OFICINA TERAPÊUTICA: UM ESPAÇO DE (RE) INVENTAR O COTIDIANO ELY, Gabriela Zenatti1; LARA, Michele Pivetta de2; TERRA, Marlene Gomes3; MARTINS, Luciane Regio4; VASCONCELOS, Raíssa Ottes5; FREITAS, Fernanda Franceschi de6; SILVA, Adão Ademir da7; LIED, Ricardo Germano8 [email protected] RESUMO As oficinas terapêuticas são estratégias de cuidado para amenizar o impacto das mudanças no cotidiano do paciente internado em uma Unidade Psiquiátrica. Neste sentido, objetiva-se relatar a experiência de profissionais da residência multiprofissional em uma oficina terapêutica, denominada “oficina da horta”, que ocorre no pátio de uma unidade de internação psiquiátrica de um hospital geral localizado no sul do país. O público alvo é pacientes acometidos por transtornos mentais graves. Essa atividade como prática de cuidado ao próprio meio de convívio, sendo notáveis inúmeras modificações para um ambiente harmonioso e 1 Enfermeira do Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Gestão e Atenção Hospitalar no Sistema Público de Saúde CCS/UFSM/HUSM. 2 Psicóloga do Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Gestão e Atenção Hospitalar no Sistema Público de Saúde CCS/UFSM/HUSM. 3 Doutora em Enfermagem, Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem e do Programa de PósGraduação em Enfermagem da UFSM, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 4 Enfermeira, Coordenadora Regional da Política de Saúde Mental, Coordenadora Regional da CIES, Coordenadora do Núcleo Regional de Ações em Saúde- 4ªCRS, Apoiadora Institucional da PNH e Editora da Rede HumanizaSUS. 5 Acadêmica do 4º semestre do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 6 Enfermeira do Hospital Universitário de Santa Maria. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSM, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 7 Enfermeiro do Hospital Universitário de Santa Maria. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSM, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 8 Enfermeiro do Hospital Universitário de Santa Maria. Coordenador da Unidade Psiquiátrica do Hospital Universitário de Santa Maria. Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 1 construído a partir de significações do paciente como processos de construção: plantar, cuidar, colher. Com esta oficina intenciona-se produzir uma relação horizontal entre paciente e profissional criando um espaço mútuo de aprendizado e trocas, buscando assim, produzir possibilidades para autonomia, cidadania de direitos em Saúde Mental. Descritores: Humanização; Saúde Mental; Reforma Psiquiátrica; Internação Psiquiátrica; Horticultura Terapêutica. 1. Introdução As oficinas terapêuticas são dispositivos da Política Nacional de Saúde Mental que busca sensibilizar e efetivar um cuidado integral fomentado pelos preceitos da Reforma Psiquiátrica de 2001. As oficinas atuam no âmbito social e contribuem como possibilidade de transformação da realidade, no que diz respeito a toda concepção do processo saúdedoença. Sua proposta é a expressão da singularidade e subjetividade, num espaço de convivência, criação e reinvenção do cotidiano1. A Reforma psiquiátrica se caracteriza por um movimento sociopolítico em âmbito da saúde pública que instituí um modelo para o desenvolvimento de programas de suporte psicossocial, no acompanhamento do sujeito em sofrimento psíquico em serviços comunitários. Prevê a internação do doente mental com duração mínima, preferencialmente em hospitais gerais, somente no esgotar de outra possibilidade terapêutica extrahospitalares2. Dessa forma, o Ministério da Saúde reconhece que a internação psiquiátrica é a “permanência diurna e noturna em hospital especializado com medicamentos para redução dos sintomas da doença e que, freqüentemente, não favorece a melhora do paciente por provocar o isolamento social e a perda dos laços afetivos”3. Assim, as oficinas terapêuticas são estratégias de cuidado para amenizar o impacto das mudanças no cotidiano do paciente internado em uma Unidade Psiquiátrica. O cotidiano prático de uma pessoa o torna um homem sociável legitimador de sua ordem: “ser capaz de cuidar da casa é um dos primeiros passos para se conquistar independência e viver na sociedade sem precisar do auxílio diário de outras pessoas”4. Neste texto, objetiva-se relatar a oficina da horta como uma possibilidade terapêutica para pacientes em sofrimento mental grave, internos de uma Unidade Psiquiátrica de um hospital universitário do sul do país. 2. Metodologia 2 Trata-se de um relato de experiência que visa descrever uma oficina terapêutica. Esta é realizada por profissionais da residência multiprofissional conjuntamente com pacientes de uma Unidade de internação psiquiátrica de um hospital escola do sul do país. A oficina é coordenada por uma psicóloga, uma terapeuta ocupacional, uma enfermeira e auxiliada por funcionários da referida unidade. O público alvo é pacientes acometidos por transtornos psiquiátricos graves. Primeiramente, os usuários são convidados de forma intencional a participarem da oficina da horta. A dinâmica da operacionalização consiste em momentos para os usuários entrarem em contato com a terra, sendo estruturados canteiros para o plantio de hortaliças; com a utilização de ferramentas e insumos destinados para a semeadura e manutenção das mudas. Além disso, busca-se confeccionar com os usuários materiais de identificação das mudas, ou utensílios para auxiliar nas condições climáticas como a colocação de sombrites e mini-estufas. Não há recursos destinados para a realização desta atividade, sendo realizadas com parcerias com outros centros (manutenção) e por doações de mudas, sementes e pela venda das hortaliças. 3. Resultados Esta atividade é uma prática integradora que possibilita por vezes a criação de vínculo e a comunicação entre pacientes e profissionais. Alguns pacientes apresentam afinidade com esta atividade, sendo alguns agricultores (e/ou oriundos da zona rural) e/ou são simpatizadores com o cuidar da terra como uma atividade prazerosa e terapêutica. Essa atividade como prática de cuidado ao próprio meio de convívio, sendo notáveis inúmeras modificações para um ambiente harmonioso e construído a partir de significações do paciente como processos de construção: plantar, cuidar, colher. Além disso, há verbalização da atividade pelos pacientes como um meio de se ‘sentir útil’, além da equipe como uma atividade que possibilita trabalhar os sentimentos negativistas da internação: ansiedade, medo, raiva, revolta, inutilidade. Também se observa a prática da horta como algo ‘naturalmente aceito’ aos pacientes, ou seja, apesar da utilização de ferramentas nesta prática, elas não são vistas pela equipe como ‘ameaça’, apesar da sempre vigia mesmo ‘inocente’ tida como responsabilidade de uma equipe de cuidado. Neste sentido, é possível problematizar uma dinâmica de cuidado, não desmerecendo aos ‘riscos’ que os pacientes apresentam, porém, revendo algumas possibilidades, salientando o aprender a aprender com o paciente. 3 Observa-se, por exemplo, na confecção de placas que nomeiam as plantações da horta, a participação ativa do paciente nas etapas do processo de pintura, secagem e denominação de seu lugar (colocação na terra). Percebeu-se, nestas etapas, que os pacientes antes considerados apenas pelo seu diagnóstico e pela sua ‘incapacidade’ de realizar atividades do pensar dado pelo mesmo, mostraram-se potencialmente capazes de iniciativas, como, desenvolver da sua forma, meios de expressões do seu ser. Logo, reconquistar a confiança para a realização de atividade antes corriqueira ou aprender novas se torna uma estratégia terapêutica do promover a sua cidadania. Além disso, é realizada com os pacientes a venda das hortaliças em diversos setores da universidade proporcionando não somente uma fonte de renda para manutenção da horta, mas também a valorização e simbologia de todo o processo da oficina terapêutica. 4. Considerações finais Embasados pela reforma psiquiátrica brasileira procuram-se instrumentos terapêuticos que reforcem as possibilidades e melhorem o tratamento dos usuários em saúde mental. O uso racional de medicação faz parte do tratamento, junto com as atividades grupais e a formação de vínculo solidário entre as pessoas envolvidas no tratamento. Dentre estas novas práticas terapêuticas em saúde mental se destaca as atividades na forma de oficinas em que os usuários têm a possiblidade de se mostrar e interagir com outras pessoas. Na oficina de horta se busca a integração e troca de experiências para a melhor vivência do usuário internado em unidade fechada. Nesta oficina, além de produzir plantio e cuidado com hortaliças o usuário tem a possibilidade de praticar uma atividade que realiza em casa, visto que, muitos usuários são agricultores. Com esta oficina intenciona-se possibilitar uma relação horizontal entre paciente e profissional criando um espaço mútuo de aprendizado e trocas, buscando assim uma pratica em saúde mental que produza mais autonomia e cidadania de direitos. Referências Mendonça, TCP. As oficinas na saúde mental: relato de uma experiência na internação. Psicol. cienc. Prof. 2005; Berlinck MT, Magtaz CA, Teixeira M. A Reforma Psiquiátrica Brasileira: perspectivas e problemas. Rev. Latinoam. Psicopat. 2008; Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria da Atenção à Saúde. Saúde mental no SUS: os centros de atenção psicossocial. Brasília: Ministério da Saúde, 2004; 4 Salles, MM, Barros, S. Vida cotidiana após adoecimento mental: desafio para atenção em saúde mental. Acta Paul Enferm. 2009; 22(1):11-6. 5