INDICE RESUMO 3 ABSTRACT 4 TABELAS 5 INTRODUÇÃO 6 MATERIAL E MÉTODOS 7 DESENVOLVIMENTO 8 Definição de conceitos 8 Epidemiologia 9 Fisiopatologia 10 Manifestações Clínicas 17 Exames Complementares de Diagnóstico 17 Tratamento 22 CONCLUSÃO 30 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 31 Resumo Sarcopenia pode ser considerada uma síndrome geriátrica caracterizada por perda de massa muscular e força e/ou performance física sendo que é necessário a documentação de dois dos três critérios anteriormente citados para se estabelecer o diagnóstico. Esta condição pode ter consequências muito graves, como é exemplo a síndrome de fragilidade no idoso. Atualmente a sarcopenia afeta mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo e pode vir a afetar mais de 200 milhões de indivíduos nos próximos 40 anos, sendo que é um problema atual e com importância crescente na sociedade. Em relação à fisiopatologia desta condição há que realçar um estado de inflamação crónica decorrente do envelhecimento, alterações na fisiologia do músculo, neuroenvelhecimento, alterações hormonais, sedentarismo, alterações intrínsecas do músculo esquelético e redução tanto da resposta anabólica ao exercício físico como da resposta anabólica à nutrição. Os exames complementares de diagnóstico podem ser divididos em 4 classes: métodos para determinação de massa muscular, métodos para avaliar a força muscular, métodos para a determinação de performance física e marcadores biológicos. O tratamento e prevenção mais adequados passam pela combinação de nutrição apropriada com treino de resistência, estando a aplicação de métodos farmacológicos reservada para situações particulares. Novos fármacos encontram-se atualmente em processo de investigação. PALAVRAS CHAVE: Envelhecimento, Sarcopenia, Fisiopatologia, Diagnóstico, Tratamento Abstract Sarcopenia can be considered a geriatric syndrome characterized by loss of muscle mass and strength and/or physical performance; to establish this diagnosis is necessary the documentation of at least two of the three previous criteria. This condition can have very serious consequences, as the frailty syndrome in the elderly. Currently, sarcopenia affects over than 50 million people worldwide and it could affect more than 200 million people over the next 40 years. It is an actual problem and its importance is increasing in our society. The pathophysiology of this condition includes the state of chronic inflammation due to aging, changes in muscle physiology, neuro-aging, changes in hormone levels, sedentary lifestyle, intrinsic alterations of skeletal muscle and the reduction of both the anabolic response to physical exercise and the anabolic response to nutrition. The diagnostic exams can be divided into 4 classes : methods for measuring muscle mass, muscle strength methods, methods for the determination of physical performance and biological markers . Proper nutrition in combination with resistance training are the most suitable resourses for treatment and prevention of this condition. Application of pharmacological methods still reserved for particular situations. New drugs are currently under investigation. KEY WORDS: Aging, Sarcopenia, Pathophysiology, Diagnosis, Treatment Tabelas Tabela 1-Métodos para avaliar a massa e imagem muscular [32] Introdução Ao longo do ultimo século tem-se assistido a uma alteração na distribuição da população mundial pelas diversas faixas etárias, em que se observa um aumento da longevidade em especial nos países desenvolvidos atingindo alguns deles uma esperança média de vida superior a 80 anos, em oposição com a esperança média de vida do inicio do século vinte que era cerca de 45-50 anos. Durante o período de 2000 a 2030, estima-se que a população com mais de 65 anos continue a crescer em número, e que esse aumento represente um incremento de cerca de 6,9% a 12% na população mundial. Como se pode imaginar, esta alteração demográfica que se observou e se irá continuar a observar nos próximos anos tem consequências no que respeita à prestação de cuidados de saúde, à distribuição de cuidados e a nível económico. [1] O envelhecimento pode ser visto como um período em que há declínio da função da maioria dos órgãos e sistemas devido a mecanismos intrínsecos e/ou extrínsecos, existindo perda progressiva de tecidos saudáveis e acumulação de órgãos e tecidos com função reduzida. De acordo com Berhard Strehler o envelhecimento é universal, intrínseco, progressivo e deletério (irreversível). [2] Um idoso saudável é aquele que tem uma vida social satisfatória, boa condição física e psicológica, apesar de poder ter algumas disfunções como um certo grau de alteração cognitiva, hipertensão, sarcopenia, osteoporose e outras alterações associadas a disfunção de órgão alvo. Pode-se então falar em envelhecimento fisiológico, sendo distinto do envelhecimento patológico que se associa a doenças como as oncológicas, cardiovasculares, entre outras. [3] Uma das alterações mais marcantes do envelhecimento ocorre a nível muscular, em que se observa uma alteração na constituição e diminuição do volume de massa magra com repercussão funcional importante. Este artigo de revisão foca-se então na sarcopenia no envelhecimento (do grego “sarx” (carne) +”penia”), abordando esta temática no que respeita à sua definição, epidemiologia, fisiopatologia, manifestações clínicas, exames auxiliares de diagnóstico e terapêutica, com o objectivo de na prática clínica se poder reconhecer esta entidade mais precocemente e propor terapêutica adequada, evitando algumas consequências nefastas que poderão advir. Material e Métodos Para elaborar este artigo de revisão, realizou-se uma pesquisa nas bases de dados Pubmed/MedLine recorrendo ao serviço de pesquisa da biblioteca do CHUC (Centro Hospitalar Universitário de Coimbra), com a utilização de palavras chave: Sarcopenia e Envelhecimento. Numa primeira fase foi fornecida uma listagem de artigos (contendo título, abstract, autores, datas e revistas onde foram publicados), e de seguida foram selecionados em função da atualidade da publicação e da potencial relevância para o fim em causa. O presente artigo de revisão foi redigido com recurso à literatura publicada até ao momento, e as fontes de informação utilizadas encontram-se devidamente referenciadas. Desenvolvimento Definição de Conceitos O termo sarcopenia que deriva do grego “sarx” (carne) +”penia” foi pela primeira vez abordado por Irwin Rosenberg em 1989 que o definiu como sendo a perda de massa muscular que ocorre durante o envelhecimento. [4,5] Atualmente e de acordo com a definição de 2010 da “European Working Group on Sarcopenia in Older People”, pode ser considerado uma síndrome geriátrica caracterizada por perda de massa muscular e força e/ou performance física com inevitável aumento do risco de limitação de mobilidade, incapacidade motora, diminuição da qualidade de vida e morte [6,7], sendo que é necessário a documentação de dois dos três critérios anteriormente citados para se estabelecer o diagnóstico. A perda de massa muscular deve corresponder a 2 ou mais desvios padrão a baixo da média da massa muscular da população jovem de referência, sendo esta documentada por densitometria (DEXA-“Dual-Energy X-ray Absormetry”) ou análise da impedância bioelétrica (BIA); A perda de força muscular pode ser diagnosticada por força de preensão da mão ou extensão do joelho; A reduzida performance física pode ser demonstrada com score reduzido de acordo com a “Short Physical Performance Battery” . [6] É necessário descartar outros fatores que condicionariam diminuição da força muscular que não a perda de massa magra tais como: alteração do metabolismo energético no músculo, alterações nas inserções tendinosas, alterações na unidade motora, alterações na microcirculação relacionadas com a libertação de óxido nítrico e a mio-esteatose (infiltração de adipócitos no músculo) [8,9]. Para além disso será também importante distinguir a sarcopenia decorrente do envelhecimento de outras formas de perda de músculo secundárias como a “fome”, malnutrição, prolongada inatividade física (como exemplo: pessoas acamadas), embora todos eles se enquadrem num conjunto de factores que contribuem para a natureza multifatorial deste síndrome. Sarcopenia deve também ser diferenciada de caquexia, sendo esta ultima definida como uma síndrome associada a uma doença de base em que há perda de massa muscular com ou sem perda de massa gorda. Na caquexia a inflamação é o ponto chave da fisiopatologia e a perda de peso a clinica dominante. Desta forma pode-se dizer que muitas pessoas com caquexia também têm sarcopenia, ao passo que muitas pessoas sarcopénicas não podem ser consideradas caquéticas, podendo a caquexia ocorrer em qualquer idade. A caquexia pode ser vista como uma forma acelerada de sarcopenia relacionada com a idade. [10,11] Por sua vez a caquexia também deve ser diferenciada de “fome” (“starvation”) e apesar de não ser totalmente reversível com a terapêutica nutricional de suporte, a reduzida ingesta de nutrientes tem um papel muito importante no mecanismo fisiopatológico da caquexia; sendo assim nem todos os doentes malnutridos são caquéticos, ao passo que todos os doentes com caquexia são malnutridos.[12] Epidemiologia da Sarcopenia A partir da quarta década de vida observa-se uma perda progressiva de massa muscular, cerca de 8% por década até aos 70 anos e cerca de 15% nas décadas seguintes, o que resulta num decréscimo de cerca de 40% na circunferência muscular do braço entre os 30 e os 60 anos. Em relação há força muscular (medido através da força de extensão do joelho), verifica-se uma perda de cerca de 10-15% por década até aos 70 anos e 25-40% nas décadas seguintes. De acordo com a literatura é também possível verificar que a perda de massa muscular é maior no homem que na mulher. [13,14] O compromisso funcional que advém da perda de massa muscular acarreta consigo um aumento da morbilidade e mortalidade, que por sua vez representa uma enorme despesa para o Serviço de Saúde. Nos Estados Unidos os custos atribuídos à sarcopenia no ano 2000 foram estimados em 18,5 biliões de dólares. [15] A prevalência da sarcopenia observada nos diferentes estudos não é uniforme, já que existem diferenças na população idosa estudada e na população jovem de controlo (jovens saudáveis), bem como nas técnicas de medição da massa muscular. Desta forma, a prevalência da sarcopenia nos idosos com idades entre a sexta e fim da sétima década de vida varia entre 5% e 13%, aumentando para valores compreendidos entre os 11% e 50% para a população com 80 anos ou mais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde a população com idade maior ou igual a 60 anos no ano de 2000 era de 600 milhões, sendo que, no ano 2025 se prevê um aumento desse numero para 1,2 biliões. Desta forma, de acordo com a prevalência da sarcopenia na população e com os números da Organização Mundial de Saúde, atualmente a sarcopenia afecta mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo e pode vir a afectar mais de 200 milhões de indivíduos nos próximos 40 anos. [1,6] Fisiopatologia - Alterações na fisiologia do músculo e neuroenvelhecimento As alterações decorrentes do envelhecimento sobre o músculo, refletem-se em perda de unidades motoras lentas e rápidas, com perda mais acelerada de unidades motoras rápidas (neurónio motor+fibra muscular); Para além disso verifica-se ainda atrofia das fibras musculares tipo II (fibras glicolíticas rápidas). À medida que as unidades motoras são perdidas (por desenervação), as restantes unidades vão recrutar as fibras musculares que se encontram desenervadas havendo por isso uma adaptação. Desta forma há uma conversão de fibras do tipo II em tipo I, à medida que as fibras tipo II são recrutadas por unidades motoras lentas; como resultado, há pouca alteração na área total ocupada por fibras tipo I, havendo no entanto um aumento do percentual de músculo ocupado por fibras tipo I. Há então diminuição da área seccional de músculo, diminuição do numero total de unidades motoras rápidas, enquanto que o numero de fibras musculares tipo I sofre pouca alteração (resultado da adaptação que foi mencionada anteriormente), e o percentual de área muscular ocupado por fibras lentas(tipo I) aumenta. Tudo isto se traduz numa alteração drástica na função muscular, com diminuição da força muscular, falta de precisão motora e pode ser a causa do tremor típico observado nos idosos. [16,17] Outros níveis do sistema nervoso são também afectados, como o córtex motor, medula espinhal, neurónios periféricos, e junção neuromuscular. Na medula espinhal há uma perda preferencial de neurónios motores alfa que suprem unidades motoras rápidas. Nos nervos periféricos observa-se uma alteração nas bainhas de mielina. Na junção neuromuscular, como já indicado anteriormente, há um aumento do numero de ramificações dos axónios terminais por mecanismos adaptativos secundários à desenervação.[18] Outra alteração morfológica corresponde à infiltração do músculo esquelético por lípidos, quer dentro de adipócitos, quer diretamente nos miócitos. No primeiro caso, verificase que durante o envelhecimento as células satélite musculares desenvolvem um fenótipo de adipócito, no entanto este processo continua parcialmente desconhecido no que diz respeito há sua extensão e distribuição (lípidos intermusculares); No segundo caso, a deposição de lípidos dentro dos miócitos parece ser consequência da redução da capacidade oxidativa das fibras musculares (lípidos intramusculares) [19, 20]. Pode-se então falar de obesidade sarcopénica. Os doentes sarcopénicos com obesidade tem maior tendência a ter problemas de mobilidade e incapacidade motora. A sarcopenia e a obesidade tem então uma ação sinérgica. Neste tipo de sarcopenia, a IL-6 (interleucina-6) tem uma importante atividade catabólica, pois o sua produção relaciona-se com a existência de gordura abdominal. Para além disso o aumento de gordura corporal (em particular da gordura abdominal) contribui também para a redução dos níveis de testosterona e GH (hormona do crescimento) e para o aumento de cortisol, citocinas pró-inflamatórias e outros fatores que contribuem para o estado de inflamação crónica. [21] - Causas Hormonais Durante o envelhecimento há alteração na produção e na sensibilidade do organismo à ação de hormonas circulantes. No âmbito desta revisão vou me focar nas alterações que decorrem na ação da insulina, hormona de crescimento (GH), factor de crescimento semelhante à insulina (IGF-1), cortisol, vitamina D e na testosterona, apesar de também poderem ocorrer alterações noutras hormonas.[1] Em relação à insulina verifica-se uma redução na síntese proteica secundária à insulino-resistência bem como uma “reduzida redução” da inibição da proteólise pela insulina ou ingestão de alimentos. [22] Existem duas formas de produção de IGF-1; uma delas resulta de interação de GH com o fígado, e outra resulta da produção diretamente no músculo. Com o envelhecimento há redução dos níveis circulantes de GH que por sua vez causam redução dos níveis circulantes de IGF-1, assim como também existe redução da produção local deste factor. A IGF-1 tem efeitos anabólicos no músculo, favorecendo a síntese proteica, a diferenciação e proliferação de mioblastos e tem efeitos neurotróficos (favorecendo os mecanismos adaptativos de reenervação). É importante referir que baixos níveis de IGF-1 no idoso estão também associados a reduzida força de extensão do joelho bem como reduzida velocidade de passada. Pode parecer lógico usar como tratamento injeções de GH, no entanto não há relato que tal tratamento pudesse aumentar a força muscular, apesar do possível aumento de massa muscular; além disso o seu tratamento a longo prazo teria efeitos adversos inaceitáveis.[1,22] Relativamente ao papel do cortisol no envelhecimento, é importante referir que há uma redução da sensibilidade do eixo hipotálamo-hipofise-supra-renal, havendo um aumento dos níveis de cortisol circulante com aumento da exposição dos tecidos orgânicos aos glucocorticoides.[1] Os níveis de vitamina D circulantes diminuem significativamente com o envelhecimento, sendo que tal diminuição está relacionada com a sarcopenia, quedas, fratura do fémur e aumento da morbilidade e mortalidade no idoso, devendo ser um ponto importante a explorar do ponto de vista terapêutico. O anabolismo muscular diminui quando os níveis de vitamina D são reduzidos, quer por aumento da degradação miofibrilhar quer pela redução da síntese proteica. [23] No homem os níveis de testosterona livre no soro diminui em cerca de 40% dos 25 aos 75 anos; Uma vez que a testosterona está correlacionada com a produção de cadeias pesadas de miosina e com força muscular, com a redução da sua concentração durante o envelhecimento, há uma diminuição da massa muscular e em menor grau da força. Os níveis de testosterona podem ser considerados como um factor major no declínio da função muscular no idoso. A testosterona está também relacionada com a inibição da via que transforma as células satélite musculares em adipócitos. Na mulher a concentração de testosterona diminui rapidamente entre os 20 e os 45 anos no entanto a sua importância para manter a massa e força muscular não é clara. Apesar dos níveis de testosterona entre os 43 e os 73 anos estarem relacionados com a massa muscular e força, a literatura sugere que a mulher produz testosterona suficiente para ter o efeito anabólico.[22,24] Outro aspecto importante é a redução da concentração de desidroepiandrosterona (um percursor da testosterona) com o envelhecimento. Uma vez que esta hormona inibe a produção de interleucina 6 (IL-6), existe um aumento deste mediador inflamatório condicionando um estado de inflamação crónica promovendo o catabolismo.[22, 24] - Causas Inflamatórias A inflamação pode ser o factor chave na fisiopatologia da sarcopenia decorrente do envelhecimento. No idoso assistimos a um baixo grau de inflamação crónica, que pode ser demonstrado por aumento da concentração de citocinas pró-inflamatórias e reagentes de fase aguda, como o factor de necrose tumoral alfa (TNF-alfa), interleucina 1 e 6 (IL-1 e IL-6) e a proteína C reativa (PCR). O aumento das citocinas pró-inflamatórias resulta num estimulo para a degradação das proteínas musculares e uma inibição da sua síntese. O sistema ubiquitina-proteossoma é a via mais importante na degradação de proteínas musculares. Esta via é ativada pelas citocinas pró-inflamatórias citadas anteriormente e por hormonas como o cortisol e a angiotensina, assim como por espécies reactivas de oxigénio (ROS). [1] O TNF-alfa tem um papel fundamental na fisiopatologia desta síndrome, ativando cinases e factores intracelulares responsáveis pela indução da proteólise, estando também associada a alteração do factor de iniciação 4E, diminuindo a síntese proteica por diminuição da iniciação e transcrição. [1,22] Um efeito indireto da TNF-alfa no metabolismo proteico pode também ser a inibição da ação da insulina no músculo.[22] O tecido adiposo é responsável pela produção de IL-6 e resistina. Desta forma há uma relação entre o adipócito e a degradação proteica, fazendo com que a obesidade contribua para um estado inflamatório crónico que condiciona perda muscular. As citocinas próinflamatórias estão também relacionadas com a diminuição do apetite, diminuição da mobilidade do intestino e atraso no esvaziamento gástrico. [22] As espécies reativas de oxigénio (ROS), que são resultado do metabolismo oxidativo, acumulam-se ao longo do tempo e vão contribuir para alterações degenerativas celulares. Como a mitocôndria produz ROS, o DNA mitocondrial é muito afetado, sendo que a frequência de mutações no DNA mitocondrial é maior nos músculos extremamente sarcopénicos. No entanto o papel da mitocôndria na fisiopatologia da sarcopenia permanece em investigação. Sabe-se apenas que a alteração na mitocôndria pode afectar o transporte de electrões e condicionar a respiração celular, podendo estar envolvida na redução do consumo máximo de oxigénio que ocorre com a idade. [25] - Sedentarismo e Imobilidade Durante o envelhecimento, há tendência para a inatividade física e sedentarismo. De igual forma, também se verifica um aumento do número de quedas, o que faz com que inúmeros idosos fiquem acamados. Os estudos demonstram que existe uma redução da massa muscular sem alterações significativas na massa gorda em idosos que ficam acamados durante 10 dias, ao passo que estes efeitos são apenas notórios quando o período de imobilidade nos adultos jovens é de 28 dias. Isto demonstra que as pessoas idosas têm maior tendência a perder massa muscular quando ficam acamados.[26] - Alterações Intrínsecas do Músculo Esquelético Os estudos que dizem respeito a alterações no número de células satélite musculares não são consensuais, existindo alguns que afirmam que o seu número diminui enquanto noutros o seu número não se altera. Há evidencia que a alteração da capacidade regenerativa do músculo diminui devido a alterações nos reguladores moleculares que atuam na célula satélite muscular, chamados de factores reguladores miogénicos (MRF- Myogenic Regulatory Factors). A expressão destes factores encontra-se diminuída em indivíduos idosos. Outro factor envolvido é a miostatina, que tem uma ação inibitória na diferenciação e proliferação dos miócitos através da supressão da expressão dos MRFs. [27, 28] - Outros Mecanismos Durante o envelhecimento existe um comprometimento/redução tanto da resposta anabólica ao exercício físico como da resposta anabólica à nutrição. A resposta anabólica à alimentação no idoso encontra-se reduzida, estando esta relacionada tanto com a qualidade de proteína consumida como com as alterações hormonais decorrentes do envelhecimento, assim como com a resistência a insulina. Estudos baseados no balanço do nitrogênio indicam que os requisitos proteicos aumentam com a envelhecimento e que as proteínas “rápidas” (soro do leite) são mais benéficas que as “lentas” (caseína) na estimulação da síntese proteica. O mecanismo fisiopatológico desta redução da resposta anabólica parece estar relacionado com um defeito na via de ativação dos aminoácidos de cadeia ramificada, sendo por isso importante do ponto de vista terapêutico aumentar a disponibilidade de aminoácidos de cadeia ramificada.[22] Está demonstrado que uma mistura de aminoácidos essenciais contendo leucina aumentam mais a síntese proteica que outras formas de proteína; O mecanismo pelo qual a leucina estimula a tradução de proteínas está relacionado com o aumento da concentração intracelular desse aminoácido promover a ativação de uma proteína cinase denominada alvo da rapamicina (mTOR). O mTOR estimula a síntese proteica através de ativação de proteínas reguladoras chave. Para além da resposta anabólica reduzida, não se pode deixar de referir que o reduzido aporte nutricional do idoso, em particular a quantidade de proteínas ingeridas, é comum e constitui também uma causa da perda de massa magra.[29] A resposta anabólica ao exercício de resistência ocorre através do reforço da síntese proteica muscular. Apesar de os idosos continuarem a ter resposta anabólica, esse mecanismo é menos eficaz que nos adultos jovens. Da mesma forma, os estudos que analisam o grau de proteólise muscular após exercício sugerem que a proteólise é mais intensa e permanece durante mais tempo nos indivíduos idosos.[22] Manifestações Clínicas A perda de massa muscular conduz a uma diminuição da força (“Kratopenia”) e potência muscular (produto de força muscular com a velocidade de contração – “Dynapenia”), estando estas manifestações relacionadas com um maior risco de mortalidade do que a perda muscular por sí só. A incapacidade de desenvolver uma adequada potência muscular é uma das causas do síndrome de fragilidade. Um idoso “frágil” é um individuo com maior risco de quedas, fraturas, incapacidade, dependência, hospitalização recorrente e mortalidade, sendo que tem uma menor capacidade de resposta a estímulos nocivos apresentando maior vulnerabilidade fisiológica. Os indicadores da síndrome de fragilidade incluem auto-relato de fadiga, incapacidade de subir um vão de escadas, incapacidade de andar um quarteirão, coexistência de mais de cinco patologias e perda de peso recente (especialmente da massa magra). Esta síndrome deve ser considerada uma condição que precede a incapacidade, podendo ser denominada de pré-incapacidade. A sua prevalência corresponde a 50% da prevalência da sarcopenia. Um idoso com incapacidade não consegue desempenhar as atividades do dia a dia, perdendo a sua autonomia e independência. [30,31] Exames Complementares de Diagnóstico Em relação aos exames complementares de diagnósticos estes podem ser dividos em 4 classes: métodos para medição de massa muscular, métodos para avaliação da força muscular, métodos para a determinação de performance física e marcadores biológicos.[32] Os métodos para determinação da massa muscular incluem: densitometria (DEXA“dual energy X-ray absorptiometry”), antropometria, análise de impedância bioelétrica (BIA“Bioelectrical Impedance Analysis”), ressonância magnética (RMN), tomografia computadorizada (TC), excreção urinária de creatina, ultrassom e tomografia computadorizada periférica quantitativa (pQCT-“peripheral quantitative computerized tomography”). [32] A densitometria (DEXA) é uma técnica que permite análise da composição corporal, sendo a escolha de rotina na determinação da densidade mineral óssea. Expõe o individuo a uma dose baixa de radiação, é pouco dispendioso, é necessário um técnico especializado, um centro especializado, e o tempo de execução é de cerca de 15min. Para além disso, a densitometria pode sobrestimar a massa magra de um individuo com edemas, pois não diferencia a água de tecido muscular. A antropometria é um método com custos reduzidos, fácil de usar, no entanto tem baixa validade e exatidão. A análise da impedância bioelétrica (BIA) é um teste de rotina para estudo da composição corporal. A BIA não expõe o individuo a radiação, os custos associados são reduzidos, não necessita de pessoal especializado, é portátil podendo ser realizado à cabeceira do doente, o tempo de execução é reduzido (5 minutos), mas por outro lado é menos sensível e especifico que a densitometria. A BIA, tal como a DEXA, também pode sobrestimar a massa magra na presença de edema. A TC e RMN são os métodos mais específicos, sendo os Gold Standart na determinação da massa muscular. Como nos dão a imagem em cortes axiais, são também excelentes métodos para avaliar a qualidade muscular através da determinação da densidade muscular e infiltração intramuscular de gordura. Estes métodos são bastante dispendiosos, necessitando de pessoal e centros especializados, a sua execução é demorada (15-20 minutos) não sendo por isso usados como testes de rotina. Uma vantagem da RMN em relação a TC reside no facto de esta não expor o doente a elevadas doses de radiação. A determinação da excreção urinária de creatinina é um indicador especifico da massa muscular total. Como desvantagens pode considerar-se que a excreção urinária de creatinina varia ao longo do dia, a excreção urinaria pode ser influenciada com a ingestão de carne, e seria necessário colheitas de urina de 24horas. A utilização de ultrassom é um método económico e não expõe o doente a radiação; No entanto é necessário pessoal especializado para a sua realização, existem dificuldades para avaliar a qualidade muscular e não nos permite avaliar a massa muscular total do individuo A tomografia computadorizada periférica quantitativa (pQCT) consiste num aparelho de TC portátil que mede a área seccional e analisa a composição corporal das extremidades sendo que para a sua execução não é necessário pessoal altamente especializado. Expõe o individuo a doses baixas de radiação, e foi inicialmente desenvolvido para avaliar os parâmetros ósseos tendo menos aplicabilidade a nível muscular. Tabela 1-Métodos para avaliar a massa e imagem muscular [32]: DEXA Vantagens Desvantagens -Pouco dispendioso; -Baixa dose de radiação; -Sensível; -Técnico e centro especializado; -Analisa a composição corporal (massa -Falsos resultados quando doente gorda, massa magra, osso) no corpo apresente edema. inteiro ou numa zona especifica; -Disponível em vários locais. Antropometria -Fácil acesso e ausência de custos. -Não dá informações sobre a qualidade do músculo; -Informação muito limitada e operador dependente; -Influenciada por comorbilidades e estado nutricional. BIA Pouco dispendioso; -resultados baseados na Portátil; resistência corporal; Resultados estão logo disponíveis. -não fornece informação sobre a qualidade do músculo; -afectado pelo estado de hidratação; - os resultados são menos específicos que a RMN, TC e DEXA. TC e RMN -Avalia a qualidade do músculo; -Exposição a Radiação (TC) -Permite cortes seccionais em áreas -Necessário técnicos e centro especificas. especializado; -Muito dispendioso; -Resultados não são imediatos. Excreção Ur. -Tem correlação com a massa muscular - Resultados não são imediatos; Creatinina total. -Influenciado pela alimentação; -Variação diária da excreção. Ultrassom -Pouco dispendioso; - Operador dependente; -Consegue-se aceder a músculos -Não dá informação sobre a específicos. massa muscular total; -Dificuldade técnica para aceder à qualidade muscular. pQTC -Portátil; -Baixa dose de radiação; -Permite cortes seccionais. -Inicialmente foi criado para avaliar os parâmetros ósseos, tendo por isso menos aplicabilidade no músculo. Os valores de cut-off num estudo de Baumgarher publicado em 1998 sobre a prevalência da Sarcopenia no Novo México, são de 7,26 Quilogramas/metro quadrado para homens e 5,45 Quilogramas/metro quadrado para mulheres usando como método de medição de massa muscular a densitometria (DEXA). Neste estudo inicialmente fez-se um ajustamento da massa muscular apendicular em relação ao peso corporal (massa muscular da perna+braço a dividir pelo quadrado da altura). De seguida considerou-se sarcopenia como um valor correspondente a 2 ou mais desvios padrão a baixo do valor de massa apendicular ajustada da média dos adultos de referencia. [33,34] Existem outros valores de cut-off definidos por outros autores e com base noutros métodos de diagnóstico, no entanto tais dados saem fora do âmbito desta revisão. Em relação aos métodos para avaliar a força muscular, existem dois tipos de métodos: os dinamómetros (que medem a força isométrica) e aparelhos mais complexos que nos dão medição de potência muscular (produto da força muscular com a velocidade de contração). Uma vez que a sarcopenia é uma condição sistémica que não se limita a um grupo muscular específico, a medição de força muscular nos vários compartimentos musculares está correlacionada. Desta forma, um método eficaz e simples de avaliar a força muscular no idoso será através da força de preensão da mão com um dinamómetro [32] Os métodos mais utilizados para avaliar a performance física incluem o “Short Physical Performance Battery” (que é baseado na velocidade da passada, na capacidade de um individuo se levantar de uma cadeira e testes de equilíbrio), o teste dos 400m de passada e o teste 6 minutos. [35,36,37] Os marcadores biológicos como citocinas pró-inflamatórias, anemia, níveis de albumina sérica reduzidos, níveis plamáticos de Selénio reduzidos, biomarcadores de lesão axidativa (como o oxLDL- “Oxidized low-density lipoprotein”, que resulta da peroxidação da lipoproteina de baixa densidade (LDL)) apresentam uma baixa especificidade para a perda de massa magra e de força muscular tendo por isso uma utilidade limitada no diagnóstico, uma vez que são também marcadores de outras patologias. Em relação à medição dos níveis circulantes de ubiquitina-proteossoma, apesar de constituir um marcador específico de proteólise, a sua relação com a sarcopenia no idoso ainda não foi estudada. [32] Tratamento A Sarcopenia é uma condição de etiologia multifatorial que pode ser tratada por múltiplos métodos. Dentro das estratégias disponíveis, o exercício físico (treino de resistência) em combinação com uma nutrição adequada constituem a forma mais eficaz de prevenir e tratar a sarcopenia. [1] - Exercício Durante a atividade física, a contração muscular causa uma libertação de factores de crescimento muscular que ativam as células satélite e favorecem a síntese proteica, contribuindo para a regeneração muscular (processo que se torna menos eficaz com o envelhecimento). A prática de exercício físico, mais especificamente treino de resistência, tem como consequências ganhos a nível de força e massa muscular. É importante considerar que com o envelhecimento surgem limitações para a pratica deste tipo de exercício, quer do ponto de vista osteoarticular quer cardiovascular, que condicionam os seus efeitos, sendo essas limitações mais evidentes nos indivíduos mais idosos, mais “frágeis” ou com fraco suporte social. Por outro lado, o treino de resistência não deve ser descontinuado, pois isso teria como consequência uma perda rápida dos benefícios adquiridos com a sua prática. [38] Existem diferentes estudos descritos sobre o efeito do treino de resistência na força e massa muscular. Frontera et al que realizou um estudo em que indivíduos do sexo masculino entre os 60 e 72 anos foram submetidos a treino de resistência durante 12 semanas e Fiantarone et al que realizou um estudo semelhante com homens e mulheres entre os 87 e 96 anos submetidos a treino de resistência durante 8 semanas obtiveram resultados semelhantes; Em ambos os casos se obtive um ganho de massa muscular de cerca de 10% e um ganho em termos de força muscular de cerca de 170%. Desta forma, pode-se concluir que existe uma diferença enorme entre os ganhos de força e de massa muscular decorrente da prática de treino de resistência, sendo que os ganhos no que respeita a força muscular superam de longe os ganhos de massa muscular. A perda de força muscular é mais evidente que a perda de massa em indivíduos sedentários, e por sua vez os ganhos de força muscular superam os ganhos de massa em indivíduos sujeitos a treino de resistência. Pode se então considerar que tamanho de músculo não é equivalente a qualidade muscular e que não é o ponto determinante da função muscular. [39,40] -Farmacologia No homem idoso os níveis de testosterona diminuem a um ritmo de 1% por ano de forma que 20% dos homens na sexta década de vida e 50% na oitava têm hipogonadismo. [41] Esta redução de testosterona está relacionada com perda de força e massa muscular, assim como com uma deterioração do status funcional. [42] Por sua vez na mulher ocorre uma redução dos níveis circulantes de estrogénio com a menopausa que tem como consequência uma diminuição da força e massa muscular, uma vez que os estrogénios podem ser convertidos perifericamente em testosterona. As hormonas sexuais têm também uma ação supressora nas citocinas inflamatórias que por sua vez têm efeitos catabólicos no músculo. No homem jovem que pratica treino de resistência a administração de doses superiores à concentração fisiológica de testosterona está associada a um aumento muito acentuado de massa e força muscular. No homem idoso com hipogonadismo, a administração de testosterona aumenta a massa muscular, a força e reduz o percentual de massa gorda. Em relação aos indivíduos idosos que não tem hipogonadismo a eficácia na administração de testosterona na força e massa muscular é inconclusivo. [41] Nos idosos com síndrome de fragilidade a administração de 50 mg por dia de testosterona durante 6 meses demonstrou um aumento da massa magra assim como um aumento na força muscular, sendo este incremento maior quando combinado com exercício físico e com uma nutrição adequada. [43] Os efeitos da administração de testosterona na redução do numero de quedas, redução do numero de mortes, e aumento da autonomia no idoso continuam por estudar. [41] A administração de testosterona no tratamento do idoso com sarcopenia é controverso, devido aos potenciais efeitos secundários (como exemplo: acne, alterações na forma e tamanho dos testículos, edemas, alterações no desempenho sexual, obstrução urinária, apneia do sono, depressão [44]). Atualmente, apenas se recomenda a administração de testosterona em homens com sinais e sintomas de deficiência de androgénios (incluindo reduzida massa muscular e força) e com níveis séricos baixos de testosterona, sendo que a ausência de benefícios após seis meses de tratamento justifica uma revisão e uma possível mudança de estratégia terapêutica. Está contraindicada a administração de testosterona em indivíduos com cancro da próstata, eritrocitose, hiperviscosidade sanguínea, apneia obstrutiva do sono não tratada, sintomas do trato urinário baixo e insuficiência cardíaca grau III e IV. [41] Os moduladores seletivos dos receptores de androgénios (SARMS- “Selective Androgen Receptor Modulators”) são agentes não esteroides que se ligam ao receptor de androgénios presente no músculo, órgãos sexuais e osso. Estes agentes têm menor efeito na estimulação prostática e resultam numa menor virilização, tendo por isso menor número de efeitos secundários. Têm efeitos anabólicos, constituindo uma potencial arma terapêutica na sarcopenia, com aplicação tanto na mulher como no homem. No entanto, estes agentes farmacológicos ainda se encontram numa fase precoce de ensaios clínicos. [45] Como com o envelhecimento ocorre uma redução dos níveis séricos de desidroepiandrosterona (um percursor da testosterona) que por sua vez têm um efeito antiinflamatório [22], seria de esperar que administração deste agente resultasse em alterações benéficas a nível muscular, o que de facto não se verifica. Desta forma, e apesar de ter um efeito benéfico no aumento da densidade óssea, não é recomendado o seu uso no tratamento da sarcopenia no idoso. [46] Como já foi referido anteriormente, a mulher tem uma redução da força e massa muscular na altura da menopausa. Estas alterações parecem ser consequência tanto das alterações hormonais como também de alterações no estilo de vida da mulher (como o sedentarismo). A terapêutica hormonal de substituição faz com que as mulheres possam ter uma melhoria da qualidade de vida com aumento da auto-estima o que traz muitos benefícios no pós menopausa. Apesar destes benefícios, os estudos sobre os efeitos dos estrogénios em mulheres pós menopausa na força e massa muscular não são consensuais existindo estudos que demonstram ganho tanto de força como de massa magra enquanto outros não se verifica qualquer alteração. Em relação a mulheres idosas existem poucos estudos realizados até ao momento, pelo que não se consegue concluir a eficácia e a aplicabilidade dos estrogénios no tratamento da sarcopenia no idoso [41] Como já abordado anteriormente, o envelhecimento tem como consequência uma redução nos níveis circulantes de hormona de crescimento (GH) e IGF-1. Em indivíduos idosos do sexo masculino, diversos ensaios clínicos relatam ausência de beneficio da suplementação de GH com o exercício de resistência ou com outras hormonas anabólicas no que respeita a hipertrofia muscular, força, e expressão de IGF-1. [47] No entanto, num ensaio clínico realizado em mulheres obesas na pós menopausa foi demonstrado que a administração de GH (com ou sem combinação com IGF-1) resulta numa redução de peso e massa gorda superior à adquirida com o exercício ou a dieta isoladamente, sem intervir na quantidade de massa magra. [48] Apesar da administração exógena de GH constituir terapêutica de algumas condições (como por exemplo a deficiência primária de GH, a deficiência adquirida de GH, e como tratamento da caquexia associada ao HIV) a sua aplicação no tratamento da sarcopenia no idoso ainda não foi testada no que respeita a segurança e eficácia em ensaios clínicos duplamente cegos. Por outro lado a administração de GH está associada a inúmeros efeitos secundários que limitam a sua aplicação clínica (exemplo: diabetes, ginecomastia, artralgias, edemas, síndrome do túnel cárpico). Da mesma forma, a biologia complexa da ação da GH no organismo bem como a sua pulsatibilidade biológia constituem também pontos que limitam a sua aplicação no tratamento da sarcopenia. [41,44] A concentração sérica de vitamina D vai diminuindo com o envelhecimento, sendo esta deficiência vitamínica um achado muito prevalente na população idosa. É recomendada a determinação da concentração sérica de vitamina D em todos os idosos com sarcopenia, sendo que deve ser iniciada suplementação naqueles cuja concentração seja inferior a 100 nmol/L. A perda de força proximal e a miopatia induzida por estatinas constituem manifestações clínicas típicas deste défice vitamínico. A suplementação com vitamina D no tratamento da sarcopenia tem como benefício o aumento de força muscular e redução do risco de quedas e de fracturas. [41,49] Encontram-se em investigação possíveis estratégias de tratamento da sarcopenia e da caquexia, entre as quais se destaca a utilização de grelina, o antagonista do receptor da melanocortina 4 a nível central (MC4R), a utilização de leptina, e o antagonista da miostatina no músculo. Em relação a utilização de grelina no tratamento da caquexia em doentes crónicos, destaca-se um ensaio clínico realizado em 25 doentes com doença pulmonar obstrutiva crónica em que a administração de injeções subcutâneas de um análogo da grelina resultou num aumento da massa magra e melhoria da função motora. [50] Não foram publicados até ao momento resultados sobre a sua aplicabilidade no tratamento da sarcopenia. Em relação ao antagonismo do receptor central da melanocortina 4 (MC4R), foi demonstrado num modelo animal (rato) com caquexia cardíaca que esse bloqueio aumentava tanto a massa gorda como a massa magra. [51] Os resultados deste antagonismo no Ser Humano ainda não foram publicados até ao momento. O papel da leptina na fisiopatologia da sarcopenia não é claro, no entanto sabe-se que a leptina pode influenciar a síntese proteica a nível muscular podendo constituir uma arma terapêutica no futuro. [41] Em relação à miostatina, sabe-se que esta é expressa no músculo esquelético e que tem como ação a inibição da síntese proteica e inibição do crescimento muscular. Desta forma, a inibição da miostatina pode constituir uma estratégia terapêutica do futuro no tratamento da sarcopenia e da distrofia muscular. [41] Como já abordado anteriormente, a inflamação parece ter um papel fundamental na fisiopatologia da sarcopenia, levando-nos a pensar que do ponto de vista terapêutico os antiinflamatórios pudessem constituir uma arma poderosa para prevenir e impedir a progressão desta síndrome. Sabe-se por exemplo que a talidomida aumenta o peso e a quantidade de massa magra em doentes com SIDA, resta-nos por isso aguardar que sejam realizados ensaios clínicos sobre o efeito dos agentes anti-inflamatórios em idosos sarcopénicos. [1,22,41] A suplementação de creatina é essencial para aumentar as reservas energéticas extramitocondriais através da formação de fosfocreatina, contribuindo para um aumento da capacidade física e ganhos a nível de massa e força muscular. Para além disso a creatina também parece ser responsável pela diminuição do catabolismo proteico e por aumentar o ritmo de síntese proteica. A creatina pode também ser responsável pela modulação de genes específicos do músculo, como a miogenina, e em combinação com treino de resistência parece também reforçar a ativação das células satélite musculares. [41] Desta forma a creatina aumenta tanto a massa muscular como a força de extensão/flexão do joelho em indivíduos idosos. A creatina causa também retenção de fluidos que pode resultar em edemas periféricos, sendo um ponto negativo para a sua aplicação no idoso. Nutrição Como já abordado anteriormente, a nutrição desempenha um papel importantíssimo na fisiopatologia da Sarcopenia, pelo que constitui também um ponto chave no tratamento desta condição. Uma nutrição adequada, em particular a ingestão de proteínas, é essencial para a manutenção da massa muscular. A quantidade de proteína adequada num idoso é de 1,25 a 1,50 g/kg/dia, sendo maior do que a o valor que é recomendado para um adulto (0,8 g/kg/dia), sugerindo então que as necessidades proteicas no idoso podem estar aumentadas. [53] Alguns estudos foram realizados para verificar o efeito de uma ingestão diária de proteína elevada no idoso. Num estudo verificou-se que o turnover proteico é reforçado quando a proteína corresponde a cerca de 12-21% da fonte energética diária. [54] Noutro estudo, em que se utilizou uma dose diária de proteína de 3g/kg/dia durante 10 dias, não se verificou alteração na síntese proteica a nível muscular, nem na massa muscular total. Neste mesmo estudo verificou-se também que uma carga diária de proteína muito elevada causa um aumento da taxa de filtração glomerular nos jovens e uma diminuição da função renal no idoso, sugerindo que uma carga proteica muito elevada pode ser prejudicial nos indivíduos idosos. [55] Noutro estudo ainda, em que se realizou um “follow-up” de 3 anos de idosos que consumiam uma dose diária de proteína superior à recomendada no adulto, verificou-se que um consumo mais elevado de proteína causa uma menor redução da massa magra apendicular. [56] Em relação ao tipo de proteína ingerida, é necessário referir que as proteínas de maior valor biológico têm maior impacto a na inibição da protéolise a nível muscular. Foi também demonstrado que as proteínas “rápidas” (soro do leite) são mais benéficas que as “lentas” (caseína) na estimulação da síntese proteica. [22] Uma mistura de aminoácidos essenciais contendo leucina aumenta mais a síntese proteica que outras formas de proteína; o mecanismo pelo qual a leucina estimula a tradução de proteínas está relacionado com o aumento da concentração intracelular desse aminoácido promover a ativação de uma proteína cinase denominada alvo da rapamicina (mTOR). O mTOR estimula a síntese proteica através de ativação de proteínas reguladoras chave. [29] Alguns dos alimentos que contêm leucina são: leite, queijo, carne, atum, amendoim e ovos. Outro ponto importante a considerar é a distribuição da ingestão proteica ao longo do dia. De acordo com a literatura, nos idosos é mais benéfico uma ingestão de cerca de 80% da proteína total diaria numa refeição (almoço) que uma ingestão espaçada de pequenas quantidades de proteína. [22] Este tipo de estratégia é chamado de “pulse protein pattern”, e causa uma maior retenção de proteínas no idoso assim como um balanço de nitrogénio “mais positivo”. Esta estratégia tem como vantagens: uma refeição rica em proteína ao almoço faz com que a concentração de aminoácidos aumente drasticamente no organismo e de seguida as pequenas refeições contendo pequena quantidade de proteína e maior quantidade de hidratos de carbono vão ser responsáveis por um aumento da insulina pós-prandial que limita a perda proteica por redução da proteólise. A “pulse protein pattern” faz com que os idosos possam recuperar até certo ponto a resposta anabólica à nutrição, e representa uma forma mais adequada e segura de fornecer mais quantidade de proteína aos indivíduos idosos. [22, 53] Conclusão A sarcopenia é uma causa muito importante de morbilidade e mortalidade no idoso. Com o aumento da esperança média de vida e com envelhecimento atual da população mundial esta síndrome geriátrica ganha um destaque especial pelo que deve ser melhor entendida a sua fisiopatologia para que se possa proceder a uma intervenção terapêutica adequada. Para além disso, será importante também uniformizar uma estratégia diagnóstica para que se consiga reconhecer esta condição o mais precocemente possível com a finalidade de prevenir eventuais complicações. Em relação ao tratamento, reconhece-se que a melhor intervenção passa pela nutrição adequada em associação com treino de resistência, estando o tratamento farmacológico reservado para situações específicas. Apesar de ser o tratamento com melhores resultados demonstrados até ao momento, muitas das vezes a sua aplicação não é possível, uma vez que alguns idosos não têm suporte familiar que lhes permita efetuar uma alimentação rigorosa assim como a prática de exercício físico pode ser contra-indicada por comorbilidades existentes no idoso. Seria importante realizar um estudo sobre a influencia dos antiinflamatórios no tratamento da sarcopenia, uma vez que a inflamação parece ter um papel importante na patogénese desta síndrome geriátrica. Referencias Bibliográficas 1. Cuiying Wang , Li Bai. Sarcopenia in the elderly: Basic and clinical issues. Geriatr Gerontol Int 2012; 12: 388–396 2. Strehler BL. Time, cells, and aging. Academic Press, New York; 1997 3. Goto M. Inflammaging (inflammation+aging): a driving force for human aging based on an evolutionary antagonistic pleiotropy theory? BioScience Trends 2008 (6):218230 4. Rosenberg IH. Summary comments. Am J Clin Nutr 1989;50:1231-3 5. 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