entrevista com um professor de Filosofia do nível médio

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Um diálogo: entrevista com um professor de Filosofia do nível médio
Felipe Henrique Souza Cirino
Licenciando do Curso de Filosofia da UFAL
e-mail: [email protected]
RESUMO:
O objetivo deste trabalho é apresentar as expectativas e as limitações vivenciadas por um professor de Filosofia
que trabalha em uma escola estadual de Alagoas. Após a elaboração de um roteiro de entrevista, a qual serviu
como método para a coleta e a análise de dados, como indica a pesquisa qualitativa (LÜDKE e ANDRÉ, 1986),
o professor respondeu algumas perguntas referentes à escola em que atua e ao processo de ensino-aprendizagem
que se tem na educação pública, partindo de sua prática em uma escola de Maceió. As inferências feitas pelo
autor deste texto, a partir das respostas do entrevistado, têm como referencial teórico, as ideias dos autores:
Bueno (2001), Cerletti (2004), Lüdke e André (1986), Martins (2008), Melo (2012), Rocha (2008) e Tonet
(2009). Duas matérias de informativos online, além das Orientações Curriculares para o Ensino Médio (MEC,
2006) também serviram como base para as colocações redigidas no texto.
PALAVRAS-CHAVE: Educação em Alagoas. Ensino de Filosofia. Entrevista. Estágio Supervisionado.
Profissão docente.
1 INTRODUÇÃO
Como requisito da disciplina Estágio Supervisionado 2, do curso de Licenciatura em
Filosofia da Universidade Federal de Alagoas, este texto foi elaborado a partir de uma
entrevista feita com um professor de Filosofia do Ensino Médio da rede pública de Educação
de Alagoas, no primeiro semestre de 2013.
Seguindo o método de entrevista semi-estruturada, proposto por Lüdke e André
(1986), as informações coletadas versam sobre a formação do professor, os conteúdos, a
didática, a metodologia, a avaliação, o planejamento e outros elementos que estão envolvidos
no trabalho da profissão docente. A entrevista foi realizada em dois dias e nela o professor
entrevistado expõe a sua perspectiva a respeito das atividades que ele desempenha na escola,
localizada em um bairro periférico na cidade de Maceió. Ele se dispôs, sem ressalvas, a
contribuir com a construção desse texto, no qual também é proposta uma breve análise do
momento atual da Educação no Estado.
Os autores citados no corpo do texto contribuem para o debate em torno de questões
próprias do ensino de Filosofia: o uso do livro didático, a leitura do texto filosófico, o
planejamento do currículo escolar, a interdisciplinaridade, a função social da escola e etc.
Foram estas as questões que balizaram o diálogo com professor.
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2 CHEGANDO À ESCOLA
Explicando o propósito de minha visita à diretora da escola, fui guiado por ela até a
sala de aula, onde estava o professor de filosofia. Para minha surpresa, eu já o tinha visto na
Universidade. Ele ainda era aluno no período em que ingressei no curso. No meio da agitação
dos alunos que estavam no corredor, eu falei para ele que o aguardaria na sala dos professores
até a hora do intervalo, a fim de que pudéssemos conversar.
Despertou a minha atenção a grande quantidade de alunos que estavam espalhados no
pátio, nos corredores e até no portão de entrada e saída principal. Anteriormente, quando
estive em outras duas escolas públicas estaduais, situação semelhante aconteceu. Imaginei que
os alunos estivessem com aulas vagas, mas isso não explicava porque alguns entravam e
saiam da escola naquele horário, ainda cedo para o horário da saída e já tarde para o horário
de entrada. O porteiro abria e fechava o portão ao som do barulho. A sensação que eu tive foi
a de que a escola estava num longo recreio.
O professor e eu nos reencontramos durante o intervalo, e ele falou que também se
lembrava de mim. Visto isso, considerei amistoso o nosso primeiro contato. Não foi preciso
que eu explicasse a fundo como seria a nossa conversa, dado que ele já havia passado pela
mesma situação, quando estava cursando a disciplina Estágio Supervisionado na universidade.
Falei apenas que, naquele primeiro momento eu faria algumas perguntas acerca de sua
trajetória enquanto professor e sobre o conteúdo trabalhado nas aulas; e pedi que ele se
sentisse bastante à vontade para respondê-las.
Eu perguntei se ele era monitor ou professor efetivo da escola e ele respondeu que era
monitor. Imaginei que ele já houvesse concluído o curso de filosofia, mas ele falou que ainda
faltava entregar o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso). E mesmo não sendo ainda
formado, ele já estava exercendo a profissão docente. Há dois anos ele vinha lecionando
teoria musical e artes em uma escola privada, e há apenas dois meses estava atuando como
professor de filosofia da rede pública estadual de ensino. Na escola privada, ele tinha oito
turmas no turno matutino. E na escola pública, ele tinha somente cinco turmas no turno
vespertino. Diante disso, pensei rapidamente que a pouca experiência dele com o ensino de
filosofia, de alguma maneira, viesse a ser um empecilho para que ele respondesse
satisfatoriamente as perguntas que eu havia elaborado.
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Questionado sobre o uso do livro didático, como referencial teórico para as suas aulas,
ele respondeu que não utiliza o livro adotado pela escola. Ele preferia usar o livro Convite à
Filosofia, de autoria da Marilena Chauí. Perguntei qual era o livro adotado pela escola, e por
qual razão ele não o usava. Ele não lembrava qual era o livro didático da escola, mas disse
que, por já ter a leitura do livro da Chauí, por considerá-lo de fácil compreensão, ele preferia
utilizá-lo em sala de aula. No entanto, para elaborar o seu plano de curso, o professor gostava
de ter várias referências bibliográficas. Ele não se “prendia” às sugestões de um único livro
didático.
Sendo seu plano de curso independente do livro adotado pela escola, faz-se propício
pontuar que um plano de curso não é um plano completamente independente do plano
curricular que envolve toda a escola, pois como escreve Rocha, eu seu artigo Estudos
curriculares e Filosofia:
Se falamos em currículo, somos obrigados a falar em conteúdos e métodos de
ensino; temos que falar sobre coisas mais particulares que dizem respeito aos
problemas decorrentes de sua aplicação concreta nas instituições escolares; devemos
indicar princípios de planejamento e de avaliação a ser colocados em prática; e
devemos, antes de tudo, falar de uma proposta educacional, pois o currículo é o
conjunto das iniciativas, dos meios e dos procedimentos com os quais, nas palavras
de Stenhouse, tentamos colocá-la em prática (ROCHA, 2008, p. 9).
De tal modo, quando o professor afirmou que, de vez em quando, propusera questões
do ENEM como atividade para os alunos, está implícito que a preparação para o ENEM é
uma meta de toda a escola. Interessante também foi o professor ter falado com sinceridade
que, como ele estava na escola há apenas dois meses, ainda conhecendo as turmas, ele não
teria propriedade para falar a respeito do interesse dos alunos pelo ENEM.
O intrigante se coloca: será que a escola, no atual momento histórico da educação no
Brasil, funciona como um preparatório para o ENEM? A pergunta não tem o objetivo de
responder a ela mesma, insinuando que sim, que a escola se reduz ao ENEM. Não se trata
dessa simplificação. A questão é se a proposta educacional da escola, como mencionada por
Rocha, problematiza o ENEM ou não. Afinal, o ENEM é uma política do governo federal e
não um tipo de avaliação natural isenta de falhas; e como tal, ela é passível de erros das mais
variadas ordens.
Com relação ao uso do texto filosófico, o professor considera ser fundamental para o
estudo de filosofia, ler os textos dos filósofos. Além dos trechos disponíveis no livro, ele disse
que levava outros trechos de textos filosóficos para a sala de aula, apesar dos estudantes terem
muita dificuldade em lidar com o texto: dificuldade em interpretar o texto, em identificar as
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ideias centrais, os conceitos presentes. O professor disse que era complicado para eles
entenderem um texto da antiguidade, por exemplo. O texto é denso.
Martins (2008), problematizando a leitura do texto filosófico, no sentido de tentar se
chegar a uma maneira mais correta de sua interpretação em meio a tantas predileções
filosóficas e metodológicas, diz que
Para isso, creio que ainda seja adequada uma análise dos textos a partir daquilo que
ele mesmo nos fornece como instrumentos para a sua compreensão. Se de fato
existem parâmetros para desvendar um pensamento filosófico, esses devem ser
apontados, e certamente o foram, pelo próprio filósofo (...) (MARTINS, 2008,
p.283).
A leitura do texto filosófico apresenta dificuldades para o próprio estudante de
graduação. Não seria exagero dizer que um aluno que não tem o hábito da leitura e da escrita,
não conseguiria interpretar algum texto do filósofo Jean Baudrillard, por exemplo. E aquém
disso, coloca-se a pergunta: é necessário ler o texto de Baudrillard no ensino médio? Sem se
ater aos detalhes da problemática que essa pergunta pode suscitar, ela permanece como uma
indagação provocativa para muitos de nós, graduandos de licenciatura em Filosofia.
A última pergunta respondida pelo monitor, no primeiro encontro, foi a respeito da tão
pautada
interdisciplinaridade.
Perguntei
se
ele
já
tivera
experiências
com
a
interdisciplinaridade no momento da aula e ele, rapidamente, respondeu que não. Ele falou
que isso, a interdisciplinaridade, talvez acontecesse em um momento de gincana, por
exemplo; pois essa perspectiva de ensino não existe na administração da escola.
Interpretei que ele não acreditava na proposta interdisciplinar. De fato, muito se
escreve sobre ela, tanto a favor quanto contra a proposta. Tonet (2009), em um artigo que
critica radicalmente a proposta da interdisciplinaridade, expõe que muitos de seus defensores
não escrevem sobre as razões materiais que tornaram o ensino fragmentado. Ele define e
distingue três características que permeiam o debate em torno do conhecimento: a sua
complexificação, a sua especialização e a sua fragmentação. E admitindo que as duas
primeiras características sejam próprias do desenvolvimento social da humanidade, ele afirma
que a fragmentação é um elemento típico da sociedade burguesa e que, como tal, ela precisa
ser compreendida como um fator de ordem social e histórico:
(...) a proposta de superação da fragmentação do saber ganha um caráter
marcadamente subjetivo. Deixando de lado as raízes materiais da fragmentação do
conhecimento, e mesmo admitindo que este é um processo natural, pressupõe que se
trate de um problema meramente epistêmico e que, portanto, pode ser superado
também no plano epistêmico. Quando muito, além desse plano meramente
epistêmico também se agrega um plano moralista, enfatizando a necessidade de ter
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atitudes pedagógicas integradoras (TONET, 2009, p. 9).
Aproximadamente em 35 minutos, estava encerrada a entrevista naquela quinta-feira.
Ele tinha que voltar para dar aula e só estaria disponível em torno das 18h. Como eu precisava
ir para a universidade, eu não pude esperá-lo e resolvi, então, voltar à escola na semana
seguinte, visto que ele só trabalhava lá em dias de quinta-feira.
3 RETORNANDO À ESCOLA
Voltei na escola, uma semana depois, como havíamos combinado. A metodologia, os
recursos e a avaliação foram os temas desse segundo momento da entrevista.
Mesmo com pouco tempo de serviço na escola, ele disse que procurava diversificar as
suas aulas para além das aulas expositivas. Ele tinha expectativas de utilizar revistas, vídeos e
outros recursos, a fim de que a aula pudesse ser dinamizada. Imaginei que, por ele também ser
professor de artes, ele teria facilidade em elaborar uma didática com recursos não filosóficos
de uma forma atrativa para os alunos.
Pergunto qual recurso didático ele achava interessante e ele falou um pouco
entusiasmado sobre a boa experiência realizada em uma aula, ao passar o filme Fahrenheit
401. A partir do filme, ele pode abordar as ideias de “senso comum”, “transformação social” e
“pensamento crítico”. Imaginando que os alunos não pudessem gostar do filme, não se
interessar pela história, talvez por ser um filme “velho” do ano de 1966, o professor se
surpreendeu com a atividade bem sucedida que realizou.
Ainda sobre a metodologia, eu perguntei se ele já havia trabalhado algo de caráter
prático com a filosofia, uma disciplina que é exercitada através da reflexão sistemática
baseada em teorias. O professor falou que já havia retirado os alunos da sala de aula, mas não
para desenvolver alguma atividade prática. Ultimamente, ele falou que vinha pensando em
Aristóteles, na escola peripatética e em como seria interessante caminhar com os alunos pela
escola. Porém, ele tinha a preocupação com a quantidade de alunos, sobre os quais ele teria
que ter atenção, visto que eles poderiam ficar descontrolados fora da sala de aula.
Cerletti (2004), propondo uma metodologia do ensino filosófico, considera que
Já não será possível pensar em uma didática da filosofia (como uma técnica de
aplicação) independentemente das decisões filosóficas que o professor adote, posto
que o quê ensinar aparecerá sempre entrelaçado com o como fazê-lo, e vice-versa.
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Se a meta de nossa metodologia é o filosofar, o “conteúdo” a ensinar deverá integrar
a atividade, a atitude e o tema filosófico (CERLETTI, 2004, p. 36).
A vontade do professor-monitor, em inovar em sala de aula, coloca para o debate sobre
a metodologia, justamente essa perspectiva de articulação entre o quê se ensina, o conteúdo, e
como se ensina, o modo. Também nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio, está
exposto que “uma metodologia para o ensino da Filosofia deve considerar igualmente aquilo
que é peculiar a ela e o conteúdo específico que está sendo trabalhado” (MEC, 2006). E se
aceitamos que o que é peculiar à Filosofia é a reflexão conceitual sistemática, ainda conforme
as OCEM, o conteúdo da aula pode ser trabalhado com
(…) A utilização de dinâmicas de grupo, recursos audiovisuais, dramatizações,
apresentação de filmes, trabalhos sobre outras ordens de texto, etc, com o cuidado de
não substituir com tais recursos “os textos específicos de Filosofia que abordem os
temas estudados, incluindo-se aqui, sempre que possível, textos ou excertos dos
próprios filósofos, pois é neles que os alunos encontrarão o suporte teórico
necessário para que sua reflexão seja, de fato, filosófica” (MEC, 2006, p. 38).
Dando continuidade a entrevista, eu perguntei se ele tinha a autonomia para elaborar
as avaliações ou se a direção da escola era quem decidia sobre as mesmas. Ele respondeu que
algumas avaliações ficavam ao seu critério, mas que outras eram determinadas pela escola,
como os simulados e as avaliações bimestrais.
Sua avaliação era contínua e, às vezes, ele pontuava os alunos por alguma atividade
feita em sala. Porém, para ele, o que mais importava era que os alunos prestassem atenção no
que ele tinha a dizer no momento da aula. O interesse deles era fundamental para que a aula
tivesse um bom desenvolvimento.
Perguntei em que consistia uma avaliação, dado que a própria Secretaria de Educação
estadual delibera em suas políticas que não pode haver reprovação. A pergunta foi: para que
avaliar se, inevitavelmente, o aluno terá que “passar” para o próximo ano? Ele me disse que
havia uma implicação diferente no caso da Filosofia, pois o papel do professor de Filosofia
não seria só aprovar ou reprovar os alunos. O que ele ensinava precisava fazer sentido para a
vida de cada aluno, na medida em que o importante era que eles aprendessem a pensar a
Filosofia, a partir de suas vidas. Independentemente da avaliação, é mais significativo que
eles absorvam o conteúdo para si.
Tal resposta do professor está relacionada ao que Bueno (2001) escreve a respeito da
função social da escola:
(…) É preciso que, dentro de condições historicamente determinadas, ela procure
dar conta tanto do acesso à cultura como de se constituir em espaço de convivência
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social que favoreça e estimule a formação da cidadania. (…) Isto é, a escola, por
suas características peculiares, talvez seja o único espaço social em que podemos
atuar com o conhecimento como forma de crescimento pessoal (…) (BUENO, 2001,
p. 6).
Sem fazer uma análise sobre o conceito de cidadania, algo que demandaria um texto
bem maior que este, devido à complexidade do tema, o que o entrevistado falou sobre a
absorção do conhecimento para si, articula-se com o que se exige da Filosofia no tocante à
prática cidadã. As Orientações Curriculares para o Ensino Médio reconhecem que a cidadania
pode ser pensada por diferentes perspectivas, ressaltando-se, inclusive, seu caráter limitador à
experiência pedagógica, quando esta se realizava nas antigas disciplinas de Educação Moral e
Cívica. Contudo, em síntese
Cabe, então, especificamente à Filosofia a capacidade de análise, de reconstrução
racional e de crítica, a partir da compreensão de que tomar posições diante de textos
propostos de qualquer tipo (tanto textos filosóficos quanto textos não filosóficos e
formações discursivas não explicitadas em textos) e emitir opiniões acerca deles é
um pressuposto indispensável para o exercício da cidadania (MEC, 2006, p. 26)
4 OUTRAS LINHAS
Além dos temas já expostos, nós também conversamos um pouco acerca da atual
conjuntura da educação, na qual se encontra o professor da rede pública de ensino de Alagoas;
e de quais maneiras vem se desenvolvendo, nesse referido contexto, o relacionamento entre o
docente e os alunos em sala de aula.
Perguntei se há diferença entre a autoridade e o autoritarismo que o professor pode
exercer sobre os alunos e ele respondeu, prontamente, que sim. Ele acredita que o
autoritarismo está ligado ao medo e que o medo não significa respeito. Ninguém deve ser
respeitado por medo. Ele não gosta de dar lição de moral, visto que os estudantes, mesmo em
processo de formação, sabem o que querem. O professor entrevistado conclui dizendo que os
alunos não precisam enxergá-lo com receio, visto que eles devem respeitá-lo pelo simples fato
dele ser o professor que ele é na escola.
Mesmo com uma turma de quarenta ou cinquenta estudantes, o professor acredita que
é possível manter uma boa relação com eles. Ele se esforça para manter o respeito mútuo.
Pergunto se ele atua de uma maneira específica para manter essa boa relação e ele me diz que
procura se aproximar primeiro dos alunos “problemáticos”, visto que os “quietos” prestam
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atenção na aula. Ele afirma: “todos os alunos são pessoas e eu procuro me aproximar delas.”
Percebo que o professor é otimista com relação a sua função como educador, pois ele
disse que a sala de aula não é um problema que o deixa desmotivado. O que o faz pensar em
deixar de ser docente são as questões burocráticas e administrativas em torno da educação.
Para ele, a sala de aula é uma “delícia” se comparada aos tantos problemas que existem na
educação em todo o estado alagoano.
Os problemas da educação em Alagoas são abordados em uma matéria de um jornal
local online, a qual trata do índice do Ideb na região. Na matéria, é descrito que Alagoas
ocupa as piores posições do país no quesito qualidade do ensino público. O Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica exprime em número aquilo que tem como causa o
analfabetismo, os problemas sociais e a falta de infraestrutura em algumas escolas. O próprio
Ministério Público Estadual fez uma denuncia recentemente, através de uma pesquisa, na qual
constata a situação caótica em que está a Educação de Alagoas.
Diante disto, é pertinente procurar respostas para a pergunta feita pela professora
Elizabete Amorim (2012), em um artigo que aborda algumas questões sobre a docência de
Filosofia no ensino médio em Alagoas. Ela pergunta: quais são as consequências que surgem
a partir do fato da Filosofia, uma área do conhecimento que historicamente foi sendo
reservada para as classes privilegiadas, a partir do século XXI, passar a ser “estudada, na sua
grande maioria, por alunos das classes populares (…)?” (MELO, 2011).
Eu penso que uma das consequências que surgem, diz respeito, no mínimo, a qual
seria a metodologia que possibilitaria realizar a “transposição didática”, como é citada por
Cerletti:
É habitual escutar que há que “baixar” o nível da disciplina científica para “adaptála” ao nível do estudante (com a contrapartida de considerar que há que “elevar”
progressivamente o estudante ao nível da disciplina). Partindo dessa perspectiva, a
questão seria, então, como conseguir “baixar” o nível de complexidade de um campo
disciplinar sem perder o essencial no caminho. Yves Chevallard (1998) cunhou o
conceito de “transposição didática”, para dar conta desse procedimento (CERLETTI,
2004, p. 25).
Tornar o que, historicamente, fez-se como erudito em algo acessível às classes
populares que frequentam tanto as escolas públicas quanto as universidades, é um desafio que
se coloca para todos os professores, após a obrigatoriedade da Filosofia no Ensino Médio.
Nesse sentido, o profissional docente está lidando com algo de ordem pedagógica, mas
também com algo de ordem socioeconômica, pois ter que filosofar com estudantes oriundos
da classe trabalhadora, sem perder o “essencial” é um fato que não pode ser relegado da
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realidade escolar.
Em meio ao nosso diálogo sobre a conjuntura da Educação em Alagoas, eu pergunto
por qual razão ele escolheu ser professor de Filosofia. Sinceramente, ele responde que não
escolheu ser professor, mas que escolheu estudar Filosofia. Ser professor foi uma
consequência.
Para ele, a desvalorização da disciplina no contexto social local, porquanto um saber
considerado inútil, é uma dificuldade que ele tenta contornar em sala de aula, explicando para
seus alunos o por quê da Filosofia, variavelmente, ser colocada à margem dos saberes. Além
disso, outra dificuldade enfrentada por ele diz respeito ao próprio salário da sua categoria. A
categoria da qual ele ainda não faz parte, ao menos como empregado efetivo da Educação,
uma vez que ele é professor-monitor e, como tal, não poderia estar satisfeito com o salário
que ganha para exercer a sua profissão.
Ele ainda comenta que nunca trabalhou com a ajuda de um estagiário em suas aulas,
mas que gostaria de poder contar com a ajuda de outro profissional. Ele entende que a
contribuição de um estagiário é importante para controlar a turma, no sentido de manter o
controle no nível do barulho, por exemplo. Também um estagiário poderia propor novas
didáticas.
Eu termino a entrevista recapitulando alguns pontos sobre os quais conversamos e eu
pergunto o que ele pensa, enquanto um professor-monitor, a respeito do atual momento das
escolas públicas em Alagoas. Não foi surpresa ele falar que o quadro atual é calamitoso, pois
a realidade para aqueles que trabalham com a educação no estado, é desanimadora e
desestimulante.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade desenvolvida em estágio, proporcionou o contato direto com a realidade
que, provavelmente, todos os licenciandos vivenciarão como rotina: a sala de aula. Esta que
pode ser utilizada como um símbolo que representa algo maior: a Educação.
Mesmo estando o Curso de Filosofia da UFAL passando por uma crise de identidade,
assim como acontece em outras universidades, com professores que se dividem entre leituras
de bacharel e leituras de licenciatura, não há como negar todo o arcabouço teórico que a
pedagogia nos apresenta. A teoria é indissociável de uma prática, a prática pedagógica. Logo,
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enquanto um professor em formação, diante da realidade desigual em que vivemos, é meu
dever estudar para compreender a natureza de tal desigualdade e atuar sobre ela, a fim de que,
não só o saber filosófico, mas todo o conhecimento produzido pela humanidade até então,
ganhe maiores e melhores sentidos dentro da sala de aula.
Eu lamento o tempo que foi disponível para a realização da entrevista, visto que o
professor só ia à escola um dia na semana. O tempo que tivemos para conversar foi o tempo
do intervalo. Quanto ao registro das informações, eu procurei ser fiel ao que, de fato, o
professor respondeu, mesmo sem a utilização de um gravador. As respostas foram registradas
manualmente.
Por fim, as questões que foram apresentadas no texto, nem de longe, esgotam a
discussão em torno do ensino de Filosofia. Atividades de estágio requerem muita leitura
específica sobre as problemáticas do ensino-aprendizagem e a visita a uma escola é de
fundamental importância para compreender o texto que é o cotidiano escolar.
REFERÊNCIAS
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suas Tecnologias. Vol. 3. Brasília, 2006.
BUENO, José Geraldo Silveira. Função social da escola e organização do trabalho
pedagógico. Educar, Curitiba, nº 17, p. 101-110. 2001.
CERLETTI, Alejandro A. Ensinar filosofia: da pergunta filosófica à proposta metodológica.
In: KOHAN, Walter O. (org.). Filosofia: caminhos para seu ensino. Rio de Janeiro: DP&A,
2004.
LÜDKE, Menga; André, Marli E. D. A.. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: EPU, 1986.
MARTINS, José Antônio. O texto filosófico: uma necessidade. In: Kuiava, E. A.; Sangalli, I.
J.; Carbonara, V. (orgs.). Filosofia, formação docente e cidadania. Ijuí: Ed. Unijuí, 2008.
MELO, Elizabete Amorim de Almeida. “Da Formação à Prática Docente: algumas
considerações sobre ser professor de filosofia no ensino médio em Alagoas”. In: Anais da
SETEPE – Educação, Cultura e Diversidade. Mossoró/RN: Editora Queima-Bucha, 2012.
11
p. 188-201. ISBN: 978-85-8112-020-1 (em CD ROM).
REDAÇÃO. Promotora denuncia caos da Educação em Alagoas e aponta prejuízo de 7
milhões. Correio de Alagoas, Maceió, 2013, 18 de Abril. Disponível em:
<http://www.correiodealagoas.com.br/noticia/9652/politica/2013/04/18/promotora-denunciacaos-da-educaco-em-alagoas-e-aponta-prejuizo-de-r-7-milhes.html>. Acesso em: 20 de mai.
2013.
RIOS, Odilon. Alagoas tem a pior educação do país, segundo Ideb. Extra Alagoas, Maceió,
2012,
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Disponível
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ROCHA, Ronai Pires da. Ensino de Filosofia e currículo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
TONET, Ivo. Interdisciplinaridade, Formação e Emancipação humana. Disponível em:
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