XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis Apontamentos sobre revisão textual: atribuições e conceituações Marina Ávila Birriel Pós-graduanda em Produção e Revisão Textual pela UniRitter e Bacharel em Letras pela Universidade Federal de Santa Maria UniRitter [email protected] Resumo: O presente artigo visa repensar as conceituações a respeito da revisão textual e as atribuições do revisor. A justificativa dá-se uma vez que esta é uma área que segue em expansão e, todavia, é pouco explorada. Devido ao pouco conhecimento e/ou a pouca reflexão sobre o tema, clientes e revisores utilizam como sinônimos revisão ortográfica, revisão gramatical, revisão sintática, correção de português, revisão, preparação, normalização, dentre outros. Assim, o objetivo deste artigo é repensar os conceitos que se vinculam a esta atividade, a fim de melhor compreender o que, de fato, engloba (ou deveria englobar) o trabalho desempenhado pelo revisor e de chamar atenção ao tema na intenção de que, melhor definindo o trabalho deste profissional, melhor seja seu posicionamento na cadeia que inicia com a produção de um texto e encerra na sua publicação. Para tanto, foram articulados conceitos formulados por Oliveira Pinto, Coelho Neto, Koch, Cegalla, Guedes e Chartier. Trata-se de um breve compilado de apontamentos, muito mais do que de conclusões. No entanto, o presente artigo abre portas para que se comece a refletir mais atentamente ao que compete a esta importante profissão e suas áreas de atuação. 1 Introdução Desde minha graduação, durante as disciplinas voltadas ao ramo editorial, venho percebendo fortes inconsistências e incoerências nas (poucas) produções a respeito das atribuições que competem ao revisor textual, bem como a respeito da conceituação desta atividade. Ao longo de minha atuação profissional, iniciada há alguns anos, ainda no período da graduação, diversas vezes notei o desconhecimento, por parte dos clientes, sobre qual o trabalho desempenhado por este profissional e, mais ainda, sobre como se referir: revisão ortográfica, revisão gramatical, revisão sintática, correção de texto, revisão de texto, preparação de texto, normalização, dentre outros. As reflexões aqui expostas partem da percepção da importância do trabalho deste profissional da linguagem em todos os âmbitos sociais e do notável déficit de escopo acadêmico sobre as atribuições e conceituações acerca do que é ser um revisor. Ademais, embora pouco referencial seja encontrado, quando o é, verifica-se grave inconsistência nas conceituações, que se misturam, indicando confusão entre as atividades designadas e sua hierarquização, bem como uma segmentação desnecessária e prejudicial à totalidade do texto. Assim, o objetivo deste artigo é repensar os conceitos que se vinculam a esta atividade, a fim de melhor compreender o que, de fato, engloba (ou deveria englobar) o XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015 XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis trabalho desempenhado pelo revisor e de chamar atenção ao tema na intenção de que, melhor definindo o trabalho deste profissional, melhor seja seu posicionamento na cadeia que inicia com a produção de um texto e encerra na sua publicação. Para tanto, utilizarei alguns conceitos básicos básico, pensando sobre cada uma das classificações já explicitadas e tendo como referência minha experiência no mercado de revisão. 2 Trajetória da função do revisor Do século X ao XII, o trabalho dos copistas, desenvolvido na Europa, foi de grande importância para a divulgação do conhecimento. No entanto, devido às possibilidades de ―falsas‖ interpretações de textos sagrados, foram organizados grupos de revisores para conferir as cópias (COELHO NETO, 2008). Eis onde surgiu o campo para o revisor atuar. Já no século XV, com a invenção da imprensa de tipos móveis de Gutenberg, a qual dispensou os copistas (que, mesmo se desejassem seguir no mercado, não dariam conta da demanda) este trabalho se popularizou, dada a necessidade de conferir os erros tipográficos e tendo em vista a reprodução de textos em larga escala (CHARTIER, 2009; COELHO NETO, 2008). Na esteira das inovações nos modos de produção e reprodução de textos, no século XX popularizou-se a máquina de escrever, criada em 1870. E, em 1980, surgiram os microcomputadores. Segundo Coelho Neto (2008, p. 23), ―nunca tantos recursos estiveram ao alcance das pessoas comuns para escrever e manipular textos‖. Todas essas modificações levaram a significativas mudanças no papel do revisor, a começar pela expansão de sua área de atuação. Quanto mais textos e mais edições, mais seu trabalho passou a ser requisitado. Com tantas inovações, passou-se a temer o fim do livro como o conhecíamos, aspecto bastante abordado por Chartier em sua obra ―A aventura do livro – do leitor ao navegador‖ (2008). Porém, o que se verificou foi, na verdade, a diversificação dos suportes. Hoje temos e-books, que podem ser lidos em nos computadores pessoais, em tablets, smartphones, no Kindle®, no Saraiva Lev®, no Kobo®. Além do aumento dos suportes, aumentou também, drasticamente, a quantidade de gêneros textuais. ―[...] a produção e a venda só cresceram nos últimos anos‖ (GRAIEB, 2002 apud COELHO NETO, 2009). O mercado ampliou-se largamente no âmbito da produção textual e, consequentemente, no da revisão. Em relação às editoras, por exemplo, temos desde as cartoneiras até os grandes grupos editorias. Além disso, autores podem ser autodidatas e pagar pela publicação de seus próprios livros. Sem contar as inúmeras possibilidades virtuais, como produção em blogs, sites, periódicos, e as produções independentes, como os zines, por exemplo. XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015 XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis Considerando este breve panorama, é possível organizar cronologicamente os serviços do revisor em: a) revisar cópias manuscritas dos copistas (revisão de conteúdo, a fim de evitar ―más interpretações‖); b) revisar erros tipográficos nas provas; c) revisar textos datilografados ainda antes de irem à editora, d) revisar no computador (majoritariamente no Microsoft Word®). Contudo, tendo em vista o já pouco conhecimento difundido sobre o trabalho do revisor, a ausência de legislações que regulamentem a profissão, bem como a dificuldade do próprio pessoal da área em conhecer e determinar seu campo de ação, faz-se de extrema importância repensar este tema, analisando desde sobre as interferências realizadas no texto até o tipo de suporte em que a revisão pode ser realizada. É, ainda, imperativo ao profissional empenhado ter não só conhecimentos lingüísticos (e saber como manipulá-los), como também de mundo e de softwares utilizados em processos de edição/editoração. 3 Perfil profissional e contexto mercadológico atual As nomenclaturas revisão ortográfica, revisão sintática, correção de português, revisão gramatical, por exemplo, são comuns de serem ouvidas no cotidiano do revisor. Em geral, são os termos utilizados pelos clientes ao solicitar o orçamento. O primeiro conceito mostra-se claramente insuficiente, uma vez que ortografia ―é a parte da Gramática que trata do emprego correto das letras e dos sinais gráficos na língua escrita‖ (CEGALLA, 2008, p. 52). Tampouco dá conta de um trabalho realmente comprometido em obter um bom resultado a noção de revisão sintática, pois a sintaxe contempla somente os termos da oração e sua relação entre si e com outras frases. A ideia de correção de português também se apresenta problemáticas. Primeiramente, a noção de correção é bastante excludente, já que considera o ―correto‖, que seria apenas a norma culta – o que, a depender do gênero, não deve ser levado em conta na revisão. Em segundo lugar, a simples presença do termo ―português‖ também é restritiva, induzindo à noção de língua pura, ainda vinculada aos nossos colonizadores. No entanto, é preciso considerar a variedade brasileira da língua portuguesa, bem como suas regionalidades, se o gênero permitir. Em sua obra ―O livro: manual de preparação e revisão‖, já no título Pinto estabelece uma separação entre as atividades: preparar um texto, difere-se de revisá-lo. A autora afirma (1993, p. 10) que ―As atividades relativas à adequação do texto que dizem respeito à organização, normalização e revisão dos originais são chamadas de preparação‖. Assim, é possível notar que, para ela, a revisão insere-se na preparação de textos, que seria a atividade mais abrangente. Quanto à normalização/padronização, Pinto (1993, p. 10, grifo meu) defende que estas são ―aplicações das normas linguísticas e editoriais‖ – lembrando que, por essa perspectiva, normalização/padronização não se confunde com revisão. Contudo, questiono XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015 XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis se a normalização/padronização compõe o processo de preparação e contempla a aplicação de normas linguísticas, pergunto: em que esta atividade que compõem a preparação se diferencia da revisão (exceto em relação à às normas editoriais) se esta implica a correção gramatical que é, em si, a aplicação de normas linguísticas? Guedes (2013, p. 01), em seu artigo que trata da conceituação sobre a revisão de textos apresenta, logo no início, que o revisor é o ―profissional quem corrige as formas construídas fora das normas padrão‖. Na sequência, a autora afirma justamente que a compreensão do papel do revisor é restrita pois não considera a adequação aos gêneros, a estilística e a semântica. Ora, embora neste ponto a autora não conceitue ―normas padrão‖, é possível notar certa incoerência nas afirmações, uma vez que, ao colocar o revisor como aquele que apenas adéqua à norma padrão, torna-se incoerente defender que a visão é restrita, pois a própria afirmação primeira o é. É importante lembrar que nem sempre o revisor deve se ater às normas gramaticais. Coelho Neto designa um capítulo de sua obra para tratar apenas dos ―Conceitos de Revisão‖. Logo no início, vincula a revisão à ―qualidade do material publicado‖. Ora, se todo texto revisado tem como objetivo final a publicação, preferencialmente de qualidade, e para tanto, o revisor prepara o texto, não seria ele também um preparador? Ainda neste capítulo, defende o autor (2008, p. 61): Faz-se, então, imprescindível a figura do revisor. É na revisão textual consciente, detalhista e competente, que o conteúdo vai ser aprimorado, no que diz respeito à coesão e à coerência, aos erros ortográficos, aos erros conceituais, enfim, aos deslizes praticados pelo autor. Creio que esta é uma das mais completas conceituações encontrada nas referências consultadas para a elaboração deste trabalho, uma vez que contempla desde os aspectos ortográficos até erros conceituais, englobando todos os níveis de construção de um texto. Esta é a palavra-chave: texto. Em capítulo sobre a construção de sentidos no texto, Koch (2001) apresenta três tipos de conhecimentos necessários para o processamento textual: o linguístico, o enciclopédico e o interacional. O primeiro seria a base para os demais, pois engloba os aspectos gramaticais e lexicais, que permitem a adequada exposição e organização das ideias por meio da língua. Já o conhecimento enciclopédico, também chamado conhecimento de mundo, é bastante amplo, uma vez que trabalha com a bagagem de vida de cada indivíduo e refere-se ao conteúdo temático das proposições. Por último, está o interacional, que seria o conhecimento a respeito das situações comunicativas, do contexto em que os interlocutores se encontram. No caso de textos escritos, este último diria respeito ao gênero e ao suporte da publicação. Tendo em vista tais conceituações e pensando, novamente, na noção de texto, parece-me a nomenclatura mais adequada ―revisão textual‖. Essa expressão, ao invés de XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015 XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis se apresentar como restritiva, segmentadora do próprio texto e do trabalho do revisor, abrange diversos aspectos, todos da competência deste profissional. 4 (In)conclusões O trabalho do revisor evoluiu da mesma forma que os sistemas de escrita, os quais vêm se modificando desde as pinturas rupestres até os sistemas atuais. É natural, então, que ao longo do desenvolvimento da profissão, suas conceituações variem, assim como muito variou o campo de atuação. Contudo, em pleno século XXI, no qual despontam cada vez mais gêneros e suportes para diversas produções textuais – que requerem revisão –, a necessidade de melhor compreender esta profissão apresenta-se como fator importantíssimo para sua inserção no mercado. Além disso, é importante ter em mente que ―o papel do revisor de textos é de fundamental importância, quando existe preocupação do cliente (o editor ou o próprio autor) com a qualidade do material publicado‖ (COELHO NETO, 2008, p. 61) Parece-me que a divisão entre normalização, padronização, preparação e os diversos ―tipos‖ de revisão não foi, até o momento, devidamente delineada; e creio que porque não o pode ser. São tênues demais as linhas que separam estes conceitos, e a separação deles leva a um trabalho incompleto por parte do revisor. Como fator agravante da situação atual do profissional revisor de textos, está o fato de serem escassas as publicações (sobretudo científicas) a esse respeito, o que demonstra pouca atenção dos próprios revisores para com a conceituação de seu trabalho. Consequentemente, o revisor tem dificuldades de se formalizar e profissionalizar, uma vez que não se pode colocar no mercado um serviço em relação ao qual não há consistência. É pouco, para que se obtenha resultado final satisfatório, revisar apenas aspectos ortográficos ou sintáticos, bem como apenas de coerência e coesão, por exemplo, uma vez que o texto é um entremeado de diversos aspectos e todos possuem a mesma importância para uma boa compreensão e apresentação. Nesse sentido, não me parece adequada a realização de uma revisão que não considere o texto como um todo. Todo este que, embora possa ser segmentado, só faz sentido em sua completude. O futuro do revisor não está na segmentação, mas na abrangência. Referências CEGALLA, D. P. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2008. COELHO NETO, A. Além da revisão. 2 ed. Brasília: Senac, 2008. XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015 XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis CHARTIER, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: Unesp; Imprensa Oficial, 2009. GUEDES, L. F. Revisão de textos: conceituação, o papel do revisor textual e perspectivas do profissional do texto. 2013. 13 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Letras Português)—Universidade de Brasília, Brasília, 2013. KOCH, I. V. O texto: construção de sentidos. In: O texto em perspectiva. Porto Alegre: Organon/UFRGS, v. 9, n. 35, p. 21-27, 2001. PINTO, I. O. O livro: manual de preparação e revisão. São Paulo: Ática, 1993. XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação SEPesq – 19 a 23 de outubro de 2015