Imagem da Semana: Endoscopia Digestiva Figura: Vista endoscópica de mucosa esofágica. Enunciado Paciente feminina, 52 anos, admitida em pronto socorro com hematêmese franca e história de hepatite autoimune. Em uso de Azatioprina 200mg por dia. Após ressuscitação volêmica e melhora hemodinâmica, foi realizada uma endoscopia digestiva alta, documentada na Figura 1. A partir do enunciado e da fotografia ao lado, qual o diagnóstico mais provável? a) Lesão de Mallory-Weiss b) Varizes esofágicas c) Lesão de Dieulafoy d) Úlcera esofágica Análise da imagem Imagem 2: Imagem anterior da endoscopia digestiva alta, realçando estruturas tortuosas e ingurgitadas na submucosa esofagiana, de orientação longitudinal, com projeção para dentro da luz do órgão. Diagnóstico A endoscopia digestiva alta é o padrão-ouro para diagnosticar varizes esofágicas (figura 3.A), as quais se apresentam como protrusões venosas ingurgitadas e tortuosas, que percorrem longitudinalmente a submucosa do órgão. A lesão de Mallory-Weiss (figura 3.B) acomete a junção gastroesofagiana e sua apresentação à EDA lembra a forma de uma lágrima ou de uma rachadura, com o leito escavado. Surge geralmente após episódios de tosse ou vômitos intensos. Já a lesão de Dieulafoy (figura 3.C) ocorre mais frequentemente no fundo gástrico, embora um terço dos casos sejam de sede extragástrica. Consiste em uma má formação vascular de vasos calibrosos da mucosa do trato gastrointestinal (TGI), frequentemente de origem arterial. (Veja o caso 04 para mais informações). Por sua vez, a úlcera esofágica (figura 3.D), comumente de origem péptica, apresenta-se à EDA como lesões múltiplas, hiperemiadas, com bordas elevadas e fundo nacarado. Imagem 3 (A-D): Imagens à endoscopia digestiva alta; A) varizes esofágicas; b) lesão de Mallory-Weiss; C) lesão de Dieulafoy; D) Úlcera esofágica.Fonte: Google imagens. Discussão do caso Uma das principais e mais graves causas de hemorragia digestiva alta são as varizes esofágicas, responsáveis por cerca de 12% dos casos. A apresentação clínica mais habitual é a hematêmese, embora também possam ocorrer hematoquezia, melena e anemia. O aparecimento de varizes esofágicas reflete o aumento da pressão no sistema porta, o que induz a formação de uma circulação colateral portossistêmica via plexo venoso esofágico (figura 4). O surgimento da hipertensão portal tem como etiopatogenia mais comum a cirrose, por meio de mecanismos obstrutivos. No caso em questão, a paciente apresentava varizes esofágicas subsequentes a um quadro cirrótico causado por uma hepatite autoimune. Imagem 4. Detalhe do sistema venoso portal, demonstrando a drenagem normal (seta amarela) e a circulação colateral via veias esofágicas (seta vermelha). Fonte: http://www.hepcentro.com.br/varizes.htm O exame complementar inicial e padrão-ouro para esses casos é a endoscopia digestiva alta, cuja sensibilidade para detecção de varizes esofágicas é de 92% e a especificidade alcança 100%. A EDA se configura como um método simultaneamente diagnóstico e terapêutico, sendo a via de escolha para abordagem primária, quando disponível. A terapêutica endoscópica demonstrou interromper o sangramento em até 90% dos pacientes, seja pela técnica de escleroterapia ou ligadura elástica, ambas com o mesmo valor prognóstico. A opção farmacológica disponível atualmente é o octreotide, um análogo da somatostatina que tem a capacidade de reduzir o fluxo sanguíneo esplâncnico e assim controlar paliativamente o sangramento. Em casos selecionados, pode se lançar mão da técnica de anastomose portossistêmica intra-hepática transjugular (TIPS); em situações reservadas, como casos emergenciais, tem-se demonstrado vantagem em utilizar tamponamento com balão, embora exista um risco maior de ressangramento. É imperioso ressaltar que pacientes com sangramento gastrointestinal alto de grande volume constituem uma emergência médica, além de um desafio às unidades de pronto atendimento. A propedêutica específica não deve atrasar a abordagem inicial e o suporte avançado de vida, os quais devem privilegiar, dentre outros, a reposição volêmica e proteção de vias aéreas. Aspectos relevantes - Uma das principais e mais graves causas de hemorragia digestiva alta são as varizes esofágicas, responsáveis por cerca de 12% dos casos. - A apresentação clínica habitual é a hematêmese, embora também possam ocorrer hematoquezia, melena e anemia. - As etiologias mais frequentes são as hepatites de origem virais, cirrose alcóolica e esteatohepatite não-alcóolica. - O exame complementar inicial e padrão-ouro para esses casos é a endoscopia digestiva alta, que possui alta sensibilidade e especificidade, e se configura como um método diagnóstico e terapêutico. Referências bibliográficas - Goldman L, Ausiello D. Cecil: Tratado de Medicina Interna. Tradução da 23ª edição. Editora Elsevier. Rio de Janeiro, 2005. - Luketic VA, Sanyal AJ. ESOPHAGEAL VARIZES: I. Clinical Presentation, Medical Therapy, and Endoscopic Therapy.Gastroenterology Clinics of North America. Elsevier, 2000. - de Franchis R. Revising consensus in portal hypertension: Report of the Baveno V consensus workshop on methodology of diagnosis and therapy in portal hypertension. J Hepatol (2010), doi:10.1016/j.jhep.2010.06.004 (disponível online em:http://www.achhep.cl/baveno.pdf) - WGO Practice Guidelines. Esophageal Varices. World Gastroenterology Organisation (WGO). 2008. Responsáveis Ana Elisa Diniz, acadêmica do 10º período de Medicina da FM-UFMG. E-mail: anaelisatd[arroba]gmail.com Fernando Henrique Teodoro Lemos, acadêmico do 10º período de Medicina da FM-UFMG. E-mail: fernandohtl[arroba]gmail.com Orientador Prof. Dr. Cristiano Xavier Lima, professor adjunto do Departamento de Cirurgia da FM-UFMG. E-mail: cristianoxlima[arroba]gmail.com Agradecimentos Júlio Guerra, acadêmico do 8º período de Medicina da FM-UFMG, pela ajuda com as fotografias. Revisores Manuel Schütze, Glauber Eliazar e profa. Viviane Parisotto