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FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO PARA ALÉM DA DISCIPLINA DA REFLEXÃO1
José Marcelo Costa dos Santos
Mestrando em Educação pela Universidade Federal do Piauí; Especialista em Educação (UFPI);
Professor de Educação Básica/SEDUC-PI. E-mail: [email protected]
RESUMO
O presente artigo trata de aporte sobre a Filosofia da Educação. O objetivo do estudo foi analisar ideias e concepções de
pensadores dessa área, buscando a compreensão de como se constituiu, do papel e do sentido de haver Filosofia da
Educação. A discussão realizada, por meio de um estudo bibliográfico, aliado a discussões promovidas na disciplina
Filosofia da Educação, no Mestrado em Educação da UFPI, apontou para o entendimento da Filosofia como ação
criadora, de multiplicidade; do filósofo como ser que constrói conceito, de forma responsável, visando à contribuição
em sociedade, a partir da propagação do conhecimento; e da Filosofia da Educação não como disciplina da reflexão,
mas como campo propício à discussão, a partir da construção conceitual, dos eventos e fenômenos da Educação, no
âmbito da tomada de decisão para (re)pensar melhores condições para o universo educacional.
PALAVRAS-CHAVE: Conceito. Conhecimento. Filosofia da Educação.
Introdução
A Filosofia surge a partir das leituras do pensamento humano, envolve um processo de pensar
sobre o mundo, em diferentes momentos e sob diferentes óticas de compreensão. Como ciência, a
Filosofia se preocupa com as questões em torno da construção de “conceito”, que se torna
conhecimento construído, aprendido e compartilhado ao longo dos séculos. Entretanto, muitas
contradições ainda existem em torno deste campo, e quando se considera o universo educacional, as
opiniões se dividem, principalmente, sobre o que é e qual o papel da Filosofia na Educação.
Nesse sentido, o presente artigo tece uma breve análise em torno dessa questão, tendo como
objeto “A constituição da Filosofia e do Filósofo da Educação”. O objetivo do estudo foi analisar
ideias e concepções de pensadores dessa área, buscando a compreensão de como se constituiu, do
papel e do sentido de haver Filosofia da Educação.
A abordagem em pauta considerou ainda, como questões norteadoras: O que é e para que
serve a Filosofia? O que pode ser compreendido como Filosofia da Educação? Qualo papel do
Filósofo da Educação?
Este artigo, construído mediante um aporte bibliográfico, pautou-se nas discussões realizadas
em grupos de estudo sobre a Filosofia na Educação. As discussões propostas a seguir foram
fundamentadas em diferentes momentos da história da Filosofia, e contemplam a formação, o papel
1 Trabalho oriundo das discussões realizadas na disciplina Filosofia da Educação, no Mestrado
em Educação da
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e a finalidade da Filosofia e do Filósofo da Educação, a partir de enfoques nos campos das correntes
filosóficas, desde a compreensão do conceito de Filosofia à sua abrangência na Educação.
Resultado e Discussão
A ideia de Filosofia como ciência do pensamento e do filósofo como sinônimo de “amigo da
sabedoria” vem sendo tratada em vários momentos da história. Principia uma ciência que dá luz à
fabricação de “conceitos”, tendo como sujeito a figura do “amigo”, que busca o alcance da
sabedoria. Desde a gênese grega até os períodos contemporâneos, entendeu-se a Filosofia como um
campo do saber relativo à produção do próprio saber.
[...] a Filosofia é um corpo de conhecimento, constituído a partir de um esforço que o ser
humano vem fazendo de compreender o seu mundo e dar-lhe um sentido, um significado
compreensivo. Corpo de conhecimentos, em Filosofia, significa um conjunto coerente e
organizado de entendimentos sobre a realidade. Conhecimentos estes que expressam o
entendimento que se tem do mundo, a partir de desejos, anseios e aspirações (LUCKESI,
1994, p. 22).
Nesse sentido, concebe-se que a Filosofia incide na criação de novos conceitos, a partir de
conceitos já existentes, ou na definição do que ainda não se tem em terreno conceitual. Assim,
segundo Deleuze e Guattari (1992), o filósofo constitui-se como um parceiro do conhecimento, um
“amigo”, um “sábio”, um “sábio amigo”, um curioso que estuda e busca entender determinadas
questões que não permeiam o campo da materialidade ou, em outra instância, que habitam o
material, mas em proposições que vão além da lógica e da racionalidade científica.
Esses autores fazem menção ao entendimento de um conhecimento que se constrói a partir do
conceito, prática complexa, uma vez que os conceitos não surgem acabados, aprimorados, eles
partem do exercício constante de invenção e reinvenção por parte de seu criador. Logo, não há
conceito sem a validação de quem o criou e o apontou como significante e valoroso em determinado
campo, em momento específico da história humana.
A filosofia, mais rigorosamente, é a disciplina que consiste em criar conceitos. [...] Os
conceitos não nos esperam inteiramente feitos, com corpos celestes. Não há céu para os
conceitos. Eles devem ser inventados, fabricados ou antes criados, e não seriam nada sem a
assinatura daqueles que os criam (DELEUZE; GUATTARI, 1992, p. 13).
Nesse aspecto, não é possível reduzir a Filosofia aos atos de contemplar, de refletir, de
comunicar. Segundo Deleuze e Guattari (1992), ela não se explica em tais atos, pois estes não
representam disciplinas, são elementos de constituição de “universais” nas disciplinas gerais. E
sendo tais universais tidos como insuficientes na construção de explicações, tendo em vista que eles
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próprios é que precisam ser esclarecidos, a Filosofia não é, pois, o ato de contemplar, de refletir e
nem de comunicar, embora estes possam integrar o fazer do filósofo.
Por não adentrarem a instâncias mais profundas, muitos questionaram o sentido de existir da
Filosofia, (Filosofia para que? Por quê?). Gallo (2002) enfatiza que Deleuze pensou exatamente o
entendimento que dá vazão à noção do que é e qual o papel da Filosofia para o homem. Propõe o
afastamento das bases tradicionais europeias e norte-americanas, apontando que a Filosofia é
essencial ao campo do conhecimento, pois permite a formulação de conceitos que geram o
conhecimento, sendo o filósofo um ser que é potencializado pela criação dos conceitos, novos e/ou
ressignificados, uma vez que o filósofo é essencialmente potência do conceito, e vice-versa.
Assim, entender a Filosofia nesta perspectiva é pensá-la a partir de sua própria história,
entretanto, sem estar preso a ela, no sentido de mera reprodução do pensamento, mas possibilitando
a criação de conceitos novos. Portanto, é preciso considerar a história para entender o processo que
delineou e vem se delineando nesta ciência, tornando-a um campo de multiplicidade, tendo em vista
que “A filosofia da educação, no seu acontecer histórico, esclareceu muitas dúvidas, contribuindo
para transformações qualitativas na sociedade” (VIERO; TEVISAN; CONTE, 2004, p. 95).
O conceito, em seu processo de criação pelo filósofo, surge em um plano de imanência, no
qual os acontecimentos são orientados. O plano de imanência possibilita condições para a
construção do conceito e este possibilita a existência daquele, portanto, ambos estão imbricados.
O plano de imanência é essencialmente um campo onde se produzem, circulam e se entre
cocham os conceitos. Ele é sucessivamente definido com uma atmosfera (quase como
englobante de Jaspers, que mais tarde Deleuze vai recusar), com informe fractal, como
horizonte e reservatório, como um meio indivisível ou impartilhável (PRADO Jr., apud
GALLO, 2002, p. 174).
Essa teia que envolve a ação do filósofo diante da criação do conceito abrange, além do
próprio conceito e do plano de imanência no qual foi criado, o personagem conceitual – uma figura
heterônima denominada pelo filósofo para caracterizar os entes da criação conceitual, da própria
Filosofia. Entretanto, o que significa isso na Educação? E em se tratando de educação, o que é
possível aferir sobre esta no campo da Filosofia, ou seja, como deve ser pensada a Filosofia da
Educação?
Percebe-se, ainda nos dias atuais, a atribuição da reflexão como ação definidora da Filosofia,
inclusive da Filosofia da Educação, sendo corroborada a ideia de que o trabalho do filósofo da
educação é refletir sobre o processo educativo. Ratifica-se aqui a crítica deleuziana sobre esta
acepção, uma vez que, como já evidenciado anteriormente, a filosofia não é reflexão, mesmo que
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esta permeie o fazer filosófico (mas não de forma plena, absoluta, pois nem toda reflexão é
filosófica), a filosofia é ação, ação criadora de conceitos, de acontecimentos.
Desse modo, a filosofia da educação se faz exercício que não explica, não legitima, não
consolida. Escapa à tentação de constituir-se como lei e como verdade. Pelo contrário:
dessacraliza, polemiza, interroga. Impede que ensinemos da forma como ensinávamos, que
pensemos a educação da forma como a pensávamos, que sejamos os mesmos educadores
que éramos. Permite-nos pensar, ser e ensinar de outro modo (KOHAN, 2003, p. 225).
O filósofo da educação deve ser íntimo aos problemas do campo educacional, sendo sensível
a eles, no sentido de “pensar” (criar) conceitos que permitam, no plano de imanência em que foram
gestados, questões da educação para além da educação. Em outras palavras: contribuir com a busca
de respostas aos problemas existentes, não apenas como foco específico nesses problemas para
educação, mas para no que tais problemas podem significar para a sociedade e, também, como a
possibilidade de resolução destes impacta no universo humano. Assim, tem-se em evidência a
necessidade de uma Filosofia da Educação e a finalidade do filósofo da educação.
Dessa forma, o entendimento sobre a Filosofia da Educação perpassa muitas correntes e
ideologias, às quais tentaram imprimir conceitos (não necessariamente os conceitos como ideia de
acontecimento) sobre este campo, bem como sobre a finalidade do filósofo na educação. Não é
possível dizer quem errou ou quem tenha acertado em tais definições, o que é possível aferir é que,
sendo um campo vasto e complexo, a Filosofia da Educação continua presente nas discussões
acadêmicas, para além de sua compreensão como disciplina da reflexão, componente acadêmico ou
de parte de uma ciência.
Considerações Finais
As tendências sobre a questão em torno da Filosofia da Educação e os pensadores que as
elaboraram direcionam ao entendimento de que esse campo do conhecimento não é, e nem poderia
ser, tido apenas como um fundamento ou mecanismo de reflexão sobre o universo educacional, ele
vai além.
Sua finalidade compreende mais do que o ato de refletir sobre fatos, deve-se perceber que o
exercício prolixo e cansativo de repetição de antigos conceitos sobre educação, postos fora de
contexto, somente para tentar justificar quadros ou fenômenos na educação, não valida o devido
valor da Filosofia para a educação.
Não é possível mais aos intelectuais da educação o “maquiar” da realidade, desconsiderando o
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caos, ou seja, o campo complexo de problemas que, exatamente por serem(83)
problemas,
podem
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direcionar a construção de conceitos que possibilitem não a reflexão como mera reflexão sobre a
educação, mas as ações que direcionem a melhoria do campo educacional, por meio de atividades
efetivas, bem pensadas, bem articuladas, sobre como, quando e por que fazer educação. Não há ou,
pelo menos, não deveria haver campo para os “achismos” ou para as reproduções de literaturas
ultrapassadas, como forma de pensar a educação, inclusive no campo da Filosofia.
Nessa perspectiva, a análise desenvolvida apontou para o entendimento: da Filosofia como
ação criadora, de multiplicidade; do filósofo como ser que constrói conceito, de forma responsável,
visando a contribuição em sociedade, a partir da propagação do conhecimento; e da Filosofia da
Educação como campo propício à discussão, a partir da construção conceitual, dos eventos e
fenômenos da Educação, no âmbito da tomada de decisão para (re)pensar melhores condições para
o universo educacional.
O presente estudo não encerra as discussões sobre a temática proposta, ao contrário, suscita
ampliação e aprofundamento teóricos sobre a questão, dada a sua relevância para a academia
científica, bem como para os profissionais que lidam com Educação e/ou áreas afins.
Referências
CERLETTI, Alejandro. O perguntar filosófico e a atitude filosófica. In: ______. Ingrid Müller
Xavier (Trad.).O Ensino de Filosofia como Problema Filosófico. Belo Horizonte: Autêntica
Ediora, 2009. p. 23-29.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Introdução: assim pois a questão...In: ______. Bento Prado
Jr. e Alberto Alonso Muñoz (Trad.). O que é Filosofia?. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. p. 7-21.
GALLO, Sílvio. Notas Deleuzianas para uma Filosofia da Educação. In: GHIRALDELLIJr., Paulo
(Org.). O que é Filosofia da Educação. 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.p. 157-184.
KOHAN, Walter Omar. Três lições de Filosofia da Educação. Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82,
p. 221-228, abril 2003. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>
LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 1994.
VIERO, Catia Piccolo; TREVISAN, Amarildo Luiz; CONTE, Elaine. Filosofia da Educação a partir
do diálogo contemporâneo entre analíticos e continentais.Abstracta, 1:1 p. 92 – 107, 2004.
Disponível em: http://www.abstracta.pro.br/revista/publicados/v1n1a.pdf
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