para ler na íntegra aqui - Associação dos Portos de Portugal

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ID: 65402803
23-07-2016
Tiragem: 94900
Pág: 25
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Semanal
Área: 17,14 x 43,45 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1
ATLAS, o maior estudo
de sempre dos ecossistemas
do Atlântico profundo
Portugal, através do arquipélago
dos Açores, participa
no megaprojeto europeu,
que envolve também os EUA
e o Canadá e vai realizar pelo
menos 25 expedições oceânicas
nos próximos quatro anos
Aumentar o conhecimento da complexidade dos ecossistemas no fundo do
oceano Atlântico e prever as suas mudanças e vulnerabilidades é o objetivo
do megaprojeto europeu ATLAS, que
vai durar quatro anos. A iniciativa pretende também desenvolver atividades
de divulgação — “Literacia Oceânica”
— para melhorar o conhecimento do
público sobre a importância dos ecossistemas do mar, a sua proteção e o
impacto que a atividade humana está
a ter no ambiente marinho.
Os números do ATLAS falam por si:
pelo menos 25 expedições no Atlântico Norte, 12 universidades envolvidas, participação de dez países da
UE incluindo Portugal, mais os EUA
e o Canadá, e um orçamento de nove
milhões de euros. É a maior e mais
ambiciosa avaliação de sempre dos
ecossistemas do fundo do oceano
Atlântico financiada pela Comissão
Europeia através do Horizonte 2020,
o programa de apoio à ciência, tecnologia e inovação da UE até ao final da
década.
“O Atlântico Norte foi o local onde
nasceu a biologia dos fundos marinhos e a oceanografia”, recorda Murray Roberts, coordenador do ATLAS,
investigador e professor de biologia
marinha na Universidade de Heriot-Watt em Edimburgo, no Reino Unido.
“Por isso é o local que devemos conhecer melhor, mas só nos últimos 20
anos descobrimos como os habitats
do Atlântico profundo são realmente
diversificados e vulneráveis.”
A expedição inicial já se realizou
em junho no Banco Rockall, ao largo
da Irlanda, mas as primeiras expedições verdadeiramente transatlânticas
serão entre os Açores e Gibraltar e
entre os Açores e os EUA. A viagem de
estudo entre Gibraltar e o arquipélago
português começa em setembro e vai
durar dois meses de trabalho no mar,
sendo feita num navio oceanográfico
espanhol. Portugal participará mais
tarde noutras expedições com o navio
“Arquipélago” da região autónoma
dos Açores.
Lançado recentemente em Edimburgo, na Escócia, o ATLAS tem 24
parceiros, incluindo dois portugueses:
o polo dos Açores do MARE — Centro
de Ciências do Mar e do Ambiente, e a
direção regional dos Assuntos do Mar
do governo regional do arquipélago. O
projeto vai explorar técnicas moleculares inovadoras como a sequenciação
do chamado ADN ambiental, de modo
a procurar amostras de água e de sedimentos de espécies conhecidas e
desconhecidas do mar profundo.
O ADN ambiental é recolhido de
uma grande variedade de amostras
ambientais como o solo, água do mar,
ar, fezes, mucos, gâmetas (células sexuais), pele, carcaças de animais ou
pelos. Estas amostras podem ser analisadas por métodos de sequenciação
de elevado desempenho destinados
a medir e monitorizar rapidamente
a biodiversidade dos ecossistemas.
A análise destas amostras chama-se
metagenómica.
Ecossistemas diversificados
mas vulneráveis
Um dos principais objetivos do
ATLAS é desenvolver uma base de
conhecimento científico que possa
sustentar o desenvolvimento de políticas internacionais adequadas para
assegurar que os recursos naturais
do fundo do Atlântico são efetivamente geridos. Este objetivo vai ao
encontro da estratégia de longo prazo da Comissão Europeia (CE) para
o Crescimento Azul, que aposta no
crescimento sustentável do setor marítimo a nível global. A CE considera
que os oceanos são essenciais para a
economia europeia e têm um grande
potencial para a inovação e o crescimento. Com efeito, a economia azul
já representa na Europa cerca de 5,4
milhões de empregos e gera um valor
acrescentado bruto (VAB) de 500 mil
milhões de euros por ano — o equivalente a três vezes o PIB português.
O VAB é o valor dos bens e serviços
produzidos numa determinada região, indústria ou sector da economia.
O diretor regional dos Assuntos do
Mar do governo regional dos Açores,
Filipe Porteiro, afirma ao Expresso
que “as equipas de investigação da
Universidade dos Açores ligadas à
oceanografia têm vindo a assumir
desde há décadas um lugar de destaque a nível internacional, com a
NÚMEROS DO MEGAPROJETO
9,1
milhões de euros serão investidos
no ATLAS até 2020. É o maior e mais
ambicioso projeto de sempre
de avaliação dos ecossistemas
do fundo do Atlântico financiado
pela União Europeia
25
expedições, pelo menos, vão ser
realizadas durante os quatro anos
do projeto. O ATLAS envolve
centenas de cientistas e inclui ações
de “Literacia Oceânica” dirigidas
ao público em geral
10
países europeus (Portugal,
Dinamarca, Bélgica, França,
Alemanha, Irlanda, Holanda,
Espanha, Reino Unido e Noruega)
mais os EUA e o Canadá participam
no ATLAS com 24 parceiros,
que incluem 12 universidades, cinco
PME, três agências governamentais
e quatro centros de investigação
nacionais
2
mil milhões de euros é quanto
investem por ano na investigação
marinha a UE e os seus Estadosmembros
5,4
milhões de empregos estão
concentrados na economia azul
da Europa, que gera por ano um
valor acrescentado bruto de 500 mil
milhões de euros (valor dos bens
e serviços produzidos), o equivalente
a três vezes o PIB português
publicação de artigos científicos sobre montes submarinos, habitats de
corais de águas frias (águas de profundidade), campos hidrotermais e a
respetiva biologia e ecologia”. Filipe
Porteiro sublinha que estas equipas
“ocupam o top 10 mundial das publicações científicas” na sua área
de investigação, o que significa que
“têm competência reconhecida” que
lhes permite participar em grandes
projetos como o ATLAS.
“O que nos interessa no acompanhamento deste projeto europeu
como parceiros é a informação produzida e os resultados que possam
reverter para o apoio às políticas
regionais dos Açores relacionadas
com a gestão dos recursos naturais”,
explica o dirigente regional. “Ou seja,
vamos ser utilizadores da informação
produzida pelo projeto e beneficiar da
transferência de conhecimento para
o processo de decisão política nos
assuntos do mar.”
Telmo Morato, investigador do
polo do centro de investigação
MARE nos Açores, salienta que o
grupo de investigação do mar profundo a que pertence, que vai participar no ATLAS, “é o mais conceituado a nível nacional e um dos mais
conceituados a nível internacional”.
Por outro lado, o governo regional
está envolvido no projeto “por se
ter destacado no passado no estudo
e na proteção do mar profundo”.
Além de aumentar o conhecimento
da biodiversidade do fundo do Atlântico Norte, o ATLAS “pretende saber
mais sobre o sistema de correntes
marítimas e sobre a forma como se
poderão comportar no futuro com
as alterações climáticas, tal como a
biodiversidade e a biogeografia”.
Pôr em prática tratado
entre a UE, EUA e Canadá
Há também uma inovação que o projeto pretende introduzir: a gestão
espacial. “Até agora tem sido pouco
usada, à exceção das áreas marinhas
protegidas, mas está consagrada na
Diretiva Quadro da Estratégia Marinha da UE”, reconhece Telmo Morato.
A gestão espacial consiste “em definir
no espaço os usos que o mar tem e o
seu valor ambiental, tal como se faz
em terra com a gestão do território,
mas a verdade é que não tem existido na mineração, nas pescas ou na
navegação, áreas com potencial de
conflito face à necessidade de preservar os ecossistemas”. Por isso mesmo
o ATLAS “quer contribuir para uma
economia azul sustentável”.
O projeto é também “o primeiro que
quer pôr em prática no oceano profundo o Tratado de Galway, um tratado na área da investigação e observação oceânica assinado a 24 de maio
de 2013 na cidade de Galway (Irlanda)
pela UE, EUA e Canadá”, destaca Filipe Porteiro. Chama-se mais precisamente “Declaração de Galway sobre
a cooperação no oceano Atlântico” e
o seu objetivo é compreender melhor
o Atlântico e promover a gestão sustentável dos seus recursos, bem como
estudar a sua interação com o oceano
Ártico, em especial no que diz respeito
às alterações climáticas.
Com este tratado a UE, os EUA e
o Canadá pretendem unir esforços
na observação oceânica; na partilha
de dados relacionados especialmente com a temperatura, salinidade e
acidez do mar; na coordenação das
infraestruturas de observação, designadamente navios oceanográficos
e boias de medição; na gestão sustentável dos recursos oceânicos; na
cartografia do fundo do mar e dos seus
habitats; e na promoção da mobilidade dos seus cientistas.
Virgílio Azevedo
[email protected]
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