pág.511 Pele e gestaçao: aspectos atuais dos

Propaganda
Skin and pregnancy: current aspects of commonly used treatments and drugs – Part I
Resumo
As manifestações cutâneas durante a gravidez correspondem a alterações fisiológicas, dermatoses
próprias do período gestacional e dermatoses influenciadas pela gravidez. O uso de drogas durante
a gravidez é freqüente e cabe ao obstetra informar à paciente sobre os riscos inerentes a cada droga
e, junto com a gestante, optar ou não por seu uso. Faz-se necessário a produção de evidências que
substanciem as condutas clínicas. Objetivou-se com a presente revisão abordar o tratamento das principais
alterações fisiológicas da pele que ocorrem na gestação e os principais medicamentos utilizados com
seus prováveis efeitos adversos, demonstrando que o tratamento dessas alterações deve considerar os
riscos e benefícios para a mãe e o concepto. A prescrição durante a gravidez e lactação deve ser segura
e sempre respaldada por conhecimento científico específico.
AT U A L I Z A Ç Ã O
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos
e drogas comumente utilizados – Parte I
Tamara Lemos Maia Figueiró1
Ernesto Antonio Figueiró-Filho2
3
Lílian Rezende Coelho
Palavras-chave
Manifestações Cutâneas
Dermatopatias/terapia
Gravidez
Abstract
Keywords
Skin Manifestations
Skin Diseases/therapy
Pregnancy
The cutaneous manifestations of pregnancy involve physiologic changes, specific pregnancy dermatoses and
dermatoses influenced by pregnancy. Drugs are usually prescribed during pregnancy and the obstetrician
has the responsibility to advise patients about potential maternal-fetal risks of drug usage and decide
with the patient whether or not the drug will be used. Scientific evidence is neede to support clinical
decisions. The aim of this revision is to present the treatment of the main physiologic changes in the
skin that occur in gestation and the adverse effects of the most prescribed drugs during pregnancy. It is
also aimed to demonstrate that the treatment of any of these changes must take into account the risks
and benefits for both the mother and the fetus and that the prescription of drugs during pregnancy and
lactation has to be safe based and supported by scientific evidence.
1
Pós-Graduada em Medicina Estética pela Sociedade Brasileira de Medicina Estética – Fundação Técnico-Educacional
Souza Marques – Escola de Medicina. Pós-Graduanda em Dermatologia – Instituto Superior de Medicina e Dermatologia
– Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.
2
Professor Adjunto do Departamento de Gineco-Obstetrícia da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul (UFMS).
3
Aluna da Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 511
511
23.09.08 10:28:04
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Introdução
Durante a gravidez, ocorrem mudanças imunológicas,
endócrinas, metabólicas e vasculares que predispõem a gestante a alterações fisiológicas ou patogênicas da pele. Essas
mudanças, de freqüência muito alta, ocorrem em conseqüência
da produção de várias proteínas e hormônios esteróides pela
unidade feto-placentária e, também, em razão do aumento
da atividade das glândulas tireóide, adrenais e hipófise.1,2 Em
relação à pele, as alterações gestacionais são divididas em
alterações fisiológicas da gravidez, dermatoses específicas
3
da gravidez e dermatoses alteradas da gravidez.
Diante de quaisquer modificações cutâneo-mucosas no
ciclo gravídico-puerperal, a paciente primeiramente busca o
auxílio do obstetra, que deve orientá-la quanto à conduta,
solicitação de exames ou necessidade de atendimento especializado. Entretanto, quando a gestante busca tratamento ou
prevenção de alterações da pele durante a gestação, muitos
médicos hesitam em tratar ou prescrever medicamentos nesse
período, em virtude da maioria destes não estar indicada para
1
uso durante a gravidez.
Objetivou-se, com a presente revisão, abordar o tratamento
das principais alterações fisiológicas, dermatoses próprias do
período gestacional e dermatoses influenciadas pela gravidez e
os principais medicamentos usados, com seus prováveis efeitos
adversos, demonstrando que o tratamento deve considerar os
riscos e benefícios para a mãe e o concepto e que a prescrição durante a gravidez e lactação deve ser segura e sempre
respaldada por conhecimento científico específico.
Devido à grande extensão e extrema importância do assunto
abordado, este artigo foi dividido em duas partes, sendo que
na primeira consta o tratamento das alterações fisiológicas da
gravidez e na segunda o tratamento das dermatoses específicas
da gestação, dermatoses alteradas na gravidez, medicamentos
tópicos utilizados durante o período gestacional e drogas no
leite materno.
Para facilitação da leitura e melhor compreensão do assunto
abordado, as duas partes componentes deste artigo contêm
o Quadro 1, que apresenta a classificação adotada pela Food
and Drugs Admnistration (FDA) relativa às categorias das
drogas e seu uso na gestação, e o Quadro 2, que aborda as
principais drogas utilizadas na gravidez, destacando-se as
restrições de uso de acordo com os possíveis efeitos para o
feto e para o lactente.
512
Quadro 1 - Categorias FDA (1979) relativas à gravidez
Categoria
Definição
A
Estudos adequados feitos em mulheres grávidas não demonstraram
risco para o feto durante o primeiro trimestre da gravidez e não há
indícios de risco nos trimestres subseqüentes
B
Estudos com animais demonstraram risco para o feto, mas não
há estudos adequados realizados em mulheres grávidas ou
estudos realizados com animais que enfatizem efeito adverso,
mas pesquisas adequadas realizadas com mulheres grávidas não
evidenciaram risco para o feto durante o primeiro trimestre e não há
indícios de risco nos trimestres subseqüentes
C
Estudos com animais demonstraram efeito adverso para o feto, mas
não há estudos adequados realizados em seres humanos; os benefícios
do emprego da droga em mulheres grávidas podem ser aceitáveis,
apesar dos riscos potenciais. Ou não há estudos de reprodução animal
ou não há estudos adequados realizados em seres humanos
D
Há indícios de risco para o feto humano, mas os benefícios
potenciais do emprego da droga em mulheres grávidas podem ser
aceitáveis, apesar dos riscos potenciais
X
Estudos realizados com animais ou seres humanos demonstraram
anomalias fetais ou os relatórios sobre reações adversas indicam
sinais de risco para o feto. O risco do emprego da droga em mulheres
grávidas é obviamente mais alto do que qualquer possível benefício
Modificado de Mendes & Figueiredo, 2000.
Tratamento das alterações
fisiológicas da gravidez
Melasma
A hiperpigmentação facial (melasma ou cloasma) pode ser
prevenida restringindo-se a exposição solar excessiva e utilizando-se
filtros solares potentes.2 A proteção artificial se faz com a utilização
de roupas e objetos que ajudam a refletir os raios solares, como,
por exemplo, chapéu, guarda-sol e sombrinha, lembrando que tais
produtos de material sintético protegem mais contra a radiação
2
ultra-violeta do que os de tecido de algodão. Além disso, o uso
de fotoprotetores químicos ou físicos durante a gravidez é de
1,2
grande auxílio na prevenção da hiperpigmentação facial.
Os fotoprotetores químicos são substâncias incolores que reduzem a quantidade de radiação, absorvendo os raios solares. Eles
são absorvidos até, no máximo, a derme média, ligando-se a componentes da pele para terem sua ação efetiva. Existem vários grupos
de substâncias com essa ação, como o ácido para-aminobenzóico
(PABA) e ésteres de PABA, que, em razão de freqüentes relatos de
dermatite alérgica de contato, foram abandonados. Atualmente,
são empregados filtros solares dos grupos: salicilatos, antranilatos,
cinamatos, benzofenonas e outros, os quais absorvem as radiações
UVA e UVB, conferindo grande proteção à gestante.1,2
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 512
23.09.08 10:28:04
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Quadro 2 - Principais drogas utilizadas na gestação, destacando-se as restrições de uso de acordo com os possíveis efeitos para o feto e para o lactente
Restrição de uso de acordo com a
Agentes
Classe FDA
Restrição de uso de acordo com a toxicidade para o feto
toxicidade para o lactente
DESPIGMENTANTES
Hidroquinona
C
Quando administrada até 300 mg/kg não é tóxica para a formação do feto
Não se recomenda
Arbutin
*
Não apresenta nenhuma toxicidade, não causa irritação e praticamente nenhuma reação
de hiper-sensibilidade
Uso controverso
Ácido ascórbico
*
Uso limitado pela dificuldade de penetração cutânea e rápida oxidação
Uso controverso
VC-PMG
*
Uso controverso
Uso controverso
Ácido kójico
*
Ácido azeláico
B
Retinóides
C
Alfa-hidroxiácidos (AHA)
B
Cosmocaíne
*
Pode causar alergias de contato e tem alta potencial de sensibilização, mas não foram
relatados efeitos teratogênicos
Exames toxicológicos referentes à fertilidade, embriotoxicidade e teratogenicidade em
animais não indicaram qualquer risco de uso durante a gravidez
Não indicados pelo efeito teratogênico (SNC, olhos, palato, ouvidos, coração), apesar de
alguns estudos demonstrarem sua inocuidade quando de uso tópico
Os AHAs com pH menor ou igual a 3,5 e concentração menor ou igual a 10% são seguros
para uso nas gestantes
Como não é citotóxico nem hipopigmentante, seu uso pode ser feito com segurança
por gestantes
Uso controverso
Considerado seguro
Não se recomenda
Considerado seguro
Considerado seguro
ANTIBIÓTICOS SISTÊMICOS
Nível sérico fetal é 20-50% do materno, sendo consideradas seguras para uso em
gestantes
Nunca foi associada a efeito teratogênico até o momento, embora a clindamicina possa
causar colite pseudomembranosa na gestante (incidência igual para não grávidas)
Penicilina e derivados
B
Cefalosporina/
Clindamicina
B
Eritromicina
B
Tetraciclina
D
Rifampicina
B
Clofazimina
C
Dapsona
C
Não se conhece
Cloranfenicol
C
Pode ser usado com segurança durante a gestação, desde que não exista na circulação
nas proximidades do parto, uma vez que pode causar doença grave no recém-nascido, a
síndrome cinzenta
Fluorquinolonas
C
Não são recomendadas para uso em gestantes, pois a sua segurança na mulher grávida
ainda não foi testada, porém estudos em animais demonstraram desenvolvimento
anormal de cartilagens
Aminoglicosídeos
D
Nefrotoxicidade e ototoxicidade
Sulfonamida
C
Pode causar icterícia/kernicterus no feto
Seguro, mas o estolato é hepatotóxico na gestante
Toxicidade para o fígado materno, manchas e outras anormalidades nos dentes em
desenvolvimento, efeitos no crescimento dos ossos, possível papel na formação da
catarata infantil e outros efeitos teratogênicos
Morte intra-uterina, malformações no trato urinário, hidrocefalia e anomalias do meato
auditivo. Fenda palatina e espinha bífida em ratos
Teratogênico em animais: pigmentação cutânea; não há casos de teratogênese em
humanos
É seguro, podendo causar sensibilidade,
rash, diarréia e candidíase
Seguro; secretado no leite em baixas
concentrações
Não há relatos de efeitos adversos ao
lactente
Pigmentação dentária, diminuição
do crescimento, fotossensibilidade e
candidíase
Não se conhece
Pode causar pigmentação do RN
Anemia hemolítica em RN com deficiência de
G6PD. Não é recomendada amamentação
Uso contra-indicado durante a
amamentação devido à possibilidade de
efeitos no lactente como alterações na
medula espinhal, recusa do leite pela
criança, gases intestinas e vômitos
Não existem dados de efeitos significativos
no lactente
Não há relatos de efeitos adversos ao
lactente
Anemia hemolítica em RN com deficiência
de G6PD. Amamentação contra-indicada
nos primeiros dois meses
continua...
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 513
513
23.09.08 10:28:05
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Quadro 2 - Principais drogas utilizadas na gestação, destacando-se as restrições de uso de acordo com os possíveis efeitos para o feto e para o lactente (continuação)
Restrição de uso de acordo com a
toxicidade para o lactente
Agentes
Classe FDA
Restrição de uso de acordo com a toxicidade para o feto
Cloroquina
C
Em doses antiinflamatórias: danos ao SNC; hemorragia e pigmentação da retina; abortamento
Amamentação considerada segura
Aciclovir
B
Não é teratogênico em ratos
Baixas doses no leite materno.
Baixo risco em RN com função renal
normal
Griseofulvina
C
Embrio/teratogênico em ratos
Não se conhece
QUIMIOTERÁPICOS
ANTI-HISTAMÍNICOS, ANALGÉSICOS E ANTIINFLAMATÓRIOS
Clorfeniramida
B
Não se conhece
Não se recomenda
Astemizol
B
O efeito mais comum é a hiperbilirrubinemia, porém não existe, relatos significativos de
outras alterações
Cimetidine
B
Hipoandrogenismo em ratos
Não se recomenda devido à potente
toxicidade, incluindo a hiperbilirrubinemia
Não se recomenda por possíveis efeitos
como aumento da acidez gástrica e
estimulação do SNC
Ciproheptadine
*
Não se recomenda na gravidez
Difenidramida
*
Uso após 3° mês
Inibe a lactação
Hidroxizine
C
Pode ser usado apenas no primeiro trimestre
Não se recomenda
Acetaminofen
B
Não se conhecem efeitos teratogênicos
Considerado seguro
C
Malformações em animais; aumenta o tempo de trabalho de parto e hemorragia e
aumenta o número de natimortos
Em altas doses, altera a função
plaquetária do lactente
Salicilatos
Não se sabe
AGENTES ANTINEOPLÁSICOS ESTERÓIDES E RETINÓIDES
Azatioprina
D
Teratogênico em ratos. Em humanos causa efeitos como imunossupressão e polidactilia
Não amamentar
Não amamentar. Neutropenia no RN e
depressão de medula óssea
Ciclofosfamida
D
Malformações fetais
Vitamina A e derivados
C
Teratogênico (SNC, olhos, palato, ouvidos, coração)
Não se recomenda
Fenda palatina, supressão adrenal e outras malformações em humanos.
Em doses fisiológicas não causa efeitos
ao lactente
Corticóides
C
CORTICÓIDES DE USO TÓPICO
Alclometasona
Dipropionato de
betametasona
Valerato de
betametasona
C
C
Uso deve ser limitado na gestação pelo risco de malformações e contra-indicado após
12 semanas
Uso deve ser limitado na gestação pelo risco de malformações e contra-indicado após
12 semanas
Não se recomenda
Não se recomenda
C
Contra-indicado no primeiro trimestre, mas uso liberado a partir de 12 semanas
Considerado seguro
Clobetasol
C
Uso deve ser limitado na gestação pelo risco de malformações e contra-indicado após
12 semanas
Considerado seguro
Desonida
C
Não deve ser utilizado
Considerado seguro
Dexametasona
C
Risco fator D quanto utilizado no primeiro trimestre, mas não há efeitos consideráveis
quando utilizado a partir de 12 semanas
Considerado seguro pela ausência de
dados relativos a efeitos no lactente
Halcinonida
C
Contra-indicado no primeiro trimestre, mas uso liberado a partir de 12 semanas
Considerado seguro
C
Uso liberado, desde que por período curto e em superfície pequena, pois apresenta risco
de malformações aos fetos humanos
Considerado seguro
Prednisona
C
Aparentemente apresentam risco pequeno ao feto
Considerado seguro
Triancinolona
C
Uso contra-indicado na gestação
Considerado seguro
Hidrocortisona
continua...
514
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 514
23.09.08 10:28:05
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Quadro 2 - Principais drogas utilizadas na gestação, destacando-se as restrições de uso de acordo com os possíveis efeitos para o feto e para o lactente (continuação)
Restrição de uso de acordo com a
Agentes
Classe FDA
Restrição de uso de acordo com a toxicidade para o feto
toxicidade para o lactente
ANTIPSORIÁSICOS
Ditranol
*
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Uréia
C
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Alcatrão
*
Não deve ser usado na gestação pelo risco de malformações fetais
Contra-indicado
ANTISSÉPTICOS
Cloreto de benzalcônio
*
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Etanol
D
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Glutaraldeído/
*
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
formaldeído
Fenol
*
Não deve ser usado na gestação pelo risco de malformações fetais
Contra-indicado
ANTIBIÓTICOS TÓPICOS
Ácido Fusídico
*
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Eritromicina
B
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Não deve ser usado na gestação devido a relatos de malformações congênitas após seu uso
Contra-indicado
Tetraciclina
D
Seguro; secretado no leite em baixas
Clindamicina
B
Não há relatos até o momento de efeitos teratogênicos
concentrações
Mupirocin
*
Uso limitado
Contra-indicado
ANTIACNÉICOS
Uso liberado na gestação, pois, devido à pequena quantidade de benzoato ser facilmente
Peróxido de benzoíla
C
transportada e excretada pelos rins, os efeitos sistêmicos na paciente grávida ou seu feto
Considerado seguro
são improváveis
Ácido Azeláico
B
Não há relatos de teratogenicidade por essa droga
Considerado seguro
Contra-indicado devido a inúmeros casos de malformações como deformidades cardíacas,
crânio-faciais, ausência de orelha, retardo mental, hidrocefalia, paralisia do nervo facial,
Contra-indicado devido à sua potente
Isotretinoína
X
defeitos corticais e cerebelares, microftalmia, hipoplasia do nervo óptico, defeitos na retina,
toxicidade
microcefalia, hipoplasia do arco aórtico, espinha bífida, anormalidades hepáticas, entre outras
Tretinoína tópica
C
Não existem relatos de malformações
Considerado seguro
Liberado por pouco tempo e em pequena extensão devido a relatos de malformações em
Considerado seguro, porém, em altas
Ácido salicílico
C
animais; aumento do tempo de trabalho de parto e hemorragia e aumento do número
doses, altera a função plaquetária do
de natimortos
lactente
OUTRAS DROGAS DE USO TÓPICO
Baixas doses no leite materno. Baixo risco
Aciclovir
B
Não é teratogênico em ratos
em RN com função renal normal
Matathion
*
Uso liberado na gestação
Considerado seguro
Idoxuridina
*
Contra-indicado na gestação devido a relatos de malformações em recém-nascidos
Não se recomenda
Modificado de Weissbluth & Bakos, 1992.
Já os fotoprotetores físicos, também chamados de bloqueadores
solares, não são absorvidos pela pele, formando um filtro que age
refletindo e dispersando a radiação ultravioleta (UV), impedindo
assim sua absorção. Eles têm amplo espectro de proteção contra
a radiação UV e contêm ingredientes como dióxido de titânio e
óxido de zinco. De forma geral, pelo grau de segurança e proteção,
têm seu uso associado às peles sensíveis e à gestação.2
Assim, utilizam-se substâncias contra UVA e UVB e fator de
proteção solar (FPS) número 15, diariamente, em duas aplicações
quando da permanência em recintos fechados a maior parte do dia
e várias aplicações quando em atividades de exposição mais direta
aos raios solares. Vale lembrar que os protetores com valores de
FPS maiores que 30 representam, na gravidez, exposição desnecessária e imprudente, pois possuem mais quantidade de substâncias
1
químicas, sem aumento proporcional da proteção solar.
Deve-se ainda recomendar à gestante quanto à aplicação do
protetor solar meia hora antes de se expor ao sol, para que o
filtro tenha tempo de contato com a pele, a fim de proporcionar
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 515
515
23.09.08 10:28:05
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
a proteção adequada. É importante orientar também que evite a
exposição solar entre 10 e 16 horas, pois nesse horário queima-se
mais rápido e a mulher que já tem melasma, mesmo com todo o
1
cuidado do filtro, pode manchar a pele ainda mais.
Para o tratamento da hiperpigmentação facial, é possível a
utilização de despigmentantes, que atuam diretamente na região
discrômica hiperpigmentada e não são contra-indicados durante
o período gestacional, visto que as hiperpigmentações surgem,
1,4
em geral, já no segundo trimestre.
Os despigmentantes podem agir por três mecanismos distintos: clareamento da melanina depositada, inibição da função
melanocitária e destruição dos melanócios, sendo que, neste
1
último, há risco de despigmentação definitiva.
O fármaco mais efetivo como despigmentante é a hidroquinona, derivado fenólico que inibe a melanogênese, atuando sobre o
malanócito. Age por inibição da oxidação da tirosinase em DOPA,
por meio de um duplo fenômeno de inibição da síntese melânica
e da ação citotóxica. A eficácia é proporcional à concentração e
esta varia entre 2 e 5%. Entretanto, vale ressaltar que quando a
concentração utilizada é igual ou superior a 5%, aumentam as
chances de efeitos colaterais como despigmentação em confete
nas áreas anteriormente tratadas, dermatite de contato, fotossensibilização, ocronoses, pseudomílio colóide e hiperpigmentações
1
transitórias no início do tratamento.
Estudos recentes concluíram que a hidroquinona não é tóxica
para a formação do feto, mostrando que doses de até 300 mg/kg
não foram consideradas teratogênicas, mesmo quando administradas durante a organogênese fetal. Por outro lado, esse fármaco
está classificado no grupo C pela Food and Drugs Administration
(FDA) e, em virtude dessa controvérsia, o profissional deve ser
muito cauteloso quanto ao uso de hidroquinona em gestantes,
2
principalmente em relação às suas doses.
Outro despigmentante utilizado durante a gravidez, principalmente em mulheres orientais, é o arbutin (ou extrato de
uva), um glucosídeo de hidroquinona que libera essa substância
localmente após sua absorção na pele. O mecanismo primário de
ação desse fármaco é a inibição da tirosinase, além da capacidade
de degradar naturalmente a melanina existente na pele. Sendo
assim, o arbutin é eficaz na inibição da hiperpigmentação e na
1,4
diminuição do melasma já existente.
Diversos sistemas associados de enzimas que participam do
caminho melanogênico são afetados pelos princípios ativos do
arbutin, degradando a melanina existente, provocando modificações estruturais nas membranas das organelas dos melanócitos e
acelerando o melanossoma. Além disso, esse medicamento não
apresenta toxicidade, não causa irritação e praticamente nenhuma
516
reação de hipersensibilidade, além de ser estável, o que permite
1
seu uso continuado por longos períodos.
Além desses fármacos, há ainda o ácido ascórbico ou vitamina
C, um dos mais antigos despigmentantes naturais utilizados, que
mantém a melanina sob a forma reduzida e descorada, mas seu
efeito é transitório. A inativação da tirosinase é interrompida até
a transformação oxidativa da tirosina em DOPA e tem ainda ação
anti-radical livre, protegendo, assim, as células. Entretanto, em
fase aquosa, a dificuldade de penetração cutânea somada à sua
1
rápida oxidação limita o seu uso.
Devido a essa instabilidade da vitamina C em formulações
para uso tópico, foi desenvolvido o fosfato-ascorbato de magnésio
(VC-PMG), que é um complexo de vitamina C, estável em soluções
aquosas e com capacidade de penetrar a pele, liberando a vitamina
intacta. Deve-se notar, ainda, que, se usado por dois a três meses
nas concentrações de 1 a 3%, além das propriedades clareadoras,
é protetor e agente de tratamento e prevenção dos sinais de envelhecimento, pela inibição da formação de melanina e de radicais
1
livres, além do estímulo à síntese de colágeno e fibroblastos.
O ácido kójico, isolado de algumas espécies de Aspergillus,
Penicillium e Acetobacter é outro despigmentante utilizado na
gestação. Pode ser encontrado em muitos alimentos de comida
japonesa como a pasta e o molho de soja e na bebida conhecida
como saquê. Seu efeito despigmentante dá-se por supressão
da melanogênese e é empregado geralmente na concentração
de 1 a 3% em forma de emulsão e, associado ao ácido glicólico, confere resultados semelhantes à hidroquinona a 2% no
tratamento de melasmas. Vale lembrar, entretanto, que seu
uso pode causar alergias de contato e que tem alto potencial
2
de sensibilização.
Além disso, o tratamento da hiperpigmentação facial pode ser
feito com ácido azeláico, um inibidor competitivo da tirosinase,
que tem também ação antimicrobiana contra o Propionibacterium
acnes, inibindo a formação dos comedões, além de regular a oleosidade e queratinização da pele. A redução da hiperpigmentação
desse fármaco é equivalente à hidroquinona a 4%, com a vantagem
de não agir nos melanócitos normais e fibroblastos, o que evita
a ocorrência de leucodermias e ocronoses. Os efeitos benéficos
não são observados antes de quatro semanas de tratamento e
2
deve ser utilizado por vários meses.
O ácido azeláico, segundo a FDA, pertence ao grupo B e há concordância entre os autores de que os exames toxicológicos referentes
à fertilidade, embriotoxicidade e teratogenicidade em animais não
indicaram qualquer risco de uso durante a gravidez. Além disso, a
quantidade desse princípio ativo que passa para o leite materno é
insignificante, não indicando riscos também durante a lactação.2
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 516
23.09.08 10:28:05
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Os retinóides, derivados sintéticos da vitamina A, dispensam os grânulos de pigmentação dos queratinócitos e
aumentam o turnover celular, contribuindo para a eliminação
do pigmento. Há diminuição da queratinização, o que leva à
redução entre os corneócitos, promovendo a esfoliação. Além
disso, há diminuição da produção sebácea e da colagenase.
Entretanto, tais quais os retinóides de uso sistêmico, que são
teratogênicos, os de uso tópico também não têm seu uso
recomendado durante a gravidez, apesar de alguns trabalhos
não demonstrarem ação teratogênica dos retinóides quando
2,4
usados topicamente.
Há ainda os alfa-hidroxiácidos (AHA), ingredientes de
alguns cosméticos e encontrados também em alguns produtos naturais, como a cana-de-açúcar e algumas frutas. Essas
substâncias diminuem a adesão dos corneócitos do extrato
córneo, estimulam a proliferação celular epidérmica e reduzem
a espessura da pele, tornando-a mais flexível, podendo ainda
estimular os glicosaminoglicanos e promover a síntese do
colágeno. Os pacientes em uso dessas substâncias referem
melhora da textura da pele, diminuição de pequenas rugas e
uniformização da pigmentação. Os AHAs com pH menor ou
igual a 3,5 e concentração menor ou igual a 10% são seguros
1
para uso nas gestantes.
Um despigmentante recentemente encontrado no mercado é o cosmocaíne, um clareador obtido do gérmen do
trigo, representando uma alternativa para os tratamentos de
despigmentação. O ativo controla e regula a melanogênese
a partir do estímulo à formação de pigmentos claros e da
limitação da liberação fotoinduzida de radicais livres. Com
sua utilização é possível controlar o processo de melanogênese de forma não agressiva e, como não é citotóxico nem
hipopigmentante, seu uso pode ser feito com segurança por
5
gestantes e lactantes.
Tratamentos com peelings químicos, dermoabrasões e laser
são preconizados nos casos em que o tratamento convencional
1
não surte efeito e esses podem ser realizados após o parto.
Em suma, para se oferecer algum tipo de tratamento ao
melasma gravídico, deve-se sempre levar em conta os riscos e
benefícios, visto que muitas dessas medicações são recentes e
não há ainda estudos suficientes que comprovem a segurança
de seu uso durante a gestação. Além disso, deve-se lembrar
que, durante todo o período gestacional, há estímulo hormonal
para o aparecimento das manchas e deve-se orientar a gestante
quanto à alta taxa de recorrência do melasma, sendo imprescindível o imperativo cuidado com a exposição solar e o uso
1,4
de hormônios extrínsecos.
Estrias
Sabendo-se que parte da elasticidade da pele é dada pela
quantidade de água no estrato córneo, a utilização de hidratantes durante a gestação é de fundamental importância devido
ao aumento da distensão da pele nesse período, auxiliando na
1
prevenção da formação de estrias.
Os cremes hidratantes geralmente contêm uma mistura de água
e substâncias gordurosas como petrolato, lanolina e seus derivados,
glicerina e propilenoglicol. Estes dois últimos funcionam como umectantes enquanto a lanolina e seus derivados são bons emulsificantes,
2
mas podem causar alergias em 2 a 5% dos pacientes.
Os agentes queratolíticos como os alfa-hidroxiácidos podem
ser considerados ativos hidratantes, já que minimizam a aspereza
da pele e os sinais de envelhecimento e proporcionam mais flexibilidade à pele, por diminuírem a espessura do estrato córneo.
Além disso, a uréia é outro hidratante muito importante por sua
2
propriedade higroscópica.
As formulações utilizadas principalmente para prevenir o desenvolvimento de estrias são à base de ácido glicólico ou láctico até
12%, vitamina F ou óleos emolientes em concentrações elevadas
como, por exemplo, óleos de cereja, maracujá, amêndoas doces,
gergelim, jojoba, gérmen de trigo, semente de uva, castanha do
2
Pará, rosa mosqueta, macadâmia, prímula, abricó e kalaya.
É importante ressaltar que os ativos hidratantes liberados para
uso nas gestantes são: alfa-hidroxiácidos; lactato de amônio a
12%; silícios orgânicos; fator natural de hidratação; uréia; ácido
hialurônico; PCA-Na; lipídeos como as ceramidas, fosfolipídeos,
2
colesterol e ácidos graxos; glicerina; sorbitol e propilenoglicol.
Associado à hidratação, é importante orientar a paciente
quanto ao uso excessivo de sabonetes e à temperatura elevada
durante o banho, visto que são fatores agravantes para a pele
seca. Pode-se recomendar a utilização de óleos no banho no lugar
dos sabonetes, fazendo um enxágüe rápido e depois secando
levemente com uma toalha macia. Além disso, deve-se aconselhar o uso de roupas íntimas de algodão, protegendo toda a área
que está sendo distendida, visto que o sintético pode provocar
1
dermatite em algumas pacientes.
Uma boa terapia coadjuvante é a vacuoterapia, a qual estimula
a circulação local e a neoformação da matriz conjuntiva dérmica.
Vale notar também que emolientes calmantes como a calamina
4
podem ser indicados quando o prurido está presente.
A mulher grávida deve ser orientada também no sentido de
evitar o ganho excessivo de peso, prescrevendo-lhe uma dieta
alimentar sob a supervisão de um nutricionista e/ou endocrinologista e um programa de atividades físicas próprias para gestantes
deve ser adotado.1
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 517
517
23.09.08 10:28:06
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Após o parto e a lactação, o arsenal terapêutico amplia-se
com a tretinoína 0,1% em creme para uso noturno, que pode ser
associado à vitamina C 20% em emulsão acetinada de uso diário.
Outras opções são peelings químicos com ácido retinóico seriado,
microdermoabrasão e intradermoterapia com vitamina C.4,6
Acne
O tratamento da acne na mulher grávida requer atenção
especial, pois o uso de qualquer droga, mesmo as medicações
tópicas, requer prudência. Geralmente, a indicação é de não se
usar qualquer medicamento na grávida, a menos que a droga seja
absolutamente necessária.
Sendo assim, o primeiro passo para combater a acne é
desenvolver um bom cuidado com a pele, orientando o uso
de bloqueadores solares livres de óleos e sabonetes suaves ou
substâncias para limpeza facial livres de sabão na higienização da
face. Além disso, deve-se evitar o uso de maquiagem ou qualquer
cosmético comedogênico durante a gravidez.1
O ideal seria tratar a acne fora do período gestacional, pois
uma vez ocorrida a gravidez, o tratamento fica mais restrito e
difícil. Entretanto, quando absolutamente necessário, a acne pode
ser controlada durante a gestação com medicamento tópico com
peróxido de benzoíla ou ácido azeláico, que têm demonstrado
poder antimicrobiano contra P. acnes, assim como efeito anticomedogênico, sendo muito úteis no tratamento de acne leve
e moderada.2
Em relação ao uso do peróxido de benzoíla, aproximadamente
5% do que é aplicado topicamente é absorvido na pele, onde é
completamente metabolizado em ácido benzóico. Vale lembrar
que esse antibiótico é absorvido pela derme como benzoato,
que é transportado para os rins e excretado pela urina sem sofrer
alterações. Devido a esta pequena quantidade de benzoato ser
facilmente transportada e excretada pelos rins, efeitos sistêmicos
na paciente grávida ou seu feto são improváveis, o que torna essa
droga segura para uso na gestação.1
O ácido azeláico, além de poder ser utilizado para o tratamento da hiperpigmentação, também apresenta bom resultado
no tratamento da acne vulgar, leve ou moderada, uma vez que
atua na normalização da queratinização do óstio folicular. Esse
fármaco pode ser utilizado durante a gestação e lactação, não
apresenta efeitos sistêmicos adversos, é altamente eficaz no
tratamento da acne e bem tolerado pelos pacientes.1
Além disso, preparações de ácido salicílico tópico são usadas
ocasionalmente no tratamento da acne e têm comportamento
semelhante aos salicilatos orais, os quais cruzam rapidamente a
placenta e a eliminação pelo feto é lenta. A sua utilização é segura
518
durante a gravidez por não estarem associados a malformações
congênitas, porém alguns trabalhos relacionam seu uso ao aumento
do tempo de trabalho de parto, da hemorragia e do número de
natimortos. Além disso, é excretado no leite e, quando em altas
1,7
doses, altera a função plaquetária do lactente.
Os derivados de vitamina A (retinóides) são contra-indicados
em virtude de seu efeito teratogênico. O uso de isotretinoína
oral está associado a deformidades cardíacas, crânio-faciais, ausência de orelha, retardo mental, hidrocefalia, paralisia do nervo
facial, defeitos corticais e cerebelares, microftalmia, hipoplasia
do nervo óptico, defeitos na retina, microcefalia, hipoplasia do
arco aórtico, espinha bífida, anormalidades hepáticas, entre outras malformações. Ainda não se sabe se a isotretinoína ou seu
metabólito, 4-oxo-isotretinoína, é excretada no leite materno,
porém acredita-se que ela ocorra, pois a excreção de retinóide já
está relatada na literatura.1,8
Por outro lado, poucos experimentos sobre a possível teratogenicidade da tretinoína tópica têm sido publicados e os
resultados são contraditórios. Não há estudos, na literatura, que
quantifiquem a extensão da absorção sistêmica dos retinóides
após sua aplicação tópica e que possam ser usados para avaliar
seu potencial teratogênico. Os dados sugerem que a pele pode
atuar como um depósito de tretinoína, sendo possível que ocorra
lenta liberação sistêmica da droga. Todavia, não existem relatos de
malformações congênitas em humanos após o uso da tretinoína
tópica na gravidez. Como a quantidade de ácido retinóico tópico
absorvido é pequena, não parece provável que essa substância
1,7
seja teratogênica.
Se for necessário o uso de antibiótico tópico ou sistêmico,
deve-se dar preferência ao estearato de eritromicina, uma vez que
o estolato é prejudicial ao feto.2 A eritromicina é um antibiótico
seguro tanto para a grávida quanto para o feto, se administrada por
algumas semanas, pois cruza a placenta em concentrações muito
baixas, o que resulta em níveis muito pequenos desse fármaco
nos tecidos fetais. Devido a esse fato, é droga de escolha para
tratamento de várias infecções em pacientes grávidas alérgicas
à penicilina. A eritromicina é excretada no leite materno, mas
não há relatos de efeitos adversos ao lactente. Além disso, o uso
tópico nunca foi estudado na gravidez, mas como a absorção
sistêmica é mínima, esta droga aparenta ser livre de riscos, sendo
1,8,9
considerado seguro o seu uso durante a gestação.
A tetraciclina oral está relacionada à toxicidade para o fígado
materno, manchas e outras anormalidades nos dentes em desenvolvimento, efeitos no crescimento dos ossos, possível papel na
formação da catarata infantil e outros efeitos teratogênicos. Além
disso, é excretada no leite materno em pequenas concentrações,
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 518
23.09.08 10:28:06
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
podendo, muito raramente, causar alterações nos dentes em
desenvolvimento da criança, inibição do crescimento ósseo e
modificação da flora intestinal. Entretanto, a administração de
tetraciclina tópica em mulheres grávidas nunca foi reportada como
causa de qualquer anormalidade congênita em seres humanos
1,8,9
ou animais.
A clindamicina oral é raramente usada no tratamento da acne,
devido a seu efeito colateral principal, a colite pseudomembranosa,
porém a sua forma tópica é largamente utilizada. Apesar de cruzar
prontamente a barreira placentária, a clindamicina, oral ou tópica,
nunca foi associada a efeito teratogênico até o momento, todavia
não foram efetuados estudos com a sua aplicação por mais de
seis semanas. Somente 5% são absorvidos, principalmente na
forma de hidrocloreto, e existem casos de colite pseudomembranosa causada pelo uso tópico tanto do fosfato quanto do
hidrocloreto de clindamicina, sendo que na gestante esse risco
é igual ao da população normal. Esse antibiótico é excretado no
leite materno, porém normalmente não está associado a efeitos
1,7-9
adversos ao lactente.
As penicilinas são os antibióticos mais prescritos para o
tratamento de infecções maternas durante a gestação. Estudos
demonstram a rápida passagem desse fármaco pela barreira placentária, atingindo a circulação fetal e o líquido amniótico, alcançando
concentrações inibitórias mínimas no feto. Esses antibióticos estão
classificados no grupo B pela FDA, sendo considerados seguros
para uso em gestantes. Além disso, ocorre excreção do fármaco
8-10
no leite materno, mas sem prejuízos ao lactente.
A família das cefalosporinas encontra-se agrupada também na
categoria B, tendo, como as penicilinas, ampla margem terapêutica
e, geralmente, bem tolerada. Vale ressaltar que casos de anomalias
feitas por esses antibióticos não estão documentados.10
Os aminoglicosídeos são classificados no grupo D pela FDA
e são conhecidos por causarem nefrotoxicidade e lesão no oitavo
par craniano. Essa ototoxicidade é mais freqüente com os aminoglicosídeos mais antigos e existem casos de surdez congênita
em crianças cujas mães receberam estreptomicina durante a
gravidez. Além disso, estudos recentes revelaram níveis elevados
de gentamicina e de amicacina no feto e na placenta. Assim, só
devem ser usados se a situação clínica da gestante justificar o
9,10
risco e devem ser cuidadosamente monitorizados.
A gentamicina é absorvida muito lentamente quando aplicada
sob a forma de pomada, mas esta absorção pode tornar-se rápida
quando o creme é utilizado. Caso seja aplicada em extensas
áreas cruentas, como em pacientes queimados, as concentrações
plasmáticas podem chegar a 1 μg/mL e 2-5% da droga utilizada
7
podem ser detectados na urina.
A neomicina tópica pode causar reações de hipersensibilidade
em 6-8% dos pacientes, além de poder haver toxicidade, após a
aplicação tópica ou irrigação de lesões com solução de neomicina
7
a 0,5%, mesmo em pacientes com função renal normal.
O cloranfenicol é classificado no grupo C pela FDA e pode
ser usado com segurança durante a gestação, desde que não
exista na circulação nas proximidades do parto, uma vez que
pode causar doença grave no recém-nascido, a qual é conhecida
como síndrome cinzenta. Esse antibiótico é excretado no leite
materno, sendo contra-indicado seu uso durante a amamentação
devido à possibilidade de efeitos no lactente como alterações na
medula espinhal, recusa do leite pela criança, gases intestinas
8-10
e vômitos.
As fluorquinolonas, classificadas no grupo C pela FDA,
não são recomendadas para uso em gestantes, pois a sua segurança na mulher grávida ainda não foi testada. Entretanto,
estudos recentes em animais demonstraram relação entre esse
antibióticos e o anormal desenvolvimento das cartilagens nos
recém-nascidos.9,10
Em humanos, a terapêutica com rifampicina durante a gestação
parece estar relacionada com morte intra-uterina, malformações
do trato urinário, hidrocefalia e anomalias do meato auditivo. Já
as sulfonamidas administradas a recém-nascidos ou a mães no
terceiro trimestre de gravidez podem competir com a bilirrubina
não conjugada na sua ligação com albumina plasmática. A bilirrubina livre pode penetrar nos tecidos, principalmente o cérebro,
produzindo o quadro clínico chamado kernicterus.7
Em termos gerais, os antibióticos que podem ser usados
em qualquer período na gravidez são: penicilinas (ampicilina,
penicilina V e G, ticarcilina e outros), cefalosporinas (cefoxitina,
cefaclor, cetotaxime, cefamandole e outros), eritromicina (estearato) e lincomicina. Já os que não devem ser usados na gravidez
são: aminoglicosídeos (gentamicina, amicacina, estreptomicina
e outros), antimicóticos (anfotericina B, griseofulvina e outros),
polimixinas, tetraciclinas (doxiciclina, minociclina, tetraciclina)
7
e vancomicina.
Cuidados com as unhas
Embora existam poucas informações disponíveis quanto aos
riscos para o feto ocasionados por produtos para as unhas. O
amplo uso desses cosméticos pelas gestantes indica que não há
toxicidade específica dessas substâncias, sendo a única alteração
2
mencionada a dermatite de contato não prejudicial à gestação.
Os cosméticos destinados às unhas são divididos em quatro
grupos: esmaltes, endurecedores de unhas, removedores de
esmalte e removedores de cutícula.1
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 519
519
23.09.08 10:28:06
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Os esmaltes são usados para enfeitar as unhas, cobrir descoramentos e dar resistência às unhas fracas. Entretanto, de 1 a 3%
da população apresentam dermatite de contato devido a esses
1
produtos e também onicodistrofia com dor digital.
Os endurecedores são preparações cosméticas com a finalidade
de aumentar a resistência de unhas quebradiças. Eles consistem
de modificações dos esmaltes de unhas, transparentes, com
concentrações diferentes de solventes e resinas e funcionam
como camada básica para melhor aderência do esmalte colorido.
No entanto, a literatura revela várias referências a dermatites de
contato causadas pelos endurecedores, como hiperqueratose
subungueal, leuconíquia, onicodistrofia, onicólise e outros. Devido
a isso, atualmente não se utiliza mais formaldeído livre nessas
1
preparações, o que diminuiu a incidência de tais dermatites.
Os removedores de esmaltes líquidos são os mais utilizados,
os quais contêm solventes como acetona, álcool, acetato de
etila e acetato de butila. No entanto, essas substâncias podem
provocar irritações e ressecamentos ao redor da unhas. Vale
lembrar que essa desidratação local pode ser evitada utilizandose removedores de esmalte condicionadores, contendo materiais
gordurosos em sua composição, como álcool cetílico, lanolina
1
e óleos sintéticos.
Os removedores de cutícula dissolvem o excesso de tecido
cuticular das unhas e contêm hidróxido de sódio ou de potássio (entre 2 e 5%), além de propilenoglicol ou glicerina como
umectante. Seu uso, entretanto, não é recomendado devido
ao desenvolvimento freqüente de inflamação paroniquial com
1
infecção bacteriana secundária ou colonização fúngica.
Cuidados com os cabelos
São muito freqüentes as dúvidas acerca da possibilidade ou não
de utilização de produtos químicos para melhorar a aparência dos
cabelos. Sendo assim, serão abordados, a seguir, os cosméticos
mais questionados, como tinturas, permanentes, alisamentos,
xampus e condicionadores.
Em relação às tinturas, podem ser classificadas, segundo a
durabilidade da tinta, em temporárias (removidas na lavagem
dos cabelos, pouco efetivas no disfarce dos cabelos grisalhos e
constituídas por moléculas grandes de corantes ácidos, geralmente
inofensivos), progressivas (mais utilizadas por homens e alcançam
o tom desejado após sucessivas aplicações), semipermanentes
(mantêm-se nos fios por quatro a 12 lavagens e são compostas
por produtos sintéticos ou naturais de baixo peso molecular que
penetram na cutícula dos fios) e permanentes (contêm precursores
incolores que reagem com o peróxido de hidrogênio dentro do
1,2
fio, o que produz coloração permanente).
520
Numerosas formulações para cabelos podem ser encontradas
no mercado, constituídas por grande variedade de produtos químicos, sendo os mais comuns fenilenodiamina, tolueno-diamina,
resorcinol, ácido oléico, álcool isopropílico, hidróxido de amônio,
ácido ascórbico e outros. Desses componentes, fenilenodiamina, compostos de tolueno, aminofenol, resorcinol e acetato de
chumbo (metal pesado que interfere de forma importante na
biossíntese da hemoglobina) são considerados potencialmente
mutagênicos e teratogênicos, embora ainda não existam estudos
2
suficientes em humanos.
Exceto os componentes mutagênicos e teratogênicos já citados,
estudos de toxicidade das tinturas de cabelos em camundongos
fêmeas prenhes não demonstraram efeitos embriotóxicos na
fertilidade, prenhez, peso ao nascimento ou sobrevivência dos
1
filhotes, mesmo sendo utilizados maiores volumes de tinturas.
Alguns autores tentaram associar o aparecimento de neuroblastoma e tumor de Wilms em crianças de até dois anos de idade
com o uso de tinturas de cabelos na gestação, porém o risco
de aparecimento dessas doenças envolveria ainda associação a
outros fatores como cigarro, café ou chá, contraceptivos orais,
hipertensão sistêmica materna, infecção vaginal, uso de drogas
1,2
neuro-ativas, hormonais ou diuréticas e consumo de álcool.
Dessa maneira, não está contra-indicado o uso de tinturas
de cabelos na gestação. Entretanto, por precaução, deve ser
recomendado o seu uso apenas a partir do segundo trimestre,
evitando-se os compostos teratogênicos citados, e não se deve
misturar duas ou mais cores de tinta para não se obter compostos
2
sobre os quais não se tem controle.
No tocante aos permanentes e alisamentos, esses processos
rompem as pontes dissulfeto entre as cadeias polipeptídicas dos
filamentos de queratina, as quais garantem a elasticidade dos
cabelos. Sendo assim, essas substâncias geram, freqüentemente,
danos aos fios, devendo ser utilizadas com intervalos longos e
com atenção a possíveis dermatites de contato de difícil controle,
pois o produto permanece nos cabelos por dois a três meses.1,2
Em estudos realizados com mulheres gestantes, comparando-se
usuárias e não-usuárias de alisantes de cabelos, demonstrou-se
não haver risco aumentado de parto pré-termo e baixo peso do
concepto entre as usuárias. Por outro lado, muitos autores sugeriram absorção sistêmica de químicos tóxicos por meio do couro
cabeludo, em quantidades suficientes para aumentar os riscos
de efeitos adversos sistêmicos, incluindo o desenvolvimento de
câncer. Dessa forma, não existem estudos conclusivos na literatura
mundial sobre essas substâncias durante a gestação e, portanto,
2
seu uso pela grávida deve ser cauteloso.
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 520
23.09.08 10:28:06
Pele e gestação: aspectos atuais dos tratamentos e drogas comumente utilizados – Parte I
Por fim, os xampus e condicionadores são compostos de
moléculas grandes, incapazes de penetrar a pele e, portanto, a
possibilidade de efeito para o feto ou recém-nascido é improvável,
1
sendo de uso seguro no período gestacional.
É importante considerar, ainda, a ocorrência de eflúvio telogênico
no período pós-parto, o que pode ser tratado com pantotenato de
cálcio associado à queratina e cistina, cujo uso deve ser indicado
na segunda metade da gestação, e não há restrições quanto à
utilização durante a lactação. Esse fármaco reduz a perda difusa
de cabelos e alterações degenerativas na estrutura dos fios (cabelo
enfraquecido, fino, não-maleável, quebradiço, sem vida, opaco
e sem cor), cabelos danificados pela luz do sol e radiação UV,
age na prevenção do aparecimento de fios brancos e colabora
para melhoria de desordens no crescimento das unhas (unhas
3,4,7
quebradiças, rachadas e pouco maleáveis).
Além disso, é possível fazer uso de complexos de ação tônica
sobre o couro cabeludo como auxina tricógena e diversos suplementos alimentares à base de extratos marinhos ou multivitamínicos, que podem melhorar o cabelo desde que o indivíduo tenha
carências nutricionais. Em indivíduos saudáveis, os efeitos são
mais limitados e temporários. Para mulheres que freqüentemente
fazem dietas e/ou muito esporte, uma complementação alimentar
à base de suplementos protéicos de alto valor biológico, como
3,4,7
aminoácidos do soro do leite, pode ser útil.
Leituras suplementares
1.
Kede MPJ, Sabatovich O. Dermatologia estética. São Paulo:
Atheneu; 2004.
7.
2. Maio M. Tratado de medicina estética. São Paulo: Roca; 2004.
3. Alves GF, Nogueira LSC, Varella, TCR. Dermatologia e gestação.
8. Briggs GG, Freeman RK, Yahhe SJ. Drugs in pregnancy and lactation.
7th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2005.
An Bras Dermatol. 2005; 80(2):179-86.
4. Zanini M, Paschoal LHM. Dermatoses gestacionais. Med Cutan
Iber Lat Am. 2004; 32 (4): 139-50.
5. Girardin F. Notícias galena. Associação Brasileira de Cosmetologia
2004; 125: 18.
6. Kroumpouzos G, Cohen LM. Dermatoses of pregnancy. J Am Acad
Weissbluth ML, Bakos L. Terapêutica dermatológica sistêmica e
tópica na gravidez e lactação: o que pode ser usado? An Bras
Dermatol. 1992; 67 (5): 211-6.
9.
Mendes AMD, Figueiredo CP. Uso de medicamentos durante a
gravidez: enfoque dermatológico. An Bras Dermatol. 2000; 72
(1): 87-92.
10. Faria N. Quimioterapia antibiótica na grávida. RFML 2002; 7
(3): 97-9.
22 de novembro de 2008
Caldas Novas - GO
Dermatol. 2001; 45: 1-19.
2º Encontro de Ginecologia e Obstetrícia
Baseado em Evidências
Local: Caldas Novas - GO
Realização: SGGO
Tel: 55(62)3285-4586
Fax: 55(62)3285-4607
Site: www.sggo.com.br
[email protected]
[email protected]
FEMINA | Agosto 2008 | vol 36 | nº 8
Femina_agosto.indb 521
521
23.09.08 10:28:06
Download