A REPRESENTAÇÃO DO TEATRO INFANTIL NA IMPRENSA BAIANA Alan Nunes Machado Júnior (CNPq/ PIBIC/UFBA) i Adriele Lacerda Benevides (UFBA) ii Rosa Borges dos Santos (Orientadora/UFBA) iii 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS O ato institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, foi o golpe decisivo no processo de cerceamento de liberdades começado pelos militares em 31 de março de 1964 que visava [...] a dar ao País um regime que, atendendo às exigências de um sistema jurídico e político, assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo [...].1 Foi em nome desta “liberdade”, “respeito” e no “combate à subversão” que teatros foram fechados, artistas presos e torturados, e as produções artísticas e culturais, submetidas à apreciação prévia, antes de serem levadas à população. Nesse contexto, destacam-se os textos de teatro submetidos à censura e produzidos na Bahia e os documentos que fazem referência direta ou indiretamente ao cenário teatral baiano e/ou as suas produções, objeto de pesquisa da Equipe Textos Teatrais Censurados (ETTC). Nessa equipe, alguns de seus membros ocupam-se da recensão, organização e estudo dos textos teatrais infantis e das matérias de jornais que fazem referência a estes. i Graduando em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), bolsista do CNPq com o subprojeto Textos teatrais infantis censurados na Bahia: recensão e estudo. Integrante da Equipe Textos Teatrais Censurados. Email: [email protected]. ii Graduando em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pesquisadora voluntária. Integrante da Equipe Textos Teatrais Censurados. Email: [email protected]. iii Professora Associada do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia (ILUFBA). Doutora em Letras e Linguística, Linha de Pesquisa, Crítica Textual, pela UFBA. Coordenadora do Grupo de Edição e Estudo de Textos Teatrais Censurados. ISBN: 978-85-7395-211-7 Pretende-se, neste trabalho, mostrar como se deu a recepção do Teatro Infantil nos periódicos do momento em questão. Além de, sucintamente, elencar os principais dramaturgos que trabalharam neste tipo de produção, suas obras e a crítica feita pelos jornais. 2 O TEATRO INFANTIL NA IMPRENSA A imprensa baiana teve uma importante tarefa na divulgação das peças teatrais. Apesar de a maior parte das matérias serem sobre o teatro adulto, há um conteúdo considerável sobre o teatro infantil nos principais jornais da época: Tribuna da Bahia, A Tarde, Correio da Bahia e Jornal da Bahia. Esse teatro para “crianças” foi, durante a ditadura militar, severamente criticado, principalmente por dramaturgos que escreviam de forma periódica ou ocasionalmente para os jornais da época. Um exemplo é Sóstrates Gentil, dramaturgo e jornalista, que, em matéria para o Jornal da Bahia2, critica a falta de seriedade dos autores, diretores e atores de peças infantis. Dos autores, comenta sobre a falta de preocupação com a linguagem e a mensagem passada para as crianças, além da qualidade das adaptações de grandes clássicos. Dos atores e diretores, aponta para a falta de conhecimento e compromisso com o texto que está sendo encenado. O dramaturgo também lamenta o motivo pelo qual se elabora uma peça infantil. Segundo Gentil3, o teatro infantil trata-se de uma produção “meramente comercial”4, com o intuito de arrecadar dinheiro sem a preocupação com aquilo que seria o objetivo principal, “educar divertindo”5. Há, porém, críticas positivas, como àquela feita a peça Dom Chicote Mula Manca e seu fiel companheiro Zé Chupança, de Oscar Von Pfuhi, com a direção de Manoel Lopes Pontes, uma releitura de um clássico da literatura mundial, Dom Quixote de La Mancha, para o público infantil. O sucesso foi tanto que, além de uma forte divulgação em diversos jornais do ano de 1978, a peça foi eleita como uma das melhores montagens do ano, além de agradar ao público adulto. É válido ressaltar que as releituras de clássicos da literatura (como Alice no País das Maravilhas, O Gato de Botas, Pinóquio) eram as mais divulgadas pela imprensa, fossem essas montagens baianas ou não. 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 24 Figura 1 - Matéria publicada no Jornal da Bahia, em 30 jul. 1968. Fonte: Núcleo de Acervo do Espaço Xisto Bahia 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 25 Quanto a linguagem das montagens eram tidas como “linguajar floreado, romântico e metafórico”6, e foi apresentada com uma nova concepção pelo Grupo Opinião na montagem do musical infantil Julinho contra a bruxa no espaço, de Deolindo Checcucci, que foi muito bem recebida pelos colunistas. Figura 2 - Matéria publicada no A Tarde, 6 abr. 2010. Fonte: Núcleo de Acervo do Espaço Xisto Bahia 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 26 3 OS AUTORES E SUAS PRODUÇÕES Alguns autores, ao longo da carreira, fizeram muito mais do que escrever peças. Manoel Lopes Pontes, Deolindo Checcucci, Lúcia Di Sanctis trabalharam também como diretores. João Augusto, Sóstrates Gentil, Jurandir Ferreira (este também se consagrou como ator), por exemplo, além de autores de peças teatrais escreviam matérias para os jornais da época, comentando acerca das montagens e da situação que o teatro brasileiro, principalmente baiano. Lúcia Di Sanctis, inicialmente, diretora e atriz de teatro, lançou-se como autora em 1969 com a peça A Formiguinha Professora. Por conta do sucesso dos trabalhos anteriores, a expectativa da crítica jornalística, em relação aos seus futuros projetos, foi muito grande. Manoel Lopes Pontes foi criticado no decorrer da sua carreira como autor e produtor de peças teatrais. O dramaturgo era conhecido por suas grandes produções, preocupando-se com a parte visual, cenário, figurino, seleção cuidadosa do elenco etc. No entanto, “o teatro infantil desenvolvido por ele não [impediu que] sofresse severas críticas quanto ao posicionamento ideológico e didático”7. Na montagem de Dom Chicote Mula Manca e seu fiel companheiro Zé Chupança, Pontes recebeu elogios sobre a nova forma de se produzir uma peça infantil, sem precisar fazer uso excessivo de metáforas, bastante usadas e criticadas nas peças infantis, e sim de uma linguagem mais objetiva, porém com uma produção visual com menos glamour em relação às produzidas por ele anteriormente. Na mesma peça, Jurandir Ferreira recebeu excelentes críticas, dessa vez como ator na pele da personagem Zé Chupança, um “comunicador versátil e poderoso no contato com as crianças”8, a crítica também fala sobre a capacidade de Ferreira de transformar cenas inexpressivas em situações engraçadas; além disso, ele consegue se destacar dos demais atores inclusive da personagem principal, D. Chicote, interpretada por Otávio Navarro, que teve a difícil tarefa de substituir Nilson Nobre às vésperas da estréia. 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 27 Figura 2 - Matéria publicada no Jornal da Bahia, em 28 maio 1978. Fonte: Núcleo de Acervo do Espaço Xisto Bahia 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 28 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Observamos, ao longo do texto, que a imprensa teve um papel importante na divulgação dos espetáculos e na problematização de questões relacionadas ao teatro infantil e ao seu público. Portanto, é possível afirmar que a pesquisa em textos de imprensa é de suma importância, principalmente, para a Crítica Textual, visto que oferece um caminho balizado, justificando escolhas que o editor científico faça, no processo de estabelecimento do texto crítico que vai compor a literatura dramática. Esse estudo é de grande valia ainda para os trabalhos no âmbito da Literatura ao possibilitar um conhecimento acerca da recepção dos textos, tornando possível uma caracterização do cenário literário-dramático em um momento específico. NOTAS ______________________ 1 Brasil, 1968. 1968. 3 1968. 4 Gentil, 1968. 5 Gentil, 1968. 6 Jornal da Bahia, 1974. 7 Jornal da Bahia, 1978. 8 Jornal da Bahia, 1978. 2 RESUMO A Censura instaurada no Brasil pelos militares em 1964 cerceou liberdades individuais e, no campo do teatro, impediu a realização de espetáculos, cortou textos e determinou o que se podia – ou não – dizer. Neste período, as produções teatrais destinadas ao público infantil passaram a ser, muitas vezes, um mecanismo para burlar a censura. A Equipe de Textos Teatrais Censurados (ETTC), coordenado pela Profa. Dra. Rosa Borges, tem empreendido, nos últimos anos, o resgate dos textos de teatro, bem como de materiais relacionados a este, no intuito de caracterizar essa produção dramatúrgica baiana. Neste trabalho, pretende-se abordar o tratamento dado ao teatro infantil pela imprensa baiana na época da ditadura militar, elencando alguns autores e suas produções. PALAVRAS-CHAVE: Teatro Infantil. Crítica Textual. Imprensa baiana. 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 29 ABSTRACT The Censorship established in Brazil for the military force in 1964 curtailed individual freedoms and, in the theater field, hindered the accomplishment of spectacles, cut texts and determined if could it - or not – be said. In this period, the theater productions destined to the infantile public had started to be, many times, a mechanism to mislead the censorship. The research team Equipe Textos Teatrais Censurados (ETTC), coordinated by the Professor Doctor Rosa Borges has undertaken, in recent years, the rescue of the theater texts, as well as of the materials related to it, in intention to characterize this bahian’s dramaturgical production. In this work it is intended to do an approach to the treatment given to the infantile theater by the bahian’s press at the time of the military dictatorship, listing some authors and their productions. KEYWORDS: Children’s Theater. Textual Criticism. Bahia press. REFERÊNCIAS BRASIL. Ato institucional nº 5, de 13 de Dezembro de 1968. Senado Federal. <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=194620.> Acesso em: 02 set. 2010. GENTIL, Sóstrates. Teatro Infantil. Jornal da Bahia, Salvador, 30 jul. 1968. Teatro Infantil. Jornal da Bahia, Salvador, 6 jun. 1974. 2º Caderno, p. 2. “D. Quixote” é uma mudança no trabalho de Lopes Pontes. Jornal da Bahia, Salvador, 28 maio. 1978. INFANTIL. A Tarde, Salvador, 06 abr. 2010. 4º Encontro Nacional de Pesquisadores de Periódicos Literários, 4., 2010, Feira de Santana. Anais. Feira de Santana: Uefs, 2013. 30