Prática Pedagógica Como nossos pais Somos brancos, negros, pardos; uns temos línguas que enrolam, outros não; nosso cabelo é liso ou encaracolado. Um kit torna fácil ensinar o que significa a expressão herança genética Roberta Bencini Gilton e um grupo da 7ª série: as características hereditárias e os cruzamentos são simulados com pedaços de isopor, cartolina, fios de telefone e alfinetes coloridos Foto: Pedro Motta Faz mais de 100 anos que Mendel formulou as leis básicas da herança biológica. Você se lembra dos experimentos com as ervilhas? Para muitos, não é fácil compreender as siglas (P, F1, BB, Bb) que explicam a variedade de características transmitidas dos pais às gerações seguintes e conceitos como cromossomo X e Y, o cruzamento disso com aquilo... Na sua época de escola, professor, clonar seres humanos e mapear os genes que existem nas células de DNA do corpo humano eram assunto de ficção científica. Hoje, genética virou papo de bar e de cabeleireiro sem falar no intervalo da escola. "Essa história do clone da novela das 8 é real?", perguntou um aluno, no início do ano, a Gilton Natan Soares de Almeida, professor de Ciências Naturais do Colégio Normal Nossa Senhora do Carmo, em Viçosa, a 220 quilômetros de Belo Horizonte. Ciências Naturais Tema: Introdução à genética e ao estudo da biologia das populações Objetivo: Aprender as leis de transmissão de características hereditárias, formular hipóteses de resultados de cruzamentos e entender a probabilidade de nascerem machos e fêmeas numa população Como chegar lá: Crie um jogo e monte um kit que facilite a visualização do processo. Leve a turma ao laboratório e proponha experimentos de observação do ciclo de vida de animais e vegetais, bem como de comprovação da genética envolvida na definição dos sexos Dica: Para a elaboração de um jogo ou kit, solicite a ajuda da turma e opte por um material durável, colorido e que possa ser manipulado por todos os alunos ao mesmo tempo. As experiências de laboratório não podem ser muito longas. Do contrário, há o risco de a turma perder o interesse Ele sempre gostou de criar jogos e kits para tornar as aulas mais dinâmicas. Peças de isopor representando o interior das células, garrafas pet, lâmpadas transformadas em lupa e outros equipamentos inundam o laboratório da escola. Por isso, bastou uma visita ao local para explorar o tema em classe. "Dei-me conta de que era hora de aprofundar os conteúdos de genética já nas turmas de 7ª e 8ª séries, sem esperar chegar ao Ensino Médio", conta Gilton. Nesta reportagem, você vai acompanhar uma experiência realizada com um kit simples e barato criado pelo professor para ajudar no entendimento das leis de transmissão de características hereditárias e um experimento de laboratório para o estudo da biologia das populações. Atividades de sala de aula e de laboratório, como devem ser as de Ciências. Por que somos assim? Por que algumas pessoas têm olhos castanhos, enquanto outras, azuis? Por que alguns são altos e outros, baixos? Essas são algumas dúvidas simples e básicas que surgem logo cedo nas crianças. "Genética é um assunto muito abstrato. Só com criatividade podemos tornar esse ramo complexo da Biologia interessante aos alunos, sem decoreba", conta o professor de Biologia Marco Antônio Magerowski, também inventor de jogos para sala de aula. O objetivo de Gilton ao montar o kit era fazer com que os alunos respondessem sozinhos às questões. Como? Formulando hipóteses; demonstrando, por meio de experimentação, que o método científico facilita a obtenção de resultados confiáveis, discutindo as implicações da hereditariedade nas relações sociais e as conseqüências da manipulação gênica. "Posso ser suspeito para opinar, mas Ciências é uma disciplina gostosa e dinâmica. Temos de explorar o sentido de investigação e curiosidade dos alunos todo o tempo", destaca Marco Antônio. Munido de fios de telefone, isopor, alfinetes coloridos e cartolina, os alunos de Gilton resolveram problemas sobre cruzamentos entre flores de diferentes cores, assim como no trabalho de Mendel com ervilhas. "Troquei ervilhas por flores porque meus alunos conheciam apenas o alimento enlatado, não a planta", explica o professor. O método é muito eficaz e infinitamente melhor do que ficar desenhando uma tabela para calcular os resultados. No infográfico da página 41 você encontra a resolução do problema que envolve o cruzamento de flores de pétalas brancas com outras de pétalas vermelhas. É possível aproveitar o jogo para ensinar o que é gameta, zigoto, cromossomo, divisão celular, fenótipo e genótipo. O kit permite ainda encontrar respostas para questões que envolvam a dominância de uma característica genética como o cruzamento de uma cobaia preta com uma branca ou de um cachorro de pelagem marrom com outro de pelagem preta, além de montar a árvore genealógica das crianças. Divida a classe em grupos de quatros alunos e boa brincadeira. Simule a primeira lei de Mendel de maneira divertida Veja, etapa por etapa, como descobrir o resultado do cruzamento de uma planta de flor vermelha com uma de flor branca Pai vermelho, mãe branca Uma flor de pétalas vermelhas é representada pelo círculo em cartolina vermelha () e uma de pétalas brancas, pela cartolina branca () (o círculo colorido é o fenótipo). Foi determinado que o caráter flor vermelha (B) é dominante em relação ao flor branca (b). Em seguida, são representados os gametas produzidos por esses "pais" Uma célula Um pedaço redondo de cartolina representa uma característica hereditária fenotípica, como a cor da pele ou da pétala de uma flor. A cartolina amarela serve para representar um gameta. Um pedaço pequeno de fio duplo de telefone vira um cromossomo e os genes são os alfinetes, dominantes ou recessivos conforme a cor convencionada A primeira prole O resultado do cruzamento entre os pais serão filhos 100% iguais ou com a mesma cor de petálas do genitor dominante. Porém, cada florzinha carrega uma carga recessiva vinda da mãe, que no kit está representada pelo alfinete branco. Logo depois, os alunos representam os pares de gametas produzidos pelas "filhas" A terceira geração Do cruzamento entre as duas flores da segunda geração, o resultado é 75% com pétalas vermelhas e 25% com brancas. Em plantas, a herança da cor das pétalas segue o previsto pela primeira lei de Mendel, que foi testada com ervilhas Machos e fêmeas Para analisar a genética do sexo e a probabilidade de nascerem machos e fêmeas ou homens e mulheres numa determinada população, Gilton propôs um experimento simples, realizado em laboratório com a Drosophila melanogaster, nome científico da mosquinha da banana. Por que moscas? Por causa do ciclo de vida curto, o que economiza tempo, pela facilidade da técnica de observação e cruzamento e pelo grande número de descendentes. O primeiro passo foi feito em casa. Os alunos cultivaram a banana num pote de vidro. Esperaram que moscas pousassem e depositassem seus ovos e, depois, acompanharam o ciclo de vida das larvas. Por fim, de volta ao laboratório da escola, trocaram a tampa de gaze por um pano embebido com éter, para que as moscas caíssem anestesiadas. Com uma pinça, recolheram cada inseto e sobre uma folha branca de sulfite classificaram os machos e as fêmeas. "Eles chegaram sozinhos à conclusão de que as chances são iguais para os dois sexos e que quanto maior a amostra menor a probabilidade de um resultado diferente desse", explica o professor. O mesmo princípio de herança válido para as moscas serve para outros animais, inclusive os humanos. Não é à toa que o trabalho de Gilton mereceu destaque na Feira Estadual de Ciências de Minas Gerais, em 2001, e que em breve o kit será industrializado. "Mas o melhor prêmio é ver o envolvimento, a participação e a melhoria na aprendizagem dos alunos", diz o professor. O sexo das mosquinhas da banana Para mostrar aos alunos que as chances de nascerem machos e fêmeas são iguais, basta colocar pedaços de banana num pote de vidro e deixá-lo três dias sem tampa. Depois, expulse as moscas que voam sobre a banana e lacre a boca do pote com gaze. No sexto dia é possível observar o surgimento de larvas, que viram novas mosquinhas. Anestesie os insetos com éter e deixe os estudantes classificarem-nos por sexo Grande idéia! Uma lâmpada cheia de água aumenta 20 vezes mais que uma lupa. Tire as partes internas da lâmpada. Encha-a de água e lacre o fundo com a tampa de uma garrafa PET enroscada na parte metálica da lâmpada Quer saber mais? Colégio Normal Nossa Senhora do Carmo, R. Virgílio Val, 118, CEP 36570-000, Viçosa, MG, tel. (0_ _ 31) 38912925 Gilton Natan Soares de Almeida , e-mail:[email protected] INTERNET A Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), mantém um site só com informações ligadas ao estudo da genética: www.virtual.epm.br/cursos/genetica/genetica.htm Endereço da página: https://novaescola.org.br/conteudo/3060/como-nossos-pais Links da página Publicado em NOVA ESCOLA 01 de Agosto de 2002