Transferência Gênica

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Transferência
Gênica
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Quando a Calgene iniciou a comercialização da sua
variedade de tomate transgênico "FLAVR SAVR" em 1994,
após sua liberação pela "Food and Drug Administration"
(FDA), os ecólogos levantaram duas questões principais.
Pode ocorrer escape gênico dessa variedade? Se positivo,
quais seriam as conseqüências?
Existem três tipos básicos de transferência gênica
relevantes: transferência planta–planta, transferência
planta–bactéria e transferência bactéria–bactéria. Outros
tipos de transferência são de menor relevância.
Transferência Planta–Planta
A avaliação dos riscos de transferência gênica planta–
planta deve-se fundamentar na biologia reprodutiva da
cultura e na existência de biotipos sexualmente
compatíveis. A taxa de fecundação natural e a existência de
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A. Borém
sistemas de incompatibilidade sexual definem os riscos da
transferência planta–planta. Estes riscos de transferência
planta–planta são abordados em diferentes perspectivas ao
longo deste livro.
Transferência Planta–Bactéria
O risco de bactérias do trato intestinal adquirirem genes
repórteres usados nas construções utilizadas na
transformação gênica foi alvo de preocupação dos ecólogos.
As construções utilizadas em transformação incluem genes
que facilitam a identificação e seleção de indivíduos
transformados. Os mais comuns genes repórteres são
aqueles que codificam para resistência a antibióticos, como
higromicina, canamicina e ampicilina, dentre outros.
Outros genes repórteres, como Gus, Luc e Bar, também têm
sido utilizados.
A avaliação dos riscos de transferência desses genes para
bactérias do solo ou do trato digestivo humano ou animal é
parte do protocolo de biossegurança para liberação de
variedades transgênicas. Anteriormente ao lançamento da
sua primeira variedade transgênica, a Calgene listou esses
riscos, construindo modelos de transferência gênica e
usando dados da literatura. A Calgene não estimou
diretamente a transferência gênica em condições de campo
ou de trato digestivo, uma vez que o nível de resistência das
bactérias nativas desses ambientes já era relativamente
alto. Após a análise dos dados, o FDA concluiu que não
existiria aumento no nível de resistência à canamicina,
gene repórter do tomate FLAVR SAVR, decorrente da sua
ingestão. Conclusões similares foram tiradas também com
relação às bactérias do solo.
O risco da transferência de transgenes de alimentos
ingeridos por homens ou animais para as células epiteliais
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do intestino foi detalhadamente estudado, e a conclusão foi
de que esses riscos são extremamente pequenos, uma vez
que as células do trato digestivo são completamente
diferenciadas, não se dividem e são continuamente
descamadas.
Transferência Bactéria–Bactéria
Agrobactérias portadoras de plasmídios geneticamente
modificados
são
rotineiramente
utilizadas
para
transformar espécies vegetais. Até alguns anos atrás, era
geralmente aceito que a relação da bactéria utilizada nos
procedimentos de transformação gênica com a espécie
objeto da transformação era passageira e que a
agrobactéria não sobreviveria ou persistiria após as etapas
de seleção dos indivíduos transformados. Entretanto,
ocasionalmente agrobactérias são isoladas de plantas
transformadas muitos meses após a infecção (Hoeven et al.,
1991). Embora agrobactérias possam persistir nos
indivíduos transformados, elas não lhes causam tumor.
Entretanto, suspeita-se de que essas bactérias são capazes
de transferir genes para outras bactérias no meio ambiente
(Hoeven e Dietz, 1991; Mogilner et al., 1993).
O fluxo gênico entre bactérias, especialmente a partir
daquelas portadoras de transgenes, tem despertado
preocupação nos ecólogos (Barrett et al., 1997; Laudsmann,
1995). Todavia, na maioria dos casos de transferência
gênica horizontal, nenhum risco para o meio ambiente tem
sido detectado.
A avaliação dos riscos de liberação de variedades
transgênicas portadoras de agrobactérias geneticamente
modificadas aparentemente só é relevante em casos
específicos, como na eventualidade da transferência de
genes de resistência a antibióticos da agrobactéria para
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A. Borém
patógenos, o que resultaria em vantagem competitiva
desses microrganismos.
A persistência de agrobactérias em plantas após a
transformação tem desafiado diferentes procedimentos de
limpeza. Entretanto, a não-transmissão dessa bactéria via
sementes tem permitido segurança na liberação de
variedades
transgênicas
das
espécies
propagadas
sexualmente, isto é, via sementes. Dessa forma, o uso de
antibióticos
ou
de
técnicas
de
eliminação
de
microrganismos via cultura de meristema, dentre outros,
deve ser adotado antes da liberação de variedades
transgênicas das espécies assexualmente propagadas.
A persistência de plasmídios livres
transgênicos não é relatada na literatura.
em
indivíduos
A seguir são apresentados dois modelos para estudos de
transferência de genes de plantas para bactérias, um no
trato digestivo e outro no solo, para ilustrar os
procedimentos utilizados aos se analisar a biossegurança
dos organismos geneticamente modificados.
Modelo de Transferência Gênica
no Trato Digestivo
Para estimar os riscos de transferência gênica no trato
digestivo, deve-se estimar a quantidade do gene codificador
da canamicina que é ingerido diariamente. Nenhum
fragmento de DNA grande o suficiente para conter um gene
intacto de canamicina é detectado após 10 minutos sob a
ação do suco gástrico. A probabilidade de uma seqüência
gênica suportar a digestão intestinal pode ser considerada
zero (Berkowitz, 1990). Entretanto, se for assumido que
0,1% do DNA ingerido permanece intacto para
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transferência para bactérias do trato digestivo, o risco pode
ser calculado para o pior cenário.
Após 10 minutos sob a ação do suco gástrico e das secreções
pancreáticas, praticamente nenhum fragmento com mais
de 1 Kb pode ser detectado. Normalmente, o conteúdo do
estômago é submetido a essas condições por três a cinco
horas. As secreções pancreáticas contêm enzimas que
degradam o DNA a polinucleotídios, com, em média, quatro
nucleotídios. O gene da canamicina possui 1.000
nucleotídios.
O consumo diário de tomate pode ser obtido, utilizando-se
estatísticas coletadas durante anos. O valor utilizado na
avaliação deve considerar o consumo "per capita", isto é, o
consumo médio por indivíduo, e acrescentar uma margem
de garantia para considerar os desvios em torno da média.
No caso específico do DNA originário da ingestão de
tomates não-processados, a quantidade disponível, no pior
cenário, seria de 6,7. 10 −6 mg DNA/ml de fluido intestinal,
considerando-se o consumo médio "per capita". Se esse
valor for multiplicado por 2,5, cobre-se mais de 90% da
variação em torno da média.
Para estimar a transferência no trato digestivo, as
bactérias Streptococcus foram consideradas, uma vez que
este é o único gênero nativo do trato digestivo que possui
espécies portadoras de um sistema natural de
transformação gênica. Escherichia coli não é capaz de ser
transformada nas condições do trato digestivo.
No estudo realizado pela Calgene, três considerações foram
assumidas. Primeira, que todas as bactérias aeróbias
fossem transformáveis, embora nenhuma das espécies de
bactérias residentes no trato digestivo seja reconhecida
como transformável. Segunda, foi assumido que os genes da
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A. Borém
canamicina não seriam rompidos durante a transferência
gênica. Terceira, todos os genes da canamicina
incorporados no genoma bacteriano seriam estáveis e se
expressariam. Embora essas três considerações sejam
extremamente improváveis de acontecer, elas foram
assumidas para simular o pior cenário.
Uma vez que o trato digestivo contém aproximadamente
1012 bactérias Streptococcus e que 75-86% destas já são
resistentes à canamicina, no pior caso uma nova bactéria
resistente seria produzida para cada 750 bilhões delas
presentes. Dessa forma, a margem de segurança é
extremamente grande.
Modelo de Transferência
Gênica no Solo
Para estimar os riscos de transferência gênica no solo,
podem-se considerar dois casos distintos: bactérias grampositivas, como o Bacillus subtillis, que apresenta sistema
natural de transformação; e gram-negativas, como o
Agrobacterium tumefaciens, que também apresenta sistema
natural de transformação.
Considerando-se o pior cenário, em que 100% das bactérias
do solo são competentes, isto é, transformáveis, e todo
resíduo da cultura transgênica no solo contém um gene
intacto de canamicina, o que é muito improvável de
acontecer, uma vez que o gene canamicina constitui menos
que 1.10-5 do genoma. Assumindo, ainda, que após a
recombinação o gene permaneceria estável e sua expressão
resultasse em um produto ativo e estável, no caso do
tomate, chegou-se à conclusão de que se formariam duas
novas bactérias resistentes por hectare, em média, ou 9. 10 5
bactérias/ha no pior caso.
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A produção dessas novas bactérias transformadas,
resultantes da incorporação de genes a partir de debris ou
resíduos da cultura transgênica sobre o solo, constituiria
menos que 1. 10 −6 das bactérias naturalmente resistentes à
canamicina presente no solo.
No caso de Agrobacterium tumefaciens, a probabilidade
seria cerca de três vezes menor, isto é, no pior cenário
ocorreria uma nova bactéria para cada 10 bilhões já
existentes no solo.
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