CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 CURSO DE DINÂMICA ORBITAL E CONTROLE – CAPÍTULO I: FUNDAMENTOS DA MECÂNICA CELESTE Antonio Delson de Jesus Departamento UEFS de Física - específica da Matemática. Os tópicos gerais propostos são, entre outros: 1) Fundamentos da Mecânica Celeste; 2) Teoria do Potencial; 3) Manobras Orbitais; 4) Problema de 2 corpos; 5) Problema Restrito de 3 corpos; 6) Problema de N corpos; 7) Sistemas de Coordenadas e de Tempo; 8) Determinação de Órbitas; 9) Teoria das Perturbações Gerais; 10) Satélites Artificiais; 11) Veículo Lançador de Satélite; 12) Teoria da Reentrada; 13) Introdução à Mecânica Celeste Relativística; 14) Introdução à Propulsão; 15) Introdução à Teoria de Controle, etc. Neste Capítulo abordaremos sobre os Fundamentos da Mecânica Celeste, discutindo as suas leis básicas e observando os aspectos mais relevantes desta teoria. 1. Apresentação e Objetivos A Dinâmica Orbital é uma das áreas mais importantes da Física, visto a aplicabilidade das suas leis na Mecânica Celeste, Astronomia, Astrofísica, Cosmologia, Tecnologia e Engenharia Espaciais. Seu estudo permite o entendimento das leis físicas que governam fenômenos desde os fundamentos do Universo (formação de planetas, galáxias, sistemas solares, etc.), trajetórias e órbitas de veículos espaciais (satélites, foguetes, space shuttles, mísseis, etc.) até a formação de detritos espaciais em torno do globo terrestre, tópico atual de singular interesse internacional. Pretendemos apresentar numa seqüência de Capítulos diversos tópicos de interesse da comunidade científico dentro da Dinâmica Orbital, numa linguagem acessível e simples, contudo não menos interessante para o leitor. A conexão da Dinâmica Orbital com a Teoria de Controle permite-nos aplicar os seus princípios às tecnologias e missões espaciais que demandam altos custos e necessitam ser modeladas e implementadas sob uma abordagem de otimização. Neste sentido, também estaremos reservando parte deste estudo para esta área 2. Fundamentos Celeste da Mecânica 2.1 Introdução A Mecânica Celeste é uma aplicação das leis universais da Mecânica Newtoniana ao estudo do movimento ou equilíbrio dos corpos 47 Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus ordem dos erros de observação, não servindo, portanto, para qualquer contestação. Os sucessos do programa espacial mundial e da Tecnologia em várias áreas se devem a validade da Mecânica Newtoniana. Além disso, a descrição Newtoniana da natureza é muito simples e não comete erros significativos. celestes, sujeitos a forças gravitacionais. Podemos dizer que o tema Mecânica Celeste teve seu início na publicação de Sir Isaac Newton do seu Philosophiae Naturalis Principia Mathematica em 1687, também chamada de Principia. Neste trabalho Newton formulou as leis de movimento e a lei de gravitação universal, derivou algumas das mais importantes propriedades do movimento planetário e de satélites. É claro que a derivação das três leis de Kepler precederam este trabalho de Newton por muitos anos. Além disso, foram os dados de Tycho Brahe e contribuições pessoais que permitiram Kepler estabelecer suas leis. No livro I de Newton ele escreveu que a força que atua sobre um planeta deve ser derivada das leis de Kepler. Mas, as leis de Newton não são absolutas; não conseguem descrever o movimento dos elétrons em átomos (Mecânica Quântica) e falham quando as velocidades envolvidas são compatíveis com a velocidade da luz (Relatividade). Contudo, estas limitações não as tornam inválidas, pois dentro do domínio no qual elas funcionam, elas dão uma descrição ótima do comportamento dos objetos materiais. Durante muito tempo a lei da gravitação universal foi considerada rigorosamente certa para explicar todos os fenômenos da Mecânica Celeste, até que Le Verrier observou que o periélio de Mercúrio avançava de um valor de 42’’ por século em relação ao valor predito pela Mecânica Newtoniana. Deslocamentos similares foram observados para Vênus, Terra e Marte. Porém, para estes últimos, as discrepâncias eram da mesma 2.2 Hipóteses na Teoria Clássica da Mecânica Celeste Na formulação da Mecância Celeste Clássica algumas hipóteses foram tomadas, a saber: a) A massa é considerada invariante; b) Admite-se a existência de sistema de referência inercial no qual são válidas as leis da Mecânica; c) A velocidade das interações é instantânea; d) O tempo é absoluto, isto é, pode ser medido simultaneamente em todos os referenciais inerciais, ou seja, num dado instante, ele é o mesmo em todos os referenciais inerciais; e) Os corpos sobre os quais as forças atuam são considerados puntiformes, além do que demonstra-se, na Teoria do Potencial, que todo corpo de raio finito e cuja distribuição de massa depende apenas da distância, se comporta gravitacionalmente como se toda a sua massa estivesse concentrada num ponto que é o seu centro de massa. Assim, o estudo do movimento desses corpos se resume no estudo do movimento de seus centros de massa. (O caso de corpos separados por distâncias muito grandes pode também ser 48 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 publicou as suas duas primeiras leis do movimento planetário. A terceira lei veio um pouco mais tarde, em 1619. As leis de Kepler são: 1) Lei de Kepler: “As órbitas dos planetas são elipses, tendo o Sol ocupando um de seus focos”. (Fig.1) enfocado como massas puntiformes); f) O espaço de trabalho é o Euclidiano onde a menor distância está contida em uma reta. 2.3 Sistema de Referência Um sistema de referência se constitui de um sistema de coordenadas para indicar a posição de objetos no espaço, mais um dispositivo para medir o tempo associado a esta posição. Um sistema de referência em Movimento Retilíneo e Uniforme no espaço, isto é, que não está sujeito a forças externas, é denominado de sistema inercial ou galileano. Salvo declaração contrária, os sistemas de referência com os quais trabalharemos neste curso serão do tipo inerciais. Fig.1 – Sistema Solar: Órbitas Elípticas dos Planetas 2) Lei de Kepler: “As órbitas dos planetas são planas e seus raios vetores varrem áreas iguais em tempos iguais” (Isto significa que a área varrida em um mesmo intervalo de tempo é a mesma) (Fig.2a,b). 2.4 As Leis de Kepler Na época de Kepler, e desde a época de Aristóteles, acreditava-se que o único movimento “natural” e “perfeito” dos corpos era o movimento circular. Nesta teoria, os planetas se moviam necessariamente em círculos, girando em trajetórias circulares ou em combinações de círculos menores se movendo sobre círculos maiores. Mas, os dados observacionais de Tycho Brahe, examinados por Kepler mostravam outros resultados que não conciliavam com esta teoria. A História diz que de 1601 a 1606 Kepler tentou ajustar várias curvas geométricas aos dados de Tycho sobre as posições de Marte. Encontrou um ótimo ajustamento para a elipse. A órbita foi encontrada e em 1609 Kepler Fig.2 – Órbitas Elípticas: 2a) áreas iguais, tempos iguais; 2b) detalhe: triângulo aproximado 49 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 45-58, 2004 Na Figura 2a os arcos PP´ e QQ´ são percorridos por intervalos de tempo iguais, segundo a lei de Kepler. Um infinitésimo de um destes arcos está representado na Figura 2b por um triângulo. Veremos adiante que é fácil provar que a taxa da área percorrida por unidade de tempo é dada por: dA 1 2 df h = .r . = = cte (1.1) dt 2 dt 2 h = momento angular f = anomalia verdadeira 3) Lei de Kepler: “Os quadrados dos períodos de revolução dos planetas são proporcionais aos cubos dos semi-eixo maiores das órbitas” a n3 a13 a 23 a33 = = = ... = = cte T12 T22 T32 Tn2 1) Lex motus prima: “Corpus omne perseverare in statu suo quiescendi vel movendi uniformiter in directum, nisi quatenus illud a viribus impressis cogitur statum suum mutare” “Todo corpo permanece ou em repouso ou em movimento retilíneo e uniforme, a menos que seja compelido a mudar esse estado por forças atuando sobre ele” 2) Lex motus secunda: “Mutationem motus proportionalem esse vi motrici impressae, et fieri secundum lineam qua vis illa imprimitar” “A taxa de mudança do movimento linear de uma partícula é igual à força externa atuante na direção e na magnitude” ρ d (m.v ) ρ =F dt (Lei original) (1.2) ⎛ a3 ⎜⎜ 2 ⎝T ⎞ ⎟⎟ = G.(mi + M ) / 4.π 2 , ⎠i i = 1,2,3,..., n. (Lei corrigida) (1.3) O erro da lei original para a corrigida é da ordem de 0,0009549 < 0,1% (Kovalevsky,1967), para o caso de Júpiter que é o planeta mais massivo. Por outro lado, a aplicação das leis de Kepler é válida só para o problema de 2 corpos ou em casos aproximados. 2.5 As Leis de Newton As Leis de Kepler eram apenas uma descrição e não uma explicação do movimento planetário. Coube a Isaac Newton desvendar o porquê do movimento planetário. As três leis do movimento de Newton são consideradas os axiomas da Mecânica. São elas (publicadas no Principia): (1.4) Se m for independente de tempo, ρ ρ ρ dv (1.5) F = m. = m.a dt ρ onde a é a aceleração da partícula. 3) Lex motus tertia: “Actioni contrariam semper et aequalem esse reactionem: sive corporum duorum actiones in se mutuo semper esse aequales et in partes contrarias dirigi” “A toda ação corresponde sempre uma reação que lhe é diretamente oposta; ou, as ações mútuas de dois corpos são caracterizadas por forças diretamente opostas” (Fig.3). ρ F12 ρ F21 -------.→------------------------←.------ρ -- m1 r m2 Fig.3 – Forças (ação e reação) atuantes sobre duas massas punctuais ρ ρ onde, F12 = − F21 (1.6) Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus A partir das leis de Kepler, da gravidade à superfície da Terra e do movimento da Lua em torno da Terra, Newton foi levado a enunciar a Lei da Gravitação Universal, a saber: “Duas partículas se atraem com uma força diretamente proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre elas” Da Figura 3 podemos escrever, i) partículas (massas punctuais) ii) corpos com simetria esférica (massa concentrada no centro de massa) iii) corpos assimétricos, porém separados por grandes distâncias) No sistema Terra-satélite o campo não-central deve ser considerado. O movimento de um corpo num campo central e suas características serão estudados adiante. ρ ρ F12 = −G.m1 .m 2 .r12 / r 3 2.6 Movimento Central (1.7a) ρ ρ F21 = −G.m1 .m 2 .r21 / r 3 (1.7b) ρ ρ r = r12 = r21 = com módulo Campo Introduziremos o movimento de uma partícula num campo de força central nesta seção com o objetivo de obtermos resultados importantes, com os quais construiremos a teoria do movimento de corpos celestes e satélites artificiais. Nesta seção, deduziremos preliminarmente as propriedades do campo de força central e as equações do movimento neste campo. Se uma força atuante numa partícula de massa m for tal que: i) ela seja dirigida sempre de m para um ponto fixo O ou sempre afastada do ponto O; ii) a magnitude dela depende somente da distância r entre a partícula e o ponto O, então a força é denominada força central ou campo de força central com O como centro da força. Devido a estas características, a força pode ser representada por: (Figura 4) da distância entre as massas m1 e m2 G = constante universal da gravitação, cujo valor conhecido hoje é (6,670 ± 0,005) x 10-11 N.m2/kg2. Na época de Newton o valor estimado de G foi obtido, igualandose a lei de gravitação à da inércia, G.m.M / R 2 = m.g (1.8) onde M - massa da Terra, que foi calculada na forma, M = ρ .V = num 4 .π .R 3 3 (1.9) O raio da Terra, R, já era conhecido e a densidade média conhecida, ρ era de ρ = 5,67 x 103 kg/m3 e g = 9,81 m/seg2, portanto, G ≅ 6,4 x 10-11 N. m2/ kg2 , que não é muito diferente do valor conhecido hoje. A Lei de Gravitação Universal nesta forma se aplica só no caso de: ρ ρ r F = F (r ). = F ( r ).eˆr r 50 (1.10) CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 do fato da força ser central. Para ver este resultado, tomemos o produto escalar da expressão (1.11) pelo Fig.4 – Força central, dirigida para o centro atrativo O Assim, força é dirigida segundo o versor êr ; ii) F(r) < 0, se for atração na direção de O; iii) F(r) > 0, se for repulsão de O. i) a ρ h Fig.5 – Movimento planar definido pelo vetor constante vetor posição, ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ r ο(r × v ) = r ο h → v ο(r × r ) = 0 = r ο h ⇒ r → a um vetor ρ constante h . Então o movimento é 2.6.1 Propriedades do Campo de Força Central é perpendicular planar (ocorre num plano) Um caso particular ρ ρ Sob a ação de uma força central, existem quantidades que se conservam, isto é, existem as integrais primeiras do movimento. Tais integrais permitem simplificar e mesmo auxiliar a resolução das equações de movimento. Além disso, outros resultados também podem ser obtidos do movimento num campo de força central. As propriedades do campo de força central são: Propriedade 1: O movimento da partícula é planar. (Fig.5). ρ ρ ρ ρ é h = 0 → r × v = 0 → ou r é paralelo ρ ρ a v e o movimento é retilíneo, ou v ρ é nulo e r é constante, repouso. Propriedade 2: O momento angular da partícula é conservado. De (1.11) temos que ρ ρ ρ ρ ρ ρ ρ ( r × v ) = h → m.( r × v ) = m.h = H (1.12) que é o momentum angular, neste caso, um vetor constante. Isto é, o momentum angular é constante (em magnitude e direção). Isto significa que qualquer que seja a forma da função F(r), o movimento no campo central se processa no ρ ρ plano formado por r e v que é ρ ρ ρ ρ F = F (r ).eˆr → r × F = r.eˆr × F .eˆr ρ ρ = r.F .eˆr × eˆr = 0 ρ ρ ρ ⎛ m.dv ⎞ ρ ρ ⎛ dv ⎞ ρ r ×⎜ ⎟ = 0 → r ×⎜ ⎟ = 0 → ⎝ dt ⎠ ⎝ dt ⎠ ρ ρ ρ ρ ρ ρ d (r × v ) = 0 → r ×v = h dt ρ perpendicular a H . Se o momentum ρ angular H variar, isso implicará uma ρ componente de v fora do plano original, de sorte que um novo vetor ρ momento angular, H ' , definirá um ρ ρ vs. v e será novo plano r perpendicular a ele. Propriedade 3: O campo de força central é conservativo. (1.11) Ou seja, a equação (1.11) mostra um vetor constante ρ h sempre perpendicular ao plano determinado pelos vetores posição e velocidade. Isto é uma conseqüência 51 Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus ρ Um campo de força F é dito conservativo se o trabalho realizado sobre o sistema só depender dos pontos extremos (inicial e final) e não depender da trajetória. O trabalho realizado sobre o sistema pela força F(r) é definido por: W12 = ∫ r2 r1 Fig. 6 – Sistema de eixos para o movimento plano Então, ρ r = x.iˆ + y. ˆj (1.15) Mas, o vetor posição também pode ser escrito como sendo: ρ ρ ρ r2 r ρ r2 F .dr = ∫ F ( r ). .dr = ∫ F (r ).dr r1 r1 r ρ r = r.eˆr → eˆr = cos f .iˆ + sen f . ˆj (1.16) (1.13) Por outro lado, êr é o vetor tangente a curva r = constante, portanto, pois ρ ρ 1 ρ ρ 1 r ο dr = .d (r ο r ) = d (r 2 ) = r.dr → 2 2 r2 W12 = ∫ F ( r ).dr r1 eˆt = − sen f .iˆ + cos f . ˆj (1.14) Desta forma, temos, expressão (1.14) mostra que o trabalho, W12, realizado sobre um sistema no campo central só depende dos pontos inicial e final e, então, o campo de força central é conservativo. Certamente, uma partícula terá a liberdade de “escolher” qualquer caminho dentro do campo de força central para sair ρ de um ponto r1 e chegar no ponto deˆr df = eˆt . dt dt ˆ det df = −eˆr . dt dt 2.6.2 Equações de Movimento em Campo Central ⎛ d2 f dr df ⎜⎜ r. 2 + 2. . dt dt ⎝ dt Seja o movimento plano conforme mostrado na Figura 6, onde x e y são o sistema de eixos cartesianos no plano do movimento, (1.21) êt é (1.19) ρ ρ dr dr df = eˆr . + eˆt .r. v= dt dt dt ρ ⎛ 2 2 ρ dv ⎜ d r ⎛ df ⎞ ⎞⎟ = − r.⎜ ⎟ .eˆr + a= dt ⎜⎝ dt 2 ⎝ dt ⎠ ⎟⎠ além de W12. o versor radial, (1.18) Em coordenadas polares, a velocidade e a aceleração de m são dadas, respectivamente, por: ρ r2 , sem perda ou ganho de energia, êr é (1.17) (1.20) ⎞ ⎟⎟.eˆt ⎠ Mas, pela segunda lei de ρ Newton, a força resultante, m. a , que atua sobre este corpo, num campo central é a força central ρ F ( r ) . Assim, o versor transversal perpendicular a êr e f é o ângulo polar entre o eixo x e o corpo em movimento. A massa m do ρ corpo é localizada pelo vetor r = r.eˆr num campo central. 2 ⎛ d 2r ⎛ df ⎞ ⎞⎟ ⎜ m. − r.⎜ ⎟ .eˆr + ⎜ dt 2 ⎝ dt ⎠ ⎟⎠ ⎝ ⎛ d2 f dr df ⎞ m.⎜⎜ r. 2 + 2. . ⎟⎟.eˆ f dt dt ⎠ ⎝ dt = F (r ).eˆr 52 (1.22) CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 Assim, as equações de movimento de uma partícula no campo central são: aproximadamente igual à metade da área do paralelogramo com lados r e Δr. 2 ⎛ d 2r ⎛ df ⎞ ⎞⎟ ⎜ m. − r.⎜ ⎟ = F (r ) ⎜ dt 2 ⎝ dt ⎠ ⎟⎠ ⎝ 1 ρ ρ ΔA = . r × Δr 2 (1.23) ⎛ d2 f dr df m.⎜⎜ r. 2 + 2. . dt dt ⎝ dt Dividindo-a por Δt e passando o limite para Δt→0, temos: ⎞ ⎟⎟ = 0 ⎠ Fig.7 – Lei das áreas (1.24) ρ 1 ρ Δr ΔA = λim . r × = Δt →0 Δt Δt →0 2 Δt 1 ρ ρ 1 2 df . r × v = .r . =h 2 2 dt A partir desta última equação, podemos chegar ao resultado da conservação do momentum angular. Se dividirmos esta equação por r, temos: m ⎛ 2 d2 f dr df .⎜⎜ r . 2 + 2.r. . r ⎝ dt dt dt (1.26) λim (constante) (1.27) Mas, esta quantidade é o módulo ρ da velocidade areolar, ⎞ ⎟⎟ = ⎠ m ⎛ 2 df ⎞ .d ⎜ r . ⎟ / dt = 0 r ⎝ dt ⎠ df → m.r 2 . = m.h = H (constante) dt dA dA ˆ 1 ⎛ 2 df .k = .⎜ r . = dt dt 2⎝ dt ⎞ˆ 1 ρ ⎟.k = .h 2 ⎠ (1.28) Assim, a velocidade areolar é um vetor constante. (1.25) Observemos que em (1.25) aparece o módulo do momento angular: 2.6.3 Equação de Binet ρ ρ m.(r × v ) = Para obtermos uma solução parcial, que nos dirá o tamanho e a forma da órbita de uma partícula de massa m num campo de força central, utilizamos a equação de Binet, cuja derivação é dada a seguir: Tomemos as equações de movimento (1.23) e (1.25), e façamos df ⎛ dr ⎞ m. r.eˆr × ⎜ .eˆr + r. .eˆ f ⎟ = dt ⎝ dt ⎠ df m.r 2 . =H dt que prova a propriedade 2 do campo central. Propriedade 4: A taxa temporal de variação na área varrida pelo raio vetor de uma partícula em campo de força central é constante. Na Figura 7, supomos que uma partícula se mova numa trajetória elíptica, descrevendo um setor de área ΔA em um intervalo de tempo Δt. Assim, a área ΔA varrida pelo vetor posição neste tempo é uma mudança de variável, r = 1 , u m.r 2 . 53 df u df = H. =H→ dt m dt Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus 2 ⎡ d 2r ⎛ df ⎞ ⎤ m.⎢ 2 − r.⎜ ⎟ ⎥ = F (r ) → ⎝ dt ⎠ ⎥⎦ ⎢⎣ dt ⎡ u 2 ⎛ d 2u ⎞ H2 ⎤ m.⎢− H 2 . 2 .⎜⎜ 2 ⎟⎟ − 2 3 ⎥ m ⎝ df ⎠ m .r ⎦ ⎣ 1 = F( ) u 2.6.5 Propriedades da Elipse e a Interpretação das Leis de Kepler A elipse é um lugar geométrico de um ponto que se move de forma que sua distância a partir de um ponto fixo, o foco, mantém uma relação constante (<1) com sua distância a partir de uma linha fixa, a diretriz. De acordo com a Figura 8, valem as seguintes definições: r é a distância do foco ao ponto P, f é o ângulo entre o eixo origem e o ponto P, centrado no foco, e < 1 = SP/PM é a excentricidade, S é o foco, S’ é o outro foco (virtual), a é o semi-eixo maior, com AA’=2.a, e b é o semieixo menor, com BB’=2.b. ou, finalmente, d 2u −m 1 + u = 2 2 .F ( ) 2 u df H .u (1.29) A equação (1.29), conhecida como equação de Binet, é de grande importância para o estudo do movimento no plano (campo central), pois dado qualquer campo de força central, pode-se imediatamente através dela determinar a forma da trajetória do corpo em tal campo. 2.6.4 Conservação da Energia num Campo Central Como já sabemos pela propriedade 3, o campo de força central é conservativo. Isto é, ele pode ser derivado de um potencial. Nestas circunstâncias, o trabalho realizado pela força F(r) entre dois pontos r1 e r2 deve ser igual à variação de energia potencial entre estes pontos. Assim, Fig.8 – Geometria da elipse As seguintes também válidas: e= r2 W12 = ∫ F ( r ).dr = U (r1 ) − U (r2 ) → r1 são CS CA F (r ).dr = − dU → U = − ∫ F ( r ).dr (1.32a) (1.30) (1.32b) Desta forma, podemos concluir que para um campo central, a energia se conserva e a energia potencial só depende da posição. De uma maneira geral, para forças conservativas, podemos escrever: ρ 2. p = Q.Q ' r2 relações 2.a = SP + PS ' = cte r1 (1.32c) p = a.(1 − e 2 ) (1.32d) r= F (r ) = −∇U ( ) a. 1 − e 2 (1 + e. cos f ) (1.32e) onde p recebe a denominação de “semi-latus rectum” . (1.31) 54 CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 A primeira Lei de Kepler diz que o movimento planetário é elíptico. Dada a equação da elipse, temos, r= r −1 ( 2.6.6 Exemplo de Campo de Força Central: Campo Gravitacional ) a. 1 − e 2 → (1 + e. cos f ) Pela lei gravitacional de Newton, na teoria de movimento de um corpo de massa punctual m, ao redor de um corpo massivo (SatéliteTerra, Terra-Sol, etc), tem-se: ⎛1⎞ d⎜ ⎟ (1 + e. cos f ) → ⎝ r ⎠ = − e. sen f → = df a. 1 − e 2 a. 1 − e 2 ( ) ( ) ρ − G.M .m F (r ) = .eˆr r2 (1.33) (1.37) que é um campo de força central. A equação da trajetória, como no caso do campo central, é dada por: Usando a equação de Binet, substituindo u =1/r e usando o fato de que só existe aceleração radial num campo central, ou seja, ρ ρ r F ( r ) = F ( r ). , chega-se à expressão: r d 2u −m 1 μ .m 2 + u = 2 2 .F ( ) = → u df 2 H2 H .u d 2u μ .m 2 +u = df 2 H2 ρ ρ ⎛ H ⎞ 1 r ⎟. . → F (r ) = −⎜⎜ 2 ⎟ 2 ⎝ m.r ⎠ a. 1 − e r ρ ρ − κ .m r F (r ) = 2 . r r 2 ( ) onde, μ = G.M (1.39) A solução da equação (1.38) é dada por: (1.34) 1 μ.m 2 = + D. cos( f − f 0 ) = r H2 (1.40) ( 1 + e. cos f ) = p u= onde, κ= H2 1 . 2 2 m a .(1 − e 2 ) (1.35) A segunda Lei de Kepler já havia sido obtida a partir das leis do campo central, ou seja, dA H = cte = = (Área dt 2.m π .a.b elipse)/Período = T onde H2 μ.m 2 2. p.E e2 = 1 + p= da μ (1.36) ( ) H2 π 2 .a 2 .b 2 π 2 .a 4 . 1 − e 2 ⎛ dA ⎞ = = ⎜ ⎟ = T2 T2 4.m 2 ⎝ dt ⎠ ,utilizando a equação (1.35), temos: κ= (1.41) (1.42) E = energia total do corpo A equação (1.40) é uma equação de cônica, isto é, se a lei de força central é de uma força inversamente proporcional a distância (como a lei gravitacional), a trajetória da partícula é uma cônica, como no caso do sistema Terra-Sol. A terceira Lei de Kepler é de fato apenas uma decorrência da segunda. Quadrando a taxa areolar têm-se: 2 (1.38) 4.π 2 .a 3 a3 = cte = cte → T2 T2 2.6.7 Curvas de Energia Potencial Gravitacional 55 Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus com energia potencial fictícia, dada por: (1.44) U ef ( r ) = U ( r ) + U c ( r ) Sem resolver a equação de movimento no campo gravitacional, obtida em 2.6.6, podemos ver que é possível classificar as órbitas resultantes somente por meio de uma análise de equações de movimento e de leis de conservação. Utilizamos um recurso alternativo que é o estudo das curvas de energia potencial para esse fim. Para tanto, um problema unidimensional equivalente ao problema original será considerado. Primeiramente, a energia total de uma partícula em um campo central é dada por: A energia U ef (r ) é chamada de A parte 1 ⎛ dr ⎞ .m.⎜ ⎟ da energia total é radial. 2 ⎝ dt ⎠ Além disso, a força fictícia associada é dada por: Fef = ∂U ef ∂r = F (r ) − ⎛−H2 ∂U c = F (r ) − ⎜⎜ 3 ∂r ⎝ m.r , ou seja, ⎛ H2 ⎞ ⎟ Fef = F (r ) + ⎜⎜ 3 ⎟ ⎝ m.r ⎠ 1 .m.v 2 + U (r ) → 2 2 2 ⎤ 1 ⎡⎛ dr ⎞ 2 ⎛ df ⎞ .m.⎢⎜ ⎟ + r .⎜ ⎟ ⎥ + U (r ) 2 ⎢⎣⎝ dt ⎠ ⎝ dt ⎠ ⎥⎦ (1.45) O segundo termo da força efetiva em (1.45) é o que chamamos de força centrífuga. Assim, neste problema a lei de conservação de energia pode ser escrita como sendo: (1.43) Mas, elevando a equação (1.25) ao quadrado e substituindo na equação de E, (1.43), temos, E = U ef + 2 H2 ⎤ 1 ⎡⎛ dr ⎞ E = .m.⎢⎜ ⎟ + 2 2 ⎥ + U (r) = 2 ⎣⎢⎝ dt ⎠ m .r ⎦⎥ 1 ⎛ dr ⎞ .m .⎜ ⎟ 2 ⎝ dt ⎠ 2 (1.46) Para ilustrar este modo de estudar o movimento, considere um gráfico (Figura 9) de U ef em função 2 1 ⎛ dr ⎞ 1 H 2 .m.⎜ ⎟ + + U (r) 2 ⎝ dt ⎠ 2 m.r 2 de r no caso da força gravitacional, −μ . A energia potencial para r2 −μ esta força é dada por U ( r ) = eo r (1.43) O termo grifado é um termo relacionado com a energia potencial. Neste termo temos U(r), que é a energia potencial da partícula e, o 1 H2 . = Uc 2 m.r 2 efetiva. 2 E= termo energia é o F (r ) = potencial fictício correspondente é dado por: que U ef = chamamos de energia centrífuga. A equação (1.43) pode ser considerada para um problema unidimensional (dependendo apenas de r) fictício 56 −μ 1 H2 + . r 2 m.r 2 (1.47) ⎞ ⎟⎟ ⎠ CADERNO DE FÍSICA DA UEFS, 03 (01): 47-59, 2004 Fig. 9 – Relações de energias no problema de forças centrais Fig.10 – Trajetória elíptica Consideremos uma energia potencial U(r) que corresponde a uma força atrativa para qualquer distância r, isto é, F = - ∂U/∂r , onde F(r) é negativa e U(r) é uma função crescente, conforme indica a curva (a). A energia potencial centrífuga Uc(r) está indicada pela curva (b). O termo devido a Uc(r) é pequeno para distâncias grandes, mas cresce rapidamente quando a partícula se aproxima da origem. Em muitas situações reais, a energia potencial é o termo dominante para pequenas distâncias, disto resulta uma energia efetiva Uef com a forma indicada pela curva (c). O termo “fictício” está relacionado a termos adicionais que apareceram nas equações originais por causa da transformação da solução de um problema bidimensional em outro equivalente unidimensional. Na Figura 9, quando a energia total por unidade de massa E da partícula for indicada pela reta horizontal E2, o raio da órbita oscila entre os valores mínimo e máximo, r mínimo e r máximo respectivamente, e órbita tem forma de uma roseta em geral, como indica a Figura 10. Portanto, quando o domínio de variação de r está entre r mínimo e r máximo o movimento da partícula é finito, e a trajetória permanece no interior do anel limitado pelos círculos definidos por r = r mínimo e r = r máximo. Porém, isto não significa obrigatoriamente que a órbita seja fechada. Durante o tempo que r leva para ir do r máximo para o r mínimo e novamente ao r máximo, o raio vetor desloca-se de um ângulo Δφ . Para que a órbita seja fechada, é condição suficiente e necessária que o ângulo seja uma fração racional de 2.π, isto é, Δφ = 2.π.m/n, onde m e n são números inteiros . Então, após n períodos, o raio vetor do ponto avança m voltas inteiros e retorna ao ponto inicial e a trajetória é fechada. No caso limite, quando a energia E corresponde ao ponto de mínimo D de U ef (r ) indicado pela reta E4 , a partícula descreve uma órbita circular de raio r0. Quando a energia E for positiva ou nula, como no caso das retas E2 e E0, a órbita será ilimitada e aberta, a partícula possui energia suficiente para desaparecer no infinito. Claramente, podemos ver que a 57 Curso de Dinâmica Orbital e Controle: Fundamentos da Mecânica Celeste Antonio Delson de Jesus partícula não pode ter raio inferior ao raio mínimo (G), porque neste caso teríamos U ef > E 2 , o que Antônio Delson C. de Jesus - Doutor em Dinâmica Orbital e Controle pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, professor Adjunto no Departamento de Física da UEFS. significa energia cinética negativa. A diferença entre órbitas limitadas e ilimitadas depende do fato da energia E ser negativa ou não, respectivamente; para o caso gravitacional isto sempre é verdadeiro. No caso gravitacional, temos: e2 = 1 + 2. p.E μ , p sempre positivo e μ sempre positivo → Quando E > 0 ⇒ e > 1 e a cônica será uma hipérbole Quando E = 0 ⇒ e = 1 e a cônica será uma parábola Quando E < 0 ⇒ e < 1 e a cônica será uma elipse Quando E < 0 e e = 0 ⇒ a cônica será um círculo No próximo Capítulo, estaremos continuando o curso de Dinâmica Orbital e Controle, discutindo mais um tema entre os propostos. Além disso, apresentaremos alguns exercícios de aplicação do primeiro Capítulo – Fundamentos da Mecânica Celeste. Referências [1] JESUS, A. D. C. Notas de Aula. Mecânica Orbital e Controle, SBPC, Salvador, Julho, 2001. [2] De LUCA, N. Mecânica Celeste. Editora da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1982. [3] ROY, A.E. Orbital Motion. 2nd ed. Adam Hilger Ltd. Inglaterra, 1982. [4] SYMON, K. R. Mecânica, 3rd ed. Reading, Mass.: Addison-Wesley, 1971. Sobre o Autor – 58