O SR. MARCUS VICENTE (PPB–ES) pronuncia o seguinte discurso: Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, “Uma tarde, apareceu para treinar um menino de pernas exageradamente tortas. Já no vestiário, o técnico Gentil Cardoso, rindo-se, chamara a atenção para a anomalia física do novato; aquele sujeito podia ser tudo, menos jogador de futebol.” Assim, o cronista Paulo Mendes Campos lembra como começou um brasileiro que, contrariando todas as expectativas, foi não apenas jogador de futebol, mas um dos mais brilhantes pontas-direitas do mundo, em todos os tempos. O nome não poderia ser mais comum: Manuel Francisco dos Santos, mas foi com o apelido, Garrincha, que se tornou deus dos estádios, ídolo da multidão, legenda de um povo. Assim o recordamos hoje, no vigésimo aniversário da sua morte prematura, aos 49 anos de idade, no dia 20 de janeiro de 1983. Natural do município fluminense de Pau Grande, aquela criança nascera, como tantos milhões de brasileiros, condenada à pobreza e à miséria, à doença e à fome, ao analfabetismo e à marginalidade. Não fosse um pormenor: iluminava-o a centelha do gênio, a inspiração do artista, a originalidade do inventor, a habilidade do mestre. Alguém lhe sugeriu apresentar-se ao Botafogo, de onde logo se projetaria para brilhar na Seleção Brasileira campeã do mundo em 1958 e em 1962. 2 A importância de Garrincha se faz maior e mais extraordinária por ter ele pertencido a uma linhagem de gigantes, a uma geração de craques: Pelé, Nílton Santos, Didi, Zagalo, Amarildo, Vavá... Foi, assim, um grande entre grandes, uma estrela na constelação, um virtuose no conjunto de maestros que deslumbrou torcidas, surpreendeu teóricos e encantou a imprensa, elevando o nosso futebol à condição de melhor do mundo. Botafoguense ilustre, Paulo Mendes Campos observou em uma crônica: “A alegria do futebol de Garrincha está nisto: dentro do campo, ele se integra no próprio espaço, não reflete mais, não perde tempo com a lentidão do raciocínio, não sofre a tentação dos desvios que sempre existem no caminho da inteligência. Como um poeta tocado por um anjo, como um compositor seguindo a melodia, como um bailarino encadeado ao ritmo, Garrincha joga futebol por pura inspiração, por magia, sem sofrimento.” Juntem-se, às verdadeiras obras de arte que compunha com os pés, a bondade humana, a grandeza de espírito, a comovente modéstia com que viveu e morreu. Fazemos nossas as palavras de Nílton Santos, seu amigo e compadre: “Garrincha veio para nos ensinar a simplicidade, a beleza, a humildade. Veio para doar-se e, através do futebol, ser amado e sentido.” 3 Talvez em nenhum momento da sua breve trajetória, Garrincha se tenha dado conta do gênio que era, da importância que tinha. Como tantos colegas de então, sucumbiu ao peso da glória e ao brilho enganoso da fama, à semelhança das estrelas cadentes que cruzam os céus e se desfazem na escuridão da noite, deixando um rastro de beleza e um sentimento de pesar. Poucos brasileiros nos fascinaram tanto quanto Garrincha: ele foi, verdadeiramente, a Alegria do Povo. Faz 20 anos que morreu esse homem admirável, na solidão e no silêncio em que mergulhou à procura da felicidade que nunca teve. Ao grande Garrincha, mago da bola, mestre do drible e gênio do futebol, o nosso respeito, a nossa gratidão e a nossa saudade. Muito obrigado. Marcus Vicente Deputado Federal PPB/ES 300211.00030/03 maneh.doc