do artigo

Propaganda
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
Uso de Medicamentos por Hipertensos do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil
Medications taken by Hypertensive Patients in Rio Grande do Sul State, Brazil
Artigo
Original
Christiane de Fátima Colet1, Maiara Marangon1, Karin Hepp Schwambach2
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - Departamento de Ciências da Vida - Ijuí, RS - Brasil
Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre - Porto Alegre, RS - Brasil
1
2
Resumo
Abstract
Fundamentos: A hipertensão arterial sistêmica (HAS)
é um dos grandes problemas de saúde pública no
Brasil e no mundo.
Objetivos: Verificar a utilização de medicamentos por
indivíduos hipertensos e avaliar a adesão ao
tratamento.
Métodos: Estudo transversal, descritivo e quantitativo,
com usuários de uma farmácia comercial conveniada
ao programa Farmácia Popular do Brasil de um
município do Rio Grande do Sul, que utilizavam
medicamentos anti-hipertensivos. Utilizou-se para a
coleta de dados questionário estruturado com questões
abordando características sociodemográficas e
relacionadas ao uso de medicamentos.
Resultados: Foram avaliados 155 usuários hipertensos,
com predomínio do sexo feminino. Mais da metade
dos usuários apresentou pressão arterial >140/90 mmHg.
Os medicamentos mais utilizados foram os diuréticos,
seguidos pelos inibidores da enzima conversora da
angiotensina (IECA). Houve correlação estatística entre
o uso de medicamentos e os níveis pressóricos avaliados.
Conclusões: Os resultados do estudo apontaram um
bom nível de adesão ao tratamento, mas um controle
da PA insatisfatório, mostrando um potencial viés na
avaliação da adesão, que indicam a necessidade de
ações mais efetivas no manejo da HAS, como
adequação da terapia medicamentosa por parte dos
médicos, com suporte de equipe multidisciplinar. O
importante resultado encontrado neste trabalho
refere-se ao subtratamento dos pacientes hipertensos.
Background: Hypertension is a major public health
problem in Brazil and worldwide.
Objectives: To investigate medications taken by
hypertensive patients and assess compliance with
treatment.
Methods: A cross-sectional descriptive and
quantitative study of customers taking antihy
pertensive medications obtained at a commercial
drugstore signed up with Brazil’s Farmácia Popular
government- subsidized drugs program in a town in
Rio Grande do Sul State. The data were collected through
a structured questionnaire addressing issues related
to sociodemographic characteristics and drug use.
Results: 155 hypertensive patients were interviewed,
mainly women. More than half of the users had blood
pressure levels above 140/90mmHg. The most
commonly used medications were diuretics, followed
by angiotensin-converting enzyme inhibitors (ACEIs).
A statistical correlation was noted between the
medications taken and the blood pressure levels
evaluated.
Conclusions: The findings of this study show a good
level of compliance with treatment, but poor blood
pressure control, suggesting a potential bias in
assessing compliance and indicating a need for more
effective hypertension management actions, such as
physicians adjusting medications, backed by
multidisciplinary teams. The main result of this
study shows that hypertensive patients are being
under-treated.
Palavras-chave: Hipertensão; Anti-hipertensivos;
Serviços comunitários de farmácia
Keywords: Hypertension; Antihypertensive agents;
Community pharmacy services
Correspondência: Christiane de Fátima Colet
Rua do Comércio, 3 000 - Universitário - 98700-000 - Ijuí, RS - Brasil
E-mail: [email protected]
Recebido em: 28/07/2014 | Aceito em: 03/10/2014
403
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
Introdução
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é um dos
grandes problemas de saúde pública no Brasil e no
mundo. É uma condição clínica multifatorial
caracterizada por níveis elevados e sustentados de
pressão arterial (PA) 1,2. HAS é considerada uma
doença assintomática, de evolução clínica lenta que,
sem tratamento adequado, pode ter consequências
graves, comprometendo a qualidade de vida do
portador2. Associa-se frequentemente a alterações
funcionais e/ou estruturais dos órgãos-alvo (coração,
encéfalo, rins e vasos sanguíneos) e a alterações
metabólicas, com consequente aumento do risco de
eventos cardiovasculares fatais e não fatais1, como
doença arterial coronariana, acidente vascular
encefálico, doença vascular periférica, insuficiência
renal e insuficiência cardíaca congestiva, dentre
outras2.
Inquéritos populacionais em cidades brasileiras nos
últimos 20 anos apontaram prevalência de HAS acima de
30,0%. Considerando-se valores de PA ≥140/90 mmHg,
22 estudos encontraram prevalências entre 22,3% e
43,9% (média de 32,5%), com mais de 50,0% dos
pacientes com idade entre 60-69 anos, chegando a
75,0% quando >70 anos. A prevalência foi 35,8% entre
homens e 30,0% em mulheres, semelhante à de outros
países1. Revisão sistemática quantitativa de 2003 a 2008,
de 44 estudos em 35 países, revelou uma prevalência
global de 37,8% em homens e 32,1% em mulheres3.
A HAS tem alta prevalência e baixas taxas de
controle, sendo considerada um dos principais
fatores de risco modificáveis para doenças
cardiovasculares (DCV). O objetivo do tratamento
da hipertensão arterial não é somente a redução da
pressão arterial, mas também a redução da morbidade
relacionada a essas doenças1.
O tratamento farmacológico da HAS envolve o uso
contínuo de anti-hipertensivos, e muitas vezes, em
associações 1,4 . Embora haja grande número de
medicamentos com benefícios comprovados no
tratamento e na prevenção de doenças cardiovasculares,
o número de hipertensos que consegue manter a PA
em níveis adequados é muito baixo, relacionado à baixa
adesão ao tratamento por parte desses usuários5.
Diversos fatores podem interferir para que não ocorra
adequada adesão ao tratamento, dentre eles destaca-se
a demora do atendimento, ausência de sintomas,
normalização da PA quando em tratamento, distância
do domicílio ao serviço, falta de conhecimento por
parte do paciente sobre a doença, dificuldade na
marcação de consultas, custo elevado dos medicamentos
e ocorrência de efeitos indesejáveis1,6.
404
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
Considerando que o não acesso aos medicamentos
pode ser um fator para a não adesão ao tratamento, o
Governo Federal implantou em 2004 o programa
Farmácia Popular do Brasil, em parceria com setor
privado varejista farmacêutico, com o objetivo de
viabilizar a dispensação de medicamentos antihipertensivos, gratuitamente7.
Este estudo tem por objetivo conhecer o perfil de
utilização de medicamentos por usuários hipertensos,
e a adesão ao tratamento.
Métodos
O estudo seguiu um modelo transversal, com usuários
de uma farmácia comercial conveniada ao programa
“Aqui tem Farmácia Popular”, de um município
pequeno do noroeste do estado do Rio Grande do Sul.
A população do estudo foi constituída por indivíduos
residentes nesse município, em uso de medicamentos
para tratamento da hipertensão e que utilizavam o
serviço da farmácia em estudo.
A amostragem foi do tipo intencional, e as entrevistas
realizadas nos meses de outubro e novembro de
2012, em dias da semana escolhidos de forma
aleatória. A coleta de dados realizou-se duas vezes
por semana, no turno da tarde, considerando um
menor fluxo de clientes. Foram incluídos no estudo
usuários da farmácia pesquisada que acessassem
esse local no período de coleta de dados,
independente de eles serem ou não indicados pelo
Programa Farmácia Popular, que retiravam antihipertensivos, que aceitassem participar da pesquisa
e assinassem o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Unijuí, sob o nº 77 285/2012.
O instrumento de coleta de dados foi composto pelas
variáveis: sexo, idade e medida da PA. Os medicamentos
utilizados pelos entrevistados foram anotados no
momento da entrevista e conferidos com a prescrição
apresentada para a retirada dos medicamentos.
Para verificar a adesão do paciente ao tratamento
farmacológico, foi utilizado o banco de dados da
farmácia. Verificou-se a regularidade na retirada de
medicamentos para o tratamento da HAS pelos
indivíduos, uma vez que este é o único local do
município que dispensa esses medicamentos de forma
gratuita. Há que se considerar que a Secretaria
Municipal de Saúde não inclui esses medicamentos e
esta é a única farmácia conveniada do município
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
pesquisado. A coleta de dados foi realizada durante
dois meses, sendo analisado, via sistema, a retirada
dos medicamentos no início e no final dos meses de
outubro e novembro de 2012.
Os dados referentes à HAS foram coletados através
da medida da PA por técnica auscultatória, com
esfigmomanômetro, sendo considerados como valores
de referência aqueles estabelecidos pelas VI Diretrizes
Brasileiras de Hipertensão1.
Os medicamentos utilizados pelos usuários foram
listados e classificados de acordo com a Classificação
Internacional Anatômica-Terapêutica-Química (ATC),
utilizando-se o 1º nível (órgão ou sistema de ação), o
4º nível (grupo químico/farmacológico/terapêutico)
e o 5º nível (substância química)8.
Os dados foram armazenados em banco de dados e
analisados através da estatística descritiva, e expressos
em média, desvio-padrão, frequências e valores
máximos e mínimos. A análise estatística foi realizada
no software Statistical Package for the Social Science (SPSS)
(versão 18.0) para o teste de Kruskal-Wallis, que
analisou a relação entre o número de medicamentos
com os estágios da pressão arterial.
Resultados
Amostra constituída por 155 usuários, sendo 74,0%
do sexo feminino. A média de idade foi 61,0±10 anos
(31-93 anos).
Em relação aos níveis pressóricos, verificou-se que 46,0%
apresentavam PA em níveis normais ou limítrofes,
enquanto 54,0% apresentaram PA >140/90 mmHg.
Vale ressaltar que todos os usuários entrevistados
utilizavam um ou mais medicamentos para o
tratamento da HAS, sendo este um critério de inclusão.
Constatou-se a utilização de uma média de
2,0±3,3 medicamentos adquiridos por paciente. Dos
medicamentos adquiridos pelos usuários, classificados
pelo sistema ATC, verificou-se que 82,0% eram para
o sistema cardiovascular e 19,0% relacionados ao
sangue e órgãos hematopoiéticos (Tabela 1).
Neste estudo, 95,0% dos usuários utilizavam um fármaco
para a hipertensão, 4,0% dois fármacos e 1,0% três
fármacos. Entre os medicamentos mais utilizados pelos
usuários, destacam-se: os diuréticos tiazídicos,
representados pela hidroclorotiazida (56,0%) e os
inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA),
cujos fármacos mais prevalentes foram o captopril
(46,5%) e o enalapril (27,0%).
Observou-se correlação significativa (p<0,014) entre
o número de medicamentos anti-hipertensivos
utilizados pelos usuários e os níveis de PA, mostrando
que aqueles usuários que não apresentaram controle
da sua PA na aferição realizada, usavam maior
número de medicamentos para controle da mesma.
Com relação à adesão ao tratamento da HAS,
observou-se que 78,0% dos usuários hipertensos
retiravam o medicamento regularmente, na data
correspondente ao término dos seus medicamentos e,
assim, foram considerados aderentes ao tratamento.
Tabela 1
Classificação dos medicamentos utilizados pelos participantes de acordo com a ATC: 1º nível, 4º nível e 5º nível (n=155)
1° nível
C
Cardiovascular
4° nível
5° nível
n
%
Inibidor da enzima conversora da
angiotensina I
Captopril
72
46,5
Enalapril
42
27,0
Diuréticos tiazídicos
Hidroclorotiazida
87
56,0
Diuréticos de alça
Furosemida
10
6,5
Atenolol
14
9,0
Propranolol
5
3,0
Antagonista do receptor da
angiotensina
Losartana
34
22,0
Inibidores da HMG-Coa redutase
Sinvastatina
19
12,0
Sulfonilureia
Glibenclamida
4
2,0
Biguanida
Metformina
8
5,0
Outros níveis ATC
27
17,0
Total
322
Betabloqueador
B
Sangue e órgãos hematopoiéticos
ATC - Classificação Internacional Anatômica-terapêutica-química; IECA - inibidores da enzima conversora da angiotensina
405
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
Discussão
Os resultados encontrados demonstram que os
entrevistados, em sua maioria, eram idosos. A pressão
sistólica tende a aumentar com a idade, e a diastólica
se eleva até os 50 anos em homens e 60 anos em
mulheres, tendendo a declinar após essa faixa etária9.
Em estudo realizado por Reza e Nogueira10 em uma
população mexicana hipertensa, o predomínio de
hipertensos ocorreu na faixa etária superior a 60 anos
e no sexo feminino, assim como no presente estudo.
Segundo Silva11, no Brasil, a prevalência de HAS está
relacionada ao sexo feminino (66-70%). Encontra-se
em Pessuto e Carvalho9 a justificativa que, com a
mulher mais inserida no mercado de trabalho,
ocorreram mudanças de hábitos de vida, com aumento
do número de mulheres hipertensas.
O tratamento medicamentoso da HAS visa a reduzir
os níveis pressóricos para valores <140 mmHg de
pressão sistólica e a <90 mmHg de pressão diastólica,
respeitando-se as características individuais, as
comorbidades e a qualidade de vida dos pacientes1.
Esta premissa não se confirma neste estudo, visto que
a maioria dos usuários entrevistados retiraram seus
medicamentos para tratamento da HAS com
regularidade no local pesquisado, mas, mesmo assim,
mais da metade deles apresentava PA elevada. O estudo
de Gus et al.12, realizado em Porto Alegre/RS, analisou
uma população de 918 adultos, e somente 25,6% dos
hipertensos tinham seus níveis pressóricos controlados,
mesmo seguindo tratamento medicamentoso.
Considerando que o tratamento da HAS tem como
objetivo primordial a redução da morbidade e da
mortalidade cardiovascular, podendo para isso usar
fármacos anti-hipertensivos11, este estudo demonstra
que parte dos pacientes pode continuar com riscos
elevados de morbidade e mortalidade associados com
a HAS, mesmo com uso de medicamentos.
Em relação aos grupos terapêuticos utilizados pelos
entrevistados, os medicamentos relacionados ao
sistema cardiovascular foram os mais utilizados. É
necessário destacar que a população-alvo deste estudo
foi composta por hipertensos e, assim, é provável que
os percentuais de medicamentos do sistema
cardiovascular sejam superiores àqueles dos demais
estudos. No estudo de Pereira et al.13, realizado no Rio
de Janeiro em programa de hipertensos e diabéticos,
a classe de medicamentos mais utilizada também foi
a do sistema cardiovascular (82,0%).
O tratamento inicial da HAS pode ser realizado
utilizando-se monoterapia ou combinações de dois e
406
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
até mais fármacos em doses baixas1,4. No presente
trabalho 95,0% dos usuários utilizavam apenas um
fármaco anti-hipertensivo. Em outros estudos
realizados no Brasil, a maioria dos pacientes estudados
utiliza mais de um medicamento, como descrito por
Piati et al.14, no qual 65,0% fazem associação de mais
fármacos e apenas 35,0% utilizam apenas um fármaco.
Schroeter et al.15 verificaram em estudo realizado com
385 idosos em Porto Alegre/RS que 58,9% utilizavam
anti-hipertensivo; uso combinado de dois
medicamentos em 40,1% dos pacientes e a monoterapia
prescrita em 35,3%. A combinação medicamentosa de
agentes com mecanismos de ação diferente é
recomendada, pois em alguns idosos resultam em
melhor resposta16.
A classe de medicamentos mais prevalente neste
estudo foram os diuréticos que, em baixas doses,
mostraram benefício em reduzir eventos
cardiovasculares, cerebrovasculares e renais maiores,
têm baixo custo e são recomendados como primeira
opção anti-hipertensiva na maioria dos pacientes.
Entretanto, a monoterapia inicial é eficaz em apenas
40-50% dos casos e muitos pacientes necessitam a
associação com anti-hipertensivo de outra classe17.
Mion et al.18 realizaram um estudo em São Paulo,
analisando 2 519 questionários respondidos por
médicos. Os fármacos mais prescritos pelos
entrevistados para o tratamento da HAS foram os
diuréticos (53,0%), sendo usados como primeira opção
na maioria do pacientes hipertensos, seguidos pelos
IECA, com 24,0%. Nesse estudo, 88,0% dos pacientes
faziam uso de monoterapia, principalmente para
tratamento da hipertensão leve ou moderada. Esses
dados são semelhantes aos da presente pesquisa.
Além dos diuréticos, representado pela hidroclorotiazida,
outros medicamentos mais utilizados neste estudo
foram captopril e enalapril. O estudo de Schroeter et
al.15 também verificou o predomínio dos mesmos
medicamentos, contudo com maior porcentagem de
utilização do enalapril que do captopril, ao contrário
deste estudo. Em estudo realizado com 143 pacientes
hipertensos em Antônio Prado/RS, os IECA foram a
classe de medicamentos mais utilizada19. Já no estudo
de Pucci et al.20, realizado com 260 idosos hipertensos,
em Tubarão/SC, os diuréticos tiazídicos foram
utilizados por 58,8% dos entrevistados e os IECA por
49,2%.
Verificou-se neste estudo a ausência de bloqueadores
de canais de cálcio entre as classes farmacológicas
anti-hipertensivas utilizada pelos entrevistados,
diferindo de outros encontrados na literatura19,20. Este
fato pode estar relacionado com as características dos
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
prescritos do município pesquisado e também ao fato
de esta classe não estar presente na lista de itens do
Programa Farmácia Popular do Brasil. Pode-se
inclusive prever uma possível tendência desse
município na prescrição dos itens que estão
contemplados na listagem, em relação àqueles que
não são subsidiados pelo governo.
A análise estatística realizada indica que os usuários
que não apresentaram controle da PA na aferição
utilizavam maior número de medicamentos para tal
finalidade, dado também encontrado no estudo de
Pucci et al. 20. Isto pode indicar dificuldades no
cumprimento do esquema terapêutico pelo número
de medicamentos, problemas de não adesão ao
tratamento ou ainda problemas na avaliação do
quadro clínico geral, como avaliação de comorbidades,
evidenciando a necessidade de mais atenção a esses
pacientes, pelo aumento das chances de ocorrência de
efeitos adversos e interações medicamentosas15.
A adesão ao tratamento pode ser avaliada através de
métodos, classificados em diretos e indiretos. Entre os
indiretos, destacam-se os descritos por Morisky et al.21
que utilizam questionários. Os métodos diretos podem
incluir a detecção do medicamento, metabólito, ou
marcador no plasma ou urina. Todos esses métodos
apresentam vantagens e desvantagens, sendo que a
combinação de dois ou mais métodos parece aumentar
a confiabilidade da aferição22.
Neste estudo observou-se que 78,0% dos entrevistados
estavam seguindo o tratamento, contudo o tempo de
avaliação foi pequeno e este método de avaliação
isolado indica apenas que o medicamento foi retirado
e não administrado. Esta porcentagem elevada pode
ser justificada pela facilidade de acesso ao medicamento,
uma vez que os mesmos são fornecidos por meio do
programa “Aqui tem farmácia popular” do Governo
Federal, que garante o abastecimento regular,
garantindo a disponibilidade dos medicamentos.
Contudo, deve-se considerar que não se sabe,
efetivamente, se a retirada do medicamento significa
necessariamente que o usuário administre o mesmo.
Por outro lado, 22,0% dos hipertensos não retiraram
o medicamento. Isto pode estar relacionado a não
adesão ou ao fato de estes entrevistados terem
adquirido o medicamento em farmácia comercial de
outro município.
Em estudo realizado em Jequié, BA com hipertensos,
58,7% dos informantes aderiram ao tratamento. Dentre
os que não aderiram, os principais motivos relatados
foram a falta de medicamentos (25,4%) e a dificuldade
ao acesso ao sistema de saúde (15,3%)23. No estudo de
Grezzana et al.19, 65,7% mostraram adesão ao tratamento,
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
mas não foi verificado um controle adequado dos
níveis de PA.
Sabendo-se que a adesão ao tratamento medicamentoso
é extremamente importante para o controle da PA,
neste estudo, mesmo com elevada adesão ao
tratamento, os valores de PA não se mostraram
positivos. O fato pode estar relacionado com uma
possível tensão do usuário em contato com os
pesquisadores, levando a resultados alterados, uma
vez que a medida da PA foi realizada uma única vez,
no momento da entrevista. Essa situação é descrita
como possibilidade de hipertensão do avental branco,
principalmente com elevações de pressão arterial
sistólica, que pode ser minimizada por meio de
aferições repetidas1. Também a medida indireta da PA
está sujeita a possibilidades de erros relacionados ao
equipamento, ao paciente, ao procedimento, ao
ambiente e ao observador24.
Este estudo apresenta algumas limitações na execução,
como curto período de avaliação, não avaliação da
possível presença de comorbidades, assim como não
avalia o uso de medicamentos não prescritos,
fitoterápicos ou plantas medicinais que podem estar
influenciando no sucesso terapêutico e no controle da
pressão arterial.
Conclusão
Os resultados do estudo apontam um bom nível de
adesão ao tratamento, mas um controle da PA
insatisfatório, mostrando um potencial viés na
avaliação de adesão e mostram a necessidade de ações
mais efetivas no manejo da HAS, como adequação da
terapia medicamentosa por parte dos médicos e
suporte multidisciplinar. Cabe aos profissionais da
área da saúde estimular a orientação e conscientização
para manutenção de hábitos de vida saudáveis e para
a adesão e seguimento do tratamento farmacológico,
orientando sobre o uso correto dos medicamentos e
sobre a importância do uso de anti-hipertensivos.
Além disso, o principal resultado encontrado neste
trabalho refere-se ao subtratamento dos pacientes
hipertensos, que é uma realidade no Brasil e no mundo
e para a qual se precisa trabalhar com melhor preparo
dos profissionais que atendem esses usuários, para
evitar os desfechos clínicos negativos relacionados à
hipertensão arterial sistêmica não controlada e
subtratada.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
407
Rev Bras Cardiol. 2014;27(6):403-408
novembro/dezembro
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo representa o Trabalho de Conclusão de Curso
em Farmácia de Maiara Marangon pela UNIJUI.
Referências
1. Sociedade Brasileira de Cardiologia; Sociedade
Brasileira de Hipertensão; Sociedade Brasileira de
Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão.
Arq Bras Cardiol. 2010;95(1 supl. 1):1-51. Erratum in:
Arq Bras Cardiol. 2010;95(4):553.
2. Trad LA, Tavares JS, Soares CS, Ripardo RC. Itinerários
terapêuticos face à hipertensão arterial em famílias de
classe popular. Cad Saude Publica. 2010;26(4):797-806.
3. Schmidt MI, Duncan BB, Azevedo e Silva G, Menezes
AM, Monteiro CA, Barreto SM, et al. Chronic noncommunicable diseases in Brazil: burden and current
challenges. Lancet. 2011;377(9781):1949-61.
4. Mancia G, Fagard R, Narkiewicz K, Redón J, Zanchetti
A, Böhm M, et al; Task Force Members. 2013 ESH/ESC.
Guidelines for the management of arterial hypertension:
theTask Force for the management of arterial
hypertension of the European Society of Hypertension
(ESH) and of the European Society of Cardiology (ESC).
J Hypertens. 2013;31(7):1281-357.
5. Ortega KC, Ginani GF, Silva GV, Mion Jr D. Préhipertensão: conceito, epidemiologia e o que falam as
diretrizes. Rev Bras Hipertens. 2009;16(2):83-6.
6. Duarte MTC, Cyrino AP, Cerqueira ATAR, Nemes MIB,
Massako I. Motivos do abandono do seguimento
médico no cuidado a portadores de hipertensão arterial:
a perspectiva do sujeito. Cien Saúde Coletiva.
2010;15(5):2603-10.
7. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 184 de 3 de
fevereiro de 2011. Dispõe sobre o Programa Farmácia
Popular do Brasil. Diário Oficial da União, 4 de fevereiro
de 2011.
8. WHO Collaborating Centre for Drug Statistics
Methodology. [Internet]. ATC/DDD Index 2014. [cited
2014 Apr 10]. Available from: <http://www.whocc.
no/atc_ddd_index>
9. Pessuto J, Carvalho EC. Fatores de risco em indivíduos
com hipertensão arterial. Rev Latino-Am Enfermagem.
1998;6(1): 33-9.
10. Reza CG, Nogueira MS. O estilo de vida de pacientes
hipertensos de um programa de exercício aeróbio:
estudo na cidade de Toluca, México. Esc Anna Nery.
2008;12(2):265-70.
11. Silva MEDC. Representações sociais da hipertensão arterial
elaboradas por portadoras e profissionais de saúde: uma
contribuição para a Enfermagem. [Dissertação de
Mestrado]. Teresina: Universidade Federal do Piauí; 2010.
408
Colet et al.
Uso de Medicamentos por Hipertensos
Artigo Original
12. Gus I, Harzheim E, Zaslavsky C, Medina C, Gus M.
Prevalência, reconhecimento e controle da hipertensão
arterial sistêmica no estado do Rio Grande do Sul. Arq
Bras Cardiol. 2004;83(5):424-8.
13. Pereira VO, Acurcio FA, Guerra Jr AA, Silva GD,
Cherchiglia ML. Perfil de utilização de medicamentos
por indivíduos com hipertensão arterial e diabetes
melittus em municípos da rede farmácia de Minas
Gerais, Brasil. Cad Saude Publica. 2012;28(8):1546-58.
14. Piati J, Felicetti CR, Lopes AC. Perfil nutricional de
hipertensos acompanhados pelo hiperdia em Unidade
Básica de Saúde de cidade paranaense. Rev Bras
Hipertens. 2009;16(2):123-9.
15. Schroeter G, Trombetta T, Faggiani FT, Goulart PV,
Creutzberg M, Viegas K, et al. Terapia anti-hipertensiva
utilizada por pacientes idosos de Porto Alegre/RS,
Brasil. Sci Med. 2007;17(1):14-9.
16. Kohlmann Jr O, Oigman W, Mion Jr D, Rocha JC,
Saraiva JFK, Franco RJS, et al. Estudo multicêntrico da
eficácia, tolerabilidade e efeito sobre a calemia da
combinação fixa de clortalidona e amilorida no
tratamento da hipertensão arterial primária. Rev Bras
Hipertens. 2006;13(3):177-85.
17. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.
Departamento de Atenção Básica. Hipertensão arterial
sistêmica para o Sistema Único de Saúde. Brasília:
Ministério da Saúde, 2006. Cadernos de Atenção Básica
nº 15. Série A. Normas e Manuais Técnicos.
18. Mion Jr D, Pierin AMG, Guimarães A. Tratamento
da hipertensão arterial-respostas de médicos
brasileiros a um inquérito. Rev Ass Med Brasil.
2001;47(3):249-54.
19. Grezzana GB, Stein AT, Pellanda LC. Adesão ao
tratamento e controle da pressão arterial por meio de
monitoração ambulatorial de 24 horas. Arq Bras
Cardiol. 2013;100(4):335-61.
20. Pucci N, Pereira MR, Vinholes DB, Pucci P, Campos
ND. Conhecimento sobre hipertensão arterial sistêmica
e adesão ao tratamento anti-hipertensivo em idosos.
Rev Bras Cardiol. 2012;25(4):322-9.
21. Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and
predictive validity of a self-reported measure of
medication adherence. Med Care. 1986;24(1):67-74.
22. Simoni CR. Avaliação do impacto de métodos de
atenção farmacêutica em pacientes hipertensos não
controlados. [Dissertação de Mestrado] Porto Alegre:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2009.
23. Mascarenhas CHM, Oliveira MML, Souza MS. Adesão
ao tratamento no grupo de hipertensos do bairro
Joaquim Romão- Jequié/BA. Rev Saúde.Com.
2006;2(1):30-8.
24. Pierin AMG, Mion Jr D. Hipertensão, normotensão e o
efeito do avental branco. In. Pierin AMG, coord.
Hipertensão arterial: uma proposta para o cuidar.
Barueri: Manole; 2004. p. 49-70.
Download