A utilização da dietilamida do ácido lisérgico (LSD) na

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A utilização da dietilamida do ácido lisérgico (LSD) na terapêutica
clínica
Caroline Lisboa¹, Marina Mühlbeier Santos²; Gabriel Corteze Netto³
¹Pós-Graduanda em Saúde Mental - FACOS/CNEC; ²Acadêmica de Psicologia ULBRA/Torres; ³Professor - FACOS/ CNEC.
RESUMO: A dietilamida do ácido lisérgico é uma droga alucinógena potente que por
muitos anos foi utilizada na terapêutica clínica e que devido seu uso de forma
indiscriminada, logo foi considerada uma droga ilícita. Estabelecimento de leis
dificultaram o acesso à droga reduziram substancialmente as pesquisas acerca de
seus efeitos terapêuticos. Após décadas de controvérsias, a dietilamida do ácido
lisérgico está sendo reconsiderada pela comunidade científica, mostrando
perspectivas dessa droga para terapia de diversas patologias. Últimos estudos
mostraram que se administrada em doses corretas e sob supervisão médica a
dietilamida do ácido lisérgico pode ser eficaz no tratamento de desordens
psiquiátricas, de tumores e do alcoolismo, apesar do grande número de efeitos
adversos causados por essa droga.
Palavras-chave: Dietilamida do ácido lisérgico, LSD, terapêutica clínica, terapia
psicodélica, tumores.
DIETILAMINA DO ÁCIDO LISÉRGICO
A dietilamida do ácido lisérgico (LSD) é
uma potente droga sintética, que
corresponde á vigésima quinta de uma
série de modificações químicas da
molécula básica de um fungo do centeio.
O LSD é um composto quiral com dois
estereocentros nos átomos de carbono 5
e 8, portanto possui quatro isômeros
diferentes do LSD (figura 1). Foi
sintetizada por Albert Hofmann em 1938
e reconhecida como potente substância
alucinógena em 1943 (figura 1). Seu
papel na sociedade como droga de
abuso é amplamente discutido, visto
grande consumo em festas “raves”.
Av. Fernandes Bastos, n° 555.
Tramandaí – RS – Brasil
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(51) 36844241 / (51) 84379274
Figura 1. Molécula do Dietilamida do
Ácido
Lisérgico.
(Adaptado
de
ISAACSON, 1998).
FORMAS DE APRESENTAÇÃO DA
DIETILAMINA DO ÁCIDO LISÉRGICO
Diversas formas de uso como droga
ilícita podem ser encontradas (figura 2).
Revista Mirante / Curso de Ciências Biológicas – FACOS/CNEC Osório Dez/2011
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Na mais popular, uma solução de LSD é
aplicada em papéis absorventes, onde
figuras coloridas são impressas para
encobrir oxidação e torná-lo um atrativo
para jovens consumidores.
Tabela 1. Dietilamida do Ácido Lisérgico
Descrição
da DCB*
Nome
químico
Outros
nomes
Lisergida
9,10-didehidro-N, N-dietil6-metilergolina-8βcarboxamida
LSD, LSD-25, dietilamida
do ácido d-lisérgico, N, Ndietil-d-lisergamida
Fórmula
molecular
Peso
molecular
Ponto de
fusão
323,43 g/mol
Categoria
terapêutica
Perturbador do sistema
nervoso central
(alucinógeno)
Natureza
Derivado do ácido
lisérgico
C20H25N3O
80-85°C
*: Denominações Comuns Brasileiras –
DCB. (Adaptado de O'NEIL, 2001).
Também podem ser encontrados como
tabletes de gelatina, cubos de açúcar,
encapsulados e na forma de micro
pontos e líquida. (DEA - DRUG
ENFORCEMENT
ADMINISTRATION,
1995).
O papel é dividido em quadrados, em um
único quadrado tem geralmente 30-100
μg de LSD. Esses papéis são criados a
partir de uma folha de papel absorventes
normalmente decorados e perfurados.
Depois podem ser mergulhados numa
solução de LSD, que pode ser feita em
etanol, metanol, ou outros solventes de
preferência de rápida evaporação
(CAZENAVE, 1996; EROWID, 2007).
Figura 2. Três formas de LSD: papel (A),
micro pontos (B) e tabletes de
gelatina(C) (Adaptado de EROWID,
1999).
A gelatina é feita com LSD líquido
formando pequenos e finos quadrados.
Um único quadrado desta gelatina é
mais forte do que um quadrado de papel
estima-se que há entre 50-150 μg de
LSD (EROWID, 2007). Os micropontos
são pequenos tabletes de 2-3 mm de
diâmetro (CAZENAVE, 1996).
APRESENTAÇÃO CLÍNICA
®
O Delysid
foi a única forma
comercializada legalmente do LSD,
produzida pela indústria farmacêutica
Sandoz (figura 3). Porém, o abuso de
LSD levou a empresa a cortar o
fornecimento da droga, que era
autorizado
e
gratuitamente
disponibilizado para clínicas psiquiátricas
(MANGINI, 1998).
Era encontrado em ampolas de 1 mL
com 100 μg, para administração oral, ou
subcutânea e intravenosa, para início de
ação mais rápida. Foi indicado para
relaxamento mental, ansiedade, estudos
da natureza da psicose, tratamento de
alcoolismo, entre outros.
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Tabela 2: Dosagem e concentração da
Dietilamida do Ácido Lisérgico.
Figura 3. Delysid®
PYROMANIA, 2009)
(Adaptado
de
Doses
Concentração (mg)
Limiar
20 μg
Fraca
25 – 50 μg
Comum
50 – 150 μg
Forte
150 – 400 μg
Muito forte
400 μg ou mais
Dose letal
14.000 μg*
*estimada para indivíduo com 70 kg.
(Adaptado de EROWID, 2007)
A TERAPIA PSICODÉLICA
®
A administração Delysid deveria ser
feita somente sob supervisão médica e
era indicado 50 mg de clorpromazina
como antídoto. Porém, à medida que os
experimentos médicos avançavam seu
uso sem indicação começou a crescer
principalmente na década de 50 nos
Estados Unidos. Logo, o LSD seria
usado mundialmente ilicitamente como
alucinógeno (HOFMANN, 1980). Por
outro lado, estudos tem mostrado que o
LSD pode ter uma importância
terapêutica e que estudos de suas
aplicações e mecanismos podem auxiliar
na compreensão de outras patologias
(NICHOLS, 2004).
Após certas experimentações, tornou-se
prática frequente seu uso clínico em
sessões de psicoterapia, ajudando o
paciente a chegar a uma nova
percepção acerca das questões que
envolvem seu universo psico-afetivo. O
LSD tem sido utilizado amplamente
como agente psicodélico (tabela 2).
(MANGINI, 1998).
A psicoterapia psicodélica refere-se à
prática de psicoterapia envolvendo o uso
de
drogas
alucinógenas,
e
é
provavelmente tão antigo quanto o
conhecimento humano sobre plantas
alucinógenas. (MANGINI, 1998). É
bastante conhecida como um tipo de
prática espiritual, e seus elementos
podem ser reconhecidos nos rituais de
muitas culturas. O uso de agentes
psicodélicos
(como
o
LSD)
na
psicoterapia ocidental se iniciou em 1950
(MANGINI, 1998). Diversos estudos
descobriram que o uso de drogas
psicodélicas, facilita os processos
psicoterapêuticos, e provaram também
que podem ser úteis para pacientes com
problemas de alcoolismo, vícios em
drogas,
sociopatas
e
psicopatas.
Esperava-se que o LSD poderia induzir
experiências tão profundas que os anos
seguintes da vida do paciente seriam de
progressos contínuos. (PAHNKE, 1969).
A ênfase na transcendência e nas
experiências evocadas por altas doses
de LSD é o que caracterizava a terapia
psicodélica.
(KURLAND;
SAVAGE;
UNGER; 1968).
Na
psicoterapia
psicodélica,
a
administração do LSD é usada depois de
semanas de psicoterapia preparatória e
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ajuda
para
sua
integração
na
experiência. Seu uso é feito após
conhecimento do terapeuta sobre o
histórico
do
desenvolvimento
do
paciente,
dificuldades
e
defesas.
(PAHNKE, 1969).
O efeito mais relevante do LSD durante
a terapia se da no pico de intensidade
quando vêm à tona os sentimentos mais
reprimidos do paciente, isso acontece
entre a terceira e quinta hora de ação,
neste momento cabe ao terapeuta
estabilizar o paciente, para melhor
trabalhar seus sentimentos. (MANGINI,
1998). As características básicas desse
pico
são:
senso
de
unidade,
transcendência do tempo e espaço,
sentimentos
positivos
de
humor
profundos (com alegria, paz e amor),
senso
de
reverência,
significante
discernimento psicológico e/ou filosófico,
senso de inefabilidade, de paradoxo e
transiência. (GROF, 1973)
O ALCOOLISMO
A motivação inicial para que um
alucinógeno fosse usado no tratamento
do
alcoolismo,
foi
baseada
na
especulação de que os efeitos do LSD
poderiam ser similares ao delirium
tremens (uma psicose causada pelo
alcoolismo). Na época, acreditavam que
este efeito poderia ser causado pelo
LSD de forma controlada, e que este
poderia assustar os pacientes e deter o
uso de álcool (NICHOLS, 2004;
MANGINI, 1998).
O CÂNCER
Foi reportado que o LSD possui efeitos
analgésicos em pacientes terminais, e
observou-se que havia uma mudança de
atitude frente à morte. Verificou-se
também que esse tipo de paciente ficava
mais responsivo à família e ao ambiente,
e melhorava a capacidade de aproveitar
o dia-a-dia. (PAHNKE, 1969).
Em
estudos posteriores, pacientes com
câncer terminal que receberam LSD
melhoraram
o
humor,
reduziram
ansiedade
e
diminuíram
os
medicamentos que recebiam para dor.
(GROF, 1973).
EFEITOS COLATERAIS DA
DIETILAMIDA DO ÁCIDO LISÉRGICO
As funções mentais produzidas pelo LSD
são variáveis e anormais. Mudanças
sensoriais resultantes do uso não são
relevantes para tal terapia, porém,
consideram-se algumas consequências
como terror e pânico. (GROF 1973). Em
baixas doses provoca alucinações,
delírios, alteração na percepção de
tempo e espaço, confusão mental,
lapsos de memória e distorções
generalizadas. Provoca um quadro
semelhante ao da esquizofrenia, além
dos efeitos físicos indesejáveis que se
manifestam. Poderão ainda ocorrer
náuseas, aumento da pressão arterial e
do ritmo cardíaco, debilidade corporal,
sonolência, aumento da temperatura
corporal como efeitos adversos (figura 4)
(GRAEFF, 1989).
UM NOVO PARADIGMA
Há cinquenta anos, o LSD era
considerado como último recurso da
ciência. O ácido lisérgico dietilamida,
mais conhecido como LSD e famoso por
suas características alucinógenas, já foi
considerado no passado como um
tratamento
válido
contra
vários
problemas psiquiátricos.
O LSD está sendo reconsiderado pela
comunidade científica. Seus efeitos
provocariam no paciente estados
mentais em que os sentidos, as
percepções
e
humores
seriam
modificados
de
maneira
intensa,
demonstrando
grande
valor
em
psicoterapia. A ciência toma uma nova
perspectiva sobre o LSD. Países, como
a Suíça, autorizaram estudos clínicos
sobre efeitos terapêuticos do LSD em
Revista Mirante / Curso de Ciências Biológicas – FACOS/CNEC Osório Dez/2011
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pacientes com câncer terminal ou outras
doenças incuráveis.
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Figura 4. Efeitos físicos da Dietilamida do
Ácido Lisérgico (LSD) no organismo
(Adaptado de EROWID, 2003)
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