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Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
ANÁLISE DOS TEMAS “EVOLUÇÃO” E “FILOGENIA” NOS LIVROS
DIDÁTICOS DO 7º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Judson Albino Koswosk (Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, Universidade
Federal do Espírito Santo - Campus São Mateus)
Diógina Barata (Universidade Federal do Espírito Santo - Campus São Mateus)
Ana Paula Agrizzi (Universidade Federal do Espírito Santo – Campus São Mateus)
Marcos da Cunha Teixeira (Núcleo de Práticas Pedagógicas em Biologia, Universidade
Federal do Espírito Santo - Campus São Mateus)
Resumo: Analisou-se a abordagem dos temas “evolução” e “filogenia” em 13 coleções
didáticas de ciências do 7º ano do ensino fundamental aprovadas pelo Programa Brasileiro do
Livro Didático e utilizadas a partir de 2014. Com base na literatura foram definidas as
seguintes categorias de análise: (1) a historicidade do conhecimento científico envolvendo a
evolução biológica e a sistemática filogenética; (2) a acuidade conceitual dos principais temas
dentro da evolução biológica e da sistemática filogenética; (3) o uso da evolução como tema
unificador do conhecimento biológico e (4) o uso da sistemática filogenética para a
compreensão dos conceitos evolutivos. A partir dos resultados, apresentam-se reflexões para
o aprimoramento das coleções de forma a evitar um ensino obsoleto e fragmentado.
Palavras-chave: Ensino de ciências; evolução biológica; sistemática filogenética; livro
didático de ciências.
Introdução
Dada a sua importância no processo de ensino-aprendizagem, o livro didático,
enquanto ferramenta de ensino, deve estar sempre atualizado para que possa ser uma fonte de
conhecimento confiável para professores e alunos (NUÑES et al., 2003). No que se refere ao
ensino de ciências e biologia, o tema “evolução” tem despertado grande interesse dos
pesquisadores em avaliar a qualidade das coleções didáticas na apresentação dos conceitos
evolutivos. Até o momento, grande parte dos trabalhos no Brasil teve o ensino médio como
nível escolar em análise (e.g. ALMEIDA E FALCÃO, 2010; SOUSA et al., 2011) e, em
poucos casos, temas diretamente relacionados à evolução, como a sistemática filogenética,
foram incluídos nas análises (LOPES E VASCONCELOS, 2012; COUTINHO, 2013).
A sistemática filogenética tem sido constantemente apontada como uma ferramenta de
ensino dos conceitos evolutivos (AMORIM, 2008, SANTOS E CALOR, 2007a, b) por sua
capacidade de sintetização, representação da história evolutiva e da conexão histórica entre as
espécies. Além disso, é relevante sua contribuição no entendimento da diversidade biológica à
luz da evolução, somada a sua capacidade de unificação das diversas áreas da biologia
(SANTOS E KLASSA, 2012). Embora estejam intimamente relacionadas, ainda não existem
estudos que analisem a proximidade e as distorções conceituais entre a sistemática
filogenética e evolução biológica nos livros didáticos no ensino básico utilizados em escolas
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brasileiras. No caso específico do ensino fundamental, a necessidade de analisar a qualidade
dos livros didáticos fundamenta-se na preocupação com a forma pela qual o conteúdo é
apresentado aos alunos no primeiro contato com o assunto. Esse contato inicial poderá moldar
a concepção que terão sobre os conceitos ensinados e sua associação com os acontecimentos
mais próximos da sua realidade, tendo influência direta na atenção dada ao tema nos anos
seguintes de estudos, tanto no ensino médio quanto na graduação.
Considerado o paradigma central da biologia (MEYER E EL-HANI, 2005), a
abordagem da evolução biológica nos livros didáticos nacionais teve início a partir de 1930.
Desde então, foram diagnosticados vários erros conceituais, distorções na historicidade da
produção do conhecimento científico e a dicotomia teórica entre lamarckismo e darwinismo
que acabam se repetindo na prática pedagógica dos professores com a interpretação e a
transmissão errônea dos conceitos evolutivos em sala de aula (ALMEIDA E FALCÃO,
2005).
No caso da sistemática filogenética Coutinho (2013) afirma que ainda são poucas as
pesquisas a fim de verificar se os conceitos e diagramas presentes nos livros didáticos
condizem com o pensamento atual da biologia evolutiva.
Diante da importância da evolução biológica, da possiblidade de inclusão da
sistemática filogenética como alternativa de ensino dos conceitos evolutivos na prática
docente e da relevância dos livros didáticos no cenário educacional brasileiro, o presente
estudo dedica-se a uma avaliação dos livros de ciências disponibilizadas pelo Programa
Brasileiro do Livro Didático, entregues nas escolas públicas a partir do ano de 2014. Nesse
contexto, torna-se relevante destacar que não se pretende aqui negar os manuais didáticos
analisados, mas sim, reunir argumentos que possam contribuir para o avanço no ensino de
evolução e filogenia no ensino fundamental.
Material e Métodos
Para esta análise foram utilizados treze livros didáticos de ciências do 7º ano do ensino
fundamental aprovados pelo Programa Brasileiro do Livro Didático e disponibilizados aos
professores da rede pública brasileira de ensino a partir de 2014.
Os livros didáticos foram analisados seguindo o referencial metodológico da análise
de conteúdo, que sugere a opção por categorização dos resultados, a qual facilita a
interpretação dos mesmos (FRANCO, 2008). Nesse contexto, após a leitura dos livros
didáticos e diagnóstico de pontos em comum nos capítulos sobre classificação dos seres vivos
e evolução biológica, as categorias foram definidas previamente, amparadas também em
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dados da literatura (AZEVEDO E MOTOKANE, 2011; ALMEIDA E FALCÃO, 2005) e nos
Parâmetros Curriculares Nacionais do terceiro e quarto ciclos (MINISTÉRIO DE
EDUCAÇÃO DO BRASIL, 1998), sendo elas: (1) a historicidade do conhecimento científico
envolvendo a evolução biológica e a sistemática filogenética. (2) a acuidade conceitual dos
principais temas dentro da evolução biológica e da sistemática filogenética; (3) se a evolução
é utilizada como tema unificador do conhecimento biológico; e (4) se a sistemática
filogenética é utilizada para a compreensão dos conceitos evolutivos. Assim como realizado
por Azevedo e Motokane (2011), para verificar se a coleção utiliza ou não a evolução como
tema unificador do conhecimento biológico, julgou-se necessário analisar também capítulos
do ensino de zoologia e botânica. Todavia, eventuais erros conceituais presentes nestes
capítulos foram desconsiderados.
Os critérios utilizados para análise de cada categoria foram os seguintes: na categoria
1 foi considerado o contexto em que os assuntos estavam apresentados e a citação de nomes
importantes na produção do conhecimento sobre a taxonomia, sistemática e evolução, dada a
forma como os assuntos estão dispostos nos livros didáticos. Na categoria 2 a mesma divisão
de análise dos temas foi utilizada quanto à acuidade conceitual, levando em consideração a
quantidade e a definição dos conceitos citados. Na categoria 3, a análise foi feita somente para
as coleções onde a abordagem evolutiva estivesse presente ao longo dos capítulos sobre o
ensino dos Reinos. Na categoria 4 as análises foram feitas apenas para as coleções cuja
história evolutiva dos diferentes grupos de seres vivos estivesse apresentada por meio de
cladogramas seguida de um texto complementar.
Todas as coleções são referidas no texto através de códigos e uma identificação
completa de cada uma pode ser verificada no quadro 1.
Quadro 1. Lista dos livros didáticos aprovados pelo Programa Nacional do Livro Didático em 2014 para o ensino
de Ciências no 7º ano, apresentando código de identificação no texto, autores, editora e ano de publicação.
CÓDIGO
OBRA
AUTOR
EDITORA ANO
C1
Ciências da Natureza
MOISÉS, H. N.
IBEP
2012
C2
Ciências - Os seres vivos
BARROS, C.; PAULINO, W.
ÁTICA
2012
C3
Companhia das Ciências
USBERCO, J. M.; SCHECHTMANN,
E.; FERRER, L. C.; VELLOSO, H. M.
SARAIVA
2012
C4
GODOY, L.; OGO, M.
FTD
2012
CANTO, E. L.
MODERNA
2012
C6
Vontade de saber Ciências
Ciências Naturais Aprendendo com o
cotidiano
Ciências - Vida na Terra
GEWANDSZNAJDER, F.
ÁTICA
2012
C7
Ciências - Jornadas.cie
CARNEVALLE, M. R.
SARAIVA
2012
C5
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C8
Observatório de Ciências
BRÖCKELMANN, R. H.
MODERNA
2011
C9
Ciências - Para viver juntos
AGUILAR, J. B.
SM
2012
C10
Ciências para nosso tempo
CARVALHO, W.; GUIMARÃES, M.
POSITIVO
2011
C11
Ciências - Projeto Araribá
SHIMABUKURO, V.
MODERNA
2010
C12
Ciências, natureza
cotidiano
TRIVELLATO, J.; TRIVELLATO, S.;
MOTOKANE, M.; LISBOA, J. F.;
KANTOR, C
FTD
2012
C13
Ciências, novo pensar
GOWDAK, D.; MARTINS, E.
FTD
2012
Resultados e Discussão
Os resultados do atendimento aos critérios estabelecidos para cada categoria de análise
das coleções estão dispostos no quadro 2. Em seguida, apresenta-se a análise de cada
categoria separadamente.
Quadro 2. Resultado geral da análise das treze coleções didáticas em relação às quatro categorias de análises
para os temas taxonomia (TAX), sistemática filogenética (SIS) e evolução biológica (EVO).
CATEGORIAS DE ANÁLISE
CÓDIGO DA
História da ciência
Acuidade conceitual
Relação entre
Evolução como
COLEÇÃO
sistemática e
Tax
Sis
Evo
Tax
Sis
Evo tema unificador
evolução
C1
X
X
C2
-
-
-
X
X
X
-
-
C3
X
X
X
X
X
X
X
X
C4
X
-
X
X
-
-
X
X
C5
-
-
X
X
X
X
-
X
C6
-
-
X
X
-
X
X
X
C7
-
-
X
X
-
-
X
-
C8
X
-
X
X
-
-
X
-
C9
-
X
X
X
X
X
X
X
C10
X
X
X
X
X
-
X
X
C11
X
-
X
-
X
-
X
X
C12
X
-
-
-
-
-
-
-
C13
X
-
-
X
-
-
-
-
Categoria de análise 1: historicidade do conhecimento científico envolvendo a evolução
biológica e a sistemática filogenética
Apenas as coleções C3 e C10 preencheram todos os requisitos de avaliação propostos
para esta categoria de análise. Esses dados estão apresentados na tabela 1. A identificação de
cientistas importantes e precursores na produção do conhecimento científico nas áreas em
análise foram encontrados em todas as coleções, com exceção de C12 e C13, que não
apresentam um capítulo inteiramente dedicado à evolução biológica.
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Nos capítulos sobre classificação dos seres vivos, todas as obras atribuem ao médico
sueco Carl Linnaeus (1707-1778) o destaque de ser o cientista que desenvolveu o atual
sistema de classificação biológica adotado pelo meio científico. Entretanto, importantes
naturalistas que buscaram classificar animais e plantas desde os tempos gregos também são
lembrados, dentre eles Aristóteles (384-322 a.C.) e Teofrasto (371-287 a.C.). Em dois casos
(C3 e C10), quando o assunto filogenia foi tratado detalhadamente, Ernst Haeckel (18341919) é citado como o criador dos esquemas reconhecidos hoje como árvores filogenéticas,
que levam em consideração o parentesco evolutivo como critério de classificação.
Constantemente, surgem nos trabalhos de avaliação da qualidade dos livros didáticos
queixas de que o conhecimento científico é apresentado como pronto e acabado, desconectado
de um processo histórico (NETO E FRACALANZA, 2003; SANTOS E CALOR, 2007a, b,
2008). Nesse aspecto, as coleções C3 e C10 foram as mais completas, pois, contemplam os
aspectos históricos dos conceitos da taxonomia, sistemática e evolução. Além disso,
constatamos nessas coleções a preocupação dos autores em demonstrar que qualquer conceito
científico, dentre eles o de classificação dos seres vivos, pode ser alterado. Nesse sentido, os
autores da coleção C3 discorrem que,
Podemos perceber que nenhuma classificação (e mesmo nenhum conceito) pode ser
considerada definitiva, porque ela pode mudar de acordo com os novos
conhecimentos adquiridos por diferentes pesquisadores ao longo do tempo. É dessa
forma que a Ciência vai se construindo e se aperfeiçoando (USBERCO et al., 2012,
p. 43).
Embora seja reconhecido que a teoria de Lamarck não esteja correta do ponto de vista
conceitual, é indiscutível a contribuição que sua visão de mundo, contraditória à vigente na
época, rompeu os paradigmas da produção de conhecimento científico das ciências biológicas
(ALMEIDA E FALCÃO, 2005). Referências à teoria de Lamarck foram feitas nas seguintes
coleções: C3, C4, C5, C6, C7, C8, C9, C10 e C11. Nesse contexto, é importante destacar a
forma como os livros didáticos expõem a contribuição de seus pensamentos para construção
da teoria evolutiva, como pode ser comprovado no trecho transcrito da coleção C7:
Embora a hipótese de Lamarck apresentasse diversas falhas, como por que
características adquiridas ao longo da vida pudessem ser passadas aos
descendentes, ela é importante por perceber a influência do ambiente sobre os seres
vivos e também por ter confrontado as ideias evolucionistas com o pensamento
criacionista, predominante no meio científico na época (CARNEVALLE, 2012,
p.28).
Entretanto, em todas as coleções que fizeram referência á Lamarck foi registrada a
insistência em desvalorizar as teorias lamarckistas frente às darwinistas. Por exemplo, na
coleção C5 a participação de Lamarck na produção de teoria evolutiva ficou reduzida à
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seguinte frase: “O mérito de Lamarck foi admitir, em sua época, que os seres vivos evoluem ”
(CANTO, 2012, p. 59).
Dessa forma, as coleções insistem em dicotomizar as duas teorias em vez de evidenciar
suas relações de continuidade. De modo geral, as coleções analisadas atribuem os méritos da
produção do conhecimento acerca da teoria evolutiva a Charles Darwin (1809-1882) e Alfred
Wallace (1823-1913), como forma de reconhecimento do esforço de ambos na produção
científica sobre o conceito de seleção natural, tida como pilar da teoria evolutiva.
Ainda sobre a teoria evolutiva, nas coleções C3 e C9 é feita uma contextualização
histórica das descobertas científicas juntamente com questões de natureza de cunho
mitológico e religioso. Nesse contexto, percebe-se que há uma preocupação dos autores em
não criar um embate imediato entre ciência e as concepções de mundo que os alunos levam
para sala de aula, ao mesmo tempo em que permite ao aluno perceber que as informações
veiculadas nos livros didáticos não se constituem como únicas e verdadeiras, mas, sim, como
outra forma de compreender o mundo e seus fenômenos, como pode ser identificado no
trecho a seguir da coleção C3:
Ao longo da história da humanidade, diferentes povos, de diferentes maneiras,
procuraram responder a essa questão fundamental. De fato, todas as sociedades
humanas elaboraram relatos, os mitos, que descrevem a formação do Universo, a
origem da humanidade e a criação dos outros seres vivos (AGUILAR, 2012, p. 68).
Em uma análise geral, no que se refere á categoria de análise “história da ciência”,
especificamente à historicidade do conhecimento científico envolvendo a evolução biológica
e a sistemática filogenética, as coleções C3, C9 e C10 foram consideradas mais completas.
Categoria de análise 2: acuidade conceitual dos principais temas dentro de evolução
biológica e da sistemática filogenética
Quatro das 13 coleções preencheram todos os requisitos propostos para a avaliação
desta categoria de análise: C2, C3, C5 e C9. Esses dados estão apresentados na tabela 1.
Um dos problemas encontrados por Azevedo e Motokane (2011) ao avaliar livros
didáticos de Biologia, é a existência de equívocos quando se trata de exemplos ilustrativos
referentes à seleção natural e adaptação. Segundo os autores, alguns exemplos dão a entender
que somente animais passam pelo processo evolutivo. Essas concepções errôneas a respeito
do tema foram observadas em todas as coleções, especialmente nos capítulos dedicados à
classificação dos seres vivos, ao processo de evolução biológica e ao estudo dos reinos, nos
quais não se registraram abordagens ao processo histórico de evolução e parentesco entre os
vegetais.
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Nos capítulos sobre a classificação biológica, em todas as coleções os conceitos mais
comuns estão ligados às hierarquias taxonômicas, à nomenclatura binomial e aos esquemas
filogenéticos de representação de parentesco evolutivo. Em relação às hierarquias
taxonômicas, todos os livros adotam o modelo de classificação em cinco reinos. No entanto,
nesse aspecto merece destaque a coleção C4, pois os autores optaram por uma classificação
alternativa e mais atualizada, como a dos domínios Archaebacteria, Eubacteria e Eukarya.
Somente as coleções C2 e C6 ressaltam os mecanismos do processo evolutivo os quais
são retratados como elementos constituintes da teoria sintética da evolução, tendo as
mutações genéticas como o principal fator para que a evolução aconteça, onde a variabilidade
dentro das populações é controlada pela seleção natural, como pode ser observado a seguir no
trecho da coleção C2:
Mutações podem resultar no desenvolvimento de características novas. Estas
podem ser favoráveis ou não para a adaptação dos organismos ao ambiente em que
vivem. É por meio da seleção natural que o ambiente modela as espécies,
preservando organismos que possuem características favoráveis e eliminando os
portadores de características desfavoráveis ou menos favoráveis. As características
podem ser transmitidas aos descendentes, contribuindo para a adaptação da espécie
a um determinado ambiente. A evolução ocorre quando a seleção natural atua sobre
a variação genética existente entre os indivíduos de uma população (BARROS E
PAULINO, 2012, p. 42).
Nos casos onde a classificação dos seres vivos deu-se através de cladogramas (C3, C6,
C7, C9, C10 e C11), as representações esquemáticas nem sempre estiveram seguidas de uma
explicação. Porém, as coleções (C10 e C11) mostraram o procedimento para a interpretação
das filogenias, a exemplo deste trecho extraído da coleção C10:
Se você notar, no topo do cladograma os animais e fungos estão ligados em um
mesmo ponto de interseção. Esse ponto é chamado de nó. Este representa o
ancestral comum entre os seres vivos. No nosso exemplo, entre animais e fungos.
Todos os outros seres vivos que saem do mesmo nó possuem mais características
em comum do que aqueles do que aqueles que não estão ligados a esse nó. [...]
Cada ramo do cladograma representa um grupo biológico em que os seres vivos são
todos aparentados (Carvalho e Guimarães, 2011, p. 61).
Embora seja comum que muitos livros abdiquem de temas relativos à evolução humana,
nas coleções C3, C6 e C10 nota-se um esforço para desfazer a errônea concepção de que o
homem tenha surgido de macacos atuais, mostrando, através de cladogramas, a história
evolutiva dos primatas. No trecho a seguir, extraído da coleção C3, após a apresentação da
filogenia dos primatas, é dito que
É provável que você já tenha ouvido alguém dizer que “o ser humano descende do
macaco”. Agora, você pode perceber que essa frase não é verdadeira. O ser humano
não descende diretamente de um macaco, mas de um ancestral que também deu
origem a alguns grupos de macacos, no caso os chimpanzés (USBERCO et al.,
2012, p. 65).
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Entender a evolução como um processo populacional trata-se de uma das maiores
dificuldades demonstrada pelos alunos, sendo normalmente assunto pouco discutido nos
livros didáticos (AZEVEDO E MOTOKANE, 2011). Somente uma das coleções (C5),
mesmo que em um breve comentário, buscou demonstrar que o processo evolutivo acontece
em escala populacional, como destacado no texto a seguir:
A evolução não ocorre com um só indivíduo, mas sim nas populações e ao longo
das gerações. A seleção natural favorece a sobrevivência e a reprodução dos
indivíduos de uma população que têm características que os tornam mais bem
adaptados ao ambiente. Ao longo do tempo, a frequência de indivíduos que
apresentam as características favoráveis tende aumentar na população (CANTO,
2012, p. 61).
Neste trabalho, das treze coleções analisadas, onze apresentam um capítulo especifico
que trata do conteúdo de evolução, apenas C12 e C13 abdicam do tema. A
compartimentalização do conteúdo ocorreu nas coleções C1, C2 e C5, enquanto, nas demais
(C3, C4, C6, C7, C8, C9, C10, C11) além do capítulo específico, faz-se uma abordagem da
história evolutiva nos capítulos destinados ao ensino dos reinos.
Categoria de análise 3: uso do tema evolução como elemento unificador do
conhecimento biológico
Nesta categoria as coleções que apresentaram a evolução como tema unificador do
conhecimento foram: C3, C4, C6, C7, C8, C9, C10, C11. Esses dados estão apresentados na
tabela 1.
Em praticamente todo início de capítulo ou unidade referente ao reino Animalia, é
feita antes ou em conjunto, uma classificação e caracterização de dados relativos à história
evolutiva. Nota-se, no entanto, que este tipo de abordagem privilegia comumente os capítulos
ou unidades destinados aos vertebrados, não sendo extrapolada para todos os grupos de
metazoa, tampouco para o ensino de botânica, existindo uma carência ou ausência completa
de exemplos que levem a pensar que os vegetais também são fruto do processo evolutivo.
Como fruto da fragmentação dos conteúdos nas coleções C1, C2 e C5, a evolução não
ocupa, de fato, sua posição como assunto unificador do conhecimento biológico, dando-se à
evolução a mesma importância dada às demais áreas de ensino. Nas demais coleções (C3, C4,
C6, C7, C8, C9, C10, e C11), onde os conceitos evolutivos foram retomados em outros
capítulos, mesmo que restritos a algumas áreas, é inegável que a evolução aos poucos passa a
ocupar e desempenhar sua função centralizadora no ensino de ciências.
A qualidade e quantidade conceitual variaram muito entre as coleções. Atribuiu-se a
este fato o número de páginas destinadas aos assuntos em análise (figura 1). Neste trabalho,
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das treze coleções analisadas, onze apresentam um capítulo especifico que trata do conteúdo
de evolução e apenas C12 e C13 abdicam do tema. A compartimentalização do conteúdo
ocorreu nas coleções C1, C2 e C5, enquanto, nas demais (C3, C4, C6, C7, C8, C9, C10, C11)
além do capítulo específico, faz-se uma abordagem da história evolutiva nos capítulos
Páginas sobre o tema (%)
destinados ao ensino dos reinos.
16
Classificação seres vivos
14
Evolução
12
10
8
6
4
2
0
C1
C2
C3
C4
C5
C6
C7
C8
C9
C10
C11
C12
C13
Códigos das coleções didáticas de ciências analisadas
Figura 1. Percentual de páginas de cada coleção didática analisada dedicadas aos temas
“classificação dos seres vivos” e “evolução”.
Categoria de análise 4. Relação entre sistemática e evolução: uso do tema sistemática
filogenética para a compreensão dos conhecimentos evolutivos
Das treze coleções estudadas sete utilizam-se do tema sistemática filogenética para a
compreensão dos conhecimentos evolutivos, a saber: C3, C4, C5, C6, C9, C10, C11. Além
disso, todas apresentam um capítulo dedicado à classificação dos seres vivos e em oito delas
(C2, C3, C4, C5, C6, C9, C10 e C11), a sistemática filogenética foi contemplada dentro do
capítulo específico sobre classificação dos seres vivos e/ou em textos introdutórios ao estudo
dos Reinos e principais grupos de animais e vegetais.
Nas coleções C9 e C11 é destacado no texto que a classificação biológica seguiu
diferentes critérios que não levaram em consideração o parentesco evolutivo dos grupos, mas
atualmente,
[...] segundo o evolucionismo darwinista, todas as espécies apresentam relação de
parentesco em maior ou menor grau, de acordo com sua história evolutiva
(AGUILAR, 2012, p. 92).
Atualmente, as classificações são naturais, isto é, procuram agrupar os seres vivos
de acordo com o maior número de semelhanças possível, tentando estabelecer
relações de parentesco evolutivo entre eles (SHIMANUKURO, 2010, p. 86).
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Em alguns livros, conceitos chaves da sistemática filogenética reforçam o pensamento
darwiniano de relação histórica entre as espécies por meio da descendência com modificações
de um ancestral comum a todos os seres vivos, o que pode ser observado nos trechos a seguir
retirado da coleção C10:
De acordo com a Teoria da Evolução, do naturalista britânico Charles Darwin
(1809-1882), todas as espécies do mundo estão conectadas e possuem um ancestral
comum. Levando isso em conta, a história dos seres vivos na Terra pode ser
representada e organizada por meio de cladogramas [...] esquemas ramificados que
mostram as relações de parentesco entre os seres vivos. [...] Note que, na base do
cladograma, há um ancestral universal. Este seria um ser vivo que deu origem a
todos os outros (CARVALHO E GUIMARÃES, 2011, p. 61).
Nas coleções C3, C6, C7, C9, C10 e C11 constatou-se haver o uso de cladogramas para
representar a história evolutiva dos grupos de animais e vegetais na tentativa de esclarecer os
conceitos evolutivos, demonstrando as relações de parentesco evolutivo entre os principais
grupos de animais e vegetais. Mas a interpretação dos cladogramas e a associação das
representações esquemáticas com os demais temas foram prejudicadas, uma vez que no
capítulo referente à evolução biológica e classificação dos seres vivos os cladogramas nem
sempre estão presentes e, quando estão, não são acompanhados de uma explicação. Além
disso, os livros didáticos não apresentam espaços dedicados à montagem e interpretação dos
cladogramas.
Livros didáticos com capítulos dedicados inteiramente à classificação dos seres vivos
e à evolução das espécies apresentaram uso recorrente da história da ciência como
componente do processo de ensino-aprendizagem. O modo como a historicidade do
conhecimento científico é tratada nas obras estimula os estudantes a encararem a ciência de
um ponto de vista em que se configura como um processo acumulativo de conhecimento ao
longo do tempo, ajudando a desfazer a errônea concepção verificada por Waizbort (2001), de
que os livros didáticos apresentam conceitos prontos e sem possibilidade de questionamento.
Considerações finais
Os resultados obtidos para cada categoria de análise permitem afirmar que a coleção
C3 destacou-se das demais analisadas no presente estudo, pois atende à todas as categorias
utilizadas para análise, seguida das coleções C9 e C10. Ao contrário do que se tem notado nas
análises de livros didáticos de ciências feitas por outros autores, a historicidade do
conhecimento científico envolvendo a evolução biológica e a sistemática filogenética é tratada
com relevância nas obras analisadas. No entanto, os conceitos dos principais temas dentro da
evolução biológica e da sistemática filogenética ainda apresentam alguns equívocos. Quando
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comparado com os resultados obtidos por outros autores, considera-se que as coleções
analisadas neste estudo apresentam avanços quanto ao uso da evolução como tema unificador
do conhecimento biológico em todas as coleções analisadas e da sistemática filogenética para
a compreensão dos conceitos evolutivos. Porem, a interpretação dos cladogramas e a
associação das representações esquemáticas com os demais temas foram prejudicadas.
Diante dos resultados obtidos neste estudo concordamos com Lopes e Vasconcelos
(2012) de que é necessário fazer proveito da natureza multidisciplinar da sistemática
filogenética, na proposição de atividades que incorporem seus principais conceitos,
estimulando, por exemplo, o aluno a refletir sobre como a diversidade biológica tem sido
gerada na perspectiva evolutiva das relações de parentesco entre os seres vivos.
Referências bibliográficas
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