Câmara Técnica de Medicina Baseada em Evidências Avaliação de Tecnologias em Saúde Sumário das Evidências e Recomendações para o Rastreamento Endoscópico do Câncer Gástrico em Indivíduos Assintomáticos e Subgrupos com Fatores de Risco Conhecidos. Porto Alegre, Outubro de 2009 Avaliação das evidências sobre o rastreamento endoscópico no câncer gástrico em indivíduos assintomáticos e em subgrupos com fatores de risco conhecidos. I – Data: 20/09/2009 II – Responsáveis Técnicos Avaliação - Câmara Técnica de Medicina Baseada em Evidência da Unimed Federação-RS: Dr. Jonathas Stifft, Dra. Mariana V.Furtado, Dra.Michelle Lavinsky, Dr. Fernando Herz Wolff, Dra. Carisi A Polanczyk, Dr. Luis Eduardo P Rohde e Dr.Alexandre Pagnoncelli,. III - Revisão de Especialista: Dr. Fabio Segal IV – Especialidade Envolvida: Gastroenterologia, Endoscopia Digestiva, Oncologia. V – Enfoque: Câncer Gástrico, Rastreamento . Cronograma de Elaboração da Avaliação Agosto – 09 • Reunião do Colégio de Auditores: escolha do tópico para avaliação e perguntas a serem respondidas. • Início dos trabalhos de busca e avaliação da literatura. Setembro -09 • Análise dos trabalhos encontrados e elaboração do plano inicial de trabalho. • Reunião da Câmara Técnica de Medicina Baseada em Evidências para análise da literatura e criação da versão inicial da avaliação. • Reunião da Câmara Técnica com Médico Especialista e Auditor para apresentação dos resultados e discussão. • Revisão do formato final da avaliação: Câmara Técnica, Médico Especialista e Auditor. • Encaminhamento da versão inicial das Recomendações para os Médicos Auditores e Cooperados. Outubro-09 • Apresentação da Recomendação na reunião do Colégio de Auditores. • Consulta pública através do site da UNIMED (www.unimed.com.br) • Encaminhamento e disponibilização da versão final para os Médicos Auditores e Médicos Cooperados. ESTRATÉGIA DE BUSCA DA LITERATURA Busca de avaliações e recomendações referentes ao impacto do segmento endoscópico em pacientes com diagnóstico estabelecido de DRGE; elaboradas por entidades internacionais reconhecidas em avaliação de tecnologias em saúde: • National Institute for Clinical Excellence (NICE) • Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health (CADTH) Busca de revisões sistemáticas e meta-análises (PUBMED, Cochrane, National Guideline Clearinghouse (NGC)). Busca de ensaios clínicos randomizados não contemplados nas avaliações ou metaanálises identificadas anteriormente (PUBMED e Cochrane). Quando há meta-análises e ensaios clínicos, apenas estes estudos são contemplados. Na ausência de ensaios clínicos randomizados, busca e avaliação da melhor evidência disponível: estudos não-randomizados ou não-controlados. Identificação e avaliação de protocolos já realizados por comissões nacionais e dentro das UNIMEDs de cada cidade ou região. São avaliados os estudos metodologicamente mais adequados a cada situação. Estudos pequenos já contemplados em revisões sistemáticas ou meta-análises não são citados separadamente, a menos que justificado. APRESENTAÇÃO DA RECOMENDAÇÃO Descrição sumária da situação clínica e da tecnologia estudada. Discussão dos principais achados dos estudos mais relevantes e, com base nestes achados, redação das recomendações específicas. Quando necessário, são anexadas classificações ou escalas relevantes para utilização mais prática das recomendações. É descrito o nível de evidência que sustenta cada recomendação, conforme a tabela abaixo. Graus de Recomendação A Resultados derivados de múltiplos ensaios clínicos randomizados ou de meta-análises ou revisões sistemáticas B Resultados derivados de um único ensaio clínico randomizado, ou de estudos controlados não-randomizados C Resultados derivados de séries de casos ou diretrizes baseadas na opinião de especialistas 1.INTRODUÇÃO O valor da realização de rastreamento para câncer gástrico em sujeitos assintomáticos permanece controverso. Em países onde a incidência de câncer gástrico é maior, como por exemplo: Chile, Japão e Venezuela, o rastreamento do câncer gástrico parece ser custo-efetivo. Por outro lado, em países onde a incidência não é elevada, o rastreamento na população é questionável. No Japão, o programa de rastreamento de câncer gástrico inicia a partir dos 40 anos de idade com uma entrevista e um raio-x baritado do estômago com duplo contraste. Se alguma anormalidade é encontrada na avaliação inicial, o paciente é referendado para realização de uma endoscopia. O Japão apresenta a mais alta taxa de incidência de câncer gástrico no mundo: 59,9 a 91,6/100.000 em homens e 23,8 a 38,9/100.000 em mulheres [1], sendo o rastreamento em sujeitos assintomáticos plenamente justificável. No Brasil, o número de casos novos de câncer de estômago estimados pelo INCA, no ano de 2008, foi de 15 casos novos a cada 100 mil homens e de 8 para cada 100 mil mulheres. No Rio Grande do Sul , a incidência é maior que a média da população brasileira: 18,66/100.000 em homens e 10,23/100.000 em mulheres [2]. A figura 1 mostra a incidência nas diferentes regiões brasileiras. Figura 1: Casos novos de neoplasia gástrica para cada 100.00 habitantes. Estimativa do INCA para 2008-2009 [2] A diminuição na incidência de câncer de estômago tem sido observada em vários países e pode ser explicada por reduções nas taxas de fatores de risco. Estratégias para a prevenção do câncer de estômago incluem melhorias no saneamento básico, mudanças no estilo de vida da população, modificação do consumo alimentar (aumento da ingesta de frutas, legumes e verduras, redução do uso do sal, melhores métodos de conservação dos alimentos), bem como atitudes individuais como não fumar e manter o peso corporal. A infecção pelo Helicobacter Pylori é considerada fator de risco para câncer gástrico. No entanto, há controvérsias na literatura quanto à possibilidade do risco de neoplasia gástrica ser reduzido pela erradicação da bactéria. Estudos prospectivos descrevem resultados limitados pelo número pequeno de participantes e desfechos infrequentes. No Brasil, um número grande de indivíduos são contaminados pelo H. Pylori, entretanto, apenas uma parcela pequena desenvolverá câncer. Desta forma, programas de erradicação em larga escala, com uso de antibióticos, têm efetividade duvidosa até o presente momento. Outro aspecto a ser considerado no câncer gástrico é a razão mortalidade/incidência alta em todas as partes do mundo. A sobrevida relativa em cinco anos é considerada baixa, em torno de 20%, exceto no Japão onde a sobrevida é cerca de 60%. Esta diferença pode ser explicada pelos programas de rastreamento populacional efetivos e aptos para identificar indivíduos com doença precoce [2]. 2. OBJETIVO O objetivo desta recomendação é realizar uma revisão da literatura em busca de evidências e indicações de endoscopia digestiva alta no rastreamento do câncer gástrico em indivíduos assintomáticos e em subgrupos que apresentam fatores de risco conhecidos para neoplasia gástrica, bem como, avaliar o papel da erradicação do Helicobacter pylori na diminuição da mortalidade por câncer gástrico. 3. RESULTADOS DA BUSCA NA LITERATURA Avaliações de tecnologias em saúde e recomendações nacionais e internacionais • NICE (National Institute for Health and Clinical Excellence - Inglaterra): 0 • CADTH (Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health): 0 • OHTAC (Ontario Health Technology Advisory Committee): 0 • HTA (The National Coordinating Center for Health Technology Assessment – Inglaterra): 1 • NGC (Dept of Health - Estados Unidos): 1 • Diretrizes internacionais: 2 • Diretriz Nacional: 0 • Revisões Sistemáticas ou Metanálises: 1 • Ensaios clínicos randomizados: 7 • Estudos Prospectivos, coortes: 3 Fuccio L. e col [4] publicaram recentemente uma meta-análise dos ensaios clínicos randomizados que realizaram erradicação do H. Pylori e posterior seguimento para avaliar o risco de câncer gástrico. Apenas 7 ensaios clínicos randomizados foram encontrados na busca na literatura e seis preencheram os critérios de elegibilidade para a meta-análise. A combinação dos resultados destes 6 estudos mostrou que após 4 a 10 anos de seguimento, 1,1% dos 3388 pacientes tratados desenvolveram câncer gástrico, comparado com 1,7% dos pacientes não tratados (Risco Relativo 0,65 com IC 0,43-0,98). Tabela 1. Características dos estudos Autor, Ano Período (referência) recrutamento País Incidência Desfecho Grupo Grupo câncer na primário tratamento, controle, n população* Correa et al, 1991 2000 [16] Nariño, 160 n Progressão 491 485 295 292 817 813 379 313 1130 1128 272 272 276 276 lesões pré- Colombia neoplásicas. Leung et al, 1996 2004 [17] Shandong, 50 Progressão lesões pré- China neoplásicas. Wong et al, 2004 1994 Fujian, China 99 [3] Saito et al, 2005 Incidência de câncer gástrico Não informado Japão 62 [18] Progressão lesões préneoplásicas. You et al, 2006 1994 [19] Shandong, 50 Progressão lesões pré- China neoplásicas. Fukase et al, 2008 [20] Zhou, 2008 [21] Abril de 2001 a Japão 62 julho de 2003 1996 Incidência de câncer gástrico Shandong, China 50 Progressão lesões préneoplásicas. *A taxa de incidência são os casos para cada 100.000 pessoas por ano. Áreas consideradas como sendo de alto risco para câncer gástrico são aquelas com incidência > 20 casos por 100.000 pessoas por ano em homens. Tabela 2. Casos de câncer gástrico nos grupos tratados para Helicobacter pylori e nos grupos controles. Autor, Ano Follow-up, Incidência câncer Incidência câncer (referência) Anos grupo tratamento, grupo controle, n Correa et al, n (%) (%) 6 3 (0,6) 2 (0,4) 5 4 (1,3) 6 (2,1) 7,5 7 (0,9) 11 (1,4) ≥4 2 (0,5) 3 (1,0) 7,3 19 (1,7) 27 (2,4) 3 9 (3,3) 24 (8,8) 10 2 (0,7) 7 (2,5) 2000 [16] Leung et al, 2004 [17] Wong et al, 2004 [3] Saito et al, 2005 [18] You et al, 2006 [19] Fukase et al, 2008 [20] Zhou, [21] 2008 Figura 2: mostra o Risco Relativo após meta-análise dos 6 estudos acima descritos. Nenhum deles mostrou diferença estatisticamente significativa quando avaliados individualmente. A área dos quadrados pretos representa o peso de cada estudo na metanálise. [4] Wong BC e col [3] publicaram em 2004 um ensaio clínico na China onde 1630 pacientes infectados pelo Helicobacter pylori foram randomizados em dois braços, erradicação da bactéria ou placebo. Através do estudo endoscópico com biópsias do antro, incisura e corpo gástrico, foram pesquisadas lesões consideradas como pré-cancerosas: gástrica atrófica, metaplasia intestinal ou displasia gástrica. Estes achados não estavam presentes em 988 dos 1630 pacientes infectados pelo H. pylori. Dezoito neoplasias foram diagnosticadas ao longo do seguimento de 7,5 anos. Não houve diferença significativa na incidência global de neoplasia entre os grupos com e sem erradicação do H. pylori. No entanto, no subgrupo de pacientes que não apresentaram lesões pré-neoplásicas na primeira endoscopia (atrofia, metaplasia, displasia), o risco de câncer foi significativamente menor. The Japanase Guidelines for Gastric Cancer Screening. Hamashima C; Shibuya D; Yamazaki H; Inoue K; Fukao A; Saito H and Sobue. Japanese Journal of Clinical Oncology Advance Access pushished March 14, 2008 [22]. Após uma revisão sistemática de vários artigos publicados sobre o assunto, os autores apresentam os dados separadamente sobre as diferentes ferramentas de rastreamento usadas nos estudos sobre screnning do câncer gástrico em pacientes assintomáticos. Como o objetivo desta recomendação é avaliar o papel da endoscopia e da pesquisa do Helicobacter pylori na prevenção primária da neoplasia de estômago, os dados abaixo descritos se restringem a estes métodos de rastreamento. (1) Endoscopia: Os autores não encontraram nenhum estudo que tenha avaliado a eficácia do rastreamento endoscópico em diminuir a mortalidade por câncer gástrico no Japão. Um estudo chinês foi realizado em Linqu County [24] onde 4394 pacientes foram avaliados entre os anos de 1989 e 1990 com endoscopia. A incidência e a mortalidade do câncer gástrico foram avaliadas até o ano 2000. Neste período, 85 neoplasias foram identificadas, sendo 25 casos de câncer precoce. Entretanto, não houve diferença estatística na mortalidade por câncer gástrico nos pacientes que realizaram rastreamento endoscópico em relação à mortalidade conhecida para esta região da China - RR 1,01 [0,32-1,37]. Outros 2 estudos que são citados neste guideline são registros de uma cidade do Japão que seguiu pacientes com sintomas gástricos durante 3 anos com endoscopias periódicas e encontrou uma sensibilidade de 77,8% para diagnóstico de câncer gástrico e a especificidade não foi informada. Outro estudo mostrou uma sensibilidade de 84%. Porém, nenhum estudo comparou a curva de sobrevida entre grupos com e sem rastreamento endoscópico. (2) Pesquisa do anticorpo para Helicobacter pylori e nível sérico de Pepsinogênio: grupos de alto risco podem ser identificados usando a pesquisa de anticorpos para H. pylori e pepsinogênio sérico. Watabe e col [23] publicaram uma coorte de 9293 indivíduos assintomáticos, sem fatores de risco para câncer gástrico, voluntários saudáveis que foram rastreados usando anticorpo para H. pylori e nível sérico de pepsinogênio (pepsinogênio I/II baixo relação com gastrite atrófica). O tempo médio de seguimento foi de 4,7 anos. Os casos de câncer gástrico detectados foram comparados com os diferentes grupos abaixo especificados em forma de tabela. Tabela 3: Adaptação da referência [23] sobre a incidência anual de câncer gástrico ao longo do seguimento médio de 4,7 anos nos diferentes grupos da coorte. “n” Câncer Incidência Grupo A Grupo B Grupo C Grupo D 3324 2134 1082 443 7 6 18 12 0,04 0,06 0,35 0,60 1 1,1 6 8,2 (IC 0,4-3,8; p =0,81) (IC 2,4-14,5; p <0,001) (IC 3,2-21,5; p <0,001) Anual (%/ano) OR (IC95%; p) Grupo A = Índice Pepsinogênio normal / Anticorpo H. pylori negativo. Grupo B = Índice Pepsinogênio normal / Anticorpo H. pylori positivo. Grupo C = Índice Pepsinogênio diminuído (atrofia) / Anticorpo H. pylori positivo. Grupo D = Índice Pepsinogênio diminuído (atrofia) / Anticorpo H. pylori negativo. Este estudo mostrou que houve uma diferença estatisticamente significativa, com maior incidência de câncer gástrico nos grupos C e D em relação aos grupos A e B. Os autores descrevem os seus achados concluindo que a pesquisa de anticorpos para H. pylori e pepsinogênio sérico são bons preditores para o desenvolvimento de câncer gástrico ao longo de quase 5 anos de seguimento. Outro dado relevante foi a diferença estatisticamente significativa entre os pacientes com < 60 anos e os pacientes ≥ 60 anos. OR de 5,3 em comparação com o grupo com < 60 anos, IC 2,9-9,9 e P <0,0001. O Guideline Japonês para rastreamento de câncer gástrico não recomenda a realização de endoscopia digestiva alta ou pesquisa de anticorpos para Helicobacter pylori como ferramenta de screening em massa. O rx baritado com duplo contraste ainda é o método de escolha para o rastreamento de indivíduos assintomáticos no Japão. NGC (Dept of Health - Estados Unidos). National Cancer Institute - Stomach (Gastric) Cancer Screening - [28]. Abaixo, a descrição resumida do parecer sobre o rastreamento do câncer gástrico na população americana, atualizado em setembro de 2009. • A endoscopia digestiva alta é um exame que tem sido usada como método para detectar o câncer gástrico precoce. • Nenhum ensaio clínico randomizado avaliou o impacto do rastreamento na mortalidade para câncer gástrico com endoscopia . • Análises de registros e estudos de caso-controle sugerem uma diminuição na mortalidade em indivíduos que realizaram o rastreamento versus grupo controle que não realizou rastreamento. • Uma coorte com 24134 indivíduos com seguimento de 40 meses não demonstrou diferença estatisticamente significativa em reduzir mortalidade por câncer gástrico entre os homens e as mulheres que realizaram o rastreamento [26]. • Um estudo prospectivo avaliou a associação entre rastreamento nos últimos 12 meses e subsequente mortalidade por câncer gástrico e mortalidade por outras causas. O risco de morte secundária ao câncer gástrico e morte por outras causas foi reduzido entre os pacientes que tinham participado dos programas de rastreamento. Este estudo demonstrou que há um viés de seleção nos programas de rastreamento (os indivíduos mais saudáveis têm tendência de serem mais cuidadosos com sua saúde). • Parece haver alguma justificativa para realizar rastreamento em grupos considerados de alto risco para neoplasia gástrica como os pacientes com idade avançada e com gastrite atrófica ou anemia perniciosa, pacientes com gastrectomia parcial, pacientes com diagnóstico de adenomas esporádicos, polipose adenomatosa familiar ou câncer de cólon hereditário não polipóide e os imigrantes de populações com incidência elevada de câncer gástrico. Os autores concluem que o rastreamento não resultará em diminuição da mortalidade por câncer gástrico na população americana e citam os riscos de realizar o rastreamento indiscriminado. Existem evidências sólidas (estudos de caso-controle bem desenhados e conduzidos) de que o exame endoscópico pode expor os indivíduos a efeitos adversos incomuns, mas graves como: perfuração, eventos cardiopulmonares, pneumonia aspirativa e sangramento com necessidade de hospitalização. No Maastricht III Consensus Report, publicado em 2007 sobre Helicobacter pylori, Malfertheiner P e col [25] realizaram as seguintes considerações em relação à prevenção do câncer gástrico: • Helicobacter pylori é a principal causa de gastrite crônica. • A inflamação crônica da mucosa gástrica pode evoluir para alterações histológicas sequenciais como atrofia, metaplasia , displasia e, finalmente, neoplasia gástrica. • Análise de estudos epidemiológicos tem mostrado que pessoas com Helicobacter pylori carregam um risco estatisticamente mais elevado para desenvolverem câncer gástrico (exceto neoplasia da região da cárdia). • Estudos não randomizados no Japão mostraram que as taxas de câncer gástrico são significativamente maiores em pacientes infectados pelo Helicobacter pylori do que em comparação àqueles onde a bactéria foi erradicada. • A erradicação do H. Pylori previne o desenvolvimento de lesões pré-neoplásicas da mucosa gástrica (atrofia e metaplasia intestinal). • As evidências de que a erradicação do Helicobacter pylori pode reduzir o risco de câncer gástrico são baseadas em estudos não randomizados. • Vários ensaios clínicos randomizados mostram a regressão de lesões pré-cancerosas, ou pelo menos a diminuição da progressão, no grupo randomizado para erradicação da bactéria. • Os autores citam o estudo de Wong BC e col [3] que não mostrou diferença na redução da incidência de câncer após 5 anos de seguimento, mas houve uma redução significativa no subgrupo sem lesões pré-neoplásicas (sem atrofia ou metaplasia intestinal). O consenso de Maastricht III conclui que a erradicação do H. pylori tem o potencial de reduzir o risco para o desenvolvimento de câncer gástrico e o melhor momento para a erradicação da bactéria é antes do surgimento das lesões pré-neoplásicas (atrofia e metaplasia intestinal). ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Ainda há várias situações específicas, com evidências muito limitadas na literatura, onde o rastreamento para câncer gástrico e a erradicação do Helicobacter pylori estão indicados. Os resultados destes estudos foram resumidos e serão apresentados abaixo em forma de tabela. Tabela 4: Fatores de risco e propostas de rastreamento para câncer gástrico em subgrupos específicos. Fator Risco H. pylori (HP) infecção 1. HP sem gastrite atrófica 2. HP com gastrite atrófica 3. Gastrite atrófica e metaplasia intestinal extensa Anemia perniciosa Gastrectomia parcial Adenomas esporádicos Risco de desenvolver câncer gástrico Odds ratio (OR): 2.3 Recomendação Área alto risco - “screening” em larga escala: possível benefício Área baixo risco - “screening” em larga escala não é custo-efetivo Ver acima 1. Odds ratio (OR): 7.13 (comparado com s/ HP) 2. Odds ratio (OR): 14.5 3. Odds ratio (OR): 61.9 Erradicação do Hp Erradicação do Hp “Standardized incidence ratio”: 5 15 - 24 years, RR = 9.4, 25 - 46 years, RR = 55.6. “Screening” com endoscopia é recomendado. “Screening” com endoscopia é recomendado. Não avaliado Referência Huang 1998 [6] Ohata 2004 [10] Kokkola 1998 [11] Lundegardh 1988 [13] Tersmette 1991 [14] Ming 1965 [15] Vigilância pós polipectomia para excluir displasia Não avaliado “Screening” com endoscopia é Alexander 1989 Polipose adenomatosa recomendado. [12] familiar Não avaliado “Screening” com endoscopia é Aarnio 1997 [7] Câncer coloretal nãorecomendado. polipoide hereditário OR: 2.5-5.1 Erradicação do Hp +/- rastreamento Yatsuya 2004 [8] História familiar positiva com Endoscopia . Chen 2004 [9] para câncer gástrico Adaptado da Tabela do capítulo sobre: Screening and prevention of gastric cancer – UpToDate17.2 Annie On On Chan ; Benjamin C Y Wong [5]. 4. SUMÁRIO DAS EVIDÊNCIAS, INTERPRETAÇÃO E RECOMENDAÇÕES • Não há ensaios clínicos randomizados (ECR) que mostraram benefício do screnning em diminuir a incidência e a mortalidade de câncer gástrico em indivíduos assintomáticos. • Os sete ECR publicados até o momento (referências 16, 17, 3, 18, 19, 20 e 21) não mostraram que a erradicação do Helicobacter pylori reduz o risco de câncer gástrico. • A meta-análise dos 6 principais ECR foi publicada por Fuccio L e col [4] em julho de 2009 no Annals of Internal Medicine e mostrou um benefício estatisticamente significativo na erradicação da bactéria em diminuir a incidência de câncer gástrico, após análise conjunta dos dados (Risco Relativo 0,65 com IC 0,43-0,98) . Dos 6 estudos analisados, apenas 1 foi realizado na América do Sul, os demais são ECRs realizados na Ásia. • O Guideline Japonês publicado em 2008 não recomenda o exame endoscópico e a pesquisa de anticorpos para Helicobacter pylori como métodos iniciais no screening em massa para câncer gástrico [22]. • O Instituto Nacional do Câncer nos Estados Unidos não recomenda o screening em massa na população americana. A baixa incidência de câncer gástrico (7/100.000) e a falta de ensaios clínicos randomizados avaliando o impacto do rastreamento na mortalidade, são os principais fatores que justificam esta conduta. • O Consenso europeu sobre Helicobacter pylori publicado em 2007 [25] relatou que a erradicação da bactéria tem o potencial de reduzir o risco para o desenvolvimento de câncer gástrico (esta afirmação foi baseada em estudos não controlados). O melhor momento para erradicação do HP é antes do surgimento das lesões pré-neoplásicas (gastrite atrófica e metaplasia intestinal). • Indivíduos com história familiar de câncer gástrico, diagnóstico de polipose adenomatosa familiar ou câncer colônico hereditário não-polipóide devem realizar o rastreamento endoscópico para neoplasia gástrica, assim como aqueles pacientes que realizaram gastrectomia parcial há mais de 15 anos (ver Tabela 4). SÍNTESE DAS RECOMENDAÇÕES 1. O rastreamento endoscópico em indivíduos assintomáticos sem fatores de risco conhecidos para neoplasia gástrica em população de baixa incidência deste tumor (< 25 casos para cada 100.000 habitantes por ano) não está indicado. (Recomendação de Grau B) 2. A erradicação do Helicobacter pylori parece reduzir o risco para o desenvolvimento de câncer gástrico em populações com incidência elevada desta neoplasia. (Recomendação de Grau A) 3. Em populações com menor incidência de câncer gástrico, como ocorre em nosso meio, não há evidências sólidas indicando benefício na realização de rastreamento da infecção ou erradicação do H.pylori. (Recomendação de Grau C) 5.BIBLIOGRAFIA 1.Parkin DM, Whelan SL, Ferlay J, Teppo L, Thomas DB.Cancer incidence in five continents, vol 8. Lyon: IARC; 2002. (IARC Scientific Publications; no. 155). 2.Instituto Nacional de Câncer; Ministério da Saúde. Estimativas 2008: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro (Brasil): INCA; 2007. 3.Wong BC; Lam SK; Wong WM; Chen JS; Zheng TT; Feng RE; Lai KC; Hu WH; Yuen ST; Leung SY; Fong DY; Ho J; Ching CK; Chen JS. Helicobacter pylori eradication to prevent gastric cancer in a high-risk region of China: a randomized controlled trial. JAMA 2004 Jan 14;291(2):187-94. 4.Fuccio L, Zagari RM, Eusebi LH, Laterza L, Cennamo V, Ceroni L, Crilli D and Bazzoli F. Meta-analysis: Can Helicobacter pylori eradication treatment reduce the risk for gastric cancer ? Ann Intern Med 2009 Jul 21;151:121. 5. Chan A ; Wong B. Screening and prevention of gastric cancer – UpToDate17.2. 6. Huang JQ; Sridhar S; Chen Y; Hunt RH .Meta-analysis of the relationship between Helicobacter pylori seropositivity and gastric cancer. Gastroenterology 1998 Jun;114(6):116979. 7. Aarnio M, Salovaara R, Aaltonen LA, et al. Features of gastric cancer in hereditary nonpolyposis colorectal cancer syndrome. Int J Cancer 1997; 74:551. 8. Yatsuya, H, Toyoshima, H, Tamakoshi, A, et al. Individual and joint impact of family history and Helicobacter pylori infection on the risk of stomach cancer: a nested case-control study. Br J Cancer 2004; 91:929. 9. Chen, MJ, Wu, DC, Ko, YC, Chiou, YY. Personal history and family history as a predictor of gastric cardiac adenocarcinoma risk: a case-control study in Taiwan. Am J Gastroenterol 2004; 99:1250. 10. Ohata, H, Kitauchi, S, Yoshimura, N, et al. Progression of chronic atrophic gastritis associated with Helicobacter pylori infection increases risk of gastric cancer. Int J Cancer 2004; 109:138. 11.Kokkola, A, Sjoblom, SM, Haapiainen, R, et al. The risk of gastric carcinoma and carcinoid tumours in patients with pernicious anaemia. A prospective follow-up study. Scand J Gastroenterol 1998; 33:88. 12. Alexander, JR, Andreas, JM, Buchi, K, et al. High prevalence of adenomatous polyps of the duodenal papilla in familial adenomatous polyposis. Dig Dis Sci 1989; 34:167. 13. Lundegardh, G, Adami, HO, Helmick, C, et al. Stomach cancer after partial gastrectomy for benign ulcer disease. N Engl J Med 1988; 319:195. 14. Tersmette, AC, Goodman, SN, Offerhaus, GJ, et al. Multivariate analysis of the risk of stomach cancer after ulcer surgery in an Amsterdam cohort of postgastrectomy patients. Am J Epidemiol 1991; 134:14. 15. Ming, SC, Goldman, H. Gastric polyps; a histogenetic classification and its relation to carcinoma. 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Fukase K, Kato M, Kikuchi S, Inoue K, Uemura N, Okamoto S, et al; Japan Gast Study Group. Effect of eradication of Helicobacter pylori on incidence of metachronous gastric carcinoma after endoscopic resection of early gastric cancer: an open-label, randomised controlled trial. Lancet. 2008;372:392-7. 21. Zhou L. Ten-year follow-up study on the incidence of gastric cancer and the pathological changes of gastric mucosa after H. pylori eradication in China [Abstract]. Gastroenterology. 2008;134:A233. 22. The Japanase Guidelines for Gastric Cancer Screeening. Hamashima C; Shibuya D; Yamazaki H; Inoue K; Fukao A; Saito H and Sobue T. Japanese Journal of Clinical Oncology Advance Access Pushished March 14, 2008. 23. Watabe H, Mitsushima T, Yamaji Y, Okamoto M, Wada R, Kokubo T, et al. Predicting the development of gastric cancer from combining Helicobacter pylori antibodies and serum pepsinogen status: a prospective endoscopic cohort study. Gut 2005;54:764-8. 24. Riecken B, Pfeiffer R, Ma JL, Jin ML, Li JY, Liu WD, et al. No impact of repeated endoscopic screens on gastric cancer mortality in a prospectively followed Chinese population at high risk. Prev Med 2002;34:22-8. 25. Malfertheiner P, Megraud F, O’Morain C, et al. Current concepts in the management of Helicobacter pylori infection: the Maastricht III Consensus Report. Gut 2007;56:772–81. 26. Inaba S, Hirayama H, Nagata C, et al.: Evaluation of a screening program on reduction of gastric cancer mortality in Japan: preliminary results from a cohort study. Prev Med 29 (2): 102-6, 1999. 27. Mizoue T, Yoshimura T, Tokui N, et al.: Prospective study of screening for stomach cancer in Japan. Int J Cancer 106 (1): 103-7, 2003. 28. NGC (Dept of Health – Estados Unidos). National Cancer Institute - Stomach (Gastric) Cancer Screening - (ultima atualização 30/09/2009), www.cancer.gov.