com autocorreções instantâneas feitas pelo próprio falante, por
exemplo, foram desconsideradas, analisando-se somente os desvios
gramaticais que não foram corrigidos ou modificados.
Unidade de Análise: a AS-unit
Para a segmentação e análise da linguagem oral, Foster et al. (2000)
sugerem uma unidade de análise sintática denominada AS-unit (Unidade de
Análise da Fala), definida como: “o enunciado de um único falante que
consiste em uma oração independente, ou numa unidade não oracional, junto
com qualquer oração(ões) subordinada(s) associada(s) a elas. (…)” (FOSTER
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et al., 2000, p. 365).6 Ao sugerirem o modo de se fazer a segmentação dos
dados, Foster et al. (2000) conseguem abarcar as peculiaridades da língua
falada relevantes para a análise de dados orais. Nesta pesquisa, a AS-unit foi
adotada, portanto, como a unidade de análise dos dados.7.
A título de ilustração, vejamos as considerações de Borges-Almeida
(2009, p. 82) sobre essa unidade de análise, com base nos exemplos de Foster
et al (2000, p. 369, 364).
(a) A: | oh that’s a big problem
B: oh no!
A: :: because my shop’s policy is only :: to give the credits for the
return goods |
(b) A: I think um (3.0) yeah it’s hard maybe he like her but no like
a girlfriend, just a
B: just like a sister
A: yeah
Em (a), A continua falando apesar da interrupção de B, portanto
temos a continuação da mesma AS-unit. Em (b), temos um fenômeno de
andaime. B completa o turno de A e, por isso, recebe uma AS-unit. Se A
tivesse repetido “just like a sister” e continuado, teríamos uma mesma ASunit, a partir da última fala sua. Como ele apenas diz “yeah”, temos de
desconsiderar “just a”, colocando como um falso início e considerar “yeah”
como uma unidade completa.
Metodologia da Investigação
A primeira etapa do trabalho consistiu na elaboração de transcrições
de seminários apresentados por dezenove alunos-formandos do curso de
Licenciatura em Letras, no ano de 2012, em uma universidade do interior de
São Paulo. Dentre treze seminários, sete deles foram apresentados
individualmente e os seis restantes em duplas. Todos os seminários foram
6
No original: a single speaker’s utterance consisting of an independent clause or sub-clausal
unit, together with any subordinate clause(s) associated with either.
7
A AS-unit é explorada mais detalhadamente na seção seguinte (seção 4) deste artigo.
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gravados em formato de áudio e de vídeo. É importante ressaltar que nem
todo o material pode ser aproveitado por problemas em relação à qualidade do
áudio. Devido a fatores externos, como barulhos e conversas fora da sala de
aula, ou alunos que falaram muito baixo durante o seminário, tornou-se difícil
o entendimento claro de todas as suas falas. Cinco transcrições tiveram que
ser descartadas, pois não havia material suficiente para a análise da
proficiência oral dos alunos em questão. Em um específico seminário, as
alunas apenas leram toda a apresentação dos slides, o que não demonstra uma
situação de uso real da língua em termos de manifestações de proficiência em
produção oral e, por isso, também foi descartado.
As transcrições dos seminários foram feitas de acordo com um
sistema de códigos para que se pudesse identificar características da fala dos
interlocutores, tais como:
A = fala do aluno/examinado
P = fala da professora-participante
(school) = o que provavelmente foi dito
(INCOMP) = fala incompreensível
+ = pausa breve (menos de 1 segundo)
[2] = duração de pausa em segundos
{ASC} = entonação ascendente
{DESC} = entonação descendente
? = entonação típica de pergunta
((risada)) = ocorrências paralinguísticas
[
] = falas simultâneas
= = turno interrompido
: = alongamento de som
/.../ = quebra de turno para fins de categorização
ENglish = sílaba enfatizada
- - = trechos desconsiderados para análise
Os onze alunos que participaram deste estudo foram identificados por
letras, de A a K.
Assim que as transcrições eram finalizadas, eram revisadas pelo
professor-orientador do estágio de IC e também por outra pesquisadora
participante do projeto do EPPLE.
A próxima etapa do trabalho consistiu na segmentação dos dados das
transcrições em AS-units, como já mencionado anteriormente, unidade de
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análise escolhida para este trabalho, a qual é uma unidade de base sintática,
que considera características relevantes da produção oral, tais como
marcadores conversacionais, pausas, autocorreções e falsos inícios.
Primeiramente, colocamos entre chaves {...} os trechos disfluentes,
que podem ser pausas preenchidas, marcadores conversacionais, falsos
inícios, palavras não lexicalizadas, reestruturação, ou trechos produzidos em
português, dentre outros. Após a demarcação desses trechos disfluentes, as
AS-units são demarcadas por barras verticais |...|, nas quais orações
coordenadas entre si são delimitadas separadamente e orações principais e
suas subordinadas são delimitadas juntas. É importante ressaltar que
autocorreções foram desconsideradas neste trabalho, assim como os trechos
disfluentes, e os trechos demarcados por hifens - -, pois não continham
material suficiente para análise.
Depois de termos as transcrições segmentadas em AS-units, foi
realizada manualmente a contagem de unidades produzidas por cada aluno e o
levantamento de desvios, para, posteriormente, calcular o índice de desvios
cometidos pelos alunos em cada unidade.
Segue a fórmula para calcularmos o índice de desvio por unidade:
Índice desvio-unidade = frequência de desvios ÷ frequência de AS-units
Portanto, para a apresentação dos resultados obtidos na análise, cada
aluno terá sua apresentação brevemente comentada individualmente e
exemplificada com um dos desvios encontrados, seguido de um gráfico com
seus desvios divididos em categorias, e o resultado de seu índice de desvio por
unidade.
É importante ressaltar que várias dificuldades em relação às
transcrições foram encontradas. Problemas com áudio ou até mesmo com o
sotaque do aluno, fazia com que a aluna-estagiária tivesse que ouvir muitas
vezes cada seminário, e em alguns casos, isso não era suficiente. No entanto,
o trabalho realizado muito contribuiu para a formação da aluna-estagiária,
pois exigiu um bom entendimento oral da língua inglesa para a realização das
transcrições, um conhecimento sintático para a divisão das AS-units e um
conhecimento linguístico da língua-alvo para o levantamento de dados.
Análise dos Dados
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Conforme mencionado anteriormente, os dados desta pesquisa foram
obtidos a partir das transcrições de treze seminários apresentados no ano de
2012 por alunos-formandos de um Curso de Licenciatura em Letras de uma
universidade do estado de São Paulo. Como cinco desses seminários foram
descartados, serão apresentados os resultados da análise de apenas oito
seminários, com o total de onze alunos-participantes.
Para cada aluno, foi feita uma análise qualitativa e uma quantitativa
de sua apresentação. Para a análise qualitativa, levantamos os desvios e os
dividimos em categorias. Todos os desvios foram levantados tomando-se
como base a língua inglesa padrão, desconsiderando os casos em que os
alunos se corrigiam imediatamente. Para a análise quantitativa, contamos o
número de desvios cometidos por cada aluno e o dividimos pelo número de
AS-units, contado manualmente pela estagiária. Assim, foi possível encontrar
o índice de desvios por unidade de cada aluno.
Como não foram encontrados apenas desvios gramaticais, utilizou-se
o mesmo sistema de categorização utilizado por Busnardi (2012), no qual se
incluiu a categoria de léxico (lex), uma vez que o uso indevido de uma palavra
pode provocar desvios sintáticos, levando a um possível desvio gramatical.
Também incluímos a categoria sintaxe (sin), na qual se enquadraram os
desvios difíceis de serem classificados em apenas uma categoria, pois
envolviam mais de um constituinte no enunciado.
Precisão gramatical nos seminários
Na Tabela 1, abaixo, segue o número de AS-units, o número de
desvios e o índice de desvios-unidade cometidos por cada aluno nos
seminários apresentados. É importante ressaltar que, quanto menor o índice
desvio-unidade do aluno, maior a sua proficiência oral.
Aluno
A
B
C
D
E
F
G
Número de
AS-units
45
36
32
27
69
44
20
Frequência absoluta
de desvios
6
7
3
9
16
2
3
Índice de
desvios
13%
16%
9%
33%
23%
4%
15%
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32
9
28%
H
36
9
25%
I
97
12
12%
J
K
65
7
10%
Tabela 1: Índices quantitativos da precisão gramatical dos alunos nos seminários
A partir dos resultados, pode-se notar que a maioria dos alunos
apresentou um número alto no índice de desvio-unidade. No entanto, é
importante levar em consideração que alguns seminários foram apresentados
individualmente e, outros, em duplas. Por isso a grande diferença de
quantidade de AS-units produzidas por cada aluno. No caso da aluna J, que
produziu noventa e sete AS-units, maior número produzido na turma, seu
índice de desvios não foi tão alto em relação aos demais (12%). Já no caso da
aluna D, que produziu apenas vinte e sete AS-units, segundo menor número da
turma, seu índice foi o maior em relação aos demais (33%).
É relevante também salientar que todos os alunos em questão são
possíveis candidatos ao EPPLE. Se testados, a partir dos resultados
quantitativos nesta investigação, será possível verificar a relação dos índices
quantitativos com suas faixas classificatórias no exame, em estudos futuros.
Apresentamos, a seguir, um quadro das categorias dos desvios
gramaticais encontrados nos seminários e as siglas utilizadas, na análise dos
desvios, para cada categoria.
Sigla
Adv
Art
Lex
Flex
Prep
Pron
Sint
Verb
Significado
Advérbio
artigo ou determinante
léxico (escolha lexical inadequada)
flexão de nome
Preposição
Pronome
sintaxe (estruturação sintática inadequada)
verbo (tempo e/ou aspecto inadequado(s))
Quadro1: Categorias dos desvios gramaticais nos seminários
Trataremos, na sequência deste artigo, da apresentação dos desvios
cometidos por cada aluno.
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A aluna A produziu 45 AS-units e cometeu seis desvios, resultando
em um índice de 13%. Como mostra o gráfico, seus desvios se dividiram em
três categorias, entre elas verb (três desvios), sint (2) e prep (1).
Excerto 1
001 A
|community college + {ahm} + can be considered a: preparation before
to go to the college or university|
Como vemos no excerto 1, a aluna apresenta um desvio na forma
verbal ao usar a partícula to em to go, ao invés de usar a forma com –ing
(going) requerida pela preposição before, que a antecede.
A aluna B produziu 36 AS-units, cometeu sete desvios e ficou com
um índice de 19%. Como mostra o gráfico a seguir, os sete desvios deste
aluno se estenderam por cinco categorias, são elas: verb (2), sint (1), prep (1),
flex (2) e lex (1).
Excerto 2
005
B
|the class time is generally is from eight to three p.m. |
Como vemos no excerto 2, a aluna B utilizou o verbo is novamente
em sua sentença, apresentando um erro sintático. Consideramos esse caso
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como erro devido ao fato de não haver pausas significativas entre a forma
verbal is e o advérbio generally, nem entre o advérbio e a segunda ocorrência
de is. Se houvessem pausas localizadas entre essas palavras, poderiam indicar
que a aluna, na verdade, refez o enunciado enquanto o produzia, ou seja,
alterou o que iria dizer, de “the class time is from eight to three p.m.” para
“the class time generally is from eight to three p.m.” e neste caso, a repetição
da forma is não seria um desvio gramatical, mas um aspecto presente na
gramática da modalidade oral.
No contexto de sua ocorrência, esse desvio também não prejudicou o
entendimento dos demais interlocutores, mas, em algum outro contexto, isso
poderia ter interferido na comunicação. Levando em consideração seu índice
de 16%, um pouco acima da média da turma, podemos dizer que a aluna
comete erros básicos referentes à gramática da língua inglesa, porém, a
compreensão da sua fala pelos interlocutores não é tão prejudicada.
O aluno C produziu 32 AS-units e cometeu apenas 3 desvios,
resultando em um índice de desvios de 9%. Como podemos observar no
gráfico abaixo, os desvios desse aluno se dividiram entre três categorias,
tendo cada uma um desvio, sendo elas prep, lex e art.
Excerto 3
|today we can climb the + three hundred + fifty four steps + to look + through +
{ahm} + crowd + and watch the back of + new york + and new jersey|
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Como se pode observar no excerto 3, o aluno C não utilizou o artigo
the em through the crowd, e, na segunda parte, usou o verbo watch ao invés
de see, por exemplo. Nos dois casos os desvios podem causar confusão no
entendimento da sua fala.
O aluno D produziu 27 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando em
um índice de 33%. Como podemos observar em seu gráfico, seus desvios se
dividiram entre cinco categorias, sendo elas verb (2), sint (1), prep (4), lex (1)
e art (1).
No excerto 4, observamos que o aluno não utiliza o pronome it, e
como envolve vários termos na oração, podendo comprometê-la, esse desvio
foi classificado como de sintaxe. No outro desvio, o aluno utiliza a proposição
on em vez da preposição in. Levando-se em consideração seu alto índice de
desvios, o mais alto da sala, conclui-se que esse aluno comete um grande
número de desvios, que podem ou não prejudicar a comunicação.
Excerto 4
|and since then + has been essential to economy + on orlando + and all unites states|
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O aluno E produziu 69 AS-units e cometeu 16 desvios, resultando em
um índice de 23%. Como podemos observar em seu gráfico, seus desvios se
dividiram entre cinco categorias, sendo elas verb (12), sint (1), lex (1), prep
(1) e art (1).
Excerto 5
|and + one day + they have a idea|
No excerto 5, vemos que o aluno cometeu dois desvios. Um em
relação ao verbo, que deveria estar no passado na forma had, e um em relação
ao artigo, que deveria ser an ao invés de a. Nesse contexto, nenhum dos
desvios prejudicou a comunicação, no entanto, o uso incorreto das formas
verbais poderia atrapalhara compreensão da fala em outros contextos.
Levando-se em conta seu índice de 23%, que é maior que o da média da
classe, conclui-se que o aluno cometeu vários desvios, mas isso também pode
estar ligado ao fato que ele também produziu bem mais unidades do que a
média da produção da classe.
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O aluno F produziu 44 AS-units e cometeu apenas 2 desvios,
resultando em um índice de 4%, o menor da classe. Como podemos observar
no gráfico abaixo, seus desvios foram apenas relacionados à categoria dos
verbos.
Excerto 6
| [2] the popularity + of the holiday + has become proFItable for comercials|
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No excerto 6 vemos que o aluno F não utilizou corretamente a forma
no passado do verbo become, que deveria ser became, no passado simples,
devido ao contexto do enunciado, em vez de o presente perfeito. Esse tipo de
desvio pode prejudicar a compreensão da fala em certos contextos como já
dito anteriormente, mas esse aluno apenas cometeu dois desvios, o que nos diz
que sua precisão gramatical é bem alta em relação aos demais alunos.
O aluno G produziu apenas 20 AS-units e cometeu 3 desvios,
resultando em um índice de 15%. Em seu gráfico observamos que este aluno
teve seus desvios distribuídos em apenas duas categorias, sendo elas verb (2)
e prep (1).
Excerto 7
|+ would you to read please?|
No excerto 7 vemos que o aluno fez o uso incorreto da preposição to,
que não era necessária nessa sentença. Pelo índice deste aluno, diríamos que
sua precisão é boa em relação aos demais alunos por estar abaixo da média da
turma, porém, esse baixo índice pode se dar pelo fato da pequena produção de
AS-units (20), sendo a menor produção entre os alunos investigados.
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O aluno H produziu 32 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando um
índice de 28%. Pelo seu gráfico, vemos que os desvios deste aluno foram
divididos em quatro categorias, sendo elas verb (3), sint (2), lex (1) e art (3).
Excerto 8
|is very important + this movie + because + {é} + talk about a his + a history of +
american civil war + in eighteen five two|
No excerto 8, no primeiro desvio, vemos que o aluno utilizou, em vez
de o artigo the, o artigo a, e no segundo desvio, verificamos que o aluno diz
eighteen five two ao invés de eighteen fifty-two, o que foi considerado como
erro de uso do léxico. Os desvios relacionados ao léxico podem causar
problemas na compreensão da fala desse aluno. De acordo com seu índice,
que está acima da média, esse aluno cometeu bastante desvios e sua precisão
gramatical não é tão alta em relação aos demais alunos.
O aluno I produziu 36 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando em
um índice de 25%. Em seu gráfico vemos que seus desvios foram distribuídos
em quatro categorias, sendo elas verb (4), sint (1), lex (1) e art (3).
Excerto 9
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|{ahn} steve vai is a complete music|
No excerto 9, verifica-se mais um caso de uso incorreto do léxico. O
aluno usa music ao invés de musician. Esse aluno apresenta desvios muito
básicos em relação à língua-inglesa padrão, apesar de seu índice de desvios
não ser o mais baixo.
O aluno J produziu 97 AS-units (maior número da sala) e cometeu 12
desvios, resultando em um índice de 12%. Em seu gráfico observamos que
seus desvios se dividiram em cinco categorias, sendo elas verb (5), pron (1),
prep (1), lex (1), art (4).
Excerto 10
| + frank mardi gras + it came + to america + in sixteen + ninety nine + with a
french + exploration|
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No excerto 10 vemos que a aluna utilizou inseriu o pronome it no
enunciado de forma incorreta, pois a forma pronominal correta seria he. Pelo
seus índices de produção oral e de desvios, pode-se concluir que a fala dessa
aluna tem uma boa precisão gramatical, pois produziu 97 AS-units, um
número bem elevado se comparado aos demais alunos, e cometeu 12 desvios.
O aluno K produziu 65 AS-units e cometeu 7 desvios, resultando em
um índice de 10%. Em seu gráfico observamos que seus desvios foram
distribuídos em quatro categorias, sendo elas verb (1), sint (1), prep (1) e art
(4).
Excerto 11
|this is characteristics + for this movement|
No excerto 11 podemos observar três desvios. Ao voltarmos ao áudio,
percebemos que o aluno estava mostrando algo no slide, por isso, deveria ter
dito these are the characteristics. Portanto, temos dois desvios relacionados a
artigos e um a verbo. Pela sua alta produção de AS-units (65) e seu baixo
índice de desvios, podemos concluir que, mesmo com alguns desvios básicos,
sua precisão gramatical é alta.
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Na totalidade da contagem absoluta das ocorrências dos desvios
gramaticais, a maioria ocorreu na categoria “verbos”, contabilizando 35
desvios, seguida das contagens de 11 desvios tanto para “itens lexicais” como
para “preposições”. Verifica-se ainda que, para o aluno E, para quem
contabilizou-se a maior produção de AS-units (69 AS-units), o número maior
de desvios cometidos por esse aluno foi justamente na categoria “verbos”, um
desvio na categoria “itens lexicais” e um desvio na categoria “preposições”,
equiparando-se, nesses dois últimos itens, à maioria dos demais alunos
investigados. Tais dados nos levam a depreender desses resultados que (a) o
uso de formas e de tempos verbais representa um desafio maior para
aprendizes de inglês como língua estrangeira e (b) parece ser necessário
trabalhar-se mais, praticar mais a LE de modo a permitir que os aprendizes
consolidem melhor o uso dos verbos na linguagem oral, o mesmo valendo
para itens lexicais e uso de preposições. E ainda que (c) essas três categorias
possam ter saliência nos critérios de avaliação de proficiência oral, no que
tange a questão da precisão gramatical em língua inglesa.
Passamos, agora, às considerações finais sobre nossa investigação.
Considerações Finais
Este trabalho teve o intuito de contribuir com o projeto maior em
vigência do exame EPPLE, o qual visa avaliar a proficiência oral e
comunicativa dos alunos-formandos em Letras, de recém-formados
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professores de língua estrangeira, bem como de professores no exercício da
profissão, através de dados qualitativos e quantitativos da proficiência oral.
A primeira parte do nosso trabalho consistiu na transcrição de treze
seminários em contexto real de sala de aula, apresentados por dezenove
alunos-formandos no curso de Letras, em uma universidade do interior de São
Paulo. O material analisado neste trabalho totalizou oito apresentações de
seminários e onze alunos avaliados individualmente.
A segunda parte do trabalho consistiu na divisão das AS-units,
unidade de análise sintática sugerida por Foster (2000). Em seguida, o
levantamento dos desvios de cada aluno foi feito e categorizado em oito
diferentes categorias (verbo, sintático, léxico, preposição, flexão de nome,
artigo, advérbio e pronome). Depois de termos o número de AS-units, contado
manualmente, mais o número de desvios, pudemos calcular o índice de
desvios por unidade de cada aluno.
Com os resultados obtidos, observou-se que a maioria dos alunos
ficou com o um índice muito alto em relação à média da própria turma. É
importante levar em consideração que alguns alunos produziram um número
muito maior de AS-units do que outros, e que esses alunos que produziram
mais, apresentavam maior proficiência oral (observável) na língua-alvo,
mesmo que alguns não tenham obtido um índice tão bom. Considerando que
produziram mais unidades, estavam mais suscetíveis a cometer desvios.
É importante ressaltar que, apesar de os dados não serem do exame
EPPLE, eles podem servir de comparação em um momento futuro quando
esses mesmos alunos prestarem o exame, já que todos eles são possíveis
candidatos. Será possível comparar o desempenho no EPPLE com os índices
obtidos e observar a evolução desses alunos, na proficiência em língua
inglesa, após o tempo decorrido entre as apresentações orais e sua produção
no teste oral do EPPLE.
O trabalho de pesquisa em questão contribui para melhor
entendermos possíveis correlações entre precisão gramatical e proficiência
oral e, acima de tudo, para o projeto maior EPPLE, que visa a qualidade na
formação dos professores de línguas estrangeiras.
Recebido em: 23/03/15
Aceito em: 27/04/15
Referências
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Proficiência Oral em Inglês do Formando em Letras: implicações para a
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Hélcio de Pádua, MARTINS, Teresa Helena Buscato, TEIXEIRA DA
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