IDENTIDADE E VARIAÇÃO DOS VERBOS COLOCAR, PEGAR, PERDER, COMER EBEBER Carmen Maria do Carmo Sousa Costa (Bolsista PIBIC/CNPq – UFPI), Maria Auxiliadora Ferreira Lima (Orientador, Depto de Letras – UFPI) INTRODUÇÃO Essa pesquisa está fundamentada na Teoria das Operações Predicativas e Enunciativas (T.O.P.E) de Antoine Culioli.Trata-se deuma pesquisa de natureza semânticoenunciativa, a qualenquadra-se em uma abordagem de caráter construtivista e postula que o sentido de um termo lexical não está previamente definido em termos de categorias previamente estabelecidas, ele é construído nas suas interações com seus diversos ambientes textuais. Nos estudos enunciativos de base culioliana, o sentido de uma expressão linguística não é fixo, estável, ele é construído no e pelo enunciado. Esta pesquisa volta-se para a construção a sentido de uma unidade lexical no âmbito do texto em uma dinâmica de interação que envolve relações cotextuais e contextuais. Dentro desta perspectiva, analisamos ocorrências dos verboscolocar e pegar, observando inicialmente o ambiente sintático, a relação de transitividade e a semanticidade dos argumentos para daí buscarmos o papel desses aspectos na construção de sentido de tais ocorrências verbais. A análise foi feita a partir de um levantamento de ocorrências dos verboscolocar e pegar em textos orais e escritos. Para os textos orais, fizemos uso do corpus do Português falado por teresinenses (PORFATER) e, para os textos escritos, examinamos ocorrências extraídas do Google. METODOLOGIA A metodologia utilizada nessa pesquisa seguiu-se em três aspectos ou fases: (1) Levantamento bibliográfico das principais obras a serem utilizadas na pesquisa e formação do corpus a ser analisado. (2) Leitura e discussão de textos auxiliares com a orientadora e o grupo de estudos e análise do corpus. (3) Elaboração do Relatório Parcial e Final – diante dos resultando alcançados. RESULTADOS E DISCUSSÕES De acordo com as análises, pode-se constatar que o ambiente cotextual foi decisivo para a construção de significação de algumas ocorrências dos verbos colocar e pegar, sobretudo dos elementos à direita do verbo, os argumentos 2, na função de objeto direto, e os argumentos 3, preposições. Conforme apresentam os exemplos abaixo: VERBO COLOCAR 1) João colocou eles na prisão. 2) João e José colocaram o cavalo dentro desse bote. Em 1, a construção na prisão determina o sentido do verbo colocar como aprisionar. X aprisiona Y, X retém Y em algum lugar. Em 2, João e José colocaram o cavalo dentro do bote, temos que X insere Y em algum lugar, sendo o argumento dentro desse bote o responsável pelo sentido de botar, inserir, o que não deixa de remeter ao ato de aprisionar, bem como em 1. Em 1 e 2, temos enunciados organizados sintaticamente da seguinte maneira: “Nome” (Sintagma nominal = sujeito) + sintagma verbal (SV) + sintagma nominal (SN = argumento 2) + sintagma preposicional (SP = argumento 3); de modo que tal estrutura sintagmática apresenta sintagmas em relações de dependência, implicando nas construções de sentido do verbo colocar. Temos assim, em ambos os enunciados, X R (relator) Y em Z. Em uma linha de abstração podemos dizer que, nos dois casos, há uma passagem do exterior para o interior, articulada a uma inserção, na construção do sentido do verbo colocar. 3) Renata vai colocar a sua opinião para os amigos. 4) Ela comia e colocava para fora. Em 3, X expõe algo para Y. Nesse enunciado, os argumentos 2 (a sua opinião) e 3 (para os amigos) atribuem o sentido de expor ao verbo colocar. Em 4, temos o complemento nulo (comida) e a construção para fora implicando no sentido de colocar. Nesse caso, X expele algo. Os enunciados 3 e 4 nos apresentam X R Y para Z e X R N (complemento nulo) para Z, respectivamente. Em uma linha de abstração, podemos dizer que, em 3, há algo que sai do interior para o exterior em direção a Z em uma relação de continuidade; em 4, há algo que sai do exterior passa ao interior e retorna ao exterior constituindo uma ruptura, há uma linha de descontinuidade. VERBO PEGAR 5) A professora também pegou sarampo. 6) A massa pegou liga. 7) O feijão pega mais sal. Em 5, a semanticidade do argumento 2 (sarampo) implica no sentido de pegar. Como a palavra sarampo representa uma doença infectocontagiosa, transmitida por vírus, não seria humanamente possível apalpar ou segurar a doença, o vírus. Portanto, nesse enunciado, temos pegar no sentido de contrair. Em 6, o argumento 2 (liga), através de sua semanticidade, que remete à ideia de fusão, união, amálgama, implica no sentido de pegar como grudar, aderir, firmar. Nesse enunciado, percebemos que pegar liga transmite uma ideia de mudança de estado da massa, ela passa de não homogênea a homogênea. Em 7, o argumento 2 (sal), através de sua semanticidade, sugere que a comida está insossa e que é necessário acrescentar mais sal para que a mesma chegue ao ponto. Portanto, temos pegar no sentido de acrescentar.Se pensarmos em uma linha de abstração, o que há de comum nesses últimos três enunciados é a ideia de algo que foi ou precisa ser adquirido. Em 5, X adquire algo (sarampo). Em 6, X adquire consistência (liga). E, em 7, X precisa adquirir mais de alguma coisa (sal). CONCLUSÃO Com as análises e discussões realizadas, observamos que uma unidade linguística não deve ser vista como um material semântico preconstruído, fixo. Concluímos, portanto, que o verbo colocar não marca apenas o ato de pôr algo sobre uma superfície e que o verbo pegar indica outros sentidos além da sensação tátil, de tocar ou de segurar algo. Em nossa pesquisa, verificamos que os termos constituintes de um enunciado não são inerentes, eles apresentam relação entre si e estão interligados na construção de sentidos. Dessa maneira, o ambiente cotextual foi decisivo para a construção de sentido das ocorrências dos verbos analisados, sendo essenciais no processo de significação os elementos à direita do verbo, o que denominamos de argumentos 2(objetos diretos) e 3 (preposições). Palavras-chave: enunciação; T.O.P.E; verbos. APOIO Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Universidade Federal do Piauí (UFPI). REFERENCIAL TEÓRICO BECHARA, Evanildo; Moderna gramática portuguesa, Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2009. FRANCKEL, Jean-Jacques; PAILLARD, Denis; VOGUÉ, Sarah.Introdução. In: Linguagem e enunciação: representação, referenciação e regulação. São Paulo: Contexto, 2011. LIMA, M. A. F.;SERRA, M. A. C. M. Porfater: Português falado por teresinenses. Edufpi: Teresina, 2010.v.1. NEVES, Maria Helena Moura. A Gramática de Usos do Português. São Paulo: 2010.