EBOLA: Papel do Profissional de Saúde no controle da epidemia Dra. Silvia Nunes Szente Fonseca O que está acontecendo? SURTO DE EBOLA • Responsável por mais de 2.000 mortos, o vírus Ebola já infectou pelo menos 4.000 pessoas desde que surgiu, no início de 2014, nos países africanos de Serra Leoa, da Guiné, Libéria e Nigéria. • A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou em 8 de agosto de 2014 um alerta decretando uma emergência de saúde pública de alcance mundial e convocou a comunidade internacional a se mobilizar contra a epidemia de Ebola no oeste da África. SURTO DE EBOLA • Este é o mais extenso e duradouro surto da doença pelo vírus Ebola já identificado no mundo, com uma letalidade entre 50 a 60%. • Pode ocorrer a detecção em qualquer lugar do mundo de casos em viajantes provenientes de países com transmissão. • Até 10/9/2014: 4. 872 casos suspeitos e confirmados ; 2.245 mortes. Mortalidade até agora=50% República Democrática do Congo De 1.871 pessoas diagnosticadas na Libéria, 1.089 já morreram (58%) • Desde sua descoberta em 1976, o vírus tem produzido, ocasionalmente, surtos em um ou mais países africanos, sempre muito graves pela alta letalidade, mas autolimitados. Epidemia 2014 • A seriedade desta epidemia é a sua extensão, atingindo entre quatro a seis países e a demora em se atingir seu controle. Início do surto 2014 • Março 2014: hospitais e serviços de saúde pública de Guéchédou e Macenta alertaram Ministérios da Saúde da Guiné e depois Médicos Sem Fronteiras sobre misteriosa doença febril, com diarréia, vômitos e alta taxa de letalidade. • 8 pacientes hospitalizados em Guéchédou, 3 mortes e mais mortes em familiares. • Várias mortes em Macenta, incluindo de profissionais da saúde. NEJM abril 2014 • Da Guiné, o surto rapidamente se espalhou para Serra Leoa e Liberia. • Um paciente da Liberia foi para Nigeria, iniciou outro pequeno surto em Lagos, e uma pessoa exposta fugiu da quarentena, iniciando outro pequeno surto em Port Hartcour. Senegal • Moço de 21 anos saiu da Guiné de carro, chegando no dia 20/08 e ficou com parentes na periferia da cidade Dakar. • Em 23/08: febre e diarréia e vômitos. Procurou ajuda médica, tomou medicação contra malária mas não melhorou. • Em 26/08 foi hospitalizado; uma investigação epidemiológica foi iniciada. Nigéria • Nigéria: passageiro infectado chegou a Lagos em 20/7 e morreu 5 dias depois. Um contato próximo fugiu da cidade de Lagos, onde estava em tratamento e foi para Port Hartcour. • Esta pessoa foi tratada em um hotel de 1 a 3 de agosto por um médico. Este médico em 11/08 desenvolveu febre e fraqueza, e morreu em 22/08; ebola confirmado em 27/08. • Este médico, mesmo doente, continuou trabalhando e operando até dia 13/08. Em 16/08 foi hospitalizado. Nigéria • Ainda em casa, participou de uma festa de um bebê, com múltiplas visitas; depois houve uma visita de vários religiosos para fazer um ritual de cura, que envolveu toques com as mãos. • Dentro do hospital, foi atendido pela grande maioria da equipe médica. • Em 21/08 fez um ultra-som (2 médicos envolvidos); morreu no dia seguinte. Nigéria • Total de contatos= 200; dentro destes, 60 de alto risco. • Esposa do paciente , e outro paciente já contraíram a doença. Total até agora: 4 • Familiares e profissionais de saúde são os de alto risco. Surto na Rep. Dem Congo • Em 26/08/2014: Ministro da Saúde da Rep Dem do Congo notificou um surto de Ebola na provincia Equateur. • Caso índex: grávida que preparou um animal selvagem morto por seu marido . • Ela ficou doente e foi para uma clínica em 11/08/2014 . • Ela morreu de uma doença febril hemorrágica. Surto na Rep. Dem Congo • Vários profissionais de saúde foram expostos durante a vida e morte desta paciente ; na semana seguinte, vários adoeceram . • Entre 28/7 e 18/08 , 24 contatos com febre hemorrágica foram identificados. • Cirurgião e duas enfermeiras, e mais dois profissionais de saúde da clínica se infectaram e morreram. Surto na Rep. Dem Congo • As amostras foram enviadas para laboratórios de referência e confirmaram Ebola. • O caso index e 80 contatos não viajaram para Guiné, Libéria, Nigéria ou Serra Leoa. • Acredita-se que este surto é diferente do surto destes outros países. Por que a infecção se dissemina nos países africanos? • Precariedade dos serviços de saúde nas áreas em que ocorre a transmissão, ausência de equipamentos básicos de proteção aos profissionais de saúde e aos demais pacientes; • Práticas e tradições culturais de manter pacientes em casa, inclusive escondendo sua condição das autoridades sanitárias; • Rituais de velórios em que os parentes e amigos têm bastante contato com o corpo do falecido. Serviços de saúde em países africanos Enfermaria de tuberculose em Accra, capital de Gana, Africa Ocidental Virus Ebola EBOLA • Doença é causada pelo vírus Ebola, conhecida também como febre hemorrágica Ebola. • Grave, pode ser fatal e possui uma taxa de mortalidade de até 90%. • Acomete os humanos e animais primatas como macacos, gorilas e chimpanzés. • O vírus, da família Filoviride, foi identificado pela primeira vez em 1976, durante dois surtos simultâneos: um em uma aldeia próxima do rio Ebola, na República Democrática do Congo, que deu nome à doença, e outro em uma área remota do Sudão. • A origem do vírus Ebola continua desconhecida, mas, acredita-se que os morcegos frugívoros (Pteropodidae) são considerados os seus hospedeiros prováveis. EBOLA • Existem cinco espécies de vírus Ebola (Zaire ebolavirus, Sudão ebolavirus, Bundibugyoebolavirus, Restonebolavirus e Tai Forest ebolavirus), sendo o Zaire ebolavirus o que apresenta a maior letalidade, entre 60% a 90% dos casos diagnosticados. • Vírus desta epidemia 2014: Zaire ebola. • O vírus Ebola morre facilmente pelo uso de sabão, água sanitária, sol ou ambientes secos. • Sobrevive, por um curto período, em superfícies secas ou com raios solares. Transmissão Transmissão/contágio • Contágio : ocorre através de contato direto com o sangue, secreções, órgãos ou outros fluidos corporais de pessoas ou animais infectados, assim como objetos e roupas usadas. • Não é transmitido pelo ar, o que favorece a não se ter uma maior disseminação entre pessoas/ambientes. Transmissão/contágio • A transmissão pode ocorrer logo após o surgimento dos primeiros sintomas. • Durante o período de incubação (de 2 a 21 dias, com média de quatro dias), a pessoa não transmite o vírus. • São necessários cuidados específicos para evitar que os profissionais de saúde, familiares, amigos e acompanhantes no hospital entrem em contato com o sangue e secreções/fluidos. Transmissão/contágio • Por questões culturais, em algumas comunidades rurais africanas, durante as cerimônias fúnebres, os familiares tocam o corpo da pessoa falecida que, se infectada ou morta pelo Ebola, pode ser uma importante forma de transmissão do Ebola. Hábitos africanos Quadro clínico Quadro clínico • Após o período de incubação, surgem sinais e sintomas súbitos como febre, fraqueza intensa, dores musculares, dor de cabeça e dor de garganta, injeção conjuntival, seguidos por vômitos, diarréia, disfunção hepática, erupção cutânea (bolhas), além de insuficiência renal e, em algumas situações, hemorragias (interna/ externa). • É nessa ocasião que os pacientes tornam-se contagiosos. Quadro clínico • Inicialmente: doença febril • Mialgias e fadiga • Sintomas gastrointestinais progressivos: anorexia, náusea, desconforto abdominal, vômitos, diarreia, levando a depleção de volume no intravascular, distúrbios eletrolíticos , hipoperfusão, choque. • Hemorragias: manifestações tardias, geralmente sangramento gastrointestinal, ocorrendo em uma minoria de pacientes. Quadro clínico • As manifestações hemorrágicas surgem no pico da doença e incluem petéquias, equimoses, sangramento contínuo nos locais de venopunção, hemorragias de mucosas e evidência pós-morte de efusões hemorrágicas viscerais. • Pode haver pancreatite, causando dor abdominal. • Nas fases finais: choque,convulsões, distúrbios metabólicos graves e coagulopatia difusa. Quadro clínico • As pessoas que morrem desenvolvem sinais clínicos precocemente e tipicamente morrem entre o 6º e 16º dia, de choque hipovolêmico e falência múltipla de órgãos. • As hemorragias podem ser graves, mas aparecem em menos da metade dos pacientes. • Os sobreviventes fazem anticorpos IgM e IgG; a convalescença é prolongada e frequentemente associada a mielite, hepatite recorrente, psicose e uveíte. NEJM, agosto 2014 84 pacientes foram a óbito Ebola x profissionais da saúde Recomendações • Os profissionais de saúde têm sido frequentemente expostos ao vírus ao cuidar de pacientes com Ebola na África. • Isso acontece quando eles não usam adequadamente equipamentos de proteção individual, como luvas e máscaras. • Os profissionais de saúde devem seguir rigorosamente as precauções de controle de infecção recomendados. Epidemia 2014 • No final de agosto (26/08), havia o registro de mais de 240 profissionais de saúde infectados, mais de 120 mortes (OMS). • Até 10/9/2014: 302 profissionais de saúde infectados, com 152 mortes (50,3%) Mesmo antes desta epidemia de Ebola....... Um médico para cada 100.000 habitantes Proteção ao profissional de saúde Precauções padrão, de contato e de gotículas No hospital- ANVISA • Internar o paciente em quarto privativo com banheiro, em isolamento, com condições de suporte à vida, adotando as medidas de biossegurança; • Evitar a movimentação e o transporte do paciente para fora do quarto de isolamento, restringindo-os às necessidades médicas. • Quando necessário, tanto o paciente quanto o profissional que for fazer o transporte devem utilizar os EPI recomendados; No Hospital- ANVISA • Todos os profissionais de saúde encarregados do atendimento direto aos pacientes suspeitos de DVE devem estar protegidos utilizando os seguintes EPI: • macacão com mangas compridas, punho e tornozelos com elástico, resistente à abrasão, resistência à penetração viral, costuras termoseladas, com abertura e fechamento frontal por ziper; • máscara de proteção respiratória PFF2 ou N95 (quando indicado); • protetor facial; cobre-bota; • luvas descartáveis • avental descartável, resistentes a fluidos e impermeáveis. No Hospital- ANVISA • Todos os EPI deverão ser retirados e descartados como resíduos do Grupo A1. • Usar dispositivos descartáveis para o atendimento ao paciente sempre que possível. • Quando não houver dispositivo descartável, implantar o uso exclusivo para cada paciente, de estetoscópio, esfigmomanômetro e termômetro, que deverão sofrer desinfecção após o uso. No Hospital- ANVISA • Evitar o uso de altas pressões de água e não pulverizar o produto químico desinfetante de procedimentos que gerem aerossóis e respingos. • Usar os EPI recomendados durante a limpeza do meio ambiente e do manuseio de resíduos. • Descartar os materiais perfuro-cortantes em recipientes de paredes rígidas, resistentes à punção, com tampa e resistentes à esterilização. • Estes recipientes deverão estar localizados próximos à área de uso. Estes resíduos são considerados do Grupo A1. Resíduos- ANVISA • Autoclavar todos os resíduos de saúde (Grupo A1) provenientes do atendimento ao paciente e encaminhar para incineração. • Todos os itens com os quais o paciente tiver contato e superfícies ambientais devem ser submetidos à desinfecção com hipoclorito de sódio 10.000 ppm ou 1% de Cloro ativo (com 10 minutos de contato). Nos países africanos, equipes internacionais • Os mortos pelo Ebola devem ser manipulados apenas por pessoas portando roupas de proteção e luvas, e, o corpo deve ser enterrado imediatamente. • Além dos cuidados usuais, os profissionais de saúde devem aplicar estritamente as medidas de controle de infecção recomendadas para evitar a exposição a sangue infectado, fluidos ou ambientes ou objetos contaminados como a roupa suja de um paciente ou agulhas usadas. Tratamento do Ebola nos EUA e Europa Confirmação laboratorial • A confirmação pode ser feita por exames laboratoriais específicos, como reações de transcriptase reversa-polimerase, por meio da detecção de anticorpos IgM e IgG. Manejo de caso • Baseado no isolamento do paciente e uso de barreiras protetoras , como as vistas nos slides anteriores. • Nos países africanos, estas barreiras e o manejo adequado de cadáveres têm sido suficientes para parar os surtos. • Disponibilidade de equipamentos estéreis para injeções e EPI para médicos e enfermeiros é fundamental para controle de epidemias nos países africanos. Tratamento • Ainda não há tratamento curativo específico. • Alguns tratamentos experimentais passam por testes em animais, mas não estão disponíveis para uso humano. • Por isso, os pacientes requerem diagnóstico precoce, para inicio de um tratamento de suporte intensivo, realizado, preferencialmente, em hospitais de referência Tratamento • Alguns pacientes receberam “Zmapp”, incluindo dois americanos e um paciente inglês. • Anticorpos monoclonais (“Coquetel” de anticorpos ) que se mostraram eficazes em primatas mas nunca tinha sido usado em humanos antes. • Os americanos e o enfermeiro inglês já tiveram alta. William Pooley, no dia da alta após infecção por vírus Ebola contraída em Serra Leoa. Tratamento • Normalmente, a infecção ocasiona desidratação, por isso são necessárias reposições de fluidos endovenosos e de reidratação oral com soluções que contenham eletrólitos. • A recuperação do doente pode ser observada quando há um tratamento adequado e precoce. Prevenção/vacinas • Até o momento, não existe uma vacina para a doença do vírus Ebola. • Algumas alternativas estão em fase de testes, feita por tecnologias recombinantes, como partículas semelhantes ao vírus, mas indisponível para uso clínico. Protocolo da ANVISAagosto/2014 ANVISA • Os contactantes deverão ser acompanhados pela Secretaria Estadual de Saúde. • Os contatos de casos suspeitos identificados deverão ser monitorados por 21 dias após a última exposição conhecida. • Para o acompanhamento dos contatos assintomáticos não é necessário o uso de EPI pelos profissionais de saúde. A partir da manifestação de sintomas compatíveis com DVE os contactantes serão tratados como casos suspeitos. Poderemos ter Ebola fora da Africa? • Pelas características da infecção pelo Ebola, a possibilidade de ocorrer uma disseminação global do vírus é muito baixa. Poderemos ter Ebola no Brasil? • No Brasil, não há circulação natural do vírus Ebola em animais silvestres, como em várias regiões da África. • Pessoas no período de incubação não transmitem. • Necessário haver triagem de pessoas vindas dos países onde está havendo transmissão Freira brasileira que mora na Libéria Palavras da irmã Maria Teresa • "Em poucos dias, (a doença) matou muitas pessoas entre nós. Durante a guerra (civil liberiana, terminada em 2003) a gente fugia de uma parte a outra para se defender. Agora não tem para onde fugir e sair. O ebola está em todo lugar, é agressivo e impiedoso.“ • "Os agentes que dão explicações sobre o ebola estão sendo perseguidos e ameaçados pelos moradores. (...) Em várias famílias, morreram até oito ou dez pessoas. Morrem jovens, velhos, gente de todas as idades. Temos que evitar toda a demasiada aproximação com as pessoas, mesmo que (aparentem ser) saudáveis." Triagem • Vem de Guiné, Serra Leoa, Liberia ou Nigeria nos últimos 21 dias? • Teve contato com pessoa doente/animal doente? • Tem doença febril de início súbito? Acompanhada de sinais de hemorragia, como: diarreia sanguinolenta, gengivorragia, enterorragia, hemorragias internas, sinais purpúricos e hematúria? Triagem em Serra Leoa; notar profissional de saúde sem adesão completa a EPI; aventais sem proteção adequada Consequências da epidemia... 15 órfãos em aldeia africana da Serra Leoa Chave do controle • Isolar paciente • Precauções de contato: evitar possibilidade de sangue/fluidos corpóreos atingirem pele ou mucosas do profissional de saúde. • Educação!!!!!!!!!!!!! • Cartaz do Ministério da Saúde da Liberia • Cartaz do Ministério da Saúde da Serra Leoa OMS- 2014 • “ O medo é a barreira mais difícil de ser ultrapassada. O medo causa contatos dos casos a escapar dos sistemas de vigilância, familiares esconderem seus bem amados sintomáticos das autoridades de saúde ou levarem estas pessoas para curandeiros tradicionais. O medo faz os pacientes fugirem dos centros de tratamento. • O medo e a hostilidade que o alimenta tem ameaçado a segurança dos times de resposta africanos e internacionais.” • “É improvável que alguma cura miraculosa terminará com esta epidemia. Ao invés disso, práticas bem embasadas de saúde publica, envolvimento com as comunidades afetadas e grande assistência internacional e solidariedade global serão necessários para derrotar o Ebola na África ocidental” . Anthony S. Fauci, editorial do New England- agosto 2014 Fontes consultadas • ANVISA: http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/oministerio/principal/leia-mais-o-ministerio/197secretaria-svs/14163-ebola-informe-tecnico • CDC: http://www.cdc.gov/vhf/ebola/hcp/infectionprevention-and-control-recommendations.html • OMS:http://www.who.int/csr/resources/who-ipcguidance-ebolafinal-09082014.pdf?ua=1 Sasobas Temé Sadnou, sobrevivente à infecção por Ebola Obrigada! [email protected]